por Chico Marques
Em "Trafic", o lendário realizador francês Jacques Tati retoma vários dos temas que havia abordado de "Playtime" (1966), só que agora levando-os a situações extremas, no mesmo nível de grandeza visual de seus filmes mais festejados, como "Meu Tio" e "As Férias de Monsieur Hulot".
Aqui, Monsieur Hulot projeta um carro com muitas características inteligentes, e segue pela estrada, acompanhado por seu cachorro, de Paris a Amsterdam, para apresentar seu protótipo num importante Salão do Automóvel que acontece por lá anualmente.
Entre as esquisitices tecnológicas que o carro de Hulot ostenta, tem um barbeador elétrico no interior do volante, uma cama, um chuveiro e uma grelha para esquentar comida. E isso é só o começo.
Como de hábito, as excentricidades de Monsieur Hulot oscilam entre o absurdo e o brilhante. Seu carro é, definitivamente, a sua cara.
Rola de tudo na viagem. Hulot tem que trocar um pneu furado. Fica sem gasolina. Sofre um acidente. Se envolve em confusões com a polícia. E, claro, fica preso em vários engarrafamentos surreais e extremamente divertidos, que permanecem como algumas das cenas mais marcantes de toda a sua filmografia.
"Trafic" não é um filme cômico nos padrões narrativos habituais. Jamais conseguiria ser, na medida em que é um filme de Jacques Tati, que sempre desafiou convenções.
Seu roteiro serve como uma linha básica para que Monsieur Hulot faça uso de mímica boa parte do tempo para ser revelar às vezes sentimental, às vezes irritadiço, às vezes divertido, mas também muito vulnerável ao rolo compressor de novidades e carente de um universo que não existe mais, do qual talvez seja o último sobrevivente em 1971.
Esse não foi o último filme de Tati.
Mas foi a despedida de Monsieur Hulot, personagem que o acompanhou por cerca de 25 anos de carreira.
Foi também seu road-movie derradeiro, além de ser a melhor e mais visual de todas as suas comédias.
Tudo em "Trafic" é peculiar ao extremo. Assim como acontece com toda a obra de Tati, é um filme datado. Mas que, de alguma maneira, consegue sobreviver a esse "defeito" com muita dignidade artística.
Para mim, pessoalmente, rever "Trafic" tem sempre um sabor muito especial, pois foi o primeiro filme de Jacques Tati que assisti -- em circuito comercial, por volta de 1972, aqui em Santos. Depois dele, foi descobrir seus filmes mais antigos.
Enfim: "Trafic" é um filme que merece ser visto.
AS AVENTURAS DE MONSIEUR HULOT
NO TRÁFEGO LOUCO
Trafic
(1971 - 93 minutos)
Roteiro e Direção
Jacques Tati
Produção
Robert Dorfman
Elenco
Jacques Tati
Maria Kimberly
Marcel Fraval
Honoré Bostel
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