Foi uma
tonelada de textos... todos prontos para publicação.
Chegava
na hora, refutava: sempre tinha um dado novo para trazer à luz, uma mudança de
paradigma... rolava sempre algum tipo de coisa — um troço qualquer — que me
fazia meter o pé no freio, dar um jeito de não botar o texto para frente.
Quando
deu um mês, meti um baita ‘textão-áudio’ para o editor dessa nobre revista. Por
doze minutos, expliquei que não havia emudecido: havia textos aos borbotões, de
dúzias, mas quase todos eles com um tom mais puxado para o niilismo e sempre
com traços de uma certa agressividade que nem dava para explicar muito.
Esse
texto foi escrito no sábado do feriadão de 07 de setembro — o feriado nacional
cai numa segunda-feira. Para quem é de Santos, rola o 08 de setembro logo em
seguida — dia da madroeira da cidade — garantindo à querida população de
Enguaguaçu uma espécie de ‘carnaval’ no segundo semestre, mas sem
quarta-de-cinzas.
Puxo
aqui esse contexto por causa da quantidade de automóveis que desceram a serra
em direção às praias do litoral paulista. Em plena pandemia de SARS-Cov-2, com
números nacionais ultrapassando os 125 mil óbitos, as imagens de todos aqueles
carros nas estradas — antes bem-vindas em momentos de paz e saúde — soavam como
um belíssimo de um ‘foda-se quem está de luto’.
Mesmo
considerando que não daria para ficar o tempo todo em casa e que, a partir de
certo ponto, todos teriam de voltar a algum tipo de atividade — seja ela qual
fosse — o momento exigiria algum tipo de recato, de reverência ao luto de mais
de 125 mil famílias, mas não foi o visto no feriadão do Dia da Independência.
De fato, não é possível viver o tempo inteiro com medo e muito menos a reboque
de controles governamentais que definitivamente não sabem como guiar uma
população inteirinha ao longo de uma pandemia.
Lá ia
eu, outra vez, com mais um texto ‘cheio de raiva’ contra a insensibilidade
humana diante de um momento de exceção. Repito que também concordo com o perigo
de controle por intermédio do medo — o lance de uma ‘segunda’ e/ou ‘terceira’
ondas amedrontadoras, suficientes para enfurnar em domicílios bilhões ao redor
do planeta para mais de ano. Todavia, trocar o feriadão de Independência pelo
da Madroeira do Brasil (12 de outubro, uma segunda-feira) soava mais condizente
se levarmos em consideração os números ruins trazidos pelo surto de Covid-19.
Isso
posto — sabedor que ninguém é a ‘medida do mundo’ — recolhi-me em minha
insignificância a fim de melhor elaborar as imagens de milhares se dirigindo ao
litoral para o feriadão. Tem horas que é ajuizado engolir a raiva e o desgosto
de certas visões a fim de se preservar: a. o bom andamento de alguma interação
minimamente civilizada num futuro próximo e; b. a saúde mental.
Portador
de um texto altamente inflamado, coloquei o danado na pastinha do ‘para mais
tarde’. Aliás, era o quinto ou sexto nessa linha que não apaguei de todo, ou
joguei fora, mas tive de segurar para outra oportunidade no claro objetivo de
não sair por aí xingando quem passasse pela frente. Sim, porque na quinta e
sexta da véspera, era doído ver conterrâneos fazendo campanha pelas mídias
sociais em prol da presença maciça nas praias — como o ocorrido no 30 de
agosto, o domingo anterior — transformando uma doença num ato político e/ou
cívico para a prevalência dos ‘direitos civis’ de ‘ir-e-vir’ — uma espécie de
“quem manda aqui nessa porra é ‘nóis’ — bem como a “derrubada do STF”.
Foi
triste. Duríssimo: amigas e amigos que perderam pai, mãe, parentes, pessoas
amadas e queridas tendo de topar com boçais transformando uma “ida à praia” num
gesto de desobediência civil bem rastaquera sem se ater à excepcionalidade
desse instante. Haja sangue-de-barata!
Mais
dois meses e tudo teria alguma solução mais apaziguadora e abrangente. Mas...
‘não!’. Rolou uma espécie de “foda-se, você” e, no caso de pintar um solzinho,
“... vamos a la playa...”.
Como
dito há pouco, é duro vivermos a reboque de gente que ainda não conhece nada da
doença, muito menos de como pedir o bom-senso das pessoas para se evitar sua propagação
em escalas exosféricas. Essa pandemia mostrou (e bem!) o quanto arrotamos muita
sapiência sobre coisas que, de fato, sabemos quase nada delas.
Foi, aí,
que pintou a ideia: “ô, Marceleza?! Do que adianta você ler os livros do Taleb
e ficar ‘putinho’ com o que anda rolando com essa pandemia?!”. Karakas, o
próprio Taleb, em fevereiro e março, afirmou por “a+b” que o coronavirus jamais
foi ou seria um “Cisne Negro” (quando muito, um cisnezinho cinza... e já
fazendo muita força nesse sentido).
Bom,
soltei o recado no sábado à noite, pelo ‘feicebúqui’: quem quisesse ter uns
‘drops’ de São Nassim Taleb, era só colar na banca. Afinal, nos próximos
eventos, já se é possível selecionar quem está falando ‘coisa-com-coisa’
daqueles que utilizam mídias sociais e de massa para ‘fazer o trabalho do
“cão”’ (a saber: engendrar, em todas e todos, a ‘máquina-do-medo’ e do pânico).
*********
Nassim
Nicholas Taleb, como todos sabem, é formado em engenharia e hoje ensina
probabilidade numa universidade nova-iorquina. Fugido da guerra civil do
Líbano, seu país de origem, teve de lutar com unhas e dentes em sua nova vida
na América, longe de toda a força e tradição de sua ancestralidade no Levante.
Taleb
teve como tio-avô um ex-vice Primeiro Ministro libanês e a experiência política
da família já havia deixado ares de que nem sempre políticos sabem, de fato e
na realidade, o que estão fazendo. Confiar na capacidade de previsão de um
político ‘profissional’ nem sempre é o melhor dos mundos. Aliás, é dele a frase
“... meu tio sabia tanto de política quanto o motorista particular dele, o
Mikail”.
Ao se
formar na faculdade, a luta continuava, dessa vez, pelo ‘primeiro emprego’: a
convite de um amigo, foi parar num banco, desses, de investimento, só conseguindo
ganhar dinheiro se fizesse algo razoavelmente diferente do executado pelos
‘cabeças coroadas’ da época. Não tardou para que jogassem ele “na fogueira”:
com a confiança dos principais acionistas das empresas por onde passou, ganhou
de presente uma ‘cova-dos-leões’. A cova?! Operar uma “mesa de opções”, uma das
mesas mais perigosas num banco de investimento.
Foi ali
que Taleb viu a ascensão e ruína de muitos ‘gurus’ do mercado financeiro: uma
turminha de ‘selecionados’, “... tocados por Deus...” que, no alto de suas
arrogâncias, levaram tombos que incluíam tragédias econômicas, passando,
inclusive, por ‘puxações de fase’ (Alô, Tim Maia! Aquele abraço!) conhecidas em
território tupiniquim como ‘cadeia’ (ou ‘ver o sol nascer quadrado’).
Taleb,
que já tinha a desconfiança de que o ser humano é um bichinho ‘meio teba’,
passou a verificar que, de fato, não há especialistas em nada nesse mundo. Sua
tese era a de que não dava para confiar muito nesses ‘gênios’ e ‘gurus’: nenhum
deles se atinha a uma espécie de ‘visão periférica’ — em sentido metafórico —
necessária para se tomar boas decisões. Pior: alimentavam seus próprios
‘auto-enganos’ ao afirmar que suas constatações eram uma espécie de ‘verdade
absoluta’.
E tomem
perder ‘zilhões’ quando “um ciclo se encerrava”: esse foi o tema de um dos seus
primeiros livros, o “Iludidos pelo Acaso”. Nessa obra, Taleb observa que uma
determinada postura acaba por ser muito bem sucedida porque o comportamento que
gerava esse sucesso tinha muito pouco a ver com o ‘elemento gerador’ desse
triunfo. Era como se dissesse que “aquela época” pedia certos procedimentos,
posturas e comportamentos que coadunavam com o cultivo daquele instante.
Quando o
ciclo se encerrava, e novos padrões mexiam nesse ‘elemento gerador’, tais
comportamentos e abordagens passavam a ‘jogar contra’. Ao invés do futuro
candidato a fracassado tirar o pé do acelerador para se aperceber ‘do
periférico’, aquilo que passava ‘pela visão periférica do(a) observador(a)’, bem
como tudo o que indicasse um novo ‘elemento gerador’ para a aquisição de uma
determinada riqueza, o(a) sujeito(a) mantinha sua fé-cega no modelo anterior e
acabava por arrombar as carteiras de investimentos dos clientes de uma
determinada instituição financeira.
Ora...
qualquer semelhança com a atual administração de uma ‘situação de exceção’ —
uma pandemia, por exemplo — talvez não seja uma ‘mera coincidência’. Quando os
governantes “que deveriam agir pelo bom-senso” não sabem quais decisões tomar, torna-se
irrefutável a evidência de que somos nós que críamos um ‘bom-senso’ dos homens
e mulheres de vida pública que só existe em nossos pensamentos e imaginações.
Nunca nos passa pela cabeça de que mulheres e homens de vida pública não sabem
o que fazer quando pinta uma pandemia na área: uma hora, fecha tudo; na outra,
abre; num instante, estão proibidas as aglomerações; em outro, a praia está
liberada, mas somente em pequenas faixas de horário.
Para
Taleb, a confiança que você tem ‘no(a) outro(a)’ é diretamente proporcional à
percepção que você tem de que ‘esse(a) outro(a)’ possui uma sensibilidade à
visão periférica e age conforme à sutileza dessa periferia. Convenhamos, é tudo
o que uma mulher e homem de vida pública não possui nos dias de hoje, não é
verdade?!
Mas isso
é matéria para a próxima coluna. Para o momento, apenas tente reparar naqueles
que possuem essa visão que capta as sutilezas encontradas nas periferias de um
dado da vida. Logo, logo, aprenderão a diferenciar quem realmente quer te
ajudar durante uma pandemia ou não passa de um(a) gaiato(a) querendo te apavorar
e te encher de medo.
Mas, por
favor, façam esse exercício longe do mar: com um bom golpe de sorte (acreditem,
o acaso também responde por 80% das coisas!), esse tipo de lazer retorna mês
que vem. A praia pode esperar.
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