Um dos prazeres
das férias para um merceeiro sem filhos é a paz encontrada na ‘padoca’ da
esquina.
Porque morar ao lado
de um dos clubes mais famosos do mundo que recebe centenas de ‘candidatos a
Neymar’, mais duas escolas estaduais, duas particulares e uma municipal, tudo
num raio de 50 a 100 metros, é passar a maior parte do ano em eterno turbilhão.
Chega essa época
do ano, das tais ‘férias’, e um sossego impera em cada centímetro de chão.
Uma belezura!
Sem filas, sem
pais fazendo filas duplas em boa parte das ruas do bairro, uma tranquilidade
que esse envelhecido merceeiro já tinha perdido o costume.
Que tesão!
Paz! Uma
coisa...
Tudo geladinho,
no ponto, dentro do tempo cronológico. Uma maravilha!
Sim, porque a
algazarra, nessa época do ano, empurramos para os chamados ‘bairros da orla’.
Três meses que
nós, cá no fundão da ilha, mandamos nossas boas energias de força & fé,
mais nossas extremas-unções para os(as) cidadãos(ãs) moradores(as) dessas
localidades.
“Vai, meu povo!
Curte a praia aí... que eu ‘tô’ te vendo!”. Se é que dá para curtir praia até o
Carnaval chegar.
A mais nova
‘coqueluche’, nos litorais brasileiros, é uma tal caixinha de som chinesa com
conexão por ‘dente azul’.
Imaginem! Cada
um leva a sua!
Numa praia com,
por baixo, 50 mil no meio da semana, é de se calcular que, se todo mundo tiver
a mesma ideia, ...
É a “guerra da
imposição”: “... meu ‘funk putaria’ tem mas putaria & sacanagem do que o
seu!”, pensam os usuários. Sim, porque ninguém vai com caixinha de som à praia
para a execução de uma 9ª de Beethoven, 25ª de Mozart ou qualquer obra-prima de
Dvórak.
Costumam dizer
que é “educativo”: aprende-se muito sobre ginecologia, urologia e obstetrícia.
Tem grandes lábios, pequenos lábios, clitóris, ânus, glande, “socar” colo do
útero, próstata, “... senta, senta, senta, senta, senta...”.
Corre-se à boca
pequena que o ‘must’ desse verão é um funk que ensina aos(às) residentes o passo-a-passo
da postectomia com requinte de detalhes. Um troço! Tudo isso na disputa sonora
de quem executa o trambolho mais alto (uma espécie de “frevo-abafa”) na
presença dos mais ‘pequerruchos’ com suas pás e baldinhos de areia.
Um problema dos compositores
ou da ouvinte plateia?! Às vezes, há certos problemas que tem tudo a ver com os
usuários.
De qualquer
forma, empurramos esse trem para as faixas de areia.
“Até fevereiro,
pessoal!!!”.
Aqui é só
sossego...
No
ar-condicionado da vazia ‘padoca’ (ô, ‘bença’!), esse merceeiro acaba por
recordar sua velhice indesejada: ele era de uma época que fazia parte do
passeio ouvir a beleza dos sons que uma praia e o mar são capazes de produzir.
Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 47 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É autor de Areias Lunares
(à venda na Disqueria,
Av. Conselheiro Nébias
quase esquina com o Oceano Atlântico)
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO
No comments:
Post a Comment