O ano de 1982 foi particularmente satisfatório para Jessica Lange. Poucos anos depois de ter sido ridicularizada por sua estreia como a protagonista feminina de "King Kong", ela mostrou à crítica e aos detratores que, por trás de seu belo rosto e do vulcão de sensualidade que havia demonstrado em "O destino bate à sua porta" (81), havia uma atriz de intenso talento, pronta para surpreender e encantar. Em "Tootsie", de Sydney Pollack, ela deixou perceber seu lado solar, como a atriz de telenovelas que desperta a paixão de um travestido Dustin Hoffman e levou pra casa o Golden Globe e o Oscar de atriz coadjuvante. Mas foi seu desempenho como outra atriz, real e com uma vida repleta de lances dramáticos, que ela derrubou de vez toda e qualquer desconfiança: na pele de Frances Farmer - papel que era cobiçado por Diane Keaton e Goldie Hawn, ambas oscarizadas e já respeitadas - ela injetou em doses exatas emoção, desespero e revolta. E só não ganhou a estatueta na categoria principal porque tinha Meryl Streep e seu "A Escolha de Sofia" pelo caminho.
Frances Farmer existiu de verdade e chegou a fazer alguns filmes em Hollywood nos anos 40 - antes que sua personalidade forte, suas simpatias comunistas e seu desinteresse pela fama estéril de um estrela de cinema em detrimento da nobreza do teatro lhe dessem o rótulo de persona non grata na capital das vaidades. Rechaçada em sua cidadezinha do interior aos 16 anos por ter escrito uma dissertação onde negava a existência de Deus, ela logo piorou sua situação indo passar um tempo em Moscou - quando já era uma jovem atriz especializada em teatro russo. Seu retorno triunfal ocorreu justamente quando chegou às telas de cinema, quando passou a ser respeitada e adulada sem por isso sentir-se obrigada a compactuar com ideais que renegavam os seus. Dedicando-se ao teatro, sua verdadeira paixão, ela jamais deixa de manter contato com o jornalista Harry York (Sam Shepard, que se envolveu com Lange durante as filmagens e teve com ela dois filhos), que é quem a ajuda a superar os piores anos de sua vida: abandonada e traída profissionalmente pelo amante dramaturgo, Clifford Oddets (Jeffrey DeMunn), ela volta à Hollywood e, desequilibrada, cai nas mãos de sua mãe, Lilian (Kim Stanley, indicada ao Oscar de coadjuvante), que vê solução apenas internando-a em um hospício.
Frances Farmer existiu de verdade e chegou a fazer alguns filmes em Hollywood nos anos 40 - antes que sua personalidade forte, suas simpatias comunistas e seu desinteresse pela fama estéril de um estrela de cinema em detrimento da nobreza do teatro lhe dessem o rótulo de persona non grata na capital das vaidades. Rechaçada em sua cidadezinha do interior aos 16 anos por ter escrito uma dissertação onde negava a existência de Deus, ela logo piorou sua situação indo passar um tempo em Moscou - quando já era uma jovem atriz especializada em teatro russo. Seu retorno triunfal ocorreu justamente quando chegou às telas de cinema, quando passou a ser respeitada e adulada sem por isso sentir-se obrigada a compactuar com ideais que renegavam os seus. Dedicando-se ao teatro, sua verdadeira paixão, ela jamais deixa de manter contato com o jornalista Harry York (Sam Shepard, que se envolveu com Lange durante as filmagens e teve com ela dois filhos), que é quem a ajuda a superar os piores anos de sua vida: abandonada e traída profissionalmente pelo amante dramaturgo, Clifford Oddets (Jeffrey DeMunn), ela volta à Hollywood e, desequilibrada, cai nas mãos de sua mãe, Lilian (Kim Stanley, indicada ao Oscar de coadjuvante), que vê solução apenas internando-a em um hospício.
Mesmo que o roteiro tenha ficcionado algumas passagens da vida de Frances - o personagem de Sam Shepard, por exemplo, nunca existiu, e a lobotomia sofrida pela protagonista jamais aconteceu - o filme de Graeme Clifford (que depois nunca mais acertou em sua carreira cinematográfica) sobrevive principalmente graças ao empenho de Jessica Lange em dar credibilidade e empatia a uma personagem difícil. Convencendo tanto como uma adolescente de 16 anos quanto como uma mulher sofrida e vivida, ela é a luz do filme, transmitindo milhares de emoções com poucas palavras, usando apenas o olhar para levar a audiência junto com ela à espiral de desespero que toma conta de sua vida no terço final da história. Seus duelos com Kim Stanley - que vive Lilian Farmer, sua mãe e algoz - são dignos de nota, dando ao filme um tom de tragédia familiar que deixa seus furiosos ataques à nata de Hollywood leves como um filme de Carlitos. Sua descida ao inferno - em especial uma inspirada sequência onde ela ensaia uma declaração aos juízes diante de uma plateia de internas insandecidas - é tratada com respeito, mesmo quando torna-se o pior dos pesadelos, com lobotomias e estupros no menu.
"Frances" é um filme irregular. Não tem um diretor brilhante que ouse na narrativa e até mesmo suas invenções no roteiro (ainda que o tornem mais chocante) acabam minando sua credibilidade. Mas tem em Jessica Lange um pilar forte o suficiente para torná-lo obrigatório. Não apenas é o retrato cruel de como a sociedade (e a indústria, seja ela qual for) pode exterminar a alma de uma pessoa de espírito livre e inteligente. Também é uma chocante mostra dos horrores do sistema psiquiátrico americano de sua época (anos 40), da maneira cruel como Hollywood se livrava de quem não mais lhe servia e até das sujeiras que escondem nos bastidores do teatro. Para quem gosta do assunto, é um prato e tanto.
FRANCES
(Frances, 1982, 140 minutos)
Direção
Graeme Clifford
Roteiro
Eric Bergren
Christopher DeVore
Nicholas Kazan
Christopher DeVore
Nicholas Kazan
Música
John Barry
Elenco
Jessica Lange
Sam Shepard
Kim Stanley
Bart Burns
Jeffrey DeMunn
Lane Smith
Sam Shepard
Kim Stanley
Bart Burns
Jeffrey DeMunn
Lane Smith
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