Na pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil 3” (Instituto Pró-livro/Imprensa Oficial, São Paulo, 2012), temos os seguintes poetas citados entre os 25 autores brasileiros mais admirados:
Carlos Drummond de Andrade (5º lugar)
Vinícius de Moraes (8º lugar)
Cecília Meireles (12º lugar)
Manuel Bandeira (16º lugar)
Fernando Pessoa (18º lugar)
e Mário Quintana (23º lugar).
Pergunto: Será que os brasileiros estão lendo assim tanta poesia?
A resposta, na verdade, tem a ver com os livros didáticos.
Esses poetas aparecem com frequência nesses livros, e em vários contextos, nem todos ligados ao ensino de literatura. E é significativo que todos estejam solidamente encastelados no cânone. Nada de poetas novos.
E esses poetas estão na companhia, na mesma lista, do Monteiro Lobato (por conta da TV), Maurício de Souza, Ziraldo e Pedro Bandeira. Todos autores amplamente lidos nas escolas.
Essa lista daria panos para muitas mangas, com a presença de outros autores, numa verdadeira salada de frutas:
Paulo Coelho (3º lugar)
Zíbia Gasparetto (9º lugar)
Augusto Cury (10º lugar)
Chico Xavier (13º lugar)
Padre Marcelo Rossi (14º lugar)
e Silas Malafaia (24º lugar)
Os demais autores citados são do cânone:
Machado de Assis (2º lugar)
Jorge Amado (4º lugar)
José de Alencar (7º lugar)
Érico Veríssimo (11º lugar)
Paulo Freire (17º lugar)
Clarice Lispector (19º lugar)
Ariano Suassuna (20º lugar)
Graciliano Ramos (21º lugar)
e Mário de Andrade (22º lugar)
Ou seja: dos autores vivos não há presença de nenhum dos que estão no campo de apreciação da crítica contemporânea.
Há, portanto, uma profunda dissociação entre o que o campo literário (no sentido dado ao termo por Bourdieu) privilegia, e o que aparece na preferência dos leitores.
O que leva, simplesmente, a uma reformulação da pergunta: de que literatura se está falando?
Da que entra no radar das forças dominantes do campo literário?
Ou da que, por uma ou outra razão, é efetivamente lida no Brasil?
Resposta:______________________
Não me importo de mudar planos, conto a quarta mudança por problemas fora de domínio.
Com um temporal lavando as partes mais íntimas da alma o jeito é buscar alternativa ao som das chuvas.
Daí a opção foi revisar alguns filmes do Jacques Tati que foi nascido filho de pai russo e mãe francesa, e que antes de se dedicar ao cinema foi um destacado atleta do Racing, um dos principais clubes parisienses.
Muito alto, tinha 1,87m, foi um bom jogador de rugby, futebol e tênis.
Ele chegou ao cinema em 1932, como ator e roteirista, realizando uma série de curta-metragens.
Em longa-metragem sua estréia foi como ator em "Sylvie et le fantôme", do diretor Claude Autant-Lara.
Sua carreira de cineasta começa em 1947 com "Jour de féte", que no Brasil teve o título de "Carrossel da Esperança", e que contava as desventuras de um carteiro francês de uma aldeia que tentava incorporar os conceitos dos serviços postais norte-americanos, então os mais eficientes do mundo.
O filme recebeu o prêmio de melhor roteiro no Festival de Veneza em 1949 e o Grande Prêmio do Cinema Francês em 1950.
O filme seguinte, "As Férias do Sr. Hulot", rodado em 1951 na praia de Saint-Marc, na Bretanha, levou um ano para ser concluído, mas ao chegar aos cinemas foi um estrondoso sucesso.
Ganhou o Prêmio Louis Delluc e o Grande Prêmio da Crítica Internacional em Cannes, em 1953.
É um filme que sempre me encanta.
Em 1957, 'Jacques Tati inicia a realização de "Meu Tio", considerado o seu filme mais lírico e que se transformou em um grande sucesso mundial, tornando-o milionário.
O filme é apresentado em estréia mundial a 9 de maio de 1958 no XI Festival de Cannes, que lhe atribui o Prêmio Especial do Júri.
"Meu Tio" recebeu consagração mundial ao conquistar o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1959.
E a chuva continua limpando a cidade.
E lá vou eu, teimosamente postar poemas nas Redes Sociais, com minha xícara de café ao lado de uma fatia de pizza amanhecida, desejando a todos um bom dia.
Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta é poeta e proprietário da banca de livros usados mais charmosa da cidade de Santos, situada na Rua Bahia sem número, quase esquina com Mal. Deodoro, ao lado do EMPÓRIO SAÚDE HOMEOFÓRMULA, onde bebe vários cafés orgânicos por dia, e da loja de equipamentos de áudio ORLANDO, do amigo Orlando Valência.
por Chico Marques Heather Graham é uma gata absoluta. Linda, loura, gostosíssima e talentosa, ela ganhou Hollywood sem precisar fazer grande esforço. Mas, mesmo assim, teve que esperar quase dez anos para conseguir pular dos papéis de coadjuvante para os de protagonista.
Filha de um agente aposentado do FBI com uma escritora de livros infantis, nunca passou pela cabeça dela virar atriz. Foi estudar Literatura na UCLA e lá conheceu o ator James Woods, com quem viveu alguns anos. Foi só a partir daí que resolveu ser atriz, e começou a aceitar pequenos papéis em produções independentes de Gus Van Sant e Alan Rudolph, entre outros. Sua projeção mundial veio com "Boogie Nights", de P T Anderson, onde interpretava uma atriz pornô que passava o dia inteiro nua sobre patins e era conhecida por Rollergirl. Foi impossível não notá-la depois deste papel. E foi mais impossível ainda esquecê-la depois disso.
De Felicity Shagwell, namorada de Austin Powers, a Judy Robinson, a jovem cientista de Perdidos no Espaço, Heather fez de tudo nesses últimos 20 anos. E apesar de gostar mais de fazer dramas e comédias românticas, nunca nega fogo quando é chamada para interpretar atrizes pornô -- como em "O Guru do Amor" -- ou strippers -- como em "The Hangover". É uma maneira de mostrar que continua exuberante apesar do passar dos anos. Heather Graham está completando 46 anos de idade, alternando sua carreira no cinema com uma carreira paralela em séries de TV, além de continuar sendo muito requisitada como modelo fotográfica para campanhas da Garnier e para a Vodka Skyy. Continua lindíssima, a mesma gata absoluta de antes. Apenas mais madura.
Nós celebramos seu aniversário resgatando cinco de seus melhores filmes. Em comum entre eles, apenas o fato de estarem todos disponíveis nas estantes da Vídeo Paradiso.
BOOGIE NIGHTS (Boogie Nights, 1997, 156 minutos, direção Paul Thomas Anderson)
Eddie Adams (Mark Wahlberg), um lavador de pratos, transforma-se em Dirk Diggler, a estrela mais famosa do mundo pornô do final dos anos 70 graças ao diretor Jack Horner (Burt Reynolds). Mas a súbita fama pode ter seu preço. Constante clima de festa, com drogas e música disco , eles têm seus dramas, como o da atriz veterana Amber Waves (Julianne Moore), que tenta a guarda de seu filho na justiça, e do próprio diretor, que sonha em fazer arte mas percebe a mediocridade de seu trabalho. O filme acompanha a ascensão e queda dessas figuras e o mundo turbulento em que vivem, com humor sarcástico, personagens humanos e complexo. Heather Graham faz Rollergirl, uma colegial que vive de patins e se transforma numa deusa do sexo. Clássico.
PAIXÕES EM NOVA YORK
(The Sidewalks Of New York, 2001, 108 minutos, direção Edward Burns)
Tommy (Edward Burns) é produtor de televisão em Manhattan. Está prestes a se casar, mesmo sabendo que seu romance não tem futuro. Enquanto procura por um apartamento com a ajuda da lindíssima corretora Annie, começa a se questionar se está fazendo a coisa certa. Annie, por sua vez, tem um casamento morno ao extremo com o dentista Griffin (Stanley Tucci), que está tendo um caso com Ashley (Brittany Murphy), uma garota de 19 anos prepotente e desmiolada.E isso é só o começo dessa ciranda amorosa atrapalhada. Grande filme pouco conhecido de Edward Burns, escrito, ditigido e interpretado por ele. Tão bom quanto "The Brothers McMullen" e "She's The One".
DO INFERNO
(From Hell, 2001, 122 minutos, The Hughes Brothers)
Londres 1888. Pessoas infelizes e miseráveis lutam para sobreviver nos piores lugares da cidade. Atormentada por quadrilhas e forçada a parambular pelas ruas em busca de sobrevivência, Mary Kelly (Heather Graham) fica sem saber o que fazer quando uma conhecida dela é sequestrada e outra é cruelmente assassinada. A sinistra morte atrai a atenção do inspetor Fred Abberline (Johnny Depp), um homem brilhante, e muito perturbado, cujas habilidades psiquicas auxiliam suas investigações. Abberline acaba por se envolver profundamente no caso e, conforme se aproxima da verdade, maior é o perigo para Abberline, Mary e as outras garotas. Trabalho extremamente climático dos Irmãos Hughes, que cresce com as ótimas performances de Depp e Graham.
MATE-ME SUAVEMENTE (Killing Me Softly, 2002, 100 minutos, direção: Chen Kaige) Apaixonar-se à primeira vista é passar por um momento único, em que duas pessoas fecham os olhos enquanto o mundo à sua volta parece não existir, tamanha a intensidade da atração que as envolve. "Mata-me de Prazer" conta a história de Alice (Heather Graham), uma jovem que tem essa experiência ao encontrar, no meio da rua, em Londres, um desconhecido (Joseph Fiennes) que a deixa completamente perturbada. Incapaz de esquecê-lo, Alice põe em risco uma vida segura e um relacionamento estável com seu namorado Jake (Jason Hughes), para entregar-se de corpo e alma a um homem misterioso e sem meios termos, de atitudes extremadas, cujo vida está envoltas em sedredos. "Mata-me de Prazer", baseado no best-seller de mesmo nome, é uma estimulante história de amor entre duas pessoas sedutoras e fisicamente atraídas, que rapidamente transforma-se num thriller emocionante.
DOCE TENTAÇÃO (About Cherry, 2012, 98 minutos, direção Stephen Elliott) O filme segue Angelina (Ashley Hinshaw), uma jovem à beira de terminar o colegial, que leva uma vida muito difícil, pois sua mãe é alcoólatra e seu padrasto, violento. Certo dia, seu namorado sugere que ela tire fotos nuas por dinheiro e depois de hesitar, ela concorda e faz a sessão de fotos. Em São Francisco, Angelina começa a trabalhar em um clube de strip, adota o nome de Cherry e conhece um advogado que a leva a festas extravagantes, até que um cliente lhe apresentam um novo mundo, a indústria do pornô. Heather Graham faz uma stripper veterana que agora trabalha como gerente e produtora de flmes eróticos.
O grande problema em sair pelo Centro do Rio para almoçar com a irmã vegana e a mulher em dieta é, claro, a escolha do Restaurante.
Casas tradicionais, com seus cardápios magníficos, serão imediatamente descartadas por elas em prol de alguma saladeria bonitinha que cobre os olhos da cara por um prato de capim, ou coisa que o valha.
E você será voto vencido.
Sempre.
Até por ter sido vítima de uma armadilha do gênero, confesso que me surpreendi positivamente com a loja da Delírio Tropical da Rua Teófilo Otoni, que fica quase ao lado na belissima Livraria da Travessa da Avenida Rio Branco.
Delírio Tropical oferece basicamente refeições rápidas, mas toma um cuidado todo especial com a qualidade das verduras e legumes que utiliza nos pratos que serve em seus balcões.
Mas não se limita a cardápios vegetarianos e veganos. Serve também opções variadas com carnes de vários tipos.
As saladas da casa são simpáticas visualmente, mas me pareceram pequenas e caras demais para o que são.
A excessão talvez seja a Caesar Salad, muito vistosa e nada natureba, com vários tipos de alface, bacon, croutons, parmesão ralado e molho de alho.
De qualquer maneira, a maioria das saladas não chega a impressionar.
O mesmo já não pode se dizer dos pratos principais da casa.
O rosbife italiano que servem por lá, por exemplo, com molho especial e cebola cortada fininha, estava no ponto e simplesmente delicioso.
A farofa de beterraba, com farinha de mandioca torrada e beterraba ralada com germe de trigo, gergelim e alho, é um outro achado gastronômico de cozinha ligeira que o Feitiço Tropical oferece em seu cardápio.
O falafel então estava extremamente crocante e muito bem temperado. Eu o achei melhor, e bem mais em conta, que o servido na maioria dos Restaurantes Árabes que não se limitam apenas a kibes e esfihas.
E confesso que adorei uma iguaria inventada por um cozinheiro nordestino da casa: o Cearáburger. Trata-se de um hamburger grelhado de carne moída bem temperada misturada com proteína de soja, e coberto por molho golf com grãos de pimenta jamaicana.
O Delírio Tropical serve sua própria linha de refrescos naturais, mas não é xiita: se você pedir uma Coca Cola, ou uma Schweppes Citrus, eles tem para oferecer.
Os pães da casa são deliciosos.
E os doces são opções que vão interessar a todos aqueles que já cansaram dessas docerias que adoçam demais seus quitutes.
Fora isso, todas as lojas da Feitiço Tropical são extremamente bem projetadas, bonitas, coloridas e aconchegantes. São nove no total: três no Centro, uma em Botafogo, uma em Ipanema, uma na Gávea, duas na Barra e uma em Jacarepaguá.
Portanto, se você estiver numa situação semelhante à que eu relatei acima, e sentir que seu almoço ou jantar vai virar refém da escolha de terceiros por alguma saladeria da vida, cheque antes se não existe na vizinhança alguma filial do Delírio Tropical.
Acredite: isso pode salvar o seu almoço ou seu jantar de uma bela roubada.
Chama a atenção o fato de A Senhora da Van ser baseado em fatos reais – ou ao menos grande parte do filme, como ressalta o alerta presente logo no início do longa-metragem. Não propriamente por ser uma história surpreendente, mas por trazer aos habitantes de um típico bairro de classe média (alta?) britânico a pobreza nua e crua, escancarada ao alcance das mãos. É no relacionamento entre a senhora Shepherd e seus vizinhos que está a sutileza do roteiro e também a beleza da situação como um todo.
A trama gira em torno do fato da tal senhora Shepherd viver em uma van que, de tempos em tempos, troca de vaga ao longo do bairro de Camden Town. Tais mudanças são um martírio para os vizinhos, devido aos hábitos pouco higiênicos da motorista de passado misterioso. O único que a tolera – e a palavra certa é esta, tolera – é o escritor Alan Bennett, que cede o banheiro para que ela possa usá-lo – não sem muitas reclamações, é bom ressaltar. É neste ponto que A Senhora da Van chama a atenção: por mais que às vezes surja uma ajuda aqui ou ali, na verdade todos os envolvidos querem mesmo é que a senhora e sua van desapareçam de suas vidas. A existência de uma pessoa que aceite passar por necessidades morando tão próximo incomoda, não apenas pela existência de tal realidade em um bairro abastado mas, também, pela dificuldade em lidar com o diferente. E isto vale também para Alan, o “herói” da narrativa.
É bem verdade que, mesmo com todos os seus preconceitos, ainda assim Alan demonstrou humanidade ao ajudá-la. Como é o verdadeiro Alan Bennett quem assina o livro e a adaptação do mesmo para o cinema, é natural que não haja uma mão muito pesada em relação ao incômodo da pobreza ao lado, tratado mais a partir de comentários ácidos, típicos do senso de humor inglês, e um certo coitadismo que logo se transforma numa espécie de “adoção coletiva da figura excêntrica do bairro”. Ou seja, o explosivo tema que poderia render bastante pela diferença de classes em um país capitalista de primeiro mundo é naturalmente minimizado, por mais que permaneça sempre nas entrelinhas.
Diante disto, o interesse maior do diretor Nicholas Hytner é ressaltar as personalidades tão anacrônicas da senhora Shepherd e de Alan, e como aos poucos surgiu entre eles uma relação de respeito e agradecimento, com cada um guardando para si segredos bem particulares. É possível notar um carinho palpável por ela, auxiliado pela atuação sempre competente de Maggie Smith, desta vez em uma personagem de atitude que, em muitos casos, torna-se antipática para o próprio público. A atriz consegue driblar bem estes momentos, incitando no espectador um interesse genuíno pela personagem. Já Alex Jennings constrói um Alan Bennett multifacetado, cuja psiquê surge dividida em duas em vários momentos e que tem na insegurança seu traço mais marcante.
Conduzido sempre em clima ameno, já que não há interesse em tocar em temas mais espinhosos, A Senhora da Van cumpre sua função de trazer tal história tão pitoresca ao grande público, agora nas telas de cinema. Entretanto, por mais que tenha dois bons protagonistas e seja até interessante, o filme por vezes cansa pelo tom monocórdio que adota, sem qualquer movimentação brusca ao status quo estabelecido desde o princípio.
QUEM GOSTOU DE "PHILOMENA", NÃO PODE PERDER "A SENHORA DA VAN" por Alex Gonçalves para CineResenhas
Famoso dramaturgo britânico de 81 anos, Alan Bennett passou ele próprio por uma situação digna de ficção: entre os anos 1970 e 1980, ele abrigou em sua garagem Miss Shepherd, uma senhora que tinha uma van caindo aos pedaços como único lar. Conhecido por “As Loucas do Rei George”, peça de 1991 que três anos depois seria levado aos cinemas pelo então estreante Nicholas Hytner, Alan não poderia deixar de relatar como artista a sua convivência com uma velhinha aparentemente com alguns parafusos a menos.
O resultado é “A Senhora da Van”, antes narrado na BBC Radio 4, transformado em romance e agora encarnado em um longa-metragem. É também Nicholas Hytner que se encarregou em compartilhar essa história no cinema atrás das câmeras, que inicia com Miss Shepherd (Maggie Smith), uma senhora religiosa envolvendo-se em um acidente. Só se houve o barulho da batida de um sujeito contra a sua van e, na sequência, a sua fuga do local e das autoridades.
O destino fez Miss Shepherd estacionar o seu veículo em um bairro cercado de vizinhos que adoram fofocar uns com e sobre os outros. De faixada em faixada, Miss Shepherd acaba estacionando permanentemente na residência Alan Bennett (interpretado por Alex Jennings), ainda em uma fase em que não atingiu o ápice da consagração como autor. Ao mesmo tempo em que respeita o passado de Miss Shepherd (ele parece a última pessoa da Terra curioso em remexer as circunstâncias que a deixaram em um estado tão desolador), Alan entra em conflito consigo mesmo quando vê na situação um belo argumento para a escrita de um novo romance.
É inevitável não pensar em “Philomena” ao avaliar “A Senhora da Van”, pois há uma série de coincidências que os aproximam. Entre os principais, temos a vida de uma idosa voltando a ganhar movimento com o acesso a um homem intelectual e alguns traumas ou perdas que serão revividos para que uma solução seja encontrada.
Lamentavelmente, a sensibilidade de Nicholas Hytner ficou nos tempos de “As Loucuras do Rei George” e “As Bruxas de Salem”, pois a história de “A Senhora da Van” recebe aqui um tratamento descuidado e desinteressado. Sem que os protagonistas sejam submetidos a qualquer processo de envelhecimento, fica difícil acreditar que o convívio entre Alan Bennett e Miss Shepherd tenha durado nada menos que 15 anos. Pesa também a condução em banho-maria, com tiradas tipicamente britânicas e um clímax revelador que não elevam a pulsação de uma história real extraordinária.
Desde os primórdios do cinema, em seus mais diferentes formatos, os filmes documentários estiveram ombro-a-ombro com as obras de ficção, sendo a última mais artística e de menor apelo factual. Ora peças de propaganda promovidas por governos e sergmentos sociais, ora noticiários exibidos antes do filme principal da programação, os filmes de informação, noticiários e documentários de uma forma ou de outra sempre estiveram presentes na vida de cinéfilos e fãs da Sétima-Arte.
Os documentários, à época, talvez causasem maior interesse nas salas de exibição sendo uma das poucas fontes audiovisuais de informação. Os cutos de produção desse estilo de cinema também eram razoavelmente baixos: bastavam bom equipamento e repórter cinematográfico familizarizado com os recursos da câmera para que a quantidade de material a ser editado fosse sensivelmente abundante.
Esse mesmo avanço tecnológico cortou o cordão umbilical do documentário com a platéia: a televisão aos poucos ocupava os lares de vários países a partir dos anos 1940 (no Brasil a partir de 1950), providenciando uma linguagem própria pertinente às características técnicas desse, então, novo meio de comunicação. Além das novas possibilidades técnicas para o cinema, o que permitiu aos filmes de ficção vôos nunca antes imaginados, a televisão e o cinema começaram a trocar influências. Uma via de mão dupla que foi benéfica para ambos.
Contudo, tal advento produziu no público de cinema menor prazer nos curtos filmes de reportagem (como o Canal 100, por exemplo) e documentários antes da exibição da película principal. A instantaneidade da transmissão de televisão acabou sendo um desfavor para o filme documentário, que já a partir dos anos 1950 e 1960 passou a flertar com conceitos e aspectos de direção de arte comumente encontrados nos filmes de ficção. O documentário iniciava, assim, seu processo de ser repensado como peça artística, muito além da mera informação.
Os documentários começaram a ser roteirizados a posteriori em relação à coleta de material e já não se era mais possível imaginar uma história contada da mesma maneira. Esses filmes passaram a ter uma voz narrativa pouco usual propriamente, mas condutora das tensões entre os dados e fatos a serem exibidos ao público. O cinema documentário passava a desenvolver uma mapa neural muito mais complexo e, logo, instigante, onde os caminhos e sinapses eram mais flexíveis e móveis.
Entretanto, mesmo com esse avanço artístico dos filmes documentários, o estrago já estava feito. A televisão se tornara entretenimento barato e acessível para as massas, com uma diversidade de seduções que iam do jornalismo ao futebol, passando pelos musicais e programas de auditório. O satélite proporcionou a transmissão imediata dos chamados grandes eventos e o cinema de ficção só não foi para o ‘saco-da-vida-eterna’ por causa dos investimentos vultosos da grande indústria estadunidense que se agarrou no caráter mágico da própria ficção para encantar platéias e não ver tudo caminhar a passos largos para o vinagre.
Com isso, e especialmente no Brasil, durante muito tempo o público de cinema se desacostumou com o filme documentário. Talvez seja ainda comum encontrarmos pessoas cujo interesse ainda não se reverte na compra de um bilhete quando esse tipo de filme está em cartaz. Os fanáticos por essa forma de cinema já não conseguiam sequer lotar uma sala-de-bolso. Aos poucos, graças às iniciativas desses fãs em eventos como o É Tudo Verdade, uma das principais mostras de documentários que temos hoje em dia, mais o espírito de resistência ainda encontrado nos famosos e tradicionais festivais de cinema, o documentário ressurge tão potente quanto às produções de ficção, animações, fazendo a platéia mais uma vez se (re)aproximar desse modalidade de filme.
O cinema como documento já não se estabelece no mundo como uma simples sequência de imagens historicamente importantes com uma quantidade abissal de declarações e depoimentos. A direção de arte nas produções da virada do milênio ganhou o caráter de imprescindível e a fotografia finalmente tornou-se componente importante da linguagem cinematográfica do documentário. Além disso, montagem e edição também se tornaram fundamentais para a intenção da peça documental e artística, sentando à mesma mesa ritmo e tom.
De acordo com esses critérios mais contemporâneos, se fossemos fazer uma lista dos 50 melhores documentários da história do cinema nesses últimos 100 anos, seria impensável a lista dos ‘10 mais’ não contar com o filme Manda Bala, do diretor norte-americano Jason Kohn, lançado em 17 de agosto de 2007, com fotografia de Heloísa Passos e edição de Andy Grieve, Doug Abel e Jenny Golden.
Filho de um empresário argentino e mãe brasileira radicados nos Estados Unidos, o interesse de Jason pelo Brasil nunca passou de alguns aspectos relacionados à cultura artística e música. Entretanto, o futuro cineasta passou boa parte da vida ouvindo histórias do pai sobre o nível absurdo de corrupção em nosso país, além dos indíces anuais de homicídios para lá de escabrosos.
Tudo ia bem até que trombou com o relatório de Jean Ziegler, o enviado especial da ONU ao Brasil em 2001. Na época, o relatório de Ziegler continha dados corroborados posteriormente por declarações polêmicas em entrevistas: "Em um país onde o solo é fértil e rico com clima tropical, passar fome é genocídio"; "Existe uma guerra de classes no Brasil. Quase 40 mil pessoas são assassinadas por ano. Para a ONU, 15 mil é um indicador de guerra".
Nascia, assim, um Brasil para Jason que não era mais um ‘bundalelê’ insosso com musiquetas ora para dor-de-cotovelo, ora para saudar o sol, a prainha e o barquinho. Era um país para lá de ‘punk’, onde a vida vale quase nada e é capaz de produzir aberrações como favelas lado-a-lado de condomínios luxuosos, com um estilo de vida que chega a ser agressivo diante de tanta ostentação.
Na abertura do filme, já é possível saber para que veio Jason Kohn. Logo nas primeiras cenas, um aviso de que o filme não pôde ser exibido no Brasil. A sequência inicial, uma espécie de ‘teaser’ para o conteúdo a ser desbravado ao longo de 85 minutos, conta com cenas intercaladas de vídeos enviados por sequestradores onde as vítimas de sequestro imploram aos prantos para que suas famílias paguem logo o resgate. A proibição do documentário no Brasil, em especial nos primeiros anos de lançamento se deve à coluna-mestre do roteiro do filme.
A parte inicial do documentário começa numa fazenda de rãs. Rotinas de trabalho, criação, alimentação e até abordagens sobre desregulação nutricional dos exemplares, principal causadora de incidentes de canibalismo entre os bichos em confinamento. Até que uma das perguntas feitas por Jason é sobre um escândalo de corrupção envolvendo o ranário, razão pela qual o gerente da fazendo solicita o desligamento da câmera. Entende-se, então, porque o documentário teve sua exibição proibida em território nacional na época em que foi lançado.
A fazenda de rãs está ligada ao derradeiro escândalo da falecida Sudene (Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste), cuja figura principal é/era o senador pelo Pará, Jader Barbalho. Jader havia solicitado à Sudene valor de R$ 9 milhões para a construção das instalações daquele ranário, mas o valor real da obra não passava de R$ 350 mil. A diferença? Poxa! Não me façam perguntas difíceis...
O escândalo naquele ano derrubou Jader Barbalho, então presidente do Senado Federal, num confronto de farpas e dedos-em-riste com o senador Antônio Carlos Magalhães. Pela primeira vez Jason tinha um dado real sobre a terra de sua querida mãe: o Brasil historicamente tinha saído das Capitanias Hereditárias, mas as Capitanias Hereditárias ainda não tinham saído do Brasil.
O desfalque e apelo escandalizante-orgiástico dos meios de comunicação aceleraram privatizações e o sepultamento da Sudene. Mas Jason acertou em cheio: seu filme ganhava a coluna-mestre de disposição das histórias conferidas em Manda Bala. Todas as narrativas, assim, giram em torno do processo de produção e comercialização da carne de rã: desde os viveiros até as danadas devidamente empanadas e crocantes na boca dos famintos apreciadores de distinta iguaria.
Intercaladas com as fases de produção e consumo da carne de rã estão as narrativas que incluem depoimentos de policiais civis da anti-sequestro, vítimas de sequestro (com as devidas orelhas reparadas por habilidosos cirurgiões plásticos), sequestradores, o procurador geral da República, delegados, um empresário abonado sob o nome fictício de ‘Mr. M’, dono de um belo inglês norte-americano, justificando o mercado dos carros blindados e a relevância dos cursos de direção defensiva, além de uma criança sequestrada, em completo estado de choque e pânico, numa gravação em vídeo enviado aos pais para fins de aceleração do pagamento do resgate.
Ah, em tempo: uma entrevista com o próprio Jader Barbalho! Sim, senhor(a)! O documentário oferece dentro do possível, sempre, o direito ao contraditório. Aliás, a evolução da carreira política de Jader, entre empresas de comunicação de sua propriedade e relatos de desafetos do senador, também está presente no documentário. Tudo entre uma caixa e outra de rãs, ora exportadas, ora transportadas para várias cidades de nosso país a fim de atender ao sacratíssimo consumo interno.
Cinematograficamente, "Manda Bala" acerta em dois aspectos. O primeiro está relacionado à direção de fotografia. Escolha certa do equilíbrio de cores, utilização de uma textura dramática na instalação das imagens e perfeito estudo do balanço de luz que aproveita a luminosidade comum em nosso país, mas sem ‘chapar’ o branco ou provendo certa involução dessa qualidade com o avanço do filme. Isso permitiu ao diretor obter mais dramaticidade nas tomadas, como nos testes de tiro contra vidros blindados ou nas macros dos girinos.
O segundo tem a ver com a montagem e edição filme, que beira à perfeição. Sem a irritabilidade comum que ritmos ‘clipados’ possam causar, o passo do filme apresenta o mesmo equilíbrio da fotografia. Acelerado, em certos trechos, mas ainda reflexivo pelos contrastes apresentados no filme. Nesse ponto, Jason Kohn mata a pau! Ele consegue chocar quem assiste ao documentário pela beleza das imagens e mantém a contemplação no nível de uma reflexão bastante forte do conteúdo apresentado ao término da exibição. Em suma, ele consegue prender a platéia num imagético bem longe do ‘arrastado’: nas curvas ele diminui para sentar o pé no acelerador quando os retões se avizinham.
Já vi muitos documentários nessa minha breve vida. Alguns, inclusive, que aparecerão nessa humilíssima Mercearia. Entretanto, não citar Manda Bala entre as ’10 mais’ da história do cinema de documentário é de se suspeitar quem organizou a lista, bem como os critérios. O filme tira qualquer um do lugar. É o exemplo do cinema de documentário como arte. O documento concomitante ao artístico, o artístico a serviço do documento. Igual a sexo com muito tesão, sem cair na prática do coito em ambiente meramente genitalizado: um filme onde o ‘pega’ é tão potente quanto à penetração.
Enfim, a cereja do bolo: imaginem um dos melhores documentários da história do cinema cuja trilha sonora se impõe com canções do movimento Tropicalista! Imagens cuidadas e ritmo brahmiano com trechos inteiros de faixas de ‘Estudando o Samba’, de Tom Zé. Vão se catar Listz e Wagner: sem a menor necessidade de viagra!
Ao final desse filme de 2007, uma constatação, triste, mas tão verdadeira quanto nossos dias atuais: caminhamos, caminhamos, caminhamos... mas não saímos do lugar. Para se repensar uma civilização que se possa chamar de ‘brasileira’: sequer o ‘para casa’ estamos fazendo. O filme se torna atualíssimo, mesmo com esse hiato de quase 9 anos: marcar passo deve ser a vocação (presumo!) do país! Uma nação onde o(a) sofista continua sendo o(a) tal, um inequívoco exercício de retórica e nada de ‘mãos à obra’.
Dizem que se conselho fosse bom, era vendido e não dado. De qualquer forma, vai aqui o meu: se esse filme pintar em Enguaguaçu ou qualquer endereço perto de casa, assistam, assistam, assistam... assistam... assistam!
(P.S. – o senador pelo Pará continua sendo Jader Barbalho)
MANDA BALA
(Send the Bullet, EUA/Brasil, 2007, 85 minutos)
Diretor
Jason Kohn
Fotografia
Heloísa Passos
Edição
Doug Abel (editor senior)
Jenny Golden
Andy Grieve
Produtores
Joey Frank
Jared Ian Goldman
Jason Kohn
Produtor associado
Mário Kohn
Produtor Executivo
Júlio de Pietro
Produção
Kilo Films
Whitest Pouring Films
Pós-produção
Goldcrest Post Production (Nova York)
Nuncle (design e animação)
inédito nos cinemas e em dvd no Brasil
consta do cardápio da NETFLIX
Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 47 anos e vive na mítica Vila Belmiro. Formado em Letras, leciona Inglês para sobreviver, mas vive mesmo é de escrever e traduzir. É avesso a hermetismos e herméticos em geral, e é o mais novo colaborador de LEVA UM CASAQUINHO