Anos 70 e nada, 11 horas, Veloso (Garota de Ipanema para os turistas).
Estava eu sentado à única mesa da varanda que realmente fazia a esquina das ruas Montenegro com Prudente de Morais. O bar estava começando, mas prometia. E como.
Recebo o terceiro chope do Dimas (ótimo garçom) quando vejo que ocuparam a mesa ao lado. Viro a cabeça e reconheço Tom Jobim, Antonio Pedro, Hugo Carvana e Miúcha.
Meu sábado estava feito. E, também, muito de minha cabeça atual.
O papo era dos mais engraçados, inteligentes e, óbvio, surpreendentes.
Como se pode imaginar. Só para variar, Tom liderava o grupo. Aquele e qualquer um em que estivesse.
Com seu modo irresistivelmente carioca de falar, ele me convidou a fazer parte da mesa deles.
Virei a cadeira e entrei de ouvinte num dos maiores papos do qual já "participei".
Da Ditadura ao jogo do Flamengo do dia seguinte, passando por Cartola e Debussy, pelas diferentes espécies de urubus, passarinhos, aves, ovos, e muitas outras bossas novas e antigas, Tom foi desfilando o seu talento e inteligência na escolha das palavras por mais de duas horas.
E, quando citava Chico (amiúde), seus olhos brilhavam, tal o carinho que tinha pelo mais famoso dos Buarque de Holanda.
No final, depois que eles pagaram (penduraram) a conta, Tom se levantou e me disse, naquele sotaque que conquistou o mundo:
"Carrrloss, foi um prazer! Gosto muito de São Paulo. Eu sou do 25 de janeiro!"
Miúcha se despediu de maneira diferente. Ela me fitou com olhos gulosos, (e sorria com aqueles seus dentes magníficos de égua no cio), dizendo:
"Volta amanhã, rapazzzz. O Veloso pega mesmo é no domingo..."
Infelizmente, não deu pra pegar aquela turma de orgulhos da raça. Pelo menos na hora combinada.
É que outra carioca, esta uma linda garota de Ipanema de não mais de dezoito anos, me desencaminhou pela madrugada a dentro, me fazendo acordar pra lá das 2 da tarde, no VIP's, o mais badalado motel da época.
Assim, quando cheguei ao Veloso, quatro e fumaça da tarde, a genial turma da véspera já tinha se mandado para outros bares. Ou lares. Como queira.
Mas o que eu vi, ouvi e aprendi naquele sábado jobiniano
valeu por uma vida.
Carlão Bittencourt é redator publicitário e cronista,
autor de "Pela Sete - Breves Histórias do Pano Verde"
(2003, Editora Codex),
um mergulho no universo dos salões de bilhar de São Paulo,
e escreve todas as quartas-feiras em LEVA UM CASAQUINHO
No comments:
Post a Comment