A Dra. Jenny Davin (Adèle Haene), jovem e dedicada médica de um pequeno ambulatório, não está tendo um dia muito fácil. Às voltas com um estagiário despreparado, Julien (Olivier Bonnaud), e pacientes carentes, não atende à campainha da clínica, que toca uma hora depois do expediente encerrado.
No dia seguinte, quando chega à clínica, é procurada por dois policiais, que pedem para ver a gravação de sua câmera de segurança, referente à noite anterior. Estão tentando esclarecer o que aconteceu com uma jovem que foi encontrada morta, ali perto.
Ao ver a gravação, Jenny se choca ao lembrar-se de ter ouvido a campainha e não atendido, mas não reconhece a jovem que ali aparece. E a polícia também ainda não conseguiu identificá-la. Inconformada, Jeeny resolve também investigar, para descobrir quem é a garota, interferindo, inclusive, no trabalho policial. Mas nem ela nem Julien sabem direito por onde começar. Ela não se conforma em não haver atendido à porta, nem com a moça ser enterrada como desconhecida.
E em suas visitas domiciliares, percebe que um de seus pacientes, o adolescente Bryan (Louka Minnella), e seus pais (Christelle Cornil e Jérémie Renier), parecem saber mais sobre o assunto do que querem admitir. Vai se envolvendo cada vez mais no processo de identificação da moça, uma espécie de “personalização” onde ela deixa de ser um rosto para ser alguém. O problema é que, quanto mais ela se envolve neste mistério, mais complicadas as coisas vão ficando para ela, profissional e pessoalmente.
Drama sobre o remorso e a necessidade de reparação, o filme dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne (de Doois Dias, Uma Noite, 2014), coloca de maneira muito sutil a precária situação dos imigrantes africanos na Europa atual, assim como ilustra a fragilidade da vida frente a situações quase banais. Experimente.
(La Fille Inconnue, 2016, 113 minutos)
Direção
Jean-Pierre e Luc Dardenne
Elenco
Adèle Haene
Olivier Bonnaud
Jérémie Renier
Louka Minnella
Christelle Cornil
Nadège Ouedraogo
em cartaz no Cinespaço Miramar Shopping
com sessões às 13h40, 18h e 20h20
Paul Kromberger (Matthias Habich), homem idoso de opiniões fortes e categóricas, se depara na internet com a foto da cantora erudita Caterina Fabiani (Barbara Sukowa, elegante como nunca), e fica estarrecido com a semelhança dela com sua finada esposa, Evelyn. Inconformado com a “coincidência”, ele apela para sua filha Sophie (Katja Riemann), para que tente contatar Caterina e ver se há alguma relação entre ela e Evelyn. Sophie ruma então para Nova York, onde Caterina está em temporada no Metropolitan Opera House, do Lincoln Center, para tentar falar com ela.
Em Nova York, Sophie vai assistir a uma apresentação de Caterina e tenta falar com ela no camarim, sem muito sucesso. A cantora parece não ter o menor interesse em atender ninguém que não seja de seu círculo mais próximo. Sophie conhece então Philip (Robert Seeliger), que se interessa imediatamente por ela, e acaba se revelando o agente de Caterina, e tenta ajudá-la a aproximar-se desta.
O que parece ser, a princípio, um drama familiar sobre identidades trocadas, acaba se revelando quase uma tragicomédia, dados os estranhos caminhos adotados pela roteirista e diretora Margarethe von Trotta que, com mais de 30 créditos como atriz, escreveu e dirigiu (como aqui), o intrigante “Hannah Arendt - Ideias Que Chocaram o Mundo” (2012). Trotta coloca seus personagens em determinadas situações que beiram o risível, entremeadas de outras que facilmente pertenceriam ao repertório operístico da personagem Caterina. Tudo muito carregado e bufo, ao mesmo tempo.
Difícil avaliar se se trata de uma opção estilística da autora / diretora (vai entender o humor alemão), mas alguns diálogos ou situações passam muito perto da grosseria – como a aproximação de Philip a Sophie -, ou do vaudeville – a relação entre Paul e seu irmão Ralf, ao final do filme.
De qualquer forma, é muito interessante ver as protagonistas, Riemann e Sukowa, na posição destas duas mulheres tão antagônicas e próximas ao mesmo tempo, e ambas – cada qual à sua maneira – dedicando-se à música, e executando ao vivo as canções que interpretam. Experimente.
(Die abhandene Welt, 2015, 101 minutos)
Direção
Margarethe von Trotta
Elenco
Katja Riemann
Barbara Sukowa
Matthias Habich
Robert Seeliger
Gunnar Möller
Karin Dor
em cartaz no Cinespaço Miramar Shopping
com sessões às 14h e 18h20
O retorno de M. Night Shyamalan à direção, “Fragmentado” (Split, 2016), depois do sofrível “Depois da Terra” (2013) e o instigante “A Visita” (2015) – fora uma passagem pela série de TV “Wayward Pines” (2015) -, garante uma dose de suspense e reviravoltas como há muito não se via na carreira do diretor. A tensão está de volta, e o trabalho todo está basicamente nas mãos do astro do filme, James McAvoy (substituindo Joaquim Phoenix, que abandonou o projeto). Algo parecido com o que aconteceu com seu maior sucesso, “O Sexto Sentido” (1999), que baseava-se no talento do pequeno (à época) Haley Joel Osment.
McAvoy é Kevin Wendell Crumb, também conhecido como Dennis, Patricia, Hedwig, Barry, Orwell e Jade – além de 17 outras personalidades que lutam por um lugar sob os refletores (conforme ele próprio define) -, e mais uma, The Beast, que está prestes a emergir e parece ser a mais primitiva e perigosa de todas. Um psicopata com múltiplas personalidades, que sequestra e aprisiona três adolescentes. E não se sabe exatamente suas intenções.
As três garotas – as amigas Claire (Haley Lu Richardson) e Marcia (Jessica Sula), mais a estranha e deslocada Casey (Anya Taylor-Joy, dando um baile) – são sequestradas e mantidas em cativeiro pelos “seres” dentro de Kevin. Com destaque para Dennis, o mentor, Patrícia a instável parceira de Dennis, e Hedwig, um garoto de nove anos (onde McAvoy exercita seu talento ao limite). As outras personalidades pipocam em determinadas situações, mas estes três dominam a cena.
Responsável pelo tratamento mental de Kevin, a Dra. Karen Fletcher (a lenda viva da Broadway, Betty Buckley), trava contato constante com Kevin e seus alteregos, principalmente Barry, um designer de moda elegante e educado, mas sem pulso para conter Dennis. A Dra. Fletcher, inebriada pela sua pesquisa no caso de Kevin, parece não perceber a real extensão do perigo que ele representa, e sua negligência toma proporções inimagináveis.
Numa espécie de spin-off de seu filme “Corpo Fechado” (2000), Shyamalan retoma personagens – Kevin e sua mãe – que haviam aparecido muito rapidamente naquele filme. A primeira intenção era ter histórias paralelas entre aquela – estrelada por Bruce Willis e Samuel L. Jackson – e esta, que acabou ganhando vida própria. Ele cogita até um “terceiro episódio”, onde este universo possa ser desenvolvido ainda mais. Pelo menos é o que dá a entender a cena pós-créditos finais, referindo-se aos dois filmes.
A produção certamente se beneficiaria de alguns “finais” a menos, sendo mais enxuto e conciso. Mas certamente atinge um grau de tensão absolutamente enervante, prendendo o espectador à beira de sua poltrona. Principalmente pelo elaborado trabalho de McAvoy. Confira.
(Split, 2016, 117 minutos)
Direção
M. Night Shyamalan
Elenco
James McAvoy
Anya Taylor-Joy
Betty Buckley
Haley Lu Richardson
Jessica Sula
Bruce Willis
em cartaz no Cinespaço Miramar Shopping
com sessões às 13h20, 15h40 e 18h
Num futuro próximo, a Terra está quase exaurida de recursos naturais e cientistas norte-americanos conseguem enviar a primeira missão tripulada de futuros habitantes ao planeta Marte. O que eles não sabem é que a comandante da missão, Sarah Elliot (Janet Montgomery), está grávida e acaba gerando o primeiro habitante humano (e, que se saiba, não humano também) nascido no planeta vermelho, Gardner (Asa Butterfield, de “A Invenção de Hugo Cabret”, 2011). Com a morte da mãe no parto, Gardner é criado pela equipe da missão, que acaba se tornando todo seu grupo de relacionamento.
Mas Gardner, já adolescente e extremamente inteligente e curioso, quer a qualquer custo visitar a Terra e descobrir informações sobre seu pai. Mas seu corpo, adaptado às condições climáticas e atmosféricas marcianas, pode não resistir a uma viagem e/ou estadia na Terra. Enquanto em Marte, ele também desenvolveu uma amizade on-line com a jovem Tulsa (Britt Robertson, de “Quatro Vidas de um Cachorro”, 2017), e isso não deixa de ser um reforço em suas intenções de vir à Terra. Contra esta determinação está o responsável por todo o projeto, Nathaniel Shepherd (Gary Oldman, de “RoboCop”, 2014), e a favor, a astronauta – e dublê de mãe adotiva de Gardner - Kendra Wyndham (Carla Gugino, de “Terremoto: A Falha de San Andreas”, 2015).
O que era um interessante argumento cinematográfico, acaba por se revelar um estranho híbrido de filme de sci-fi, ação e romance adolescente “on the road”, tudo misturado e ao mesmo tempo. Transformar o jovem Gardner num romântico incurável, graças à constante exposição dele a “Asas do Desejo” (de Wim Wenders, 1987), parece um pouco forçado demais, na medida em que ele teria acesso a todo o repertório da Internet, com uma conexão absurda em tempo real, inclusive no Skype (o que requereria tecnologia de velocidade além da velocidade da luz).
Este e mais alguns deslizes factuais no roteiro de Allan Loeb (do recente “Beleza Oculta”, 2016) acabam por criar um ruído um pouco alto demais. Visita-se e coloniza-se Marte, mas não se consegue realizar um procedimento razoável num coração debilitado? As pessoas passam por 16 anos sem sequer envelhecer (na aparência, pelo menos)? Uma Terra exaurida em seus recursos preserva paisagens deslumbrantes em inúmeras regiões dos EUA?
Enfim, o interesse pelo filme acaba residindo nos sinceros desempenhos de um (felizmente) contido Gary Oldman, Carla Gugino empática (e desperdiçada) como sempre, e principalmente do casal protagonista, Asa Butterfield e Britt Robertson (onde nenhum deles aparenta a real idade), que acaba fazendo com que o público torça para que, de alguma maneira, a relação deles floresça. Experimente.
Uma curiosidade: a voz do divertido robô Centaur é feita pelo diretor do filme, o também ator Peter Chelsom.
(The Space Between Us, 2017. 120 minutos)
Direção
Peter Chelsom
Elenco
Gary Oldman
Asa Butterfield
Britt Robertson
Carla Gugino
Janet Montgomery
BD Wong
Peter Chelsom
Colin Egglesfield
em cartaz nas Redes Roxy & Cinemark
O novo filme do escocês David Mackenzie que, de romances de baixo orçamento passou para um ambicioso western moderno – gênero até então completamente americano -, é surpreendente. “A Qualquer Custo” conta a história de dois irmãos, o bad boy Tanner (Ben Foster) e o quase ingênuo Toby (Chris Pine), que assaltam bancos – especificamente da rede Texas Midlands – em busca de pequenos saques de alguns milhares de dólares. As razões? Vamos descobrindo durante o desenrolar da ação. Por serem pequenos assaltos, chamam a atenção apenas das milícias locais.
Um destes policiais, o Texas Ranger Marcus (Jeff Bridges, num sotaque quase incompreensível), e seu parceiro, o índio-mexicano Alberto Parker (Gil Birmingham), parte em busca da dupla, tentando antever seus próximos passos, e as razões dos assaltos.
As vastas e poeirentas paisagens texanas, banhadas por uma luz sempre causticante, conferem ao filme a dimensão dos tradicionais westerns norte-americanos, mas com uma forte influência dos western-spaghetti italianos, onde todos os chavões do gênero eram levados a seus extremos. Além da homenagem/citação ao gênero, o filme também funciona como uma “não muito sutil” vitrine do processo de empobrecimento da classe média americana, fenômeno que, aliás, levou à hecatombe Trump. É naquela sucessão de terras improdutivas e exauridas em suas reservas de óleo que vive grande parte do eleitorado do bufo falastrão eleito em 2016.
Retomando: Tanner e Toby cometem seus assaltos de modo a juntar uma considerável soma em dinheiro com fim específico. E vão “trabalhando” neste sentido enquanto são perseguidos pela dupla Marcus e Alberto que, em si, já é um espetáculo à parte. Ofensas mútuas – aos brancos “white trash” e aos nativos norte-americanos ou aos mexicanos, como convier melhor – são parte da estreita relação estabelecida entre os dois, durante anos de colaboração. Qualquer coisa é motivo para discussão, do almoço à camisa que usam. Marcus está à beira da aposentadoria (este é seu último caso) e Alberto tem uma paciência de Jó, além de se adorarem mutuamente.
É impressionante a facilidade com que os personagens conseguem estabelecer um vínculo com o público neste pequeno achado da filmografia de 2016. Com merecidas indicações na temporada de prêmios, recebidas até agora – entre elas ao Oscar (Melhor Filme, Ator Coadjuvante – Bridges, Roteiro e Montagem), ao Globo de Ouro (Melhor Filme, Ator Coadjuvante – Bridges e Roteiro) e ao Bafta (Ator Coadjuvante – Bridges, Roteiro e Fotografia) -, o filme é programa obrigatório a fãs do gênero, mas também àqueles que apreciam bom cinema, independente da origem ou produção. Não perca!
A QUALQUER CUSTO
(Hell or High Water, 2016, 102 minutos)
Direção
David Mackenzie
Elenco
Jeff Bridges
Chris Pine
Ben Foster
Gil Birmingham
Katy Mixon
Joe Berryman
em cartaz no CineArte Posto 4
com sessões às 16h. 18h30 e 21h
No que pode ser chamado de “documentário de ficção”, “Era O Hotel Cambridge”, de Eliane Caffé (do maravilhoso “Narradores de Javé”, 2003), com roteiro dela e de Luis Alberto de Abreu e Inês Figueiró, traça um contundente panorama da vida de milhares de pessoas sem-teto vivendo nas grandes cidades brasileiras, no caso especificamente São Paulo. Estes sem-teto englobam também um contingente cada vez maior de refugiados que chegam aqui, vindos das mais variadas partes do mundo, em busca de vida melhor, estabilidade e segurança.
Em chegando, o que geralmente encontram é desprezo, desconfiança e preconceito, fora condições quase miseráveis de moradia e emprego. Não habilitados a trabalhar no país – que, em si, já sofre de uma aguda crise do emprego formal -, submetem-se a condições de subemprego, sem falar em suas acomodações. A falta de domínio da língua também funciona como um fator alienante deste grande contingente de refugiados.
E o que o filme mostra é justamente o dia a dia de um grupo de pessoas que se estabeleceram no antigo Hotel Cambridge, no centro de São Paulo, abandonado desde 2011. O prédio foi invadido e, desde então, abriga um grande número de habitantes, devidamente organizadas nas tarefas diárias do “condomínio”, que incluem desde a manutenção dos recursos (água, luz, limpeza), até o controle de ocupantes e a estrutura formal de tomada de decisões, incluindo assembleias e decisões conjuntas.
Partindo de uma situação ficcional, que se utiliza de atores profissionais e não atores, Eliane Caffé traz à luz o universo destes colocados à margem do sistema que buscam providências para seus graves problemas de habitação e trabalho. As presenças dos sempre excelentes José Dumont (parceiro de Eliane em “Narradores de Javé”) e Suely Franco (da recente novela “Êta Mundo Bom!”, 2016), só fazem valorizar ainda mais a mensagem do filme: estas pessoas não buscam nenhum tipo de privilégio dos poderes constituídos. Apenas o que lhes é um direito constitucional.
Some-se a isso a presença de refugiados palestinos e congoleses, fora uma grande horda de brasileiros do Nordeste, mais as angustiantes imagens (reais, de arquivo) de tropas policiais trabalhando para a desocupação de vários edifícios abandonados e invadidos, e o quadro resultante é um alarme soando ininterruptamente, até que estes problemas comecem a ser solvidos, de maneira humana e justa. Indispensável como instrumento de denúncia social.
ERA O HOTEL CAMBRIDGE
(2016, 99 minutos)
Direção
Eliane Caffé
Elenco
José Dumont
Suely Franco
Paulo Américo
Guylain Muskendi Lobobo
Juliane Arguello
Thais Carvalho
Lucia Pulido
Gabriel Tonin
Mariana Raposo
Isam Ahmad Issa
Carmen Silva
Ibtessam Umran
em cartaz no Cinespaço Miramar Shopping
com uma única sessão diária às 18h20
O novo filme do escocês David Mackenzie que, de romances de baixo orçamento passou para um ambicioso western moderno – gênero até então completamente americano -, é surpreendente. “A Qualquer Custo” conta a história de dois irmãos, o bad boy Tanner (Ben Foster) e o quase ingênuo Toby (Chris Pine), que assaltam bancos – especificamente da rede Texas Midlands – em busca de pequenos saques de alguns milhares de dólares. As razões? Vamos descobrindo durante o desenrolar da ação. Por serem pequenos assaltos, chamam a atenção apenas das milícias locais.
Um destes policiais, o Texas Ranger Marcus (Jeff Bridges, num sotaque quase incompreensível), e seu parceiro, o índio-mexicano Alberto Parker (Gil Birmingham), parte em busca da dupla, tentando antever seus próximos passos, e as razões dos assaltos.
As vastas e poeirentas paisagens texanas, banhadas por uma luz sempre causticante, conferem ao filme a dimensão dos tradicionais westerns norte-americanos, mas com uma forte influência dos western-spaghetti italianos, onde todos os chavões do gênero eram levados a seus extremos. Além da homenagem/citação ao gênero, o filme também funciona como uma “não muito sutil” vitrine do processo de empobrecimento da classe média americana, fenômeno que, aliás, levou à hecatombe Trump. É naquela sucessão de terras improdutivas e exauridas em suas reservas de óleo que vive grande parte do eleitorado do bufo falastrão eleito em 2016.
Retomando: Tanner e Toby cometem seus assaltos de modo a juntar uma considerável soma em dinheiro com fim específico. E vão “trabalhando” neste sentido enquanto são perseguidos pela dupla Marcus e Alberto que, em si, já é um espetáculo à parte. Ofensas mútuas – aos brancos “white trash” e aos nativos norte-americanos ou aos mexicanos, como convier melhor – são parte da estreita relação estabelecida entre os dois, durante anos de colaboração. Qualquer coisa é motivo para discussão, do almoço à camisa que usam. Marcus está à beira da aposentadoria (este é seu último caso) e Alberto tem uma paciência de Jó, além de se adorarem mutuamente.
É impressionante a facilidade com que os personagens conseguem estabelecer um vínculo com o público neste pequeno achado da filmografia de 2016. Com merecidas indicações na temporada de prêmios, recebidas até agora – entre elas ao Oscar (Melhor Filme, Ator Coadjuvante – Bridges, Roteiro e Montagem), ao Globo de Ouro (Melhor Filme, Ator Coadjuvante – Bridges e Roteiro) e ao Bafta (Ator Coadjuvante – Bridges, Roteiro e Fotografia) -, o filme é programa obrigatório a fãs do gênero, mas também àqueles que apreciam bom cinema, independente da origem ou produção. Não perca!
(Hell or High Water, 2016, 102 minutos)
Direção
David Mackenzie
Elenco
Jeff Bridges
Chris Pine
Ben Foster
Gil Birmingham
Katy Mixon
Joe Berryman
em cartaz no CineArte Posto 4
com sessões às 16h. 18h30 e 21h
No que pode ser chamado de “documentário de ficção”, “Era O Hotel Cambridge”, de Eliane Caffé (do maravilhoso “Narradores de Javé”, 2003), com roteiro dela e de Luis Alberto de Abreu e Inês Figueiró, traça um contundente panorama da vida de milhares de pessoas sem-teto vivendo nas grandes cidades brasileiras, no caso especificamente São Paulo. Estes sem-teto englobam também um contingente cada vez maior de refugiados que chegam aqui, vindos das mais variadas partes do mundo, em busca de vida melhor, estabilidade e segurança.
Em chegando, o que geralmente encontram é desprezo, desconfiança e preconceito, fora condições quase miseráveis de moradia e emprego. Não habilitados a trabalhar no país – que, em si, já sofre de uma aguda crise do emprego formal -, submetem-se a condições de subemprego, sem falar em suas acomodações. A falta de domínio da língua também funciona como um fator alienante deste grande contingente de refugiados.
E o que o filme mostra é justamente o dia a dia de um grupo de pessoas que se estabeleceram no antigo Hotel Cambridge, no centro de São Paulo, abandonado desde 2011. O prédio foi invadido e, desde então, abriga um grande número de habitantes, devidamente organizadas nas tarefas diárias do “condomínio”, que incluem desde a manutenção dos recursos (água, luz, limpeza), até o controle de ocupantes e a estrutura formal de tomada de decisões, incluindo assembleias e decisões conjuntas.
Partindo de uma situação ficcional, que se utiliza de atores profissionais e não atores, Eliane Caffé traz à luz o universo destes colocados à margem do sistema que buscam providências para seus graves problemas de habitação e trabalho. As presenças dos sempre excelentes José Dumont (parceiro de Eliane em “Narradores de Javé”) e Suely Franco (da recente novela “Êta Mundo Bom!”, 2016), só fazem valorizar ainda mais a mensagem do filme: estas pessoas não buscam nenhum tipo de privilégio dos poderes constituídos. Apenas o que lhes é um direito constitucional.
Some-se a isso a presença de refugiados palestinos e congoleses, fora uma grande horda de brasileiros do Nordeste, mais as angustiantes imagens (reais, de arquivo) de tropas policiais trabalhando para a desocupação de vários edifícios abandonados e invadidos, e o quadro resultante é um alarme soando ininterruptamente, até que estes problemas comecem a ser solvidos, de maneira humana e justa. Indispensável como instrumento de denúncia social.
(2016, 99 minutos)
Direção
Eliane Caffé
Elenco
José Dumont
Suely Franco
Paulo Américo
Guylain Muskendi Lobobo
Juliane Arguello
Thais Carvalho
Lucia Pulido
Gabriel Tonin
Mariana Raposo
Isam Ahmad Issa
Carmen Silva
Ibtessam Umran
em cartaz no Cinespaço Miramar Shopping
com uma única sessão diária às 18h20
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