Tomara que essa merda estabilize o pânico.
Mas o que a porra do pânico tem a ver com isso?
É o estômago que está doendo.
Então eu devia estar dizendo: “Tomara que essa merda
estabilize meu estômago.” E não meu pânico.
Afinal, quem quer viver com seu pânico “estabilizado”?
Se a porra do pânico está estabilizado, isso quer
dizer que ele – o pânico – está lá, dentro de mim, dentro de você.
Sempre, 24 horas por dia.
Todos os dias.
Por que alguém tomaria algumas cápsulas (tomei quatro,
lembro agora) para “estabilizar” o pânico, em vez de tentar livrar-se dele?
Mas bem que eu posso ter tomado, por engano,
ansiolíticos para tentar controlar uma dor no estômago.
Isso tornaria a coisa meio assustadora.
Como posso estar em dúvida se tomei as quatro cápsulas
para controlar a dor no estômago ou para “estabilizar” o pânico?
Talvez trocar a palavra “estômago” por “pânico” seja
uma daquelas coisas que as pessoas chamam de lapso freudiano.
Você, sem raciocinar, diz o que realmente queria
dizer, em vez do que tinha pensado em dizer.
A partir desse ponto, pode complicar mais um pouco, já
que isso pode significar uma porrada de coisas.
É certo que seu estômago pode doer tanto que você
entra em pânico, achando que vai morrer ou coisa perto disso.
É certo também que seu pânico pode deixar seu estômago
em frangalhos, até mesmo te dar uma úlcera de presente.
Não sei pra você, mas pra mim esses pensamentos todos
só tornaram tudo mais confuso ainda.
Melhor ir até a prateleira do armário do banheiro
checar que merda de remédio eu tomei - e pra que exatamente ele serve.
Os frascos – cerca de dez, com quase a mesma cor e
tamanho – estão meio misturados, por isso sempre ponho os óculos pra conseguir
ler os rótulos.
Eu estava de óculos quando peguei as cápsulas e tomei?
Não lembro. Mas tenho certeza de que agora estou sem
óculos e não consigo ler os rótulos dos frascos a minha frente.
Se não me engano, a bula do medicamento para o
estômago dizia que era pra tomar duas cápsulas “em caso de crise aguda”.
Eu sempre tomei três ou quatro, pra “reforçar” o
efeito.
Só que, se não me falha a memória, a bula do
ansiolítico recomenda a mesma dosagem para a mesma situação.
Não tem jeito, preciso da droga dos óculos pra ler os
rótulos.
E onde estão eles?
Dou uma geral nas superfícies dos móveis da sala. Vou
até a cozinha e o quarto.
Nenhum óculos à vista.
Volto ao banheiro e de novo os rótulos ilegíveis dos
frascos na prateleira.
Começo a sentir coisas estranhas no meu corpo.
Cobras começam a rastejar na minha cabeça e ratinhos
de laboratório chapados começam a arranhar as paredes do meu estômago.
Agora parece que, a qualquer momento, os ratinhos vão
conseguir abrir um túnel no meu estômago e subir pra minha garganta, pra comer
minha língua.
O estômago dói, a garganta dói, as cobras estão cada vez
mais agitadas na cabeça, minha língua está inchando.
Foda-se!
Preciso tomar alguma merda qualquer.
Seja lá o que eu tomei antes, não o fez efeito
pretendido.
Estou com dor de estômago e em pânico.
Se isto não é uma crise, não sei mais o que é crise.
Olha, sinto muito por envolver você nessa história
toda.
Não era minha intenção.
Mas já que você está aqui, será que podia me ajudar e
encontrar os óculos?
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