Friday, May 27, 2016

2 INDICAÇÕES PARA "JOGO DO DINHEIRO", NOVO FILME DA DIRETORA JODIE FOSTER


 

JODIE FOSTER TRANSFORMA SUSPENSE BANAL EM EXERCÍCIO CINEMATOGRÁFICO
por
Natalia Bridi
para
Omelete


À primeira vista, Jogo do Dinheiro parece um básico suspense de sequestro - homem armado invade programa de TV em busca de vingança. É arquitetado para criar tensão, mesmo que seu final seja previsível. Nas mãos de Jodie Foster, diretora acostumada a dramas familiares, essa premissa se transforma. É a condução dos personagens, não das ações súbitas, que prende o espectador.

George Clooney encarna perfeitamente Lee Gates, o “mago das finanças” do programa Money Monster, sempre disposto a partir para a apelação por um pouco mais de audiência. Patty Fenn, uma solitária diretora de TV interpretada por Julia Roberts, é a sua consciência, a grande negociadora entre o apresentador e Kyle Budwell (Jack O'Connell), o desesperado entregador que invade o cenário com uma arma em mãos e dois coletes recheados de bombas. O verdadeiro alvo é Walt Camby (Dominic West), magnata que acaba de perder US$ 800 milhões em função de uma suposta falha nos computadores da sua empresa.

Nesse cenário, Foster trabalha o roteiro de Jamie Linden, Alan DiFiore e Jim Kouf de forma inesperada. São pequenos trechos de diálogos, a inversão de certos clichês e uma escalação certeira de elenco que tornam Jogo do Dinheiro maior do que a situação extrema que desenha o seu enredo. Quando parece seguir por um caminho, o filme opta por outro, em uma sucessão de ironias que ampliam a história e seus personagens com um bem-vindo toque de humor. Há comentários sobre grandes corporações e ganância, mas o que interessa à diretora são as pessoas que circulam por esse mundo superficial.

O longa tem a agilidade de um programa de TV ao vivo, com diferentes ângulos, cortes rápidos e uma urgência na transmissão da informação. Uma estética que serve quase como metalinguagem ao estabelecer um debate sobre a forma como o conteúdo é transmitido e absorvido pelo público. Esse poderia ser um suspense qualquer, mas Jodie Foster usa o gênero como um exercício, um estudo para ampliar a sua capacidade como cineasta.

Não é um filme perfeito, já que exige certo engajamento para que se vá além das linhas gerais de uma narrativa batida - o que grande parte da crítica não estava disposta a fazer. Suas inúmeras camadas, porém, não deveriam ser ignoradas. Há entretenimento para o espectador convencional, satisfeito em se ver familiarizado com a trama e os astros que a habitam, e há detalhes para o olhar cinéfilo, que pode se deixar intrigar pelo subtexto deixado por Foster. Uma façanha que certamente vale o dinheiro do ingresso.





UM RETRATO DO MUNDO ATUAL
por
Francisco Russo
para
AdoroCinema


Em 1976, o diretor Sidney Lumet trouxe ao cinema Howard Beale, o âncora de um programa televisivo que, devido aos interesses comerciais da emissora, passa a encarnar ao vivo a figura do profeta louco, dizendo verdades que o povo, raivoso, queria ouvir. Era um retrato da ingerência cada vez maior do entretenimento no jornalismo, setor que, ao menos na teoria, deveria ser o mais sério e respeitado da empresa. Hoje, pode-se dizer que Rede de Intrigas foi visionário. O mundo mudou, a TV mais ainda e o que mais existe são programas informativos que buscam, a todo custo, capturar a atenção do espectador com todo tipo de malabarismo visual e cômico. Jogo do Dinheiro, nova investida da atriz Jodie Foster na carreira de diretora, bebe escancaradamente desta fonte.

Não é exagero dizer que Lee Gates, o apresentador encarnado por George Clooney, seja discípulo de Howard Beale - só que bem mais exagerado e plenamente consciente do que está fazendo, sem qualquer tipo de surto psicológico. Apresentador de um programa financeiro, ele faz o possível para chamar a atenção do espectador: dança, se veste de boxeador, possui ajudantes de palco... No fim das contas, a informação propriamente dita torna-se um anexo. Ou seja, trata-se de uma inversão de valores em relação a tudo aquilo que prega o jornalismo, algo constatado pela própria personagem de Julia Roberts, produtora do programa. Em uma sintomática conversa, ela sacramenta: "faz tempo que não fazemos jornalismo".

Só que ao menos parte do público não pensa assim e, ingênuo, acredita sem contestação no que é dito pela TV. Diante deste cenário em que o circo encanta e engana, o que poderia acontecer quando um dos deslumbrados, de repente, se revoltasse? Esta é a premissa do filme, trazida através da súbita invasão de um homem no programa ao vivo comandado por Lee Gates. O motivo? Ele acreditou numa de suas dicas financeiras e perdeu muito, muito dinheiro.

O mais interessante de Jogo do Dinheiro é, sem dúvida, este tom de constatação e crítica à espetacularização do jornalismo e a uma faceta do capitalismo, personificada no mercado financeiro. Jodie Foster, com habilidade, insere questionamentos pontuais aos esperados momentos de tensão envolvendo o apresentador e seu sequestrador. Por sua vez, a produtora interpretada por Julia Roberts se mantém em uma linha tênue: ao mesmo tempo que deseja salvar sua equipe, vê na situação a oportunidade de alavancar a audiência - e se esforça para isto, mesmo que utilizando os equipamentos técnicos ao seu dispor para, também, influenciar em um possível salvamento.

Em um contexto tão interessante, outro ponto positivo é a dinâmica existente entre os três protagonistas. Por mais que apenas Clooney brilhe de fato, graças ao seu misto de gaiato e canastrão inconsequente, tanto Jack O'Connell quanto Julia Roberts cumprem de forma convincente suas funções na trama, mesmo que às vezes soem um tanto quanto unidimensionais. A trilha sonora composta por Dominic Lewis e a edição de Matt Chesse também merecem destaque, ajudando a construir a tensão necessária.

O grande pecado de Jogo do Dinheiro é que, em seu terço final, passa a dar uma atenção exagerada a uma conspiração empresarial que, no fim das contas, serve como cortina de fumaça para todo o tom crítico presente até então. A partir do momento em que um vilão é nomeado, o filme torna-se absolutamente banal e assume de vez cacoetes hollywoodianos em relação à incrível rapidez com que as investigações são concluídas. O próprio desfecho, alongado mais que o necessário, soa tendencioso ao, de certa forma, "endeusar" os heróis errados desta história.

Por mais que sua metade inicial seja bem melhor que o desfecho, ainda assim Jogo do Dinheiro é um filme que merece atenção. Trata-se de entretenimento com conteúdo, algo não muito comum na Hollywood atual. Por mais que não se aprofunde tanto quanto poderia, nem tenha um tom tão incisivo quanto Rede de Intrigas, trata-se de um longa ficcional com um pé na realidade que pontua questões bastante oportunas em relação ao modo como o jornalismo é produzido nos dias atuais.


JOGO DE DINHEIRO
(Money Monster, 2016, 99 minutos)

Direção
Jodie Foster

Roteiro
Jamie Linden
Alan DiFiore
Jim Kouf

Elenco
George Clooney
Julia Roberts
Caitriona Balfe
Dominic West
Jack O'Donnell
Giancarlo Esposito


em cartaz nas Redes Roxy, Cinespaço e Cinemark


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