Tuesday, March 26, 2019

SUMIDA DAQUI HÁ VÁRIOS MESES, NOSSA CORRESPONDENTE EM MADRID DÁ SINAIS DE VIDA E DE INDIGNAÇÃO



Madrid, 17 de Março de 2019,


Há dois assuntos atuais que me preocupam muitíssimo. Não, não é a destruição do planeta, nem a quantidade de plástico nos mares, nem a reservas mundiais de água e grãos... já sabemos que de uma hora pra outra vai tudo pro vinagre, de um jeito ou de outro...

Posso ser egoísta e politicamente incorreta, mas prefiro ocupar-me de assuntos que afetam a mim e às pessoas ao meu redor. E nesse balaio, como disse antes, há dois que me preocupam de especial maneira: o futuro do transporte nas cidades e a gentrificação dos centros urbanos.

Sobre o primeiro, depois de quase 14 anos pegando o transporte público em Madrid, estava a ponto de surtar. Já não aguentava mais a corrida diária de casa ao metrô, pagar quase 55 euros de vale-transporte (o que é relativamente barato, se comparado a outras cidades europeias); logo dentro do vagão, aguentar a cara emburrada das pessoas, os olhares, o cheiro de sovaco e de gordura dos casacos alheios às oito da manhã, e em casos muito desafortunados, um peido sorrateiro de algum(a) viajante... e não só isso, depois de chegar à minha estação de destino, caminhar quase 20 minutos até o escritório... Estava tão farta, que cheguei até me empolgar e me inscrevi numa auto-escola, mas depois, disse “a tomar por saco” e me decidi por um patinete elétrico. Vanguarda, o futuro do transporte urbano... Piada... As pessoas ainda não estão preparadas, assim que conto uma das minhas aventuras:

“No sé si estoy triste, enfadada, molesta o un poco de todo... Después de algo más de una semana yendo y volviendo del trabajo en patinete, fui insultada de la manera más vil y asquerosa.

Un TAXISTA con su Toyota Hybrid de matrícula azul me acerca y me grita a todo pulmón: "!!!!QUÍTATE DEL MEDIO, ¡¡¡¡¡¡GORDA!!!!!!"

Yo iba por mi carril-bici, en la Castellana, entre Cibeles y Colón, como manda la nueva ordenanza de Madrid. En fin, a lo que voy:

Después de pasar por una anorexia y una bulimia, que todavía tengo algunos achaques de vez en cuando, viene un taxista con su pinta de farlopero (nota da escritora: gíria para cocaínomano) y me insulta, ¿llamándome GORDA? Vale que yo llevaba un pantalón ancho (y 2 tallas más grande de la que suelo llevar) que no me favorecía en nada, pero hasta ahí, nos hemos pasado, señores. Es viejo el cliché de "se amable porque no sabes las batallas internas de cada uno" y yo odio toda esa onda de positividad y buen rollo, pero eso es fundamental en la vida. ¿Qué cuesta ser amable? Como la primera vez que salí a la calle en patinete y un conductor de autobús paró a mi lado y me dijo "mira, vete por el medio del carril bici, no te va pasar nada". Eso si se agradece y más de una persona currando el domingo noche.

Esto solo refuerza mi opinión sobre el TAXI DE MADRID y sus conductores, ya que esa no es mi primera aventura con ellos: prepotentes, arrogantes, maleducados y sinvergüenzas. Jamás volveré a coger un taxi en Madrid. No, no me dio tiempo a coger ni la matricula ni la licencia… Otra cuestión que me planteo es: me insultó por ir en patinete o por ser mujer y GORDA(??????) No lo sé, quizás por la dos, quizás por ninguna, no lo sé...”

Publiquei o texto acima, em forma de desabafo, nas redes sociais na semana passada. A questão do taxista ter me xingado, sim me doeu, mas me dói mais saber que os próprios taxistas reclamam e fazem greves, parando toda a cidade, porque querem uma divisão mais justa com os serviços dos aplicativo Uber e Cabify. Pô, malandro, se querem prestar a ser o único serviço privado de transporte, convém que pelo menos dessem motivos para sê-lo. Mas enfim, foi uma mera anedota infeliz e vou seguir usando o meu patinete, e agora vi que em Santos foi aprovado o uso deste veículo. Em Madrid, cidade onde não há uma cultura ciclista (como em Amsterdam, por exemplo, onde a bicicleta tem prioridade sobre o pedestre), os patinetes podem circular na faixa ciclista (outra piada da Prefeitura de Madrid, que depois de muita pressão dos coletivos ciclistas, fez nas coxas as faixas-ciclistas, que nada mais são uma faixa da via à direita, onde pode--se ir ao máximo a 30km/h). Mas ainda assim não nos respeitam.

Seja em Madrid, Santos, São Francisco, Pequim ou Bucareste, acredito que há lugar para todos os meios de transporte, e espero que podamos conviver de forma pacífica na selva caótica do trânsito urbano (ui, meu lado hiponga falando...) Galera (motorizada com o seu carrinho) de Santos, caso um patinete cruzar o vosso caminho, vamos respeitar e ter paciência. Pelo motivo X que seja, nem todos podem ir de carro, mas todos temos o direito de ir e vir....

E mudando de alhos para bugalhos...

Portugal... Ahhh Portugal, a terrinha... Embora não tenha família portuguesa, sinto-me especialmente atraída por Portugal, sei lá, pode ser pelo idioma ou porque o centro de Lisboa (aquela parte ali da Rua Augusta, Praça do Rossio) parece o centro de Santos, só que mais luxuoso... Ah, os portugueses então? Cada vez que vou, me sinto em casa, tão em casa, que paradoxalmente tenho mais vontade de ouvir música brasileira....

Bom, Portugal ilustra perfeitamente a minha preocupação sobre a gentrificação dos centros urbanos. Entre 2001 e 2019 visitei Portugal diversas vezes (sem mencionar a minha primeiríssima vez em julho de 1985) e nesse tempo só a minha preocupação só fez-se aumentar.

Em 2001, quase não havia turistas, bom no Porto, porque em Lisboa sempre teve (não como atualmente, nem como em outras cidades como Roma ou Londres, mas sempre teve).  Naquele longínquo 2001, na Ribeira do Porto, você via um grupo de ingleses, um casal de alemães por aqui, uns franceses por aí... Mas nada como hoje em dia, onde é quase impossível fazer um passeio pelo Douro ou pegar o Elevador de Santa Justa em Lisboa, por exemplo, de tanta gente.

Nesses últimos anos, o turismo em Portugal explodiu, graças ao declínio de certos destinos por culpa do terrorismo, as aero linhas low-cost, ou simplesmente por moda. E essa explosão levou ao boom dos apartamentos turísticos, o que encareceu o custo de vida e expulsou os moradores antigos das suas casas no centro (a tal da famosa gentrificação).

Pô, é muito bacana poder alugar um apartamentinho no centro Porto, perto da Ribeira, mas a que preço?  Que ali vivia gente velha ou jovem que teve que ir embora porque a máquina do dinheiro deve ser alimentada? Ou então a carestia dos preços? Em Lisboa; sentei com o meu namorado numa “esplanada” na Rua Augusta e nos cobraram quase 20 euros por 2 cafés e dois docinhos – quando eu vi a conta quase tive um enfarte. Sem falar que o comércio old school já não existe, agora é tudo Zara, H&M, Intimissimi e etc... Em setembro do ano passado, quando estive no Porto, conversei com a menina motorista do Uber que me levou pra noitada e lhe disse que estava assustada com a quantidade de turistas, e comentei a minha experiência em 2001 e olhem o que ela me disse:

“Em 2001 eu estudava numa escola ali na Ribeira... alguns anos depois ainda estudante, tivemos que mudar de colégio, porque a nossa escola ia se transformar em um hotel...”

Com as palavras da minha Uber termino esta carta, algo a se pensar...

Besitos a todos y hasta pronto,
Juliana



Juliana Rosano nasceu em Santos SP em 1978,
e vive na Espanha há alguns anos.
Novas "Cartas Desde Madri" surgirão por aqui
ao longo das próximas semanas.


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