Um
poeta de necessário lirismo social: entra para a literatura com um duelo
honrando Stendhal. Sem o fim da História e com premências demasiado humanas
ainda mais intensas, a poesia farol do destino coletivo e das vicissitudes do
sonho segue antena dos povos como pontificava Pound. Entrecortado de alto
relevos de poderosas metáfora, Leonardo Tonus estréia em seu próprio terreno
com uma preciosa reunião de poemas: “Agora vai ser assim” com delicada
apresentação da Editora Nós de São Paulo. Tonus é um militante visceral das
letras, grande voz a levar a literatura brasileira em França e embaixador do
melhor que se faz nas escrituras lusoparlantes no Velho Continente. Formalíssima
apresentação para quem fala e faz literaturas de vanguarda, - sim no plural da
caleidoscópica produção brasileira em poesia, prosa e “proesia”, a nova concepção de gêneros indeterminados
´deleuzianamente´ amalgamados. Denunciar
sem cair no panfletário, expor sem didatismo, amplificar o sentido de ágora
cosmopolita nunca em detrimento da poeticidade. Leonardo trafega célere e
sereno entre experimentação e a referida denúncia social: não o ´vanguardoso´
experimentalismo, a experimentação calculada
com literalidade sem peias, um
verso audaz, escorreito e não menos densamente comunicacional. Em meu ofício
gozozo de rastreamento do que surge em poesia brasileira me deparo com mais
esse esforço de inventividade pelo conteúdo sem descuido da mesma criação
sutilmente torneada na forma. Quem diria na alvorada dum século high-tech fosse
necessário a ingente luta contra novos fascismos?! Quem poderia supor a
desigualdade social se agudizasse planetariamente? Na nobre esteira de Romain
Rolland e Éluard nosso autor expõem o
câncer da indiferença feito anátema pós-moderno. Tonus evocatório na medida
certa do intertextual cita no contexto de sua amplitude Clarice Lispector,
Samuel Rawet de quem é especialista e a quem o Brasil deve um resgate, Saint-John
Perse que ecoa poeta atlântico que também é e sem nomear percebo forte
influência enriquecedora dos russos Iessênin, Maiakovski e Anna Akhmátova. Da
imensa poeta uso como epígrafe de dois ensaios críticos que elaborei sobre “Agora
vai ser assim” que será lançado dia 21 na Livraria da Vila em Sampa:
“Hoje,
tenho muito o que fazer
Devo
matar a memória até o fim.
Minha
alma vai ter de virar pedra.
Terei
de reaprender a viver.”
Leonardo Tonus tem como carro-chefe ou ´leitmotiv´ um verso perfeitamente alinhavado: “Despedida
de pedra” que uso como âncora para sondar essa atmosfera lírica que vos revelo:
"Hoje
queimarei todos os meus livros
e
meus dicionários.
Pelos
becos da cidade
meus
ensaios
dilacerados
espalharei.
Enterrarei
meus poemas.
Meus
pulsos cortarei.
Com
minhas unhas
e
o bico de meu tinteiro
perfurarei
teus olhos,
catálogos
registros
e
romances.
Hoje,
a
palavra
reduzida
a
pó
sufocará
a
indiferença
os
ditadores,
as
balas
a
fome.”
Nessa semana em que um
navio errante a deriva percorre dilacerado o Mediterrâneo com simbólico nome “Aquarius”
levando 600 almas exangues, Leonardo Tonus faz-se bardo providencial e
visionário. “Marujo ensinou-me a
língua das formigas” em outro poema, Tonus tem lastro de um beat transmoderno
com a seriedade de Pasternak e a concisão rutilante de nosso Manoel de Barros. Leia-mos!
Poeta, contista e crítico literário,
Flávio Viegas Amoreira é das mais inventivas
vozes da Nova Literatura Brasileira
surgidas na virada do século: a ‘’Geração 00’’.
Utiliza forte experimentação formal
e inovação de conteúdos, alternando
gêneros diversos em sintaxe fragmentada.
Vem sendo estudado como uma das vozes
da pós-modernidade literária brasileira
em universidades americanas e européias.
Participante de movimentos culturais
e de fomento à leitura, é autor de livros como
Maralto (2002), A Biblioteca Submergida (2003),
Contogramas (2004) e Escorbuto, Cantos da Costa (2005).
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