Tuesday, June 30, 2015

"VIRANDO A PÁGINA": UMA ÓTIMA REFLEXÃO SOBRE A JUVENILIZAÇÃO DE HOLLYWOOD

por Chico Marques


A parceria de Hugh Grant com o roteirista Marc Lawrence vem de longa data. 

Juntos, fizeram comédias românticas extremamente bem recebidas pelo público adulto, como "Forças do Destino" (1999), "Cadê os Morgans?" (2009) e "Letra e Música" (2007).

Como time bom é time que está ganhando, Grant e Lawrence acabam de retomar a parceria nesse "Virando A Página", que é uma variação sobre o mesmo tema de "Letra e Música", só que focado na Indústria Cinematográfica ao invés da Indústria Fonográfica.
Grant faz um roteirista, Keith Michaels, conhecido mundialmente por um sucesso na década de 1990 -- um drama teológico chamado "Paraíso Fora de Lugar". Infelizmente, este sucesso não se repetiu nos filmes seguintes que ele escreveu, e como em Hollywood existe a regra que diz "você é o seu último filme", Keith se vê obrigado a deixar seus projetos de roteiros de lado e dar aulas em uma universidade pública no interior dos EUA para conseguir pagar as contas.

Sua amiga e agente Susan (Caroline Aaron) consegue ver um pouco mais longe que ele, e percebe nessa desgraça toda uma possibilidade de iniciar uma volta por cima. Mas Michaels não facilita as coisas. Não leva o menor jeito para a sala de aula. Avalia suas estudantes como se estivesse fazendo casting de modelos. 

Até que entra em cena uma estudante madura chamada Holly (Marisa Tomei), que percebe as inseguranças do "professor" e o ajuda a se recompor tanto artisticamente quanto emocionalmente.
Se em "Letra e Música", o popstar esquecido personificado por Grant tenta não mostrar ressentimento por estar esquecido depois de ter servido tão bem aos interesses da Indústria Fonográfica -- alega nunca ter sido enganado por ela -- e conforma-se em fazer shows em Festas de Quarentonas em Chicago, aqui a pegada é bem diferente. 

O roteirista que ele personifica em "Virando A Página" não consegue se conformar com sua nova situação. Coloca-se como vítima da Indústria, que relega o trabalho dos roteiristas à falta de imaginação dos produtores e do grande público. 

De quebra, mostra como é cada vez mais difícil ser criativo em Hollywood, e defende a tese de que não há melhor referência do que as experiências do próprio autor.

Questionável? 

Sem dúvida. 

Até porque o trabalho formulaico de Hugh Grant com Marc Lawrence não prima exatamente pela criatividade e pelo inusitado. 

Na verdade, o foco das reclamações do filme é o pouco caso dos imensa maioria dos produtores para com filmes voltados ao público adulto, num mercado cada ano mais juvenilizado.
Enfim, o importante em "Virando A Página" é que a química entre Hugh Grant e Marisa Tomei rola às mil maravilhas, e dá sustentação ao filme.

Marisa está lindíssima aos 50 anos de idade, esbanjando charme e aquela delicadeza doméstica que fez dela a "Garota do Brooklyn" favorita de nove em cada dez marmanjos frequentadores de salas de cinema, de "Meu Primo Vinny" para cá.   
Já Hugh Grant é uma estrela à moda antiga, que achou um caminho próprio para sua carreira numa Cena meio hostil a gente com o perfil dele. Por ser inglês, conseguiu escapar à triagem cruel que Hollywood impõe aos astros americanos de sua faixa de idade. Chega a ser surpreendente que ele tenha conseguido permanecer exclusivamente como ator de cinema até agora, já que as melhores ofertas para atores entre os 50 e 60 anos de idade estão na TV. Mas o caso é que Grant é brigão, e tem o seu valor. E a cada filme que passa se revela um ator melhor.

Por essas e outras, vale a pena ver "Virando A Página". É entretenimento inteligente, leve e (relativamente) descompromissado, sem contra-indicações. 

Na mesma longa tradição cinematográfica de Spencer Tracy e Kate Hepburn, Rock Hudson e Doris Day, Woody Allen e Diane Keaton, Billy Crystal e Meg Ryan, etc, etc, etc....

VIRANDO A PÁGINA
The Rewrite
(2014 - 107 minutos)

Direção e Roteiro
Marc Lawrence

Elenco
Hugh Grant
Marisa Tomei
Allison Janney
J K Simmons
Bella Heathcote


em cartaz no ROXY Iporanga 4 (Shopping Pátio Iporanga),
 e no Cinemark (Miramar Shopping)



Sunday, June 28, 2015

CAMERON CROWE DRIBLA AS ADVERSIDADES E ACERTA A MÃO EM "ALOHA-SOB O MESMO CÉU"

por Chico Marques

"Aloha", novo filme de Cameron Crowe, é uma comédia romântica incomum e fora dos padrões, com diálogos rápidos e inusitados, e que segue num tom debochado, quase altmaniano. Não é um filme em tom menor, como o anterior "Comprei Um Zoológico". Também não é um projeto extremamente ambicioso, como "Vanilla Sky" e "Quase Famosos". É, na verdade, mais um mergulho na alma da América após uma descida ao Inferno em busca de alguma espécie de redenção pessoal, como em "Elizabethtown". Considerando a extrema má vontade com que a crítica recebeu tanto "Elizabethtown" quanto "Comprei Um Zoológico", não é de se espantar que "Aloha" também fosse mal recebido por eles.

E como foi. 

"Aloha" (que aqui ganhou o estranho título "Sob O Mesmo Céu") começou a apanhar da Imprensa Especializada meses antes de seu lançamento, por conta de emails desfavoráveis ao projeto da ex-presidente da Sony Pictures, Amy Pascal, que vazaram para a imprensa. 

Quando estreou finalmente, foi massacrado por críticos que alegaram que o filme, todo rodado e ambientado no Hawaii, é branco demais e mostra poucos havaianos nativos na tela -- uma alegação no mínimo leviana e injusta. 

Para piorar, metralharam o trio romântico Bradley Cooper-Rachel McAdams-Emma Stone, alegando que falta química entre eles -- ou seja, a mesma alegação requentada que já havia sido usada contra Orlando Bloom e Kirsten Dunst em "Elizabethtown" e contra Matt Damon e Scarlett Johansson em "Comprei Um Zoológico".
Na trama, o personagem de Bradley Cooper é um militar que trabalhou para a NASA no passado, e que, depois de fracassar em uma missão de guerra em Cabul, aceita retornar ao Hawaii, sua terra natal, para um novo trabalho de natureza duvidosa para um multimilionário que investe na Corrida Espacial, deliciosamente interpretado por Bill Murray. Inicia uma relação afetiva bastante conturbada com sua assistente, Emma Stone, uma piloto de jatos muito ambiciosa, mas não a ponto de abrir mão de suas raízes havaianas. E, de quebra, resgata uma velha paixão de muitos anos atrás com Raquel McAdams, agora casada com um piloto caladão e com um casal de filhos muito engraçados.

É um filme adorável, com a marca estilística de Cameron Crowe. Desde o sucesso estrondoso de "Jerry McGuire", ele vem procurando saídas para renovar a comédia romântica, alternando drama e comédia em receitas bem dosadas, semelhantes às usadas por James L. Brooks em seus filmes, mas sempre com um diferencial existencial pop -- consequência de sua longa associação com a revista Rolling Stone, onde trabalhou como jornalista nos Anos 70 e 80. 

Daí, é compreensível que publicações caretas e futriqueiras íntimas da Indústria Cinematográfica, como Variety e The Hollywood Reporter, tenham achado o filme "profundamente confuso" e "fatalmente equivocado". 
"Aloha" teve uma bilheteria decepcionante em sua primeira semana. Mas tudo indica que o boca a boca deva permitir que, ao longo dos próximos meses, o filme ganhe público aos poucos no mercado internacional, nas plataformas de  Video On Demand e no lançamento em DVD-Blu Ray, e as contas se acertem, o que deve dar um cala-boca nos detratores de plantão. Apesar de todas as adversidades, "Aloha" está emplacando sua terceira semana em cartaz. Convenhamos: um fiasco não emplaca uma terceira semana, sai de cartaz logo após a primeira.

"Aloha" é um filme delicioso, mas é inegável que tem alguns defeitos. O roteiro flui de maneira inconstante, e os diálogos sempre rápidos nem sempre parecem ter um foco muito claro. Fica a impressão de que Cameron Crowe permitiu a seus atores inserir cacos demais no script. Isso somado ao naturalismo -- nitidamente influenciado por Robert Altman -- das interpretações do trio central, já deve ser motivo suficiente para desagradar ao público habituado com a "objetividade narrativa" em voga em 99% dos filmes de Hollywood de uns anos para cá. Já a direção de Crowe, com muita câmera na mão em movimentos inusitados, tentando passar liberdade de movimentos para os rumos de seus personagens, com certeza vai irritar as plateias mais sisudas e apegadas a convenções.  

Grandes diretores como Peter Bogdanovich, Philip Kaufman e Alan J Pakula -- para não falar em Robert Altman e Woody Allen -- já foram alvos de campanhas difamatórias bem sucedidas como esta que assola a carreira recente de Cameron Crowe, e saíram vivos delas. Crowe é um diretor extremamente criativo, que se reinventa constantemente em termos artísticos. Não é ainda um grande diretor. Ainda tem muito o que crescer. Se deixarem, ele chega lá. Daí, fica a pergunta: a quem interessa tirar a autonomia criativa tão duramente conquistada por Cameron Crowe?

Francamente? Eu -- assim como 99% dos seres humanos frequentadores de salas de cinema -- estou me lixando para as politicagens de Hollywood, que são amplificadas por esse exército de críticos futriqueiros de plantão, que vivem de babar o ovo de Hollywood em troca de presentinhos e de eleger as "bolas da vez" ascendentes e descendentes na cena cinematográfica.

Querem um conselho?

 Assistam "Aloha - Sob O Mesmo Céu". 

Mas antes preparem-se para embarcar numa comédia romântica nada corriqueira sobre um Hawaii bem mais cativante do que aquele que consta nos Guias Turísticos.  
SOB O MESMO CÉU
Aloha
(2015 - 118 minutos)

Direção e Roteiro
Cameron Crowe

Elenco
Bradley Cooper
Rachel McAdams
Emma Stone
Bill Murray
Alec Baldwyn
John Krasinski
Danny McBride
Em cartaz no Roxy Iporanga 4,
 no Shopping Pátio Iporanga




POEMINHA DE DOMINGO (por Antonio Luiz Nilo)

PONTO E TRAÇO


Mais uma vez estamos nós no papel.
Eu e minha infiel caneta,
a brilhante delatora da discreta intimidade.
Deslizando, independente e segura,
sobre a superfície de pautas estreitas,
a pena, sem a mínima pena, apenas flui seu veneno.
Encouraçada pela sutileza das entrelinhas
vai rasgando o papel e a alma
como os orientais que espetam sem dor.
A velha caneta, apesar de infiel, é mesmo a velha e única confidente.
Às vezes penso que faz parte da gente,
como um membro implantado.
Uma espécie de prótese da personalidade.
Na verdade, a velha caneta e eu somos apenas um.
Um único traço de ódio e amor preenchendo os espaços.
Um único jeito de confessar as culpas de quem peca por viver.
O que a velha caneta representa pra mim
é tão somente a própria existência.
Algo como o começo, o meio e o fim.
Se hei de responsabilizá-la
pela força da tristeza e a insegurança da alegria,
assim o faço.
E com ela, eu assino embaixo.




Antonio Luiz Nilo nasceu em Santos, 
e é redator publicitário e diretor de criação
há quase 30 anos,
com prêmios nacionais e internacionais.
Circulou a trabalho por todo o país,
com paradas prolongadas em Brasília,
Belo Horizonte e Salvador.
Publicou em 1986, o livro de poemas
"Poemas de Duas Gerações", 
e, mais recentemente, o romance
"Ascensão e Queda de Pedro Pluma"
(disponível para venda em alnilo@gmail.com).
Além disso, atuou como cronista
para o diário Correio da Bahia.
De volta a Santos desde 2013,
Antonio Luiz Nilo segue sua trajetória
como diretor de criação da Agência Êxodo
e como sócio-diretor da Agência de Textos
TP - Texto Profissional.




A BELEZA MAJESTOSA DE ISABELLE ADJANI RESISTE BRAVAMENTE AOS 60 ANOS DE IDADE

por Chico Marques

Isabelle Adjani completa 60 anos de vida neste sábado, 27 de Junho.

 Lá se vão 40 anos desde que ela foi apresentada ao público internacional através de 'Adele H", de François Truffaut. Foram quase oito anos tentando filmá-lo. No final dos Anos 60, Truffaut quase conseguiu. Jeanne Moreau seria Adele H. De repente, a produção empacou. Em meados dos 70, o filme finalmente entrou em pré-produção. Catherine Deneuve, namorada de Truffaut na época, foi escalada para fazer Adele. Mas então, ele viu acidentalmente a jovem e desconhecida Isabelle num teleteatro e ficou impressionadíssimo, tanto com sua beleza e seu vigor quanto com seu talento. Não teve dúvidas: chamou-a para fazer o papel (dificílimo) de Adele Hugo, e emplacou um sucesso internacional. Obviamente, seu namoro com Catherine Deneuve não resistiu a tantos solavancos, e acabou. Só Truffaut mesmo para fazer uma desfeita dessas com uma mulher do quilate de Catherine Deneuve...

Isabelle Adjani não era -- e não é, até hoje -- de fácil trato. Temperamental, inconstante e exigente ao extremo, ela ganhou fama por atrasar produções criando problemas difíceis de contornar. Alguns diretores, como Jean-Paul Rappeneau e Claude Miller, adoram trabalhar com ela. Outros, como Luc Besson, não querem vê-la nem pintada pela frente. Quando ela casou com o igualmente difícil Daniel Day Lewis, comentários irônicos sobre possíveis atrasos em filmes com os dois no elenco entraram rapidamente para o folclore da cena cinematográfica. 

De qualquer maneira, depois do sucesso estrondoso de "Camille Claudel" e "Rainha Margot", as idiossincrasias habituais de Isabelle Adjani passaram a ser aceitas pelos produtores. Afinal, ela havia se transformado num dos maiores produtos culturais de exportação da França. Não é pouca coisa.

Dos três filmes de Isabelle Adjani que selecionamos para hoje, dois são recentes, e um terceiro, de vinte anos atrás, pede um revisão urgente. Todos eles estão disponíveis nas estantes da Paradiso Videolocadora.

MAMUTE
(Mammuth, 2010, Gustave de Kevern)
Serge (Gérard Depardieu) acaba de completar 60 anos de idade e precisa reunir documentos para poder se aposentar. Com uma cabeleira enorme e montado em sua motocicleta Munch Mammut dos anos 70, ele inicia uma jornada em busca de seus antigos empregadores que acaba se transformando numa busca existencial. Enquanto visita os lugares onde passou sua infância e juventude, ele encontra velhos amigos, parentes e o fantasma de seu grande amor (Isabelle Adjani). Um filme delicadíssimo e pouco conhecido da filmografia de Depardieu. Isabelle está lindíssima em suas aparições. (disponível em DVD, 92 minutos)

VIAGEM DO CORAÇÃO
(Bon Voyage, 2013, Jean-Paul Rappeneau)
Um espião nazista (Peter Coyote), uma linda estudante (Virginie Ledoyen) e a amante (Isabelle Adjani) de um político (Gérard Depardieu) têm suas vidas entrelaçadas quando alguns refugiados franceses tentam escapar da ocupação alemã na França mo início da Segunda Guerra Mundial. Produção de peso, dirigida com a delicadeza habitual de Rappeneau, que também é responsável pelo roteiro. Outro filme pouco visto das filmografias de Adjani e Depardieu, que merece a sua atenção. 
(disponível em DVD, 115 minutos)

DIABOLIQUE
(Diabolique, 1996, Jeremiah S. Chechik)
Duas mulheres (Sharon Stone e Isabelle Adjani) decidem envenenar o homem que as trata como lixo, e afundam seu corpo na piscina escura. Mas quando a piscina é esvaziada para ser limpa, não há nenhum corpo por lá. As duas mulheres irão se safar desse assassinato, mas sabendo que alguém removeu o corpo da vítima e sabe a verdade sobre o que elas duas fizeram. Thriller de suspense parcialmente baseado no clássico francês de 1955 "Les Diaboliques", que não foi bem recebido pela crítica em sua estréia por conta das comparações com o original. Mas que, revisto agora, se revela um film noir com ares "camp" bastante eficiente e original. (disponível em DVD, 107 minutos)





Friday, June 26, 2015

"ENQUANTO SOMOS JOVENS": UM RITO DE PASSAGEM AGRIDOCE DE NOAH BAUMBACH

por Chico Marques

Há mais de 50 anos, o cinema produzido na cidade de Nova York lança constantemente no mercado novos talentos que acabam se revelando de valor inestimável para a renovação do cinema americano. 

Nos Anos 60, quem brilhou foi John Cassavetes. 

Nos Anos 70, Woody Allen. 

Nos 80, Spike Lee, e nos 90, Edward Burns. 

Todos poderiam ter seguido para Hollywood, mas a maioria deles preferiu permanecer em Nova York, fortalecendo o cinema produzido na cidade e dando sequência a carreiras notáveis.

Pois a bola da vez do cinema novaiorquino é Noah Baumbach, cineasta com uma filmografia em construção desde a metade dos anos 1990. Graças ao surpreendente sucesso de sua comédia FRANCES HA, de 2012, o agora quarentão Baumbach vem transformando em ficção uma certa perplexidade diante do que imagina vir pela frente em sua vida.
A descoberta de que o tempo passa sem que notemos isso com clareza é o tema de ENQUANTO SOMOS JOVENS, novo filme de Noah Baumbach, que traz novamente Ben Stiller, agora fazendo um quarentão inseguro e perdido que volta para sua Nova York e não consegue se reconectar com os antigos amigos. 

A diferença entre este trabalho e O SOLTEIRÃO, que os dois realizaram juntos em 2010, é que aqui prevalece a ótica de um casal ligado ao cinema documentário que, não mais do que de repente, percebe que está sendo ultrapassado. 

Josh (Stiller) e Cornelia (Naomi Watts) ficam amigos de Jamie (Adam Driver) e Darby (Amanda Seyfried), uma casal de hispters. Descolados, eles renegam o Facebook, usam roupas esquisitas e ouvem discos de vinil. Há 10 anos tentando terminar um documentário, Josh dá aulas e vive à sombra do sogro, o velho documentarista Leslie Breitbart (Charles Grodin), que um dia foi seu mentor. Mas nada parece andar para a frente em sua vida

ENQUANTO SOMOS JOVENS é dividido em duas partes bem distintas, mas complementares. Na primeira, Josh e Cornelia estão fascinados pelos seus novos amigos, e a amizade entre eles começa a entrar em xeque quando participam de uma cerimônia em que tomam o Santo Daime. Entre vômitos e alucinações, Josh começa a perceber que ele e Jamie, também documentarista, têm visões diferentes sobre ética e realidade. A partir daí, o filme toma um novo rumo, já que Josh enbarca numa trip paranóica em que vê Jamie como inimigo. 
Com diálogos incisivos, às vezes lapidares, que seguem num ritmo ágil semelhante ao dos filmes franceses, ou das comédias de Hollywood do final dos Anos 30, ENQUANTO SOMOS JOVENS consegue ser engraçado de uma maneira muito peculiar, começando de forma irônica e ficando um tanto quanto amargo da metade em diante. 

Não pretende ser um filme divertido. 

Mas é, com certeza, um filme muito engraçado. 

E tanto Stiller quando Naomi Watts e Amanda Seyfried -- e principalmente o genial Charles Grodin --, ajudam bastante para que esse tom incomum se concretize de forma plena nesta bela empreitada cinematográfica.


ENQUANTO SOMOS JOVENS
While We're Young
(2015 – 97 minutos)

Direção e Roteiro
Noah Baumbach

Elenco
Ben Stiller
Naomi Watts
Adam Driver
Amanda Seyfried
Maria Dizzia
Adam Horovitz
Charles Grodin


Em cartaz no Cinespaço Shopping Miramar





UMA NOITE COM BRUNA SURFISTINHA (por José Luiz Tahan)


Foi no auge do seu livro, O DOCE VENENO DO ESCORPIÃO (Panda), do Marcelo Duarte. Auge mesmo: o livro estava em primeiro lugar na lista dos mais vendidos por todos os lados. O relato da menina de classe média que ganha a vida satisfazendo os clientes com o seu corpo conquistou o Brasil. E num sábado eis que a nossa escritora surge pela porta da livraria. Usava uma camiseta branca e jeans de marca, me pareceu tímida, um pouco deslocada, dá pra entender. Foi um dos primeiros eventos feitos por Raquel, que assim se apresentou: “Prazer, Raquel”.

Lembrando dos dias que antecederam a sessão de autógrafos, vale contar que a imprensa local nos ignorou solenemente. Passamos em branco por todos os veículos que sempre nos apoiavam em pequenos ou grandes encontros com autores. Recebi até um telefonema irritado e ameaçador de uma senhora (a voz parecia a de uma senhora), que bradava contra a nossa escolha. “Como que uma livraria séria traria uma, uma, você sabe”...

 No dia passamos por outro constrangimento. Um freqüentador da Realejo chega um pouco antes da hora marcada para o lançamento e dispara: “A Bruna já chegou?” Compra um exemplar e pede para ser atendido em caráter de urgência, está com pressa. Raquel estava recolhida no andar de cima, tomando um café acompanhado de um pão de queijo.

 Achei melhor subir também, intuição de livreiro dublê de cronista. Flagrei o meu cliente propondo um encontro para uma leitura a dois do livro recém comprado. Raquel olhava para mim e dizia ao senhor: “Parei”. Simples assim, sem emoção. No final das tentativas rolou um beijinho e uma foto.
 Para solucionarmos a “ignorada” da imprensa a autora usou do melhor expediente que a antiga profissão lhe deixara. Acendeu um cigarro e ficou de pé na calçada da livraria olhando para um ponto imaginário, com aquele olhar morno, em transe. Deu certo, vendemos muitos livros. Para minha surpresa o público era mais feminino e jovem. Será que as mulheres competem? Queriam conferir de perto os atributos que levaram a autora à fama?

Sejam quais forem as respostas para essas perguntas, o livro virou filme com Deborah Secco no papel de Bruna, e não entrou para a estante dos grandes textos eróticos. Mas serve mais como um registro cru e desconcertante de uma menina que queria migrar de classe social pelo caminho da alcova. 

Hoje, Raquel Pacheco mantém sua personagem Bruna Surfistinha viva e ativa como DJ e como Conselheira Sexual no website ingenua.com.br , e neste último final de semana fez leituras dramáticas de suas histórias de alcova na Virada Erótica, um evento paralelo à Virada Cultural Paulistana.

José Luiz Tahan, 41, é livreiro e editor.
 Dono da Realejo Livros e Edições em Santos, SP,
 gosta de ser chamado de "livreiro",
 pois acha mais específico do que
 "empresário" ou "comerciante",
 ainda mais porque gosta de pensar o livro
 ao mesmo tempo como obra de arte e produto.
 Nas horas vagas, transforma-se
 no blues-shouter Big Joe Tahan.

(a ilustração acima é do Seri)

A REVISTA MIRANTE COMPLETA 32 ANOS NESTA SEXTA NO FOYER DO TEATRO MUNICIPAL (20hs)



Nesta sexta-feira, a partir das 20 horas, a Secretaria de Cultura promoverá o lançamento da edição nº. 89 da Mirante - Revista Literária Santista, coordenada pelo poeta Valdir Alvarenga e coeditada pelo poeta Antônio Canuto e pela também poeta Irene Estrela Bulhões, responsável pela diagramação visual da Revista. 

A Mirante é uma publicação independente, das mais tradicionais da região, que circula há 32 anos em Santos. Lançada e editada durante todo esse período pelo poeta Valdir Alvarenga, surgiu da efervescência do movimento que ficou conhecido nacionalmente nas décadas de 70 e 80 como “poesia marginal”. 

Detentora do título de mais longeva revista literária independente do país, atravessa os anos dando a ver tanto os escritores consagrados pela história quanto talentos anônimos da literatura santista e mundial.

Na edição nº. 89 a ser lançada nesta sexta, a Mirante traz os centenários de Batista Cepelos (poeta, natural de Cotia, 1872 - 1915), Saul Bellow (escritor canadense, 1915 - 2005) e o cineasta Orson Welles (EUA, 1915/ 1985). A poesia, por sua vez, será representada por escritores do litoral e da capital paulista e também de outros Estados, como Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. 

Nesta edição a Mirante dá destaque à poesia contemporânea da atriz, jornalista e bailarina Dóris Giesse; do poeta português Herberto Helder e do cubatense Afonso Schmidt. Contos, ilustrações, curiosidades linguísticas, crônicas e poesia visual são outros componentes da revista.

O lançamento da Mirante, que será musicado pelo Quarteto de Cordas Martins Fontes, acontecerá nesta sexta-feira, 26/06, a partir das 20 horas, na Galeria de Arte "Braz Cubas" (foyer do Teatro Municipal), no Centro de Cultura Patrícia Galvão, Avenida Pinheiro Machado, nº. 48, Vila Mathias – Santos/SP.

Na ocasião, os presentes poderão também apreciar a Mostra Individual da artista plástica e arquiteta santista Iná Uehara, que até o dia 04 de julho estará aberta ao público no Espaço VIP da Galeria de Arte Braz Cubas.

A entrada é franca.

(texto de Valdir Alvarenga)




Thursday, June 25, 2015

AL PACINO E BARRY LEVINSON NUM BELO FILME BASEADO NUM BOM ROMANCE DE PHILIP ROTH

por Allyson Oliveira
publicado originalmente no CineWeb


Há mais ou menos uma década —talvez desde sua participação como o personagem central de "O Mercador de Veneza"—, Al Pacino não procurava algo no cinema que se assemelhasse o mínimo que fosse a um desafio.

Desde a participação em um filme de Adam Sandler ("Cada Um Tem a Gêmea Que Merece") a policiais inócuos ("88 Minutos" e "As Duas Faces da Lei", no qual divide cena com Robert DeNiro), o ator que interpretou Michael Corleone na trilogia "O Poderoso Chefão" não saía da zona de conforto.

Em "O Último Ato" —adaptação do romance "A Humilhação", do escritor norte-americano Philip Roth, que estreia nesta quinta (2)—, Pacino mostra do que é capaz, algo que talvez tivéssemos esquecido há algum tempo, e se destaca mais do que o filme, algumas vezes histérico, em outras certeiro.

O tema é um ator envelhecido que está perdendo a razão num mundo governado por e para jovens mentes brilhantes. Os velhos e os fracos não têm vez.
Pacino é Simon Axler, ator veterano que, durante uma apresentação de uma peça de Shakespeare na Broadway, percebe que está perdendo aquilo que o fazia especial, algo maior do que seu talento apenas. A partir de então, o personagem entra numa espiral de insegurança e incerteza, no que considera uma espécie de reta final de sua vida.

Isso não transforma o filme, dirigido por Barry Levinson ("Assédio Sexual", "Mera Coincidência") em algo melancólico, pelo contrário, o tom predominante é de cinismo. Isso talvez porque o próprio diretor, o ator e o autor do romance estejam na mesma faixa etária do personagem, portanto, sabem como encarar essa fase com um humor sarcástico.

Num momento parecido com uma cena de "Birdman", Axler se tranca do lado de fora do teatro onde estará em cena em poucos instantes, e não consegue convencer o segurança de que precisa entrar no palco a todo custo.

Quando, finalmente, consegue entrar, provoca um incidente e acaba num hospital psiquiátrico, onde conhecerá Sybil (Nina Arianda), uma mulher rica e perturbada que pede ajuda para matar o marido que, supostamente, abusou da filha do casal.

A dificuldade que esta mulher tem para distinguir entre realidade e fantasia é um dos temas que permeiam o filme —até mesmo a vida do protagonista, embora num outro nível. Como o projeto de vida dele parece ser trazer a verdade para seus papéis, a linha entre a imaginação e o mundo real é tênue.
Quando Pegeen (Greta Gerwig) entra em cena, a vida de Axler torna-se mais movimentada, mas também mais confusa. Ela é filha de um casal de amigos, Asa (Dan Hedaya) e Carol (Dianne Wiest), com quem ele trabalhou no passado.

A moça, em alguns momentos, é mais complicada do que ele, e parece não pensar duas vezes em usar as pessoas para conseguir seus objetivos ? embora pareça ser uma jovem sem muitas certezas ou convicções.

Ela é lésbica assumida, mas entra num relacionamento doentio com Axler, mesmo mantendo um caso com a reitora da faculdade onde dá aula, Louise (Kyra Sedgwick); e também atraindo a atenção de Prince (Billy Porter), um transexual.

Não é difícil entender a atração que todos sentem pela moça, apesar do seu irritante egocentrismo. Ela transmite uma aura de poder que fascina ? mesmo sabendo que, mais cedo ou mais tarde, irá se livrar de quem seduziu, quando não lhe for mais proveitoso.

É curiosa a visão do filme sobre as mulheres —materializada nas personagens Nina e Peegan—, nenhuma muito positiva ou minimamente simpática. A chave cômica atenua, mas não apaga, a ameaça de destruição que elas representam para o protagonista.
Em seus últimos romances, publicados entre 2006 e 2010, o autor Philip Roth mostra-se preocupado com momentos limítrofes da existência, criando narrativas que caminham para uma conclusão, vidas que se aproximam da morte, e com isso, todo o peso de meditação e reflexão que trazem junto.

A transposição de "A Humilhação" para o cinema perde um pouco dos questionamentos e lamentos do livro mas, ainda assim, mantém-se fiel ao espírito do escritor.


O ÚLTIMO ATO
The Humbling
(2014 - 112 minutos)

Direção
Barry Levinson

Roteiro
Buck Henry

Produção
Jason Sosnoff
Barry Levinson

Elenco
Al Pacino
Nina Aranda
Greta Gerwig
Dan Hedaya
Dianne Wiest
Kyra Sedgwick
Billy Porter