Thursday, August 31, 2017

SAUDAMOS NOSSAS ANIVERSARIANTES VINTAGE DESTA SEMANA (27 a 30 de Agosto)

textos por Chico Marques


BARBARA BACH
August 27, 1947
Queens, NY
 
 Muita gente acha que, por ter feito carreira como modelo e atriz na Europa, e por aparecer em vários filmes falando com sotaques meio estranhos, Barbara Bach é inglesa, ou alemã, ou russa. Mas, na verdade ela é do Queens, Nova York, onde nasceu em uma família com o bandeirosíssimo "jewish name" Barbara Ann Goldbach. Iniciou como modelo em meados dos Anos 60 e conheceu seu primeiro marido Augusto Gregorini durante um trabalho na Itália. Ficaram casados quase 10 anos e tiveram dois filhos: Francesca e Gianni. Em 1975 ela se mudou para Los Angeles para tentar uma carreira no cinema, e participou de diversas produções, tornando-se inclusive uma das mais celebradas bond-girls: a agente russa Anya Amasova em "O Espião Que Me Amava" (1977), ao lado de Roger Moore. Infelizmente nunca conseguiu o papel de destaque com que sonhava, e que provavelmente a levaria ao estrelato. Em 1981, Barbara conheceu Ringo Starr nas filmagens da comédia "O Homem das Cavernas" (1981), de Carl Gottblieb, e se casaram. Desde então, ela passou a trabalhar muito pouco como atriz, circulando pelo mundo com o maridão e gerenciando (muito bem) a carreira dele.  Sem contar que virou uma fotógrafa de prestígio, com vários livros publicados -- entre eles, "African Wildlife: A Photographic Safari". Barbara Bach permanece uma mulher lindíssima aos 70 anos de idade.
CURIOSIDADES

Roger Moore praticamente não faz menção a Barbara Bach em suas memórias, apesar de insistir que "O Espião Que me Amava" é um dos dois melhores filmes que fez como Bond... James Bond. Dizem as más línguas que o motivo disso é que Moore a xavecou constantemente durante as filmagens e ela não se encantou nem um pouco com ele, achando-o extremamente "gabola" e com um senso de humor infantilóide.

Ringo e Barbara estavam de férias pelo Extremo Oriente em Dezembro de 1980 quando sua filha ligou de Nova York para avisar que John Lennon havia sido assassinado. Os dois voaram pegaram o primeiro vôo para Nova York para consolar a viúva Yoko. Ringo era o ex-beatle que estava mais distante, e mesmo assim foi o primeiro a chegar para o funeral.

Barbara e Ringo passaram boa parte dos Anos 90 entrando e saindo de Clínicas de Reabilitação para dependentes químicos e hoje em dia nem chegam perto de cocaína ou bebidas alcoólicas.
 



JENNIFER COOLIDGE
August 27, 1961
Boston Ma
Jennifer Coolidge é uma comediante sensacional, versátil a toda prova, mas que passou a maior parte de sua vida artística escalada para papéis menoress e só aos 40 anos ganhou celebridade como a "Mãe do Stifler", que devora impiedosamente os amigos de seu filho e também os pais dos amigos de seu filho na série de filmes "American Pie". Foi justamente esta personagem de Jennifer Coolidge, que num determinado momento é chamada da MILF (Mother I'd Like To Fuck) por colegas de seu filho, que acabou por desencadear a Onda MILF na Indústria da Pornografia nos Estados Unidos, que acabou tirando da aposentadoria precoce dezenas de atrizes pornôs com mais de 40 anos e trazendo-as de volta ao "mercado de trabalho", com enorme aceitação de público. Jennifer teve uma formação bastante sólida como atriz. Estudou na prestigiosa Emerson College emn Boston, Massachusetts, e se formou em Artes Cênicas em 1985, quando se mudou para Nova York para fazer parte do famoso Gotham City Improv Group, e, mais adiante, já em Los Angeles, trabalhou por uns bons anos no premiado e divertidíssimo grupo teatral The Groundlings. Estreou na TV fazendo uma massagista gostosona e atrapalhada em "Seinfeld", que chamou tanto a atenção que a qualificou para os elencos de "She TV" (1994) e do programa de Roseanne Barr "Fox's Saturday Night Special" (1996). Participou também de séries como "Frasier", "Sex and the City" e "Vida de Artista". No cinema, além de "American Pie", ela participa também da série "Legally Blonde" ao lado de Reese Witherspoon. E sempre que pode, dá um jeito de embocar no elenco dos filmes de seu velho amigo Christopher Guest.
CURIOSIDADES

Não estava nos planos da versátil Jennifer Coolidge passar tanto tempo fazendo gordinhas gostosas e fogosas no cinema e na TV, mas o caso é que ela gosta tanto de fazer esse tipo que jamais recusa um convite para isso, mesmo sabendo que isso dificulta cada vez mais a oferta de um papel dramático ou romântico onde ela possa revelar ao público a outra face de seu talento.

Jennifer Coolidge foi a escolhida nos castings preliminares da série "Desperte Housewives" (2004) para fazer o papel de Lynette Scavo", mas na hora H acabou sendo descartada do elenco e substituída por Felicity Huffman.

Jennifer Coolidge se divide entre sua casa em Hollywood, California, e uma mansão histórica em New Orleans, Louisiana, que foi totalmente restaurada depois da passagem do Furacão Katrina.



REBECCA DE MORNAY
August 29, 1959
Santa Rosa, Cal


Rebecca De Mornay vem de uma família de artistas de rádio, TV e cinema. Foi criada entre a Inglaterra e a Austria, onde estudou, tanto que fala francês e alemão fluentemente. Voltou a Los Angeles ao completar 18 anos e foi estudar no Lee Strasberg's Institute e estreou no estranhíssimo musical de Francis Ford Coppola "O Fundo do Coração" (1981). Mas foi aparecer para valer mesmo como a prostituta empreendedora que vira a cabeça de Tom Cruise em "Negócio Arriscado" (1983).
O estrelato demorou um pouco para vir, mas veio em 1992 com "A Mão Que Balança o Berço" (1992), thriller sensacional de Barbet Schroeder. Fez ainda "Expresso Para o Inferno" (1985) com o notável diretor Andrei Konchalovski e "Manhattan Nocturne" (1990) com o craque Sidney Lumet. Estreou brilhantemente na TV num papel contundente na premiada série da HBO "John From Cincinnati", e de uns tempos para cá tem feito papéis recorrentes em séries como "Hawaii 5-0", Jessica Jones" e "Lucifer".


CURIOSIDADES

Rebecca de Mornay estreou como diretora na série de TV "The Outer Limits" (1995), com John Savage and Frank Whaley. Desde então, pegou gosto pela coisa e vem dirigindo com bastante frequência.

De quinze anos para cá, Rebecca tem trabalhado como atriz no teatro com muita frequência. Seu maior sucesso até agora foi a montagem original de "Closer", e ela só não foi convidada para fazer a versão cinematográfica da peça porque os produtores queriam, custasse o que custasse, Julia Roberts no papel principal.

Rebecca vive atualmente em Los Angeles com o jornalista esportivo Patrick O'Neal e suas duas filhas: Sophia De Mornay-O'Neal e Veronica De Mornay-O'Neal.



TUESDAY WELD
August 28, 1943
New York City, NY



 Desde menininha, a linda e adorável Tuesday Weld já era arrimo de família. Seu pai morreu quando ela tinha apenas 3 anos de idade, e sua mãe a colocou para trabalhar como modelo fotográfico infantil para sustentar a família. As duas -- mãe e filha -- se desentendiam com muita facilidade, mas tudo indica que sua mãe tinha o biotipo Joan Crawford em "Mamaezinha Wuerida". O convívio entre as duas era tão difícil que aos nove anos Tuesday teve seu primeiro colapso nervoso, aos doze já bebia e aos treze tentou o suicídio pela primeira vez. Aos 16 anos conseguiu o papel principal em Ritmo Alucinante (1956), onde interpretava Dori, uma garota que tenta de todas as maneiras comprar um vestido para dançar. Dois anos depois ela estaria ao lado de Paul Newman e Joanne Woodward em A Delícia de um Dilema (1958). Começava aí uma carreira cheia de momentos muito marcantes, apesar de nenhum deles ter conseguido transformar Tuesday em uma estrela. Apesar de ser reconhecida como boa atriz pelos críticos, começou a ficar estigmatizada por recusar papéis irrecusáveis. Ela era a primeira escolha de Stanley Kubrick para interpretar "Lolita", e também a favorita de Arthur Penn para fazer Bonnie em "Bonnie & Clyde", mas descartou os dois convites. Não satisfeita com isso, descartou também um papel em "Bob, Carol, Ted & Alice" (1969, acabou sendo oferecido a Dyan Cannon) e também o papel principal em "O Bebê de Rosemary" (1967), de Roman Polanski, que glorificou Mia Farrow. Para piorar ainda mais, brilhou intensamente em "The Cincinatti Kid" (1968) de Norman Jewison e em "I Walk The Line" de John Frankenheimer, mas poucos perceberam. Sua carreira, pouco a pouco, foi embarcando numa espiral descendente. Primeiro ela virou motivo de piadas em Hollywood por suas escolhas desastradas. Depois, passaram a simplesmente não chamá-la mais para produções de relevo. Não foi nada fácil para ela tentar voltar para os papéis de protagonista, ficou uns bons anos no estaleiro fazendo filmes B e C para sobreviver. Foi mais ou menos nesta época que ela descobriu que seu espírito indômito era, na verdade, consequência do transtorno afetivo bipolar, doença da qual sofria desde criança e não sabia. Somente aos trinta anos, Tuesdday conseguiu se reerguer e ser indicada ao Oscar de melhor atriz coadjuvante, por seu papel em "Who’ll Stop the Rain" (1978), ao lado de Nick Nolte. Depois disso, brilhou ao lado de Diane Keaton em "Looking For Mr. Goodbar" (1979) de Richard Brooks, e com Al Pacino em "Author! Author!", de Arthur Hiller (1980) -- sem contar "Era Uma Vez na América" (1984) de Sérgio Leone. Daí para a frente, já morando de volta em Nova York com seu filho, Tuesday tratou de se dedicar mais ao teatro e à TV. No cinema, e nunca mais recusou um papel sequer. Está aposentada desde 2001, vive tranquilamente no Colorado e não se ouve muito falar dela. Nos últimos anos tem sido procurada por antigos fãs e algumas vezes aceita participar de festivais em sua homenagem, mas na última hora sempre cancela.

CURIOSIDADES

Os relacionamentos amorosos de Tuesday Weld ainda menor de idade com homens muito mais velhos do que ela -- como o ator John Ireland -- escandalizavam Hollywood e tiravam o sono dos produtores de seus filmes, que viviam inventando romances dela com jovens atores para que ninguém visse os velhinhos com quem ela realmente gostava de sair. Tentaram fazer namorar Elvis Presley. Foi um desastre, pois Elvis sempre se envolveu apenas com mulheres que ele pudesse controlar. E Tuesday Weld era tudo menos controlável.

Seu primeiro casamento foi 1965 com o roteirista Claude Harz, com quem teve a sua filha Natasha (1966). O casal se separou em 1971 e quatro anos mais tarde ela conheceria o ator inglês Dudley Moore. Eles se casaram no ano seguinte em Las Vegas. Patrick nasceu logo depois. Após muitas brigas, o casal se separaria de vez em 1980. Seu último casamento foi com o violinista e maestro Pinchas Zukerman, com quem esteve entre 1985 e 1998.

Musa do pop-rocker americano Matthew Sweet, que já escolheu algumas vezes fotos antigas suas para ilustrar as capas de seus discos, Tuesday Weld é frequentemente mencionada em canções de artistas e bandas pop na mesma faixa de idade dela, como Steely Dan, Swan Dive e City Boy.



PEGGY LIPTON
August 30, 1946
New York City, NY

Quem estava vivo no início dos Anos 70, com certeza nunca esqueceu Peggy Lipton. Ela protagonizava "Mod Squad", uma das duas séries de TV que inauguraram aTV a cores no Brasil.  Peggy Lipton foi criada em uma família judaica de classe média alta. Seus pais eram Harold Lipton, um advogado corporativo, e Rita Benson, uma artista. Seus avós paternos eram judeus russos, e sua mãe nasceu em Dublin, Irlanda, de pais judeus que migraram da Europa Oriental. Peggy foi criada em Long Island com seus irmãos, e foi vítima de abuso sexual por seu tio ainda muito jovem, o que fez dela uma criança nervosa e retraída, com uma gagueira que a impedia de dizer seu próprio nome. Em 1964, mudou-se para Los Angeles e se tornou uma "hippie de Topanga Canyon", na época uma dos distritos mais descolados da cidade, envolvendo-se com meditação e ioga e se alimentando apenas de bolos de arroz e queijo cottage. Seu pai correu atrás de seus primeiros trabalhos como modelo, enquanto sua mãe a incentivou a ter aulas de atuação. E então, aos 16 anos, ela entrou para o time da Ford Models e desfrutou de uma carreira bem-sucedida, e aos 18 assinou um contrato com a Universal Studios, fazendo aparições nas séries de TV A Feiticeira,, Mr. Novak, The Alfred Hitchcock Hour, e The John Forsythe Show. Então, em 1968, ela foi convidada para interpretar Julie Barnes, uma bela hippie que estava à beira de uma vida de crime antes de ser recrutada como uma policial disfarçada, na série "The Mod Squad", que lhe rendeu quatro indicações para o Emmy  e outras quatro indicações para o Globo de Ouro (ganhou em 1970). Magra com cabelo longo liso e loiro acinzentado, vestida com mini-saias, calças flare e acessórios love beads, sua personagem se tornou um ícone da moda da época, e seu look foi copiado por inúmeras mulheres pelo mundo afora.
CURIOSIDADES

Peggy Lipton teve sucesso como cantora em alguns discos bem delicados para a Ode Records na virada dos Anos 60 para os 70.

Casou-se com o produtor, arranjador e band-leader Quincy Jones, com quem teve duas filhas lindíssimas: Kidada e Rashida. O casamento durou 15 anos, mas os dois permanecem muito próximos até hoje.

Em 1988, Peggy voltou a atuar, e ganhou atenção por seu desempenho como Norma Jennings série de David Lynch "Twin Peaks" (1990–1991), participando nos anos seguintes de outras produções como "Popular", "Alias" e "Crash".



Peggy Lipton publicou sua autobiografia "Breathing Out" em 2005, onde falou de seus romances com Paul McCartney, Terence Stamp e Keith Moon, e de sua luta contra o câncer em 2004.



"A BUNNY'S TALE", UMA BOFETADA DO PASSADO DE GLORIA STEINEM, 54 ANOS DEPOIS.



A pretexto do lançamento da autobiografia da jornalista feminista Gloria Steinem "Minha Vida Na Estrada" (Bertrand Brasil, 392 páginas, R$49,90), LEVA UM CASAQUINHO resgata o clássico texto em forma de diário com suas aventuras ao longo de quase dois meses como coelhinha de um Clube Playboy, conforme publicado na revista novaiorquina SHOW de Maio de 1963.



SEXTA-FEIRA, 25
25/01/1963

Passei a tarde inteira inventando uma história pessoal para Marie. Compartilhamos o mesmo apartamento, o mesmo telefone e as mesmas medidas. Embora ela seja quatro anos mais nova do que eu (eu já passei do limite de idade para ser Coelhinha), Marie e eu comemoramos nossos aniversários no mesmo dia e estudamos na mesma escola e na mesma faculdade. Mas ela não se deixou escravizar pelos estudos — não, não Marie. Depois de um ano ela me largou, me empurrando pelo caminho que me levaria a um bacharelado, e embarcou num vôo charter para a Europa. Ela não tinha um centavo, mas curtos períodos trabalhando como garçonete em Londres, como dançarina em Paris e secretária em Genebra foram o bastante para bancar seus verões de rata de praia e suas outras escapulidas. Ela voltou para Nova York no ano passado e trabalhou temporariamente como secretária. Três amigos em comum concordaram em dar fortes recomendações pessoais. Todos que a conhecem a adoram.

Amanhã é o grande dia. Marie sairá deste caderno pela primeira vez e entrará no mundo real. Estou de saída para comprar uma malha para ela.

SÁBADO, 26
26/01/1963

Hoje vesti as roupas mais teatrais que pude encontrar, enfiei a malha numa bolsinha e caminhei até o Playboy Club. E impossível não vê-lo. O discreto prédio de escritórios e a galeria de arte que ocupavam o local foram transformados num reluzente retângulo de vidro. O interior acarpetado de laranja é claramente visível, de fora, com uma moderníssima escadaria flutuante espiralando clube acima pelo centro. O efeito geral é alegre e surpreendente.

Atravessei em direção ao clube onde um homem de meia-idade, vestindo uniforme de guarda particular, sorriu e chamou:

– Pst, pst, pst, pst, Coelhinha… — Ele ergueu o dedão e apontou para a porta de vidro à esquerda. — As entrevistas são lá embaixo, no Playmate Bar.

O interior do clube estava iluminado com tal dramaticidade que levei alguns segundos para me dar conta de que estava fechado e vazio. Desci uma pequena escadaria e fui cumprimentada por uma tal Srta. Shay, uma mulher magra, de seus trinta anos, que encontrava-se atrás de uma escrivaninha no bar escuro.

— Coelhinha? —perguntou, asperamente. — Sente-se ali, preencha este formulário e tire o casaco. — Pude ver que duas das mesas já estavam ocupadas por outras garotas curvadas sobre o lápis. Olhei para elas com curiosidade. Eu chegara bem no meio do horário de entrevistas, esperando ver o maior número possível de candidatas, mas havia apenas três. — Tire o casaco — a Srta. Shay repetiu. Ela me examinou atentamente enquanto eu o fazia. Uma das garotas se levantou e caminhou até a escrivaninha, os saltos altos de acrílico estalando contra seus calcanhares, emitindo segurança e charme.

— Me diga uma coisa — ela disse. — Você vai querer as medidas com ou sem sutiã?

— Com — respondeu a Srta. Shay.

— Mas eu sou maior sem — a garota contrapôs.

— Está certo — disse a Srta. Shay, um tanto enfadada. — Sem.

Outras duas garotas desceram as escadas. Tinham uma aparência de frescor, não usavam maquiagem.

— Coelhinhas? — indagou a Srta. Shay.

— Não exatamente — disse uma, mas a outra pegou uma ficha. Os cabelos longos e os mocassins denunciavam o status de universitárias.

O formulário de solicitação de emprego era curto: endereço, telefone, medidas, idade e os três últimos empregos. Terminei de preenchê-lo e resolvi ganhar tempo lendo um prospecto intitulado SEJA COELHINHA DO PLAYBOY CLUB! O folheto continha, ern sua maioria, fotos: uma foto em grupo mostrava Coelhinhas “escolhidas de todos os cantos dos Estados Unidos” rodeando “o presidente do Playboy Club e editor da revista Playboy, Hugh M. Hefner”; um close de uma Coelhinha servindo um drinque a Tony Curtis “um devoto do Playboy Club que em breve estrelará um filme de Hugh M. Hefner intitulado, apropriadamente, Playboy”; duas Coelhinhas sorridentes ao lado de Hugh M. Hefner no “Playboy Show, exibido em cadeia nacional”; Coelhinhas distribuindo exemplares da revista Playboy num hospital para veteranos de guerra “em um dos inúmeros projetos comunitários dignos dos quais participam as Coelhinhas”; uma Coelhinha loura, de pé, diante de uma senhora de aparência maternal, a “Mamãe Coelha”, oferecendo “conselhos pessoais”; e na última página uma garota de biquíni, agachada no convés de um iate com a bandeira com o coelhinho da Playboy. O texto: “Quando você se tornar uma Coelhinha, seu mundo será alegre, divertido e sempre excitante”. Citava um salário médio de duzentos dólares por semana.

Mais uma garota desceu as escadas. Ela usava óculos de armação azul e um casaco muito menor do que ela. Eu a observei enquanto perguntava, nervosa, à Srta. Shay se o clube aceitava garotas de dezoito anos.

— É claro que sim — respondeu a Srta. Shay. — Só não podem trabalhar no turno da meia-noite.

Entregou uma ficha para a garota, olhou as pernas gorduchas e não pediu que tirasse o casaco. Mais duas garotas entraram no bar, uma vestindo legging rosa e a outra legging roxo.

— Nossa, esse lugar é um estouro — disse Rosa.

— Se achou isso aqui um estouro, devia ver a casa de Hugh Hefner em Chicago — disse Roxa. A Srta. Shay olhou para elas com aprovação.

— Não tenho telefone — disse Armação Azul com tristeza. — Posso dar o telefone do meu tio? Ele também mora no Brooklyn.

— Pode, então — disse a Srta. Shay. Ela pediu para que me aproximasse, indicou um local a uns três metros de sua escrivaninha e pediu para que ficasse ereta. Fiquei.

— Eu quero tanto ser coelhinha — disse Armação Azul. — Li a respeito disso numa revista, lá na escola.
A Srta. Shay me perguntou se eu realmente tinha 24 anos.

— Está muito velha — ela avisou. Disse a ela ter achado que passaria por um triz. Ela concordou com a cabeça.

— Meu tio passa o dia inteiro fora — disse a garota —, mas eu irei para a casa dele e passarei o dia inteiro ao lado do telefone.

— Faça isso então, querida — disse a Srta. Shay e virou-se para mim: – Tomei a liberdade de marcar uma hora para você na quarta- feira às seis e meia. Entre pela entrada de serviço e vá até o sexto andar. Procure a Srta. Burgess, a Mamãe Coelha. — Concordei e ela acrescentou: — Você tem certeza de que não se inscreveu antes? Uma outra Marie Ochs veio aqui ontem. Fiquei perplexa. Como poderia Marie ter escapado das páginas de meu caderno? Eu tive uma fantasia de trinta segundos baseada em Pigmalião. Ou será que havia uma outra Marie Ochs? Possível era, mas não provável. Decidi partir para a valentia.

— Que esquisito — murmurei. — Deve haver algum engano.

A Srta. Shay deu de ombros e sugeriu que eu trouxesse um maiô ou uma malha na quarta.

— Posso ligar para cá? — perguntou Armação Azul.

— Não faça isso, querida — disse a Srta. Shay. — Deixe que nós ligamos para você.

Deixei o clube preocupada com a expectativa de vida de Marie Ochs. Será que eles descobririam tudo? Será que eles já sabiam? Quando cheguei à metade do quarteirão, encontrei as duas universitárias. Estavam encostadas num prédio abraçando o próprio corpo, às gargalhadas. E de repente eu me senti bem melhor a respeito de tudo aquilo. Tudo, talvez, menos imaginar Armação Azul, em estado de alerta, sentada ao lado do telefone do tio.

QUARTA-FEIRA, DIA 30
30/01/1963

Cheguei ao clube, pontualmente, às seis e meia e os negócios pareciam estar a todo vapor. Os clientes faziam fila, na neve, para entrar e vários transeuntes encontravam-se do lado de fora, com o rosto colado na vidraça. O ascensorista, um porto-riquenho bonito com jeitão de Rodolfo Valentino, me enfiou no elevador com dois carregadores negros uniformizados, cinco clientes de meia-idade, duas Coelhinhas a caráter e uma matrona robusta vestindo vison. Paramos no sexto andar.

— É aqui que eu fico? — perguntou a matrona.

— É claro, amorzinho — disse o ascensorista. — Se quiser virar Coelhinha.

Risos.

Olhei ao meu redor. Iluminação suave e tapetes macios haviam sido substituídos por blocos de cimento sem pintura e lâmpadas penduradas dos bocais. Havia uma porta marcada OELHINHAS; dava para ver o contorno onde antes houvera um “C”. Um aviso, escrito à mão num pedaço de cartolina rasgada, dizia: BATAM!! Por favor, meninas. Dá para cooperar?!! Passei pela porta e entrei num corredor iluminado e cheio.

Duas garotas passaram por mim. Uma vestia apenas a calcinha de um biquíni e a outra vestia meias arrastão de trama delicada e saltos altos lilás. Ambas entraram correndo na sala de figurinos à minha direita, berraram seus nomes, pegaram seus uniformes e voltaram correndo. Perguntei à responsável pela Srta. Burgess.

— Querida, acabamos de lhe entregar um presente de despedida.

Outras quatro garotas saltitaram sala adentro pedindo suas fantasias, golas, punhos e rabinhos. Vestiam meias-calças e salto alto e nada da cintura para cima. Uma delas parou para examinar o quadro no qual havia uma lista de “Coelhinha da Semana”.

Dirigi-me à outra extremidade do corredor. Dava para um camarim enorme cheio de armários de metal e diversas fileiras de mesas. Havia bilhetes colados aos espelhos (“Alguém quer trabalhar no Nível B no sábado?” e “Vou dar um festão na quarta em Washington Square, todas as Coelhinhas serão bem-vindas”). Havia cosméticos espalhados pelas bancadas e três garotas sentavam-se lado a lado colocando cílios postiços com uma concentração de iogue. Parecia uma caricatura do camarim de artistas de teatro de revista.

Uma garota de cabelos muito ruivos, pele muito branca e uma fantasia de Coelhinha de cetim preto deu as costas para mim e aguardou. Entendi que queria que eu puxasse seu zíper, uma tarefa que levou vários minutos de puxa e estica. Era uma garota grandalhona, de aparência um tanto rude, mas a voz que me agradeceu era pequenininha como a de uma criança. Judy Holliday não poderia ter feito melhor. Perguntei a ela a respeito da Srta. Burgess.

— Sei. Ela está no escritório — disse Vozinha de Bebê indicando uma porta de madeira com uma portinhola de vidro. — Só que a nova Mamãe Coelha é Sheralee.

Através do vidro pude ver duas garotas, uma loura e uma morena. Ambas pareciam ter vinte e poucos anos e não eram nada parecidas com a matrona do prospecto. Vozinha de Bebê puxou e esticou mais um pouco.

—Este uniforme não é o meu — explicou. — É por isso que está difícil de colocá-lo. — Ela se afastou estalando os dedos e cantarolando baixinho.

A morena saiu do escritório e se apresentou como a Mamãe Coelha, Sheralee. Eu disse que a confundira com uma Coelhinha.

— Cheguei a trabalhar para o clube quando inaugurou no mês passado — disse. — Mas agora vou substituir a Srta. Burgess. — Ela indicou a loura que experimentava um conjunto bege de três peças, provavelmente seu presente de despedida. — Terá de aguardar um instante, querida.

Eu me sentei.

Às sete eu já tinha assistido a três meninas eriçarem os cabelos até parecerem algodão doce e outras quatro encherem o sutiã com lenços de papel. Até às 19:15, eu já havia conversado com outras duas candidatas a Coelhinha, uma bailarina e uma modelo de meio expediente do Texas. Às 19:30 testemunhei a maior crise da vida de uma Coelhinha que enviara a fantasia para a lavanderia com a aliança de noivado presa com um alfinete pelo lado de dentro. Às 19:40 a Srta. Shay subiu para avisar que “Não há mais ninguém além de Marie”. Às oito eu estava certa de que ela esperava pelo gerente do clube para que ele dissesse que haviam descoberto minha verdadeira identidade. Às 20:15 finalmente fui chamada e estava nervosa além da conta.

Esperei enquanto Sheralee olhava minha ficha.

— Você não tem cara de 24 anos.

Bem, acabou por aqui, pensei.

— Parece bem mais jovem.

Sorri, incrédula. Ela tirou diversas polaróides de mim.

— É para os arquivos — explicou. Ofereci a história que eu criara é datilografara com tanto esmero mas ela a devolveu sem nem olhar.

— Não gostamos que nossas garotas tenham histórias — ela disse com firmeza. — Só queremos que você se adeque à imagem da Coelhinha. — Ela me mandou para a sala de figurinos.

Perguntei se devia vestir a malha.

-— Não perca tempo com isso — disse Sheralee. — Queremos ver a imagem da Coelhinha.

A chefe de guarda-roupa mandou que eu me despisse e começou a procurar um uniforme do meu tamanho. Uma garota entrou às pressas com uma fantasia nas mãos, berrando por ela como um soldado ferido talvez pedisse auxílio médico.

— Estourei o zíper — ela chorava. — Espirrei!

— E a terceira vez esta semana — disse a chefe de guarda-roupas.

— Parece até epidemia.

A garota se desculpou, encontrou outra fantasia e saiu.

Perguntei se um espirro realmente podia romper uma fantasia.

— E claro que sim — ela assegurou. — Garotas resfriadas normalmente precisam ser substituídas.

Ela me deu um uniforme de cetim azul. Estava tão apertado que o zíper prendeu na minha pele quando ela foi fechá-lo. Ela me mandou segurar a respiração enquanto tentava outra vez. Após conseguir deu um passo atrás para me examinar com olhos críticos. A fantasia era tão cavada que expunha meu quadril, assim como dez centímetros de bumbum branco. As barbatanas da cintura teriam feito Scarlett O’Hara desmaiar e a estrutura como um todo fora desenhada para puxar todas as carnes do corpo na direção dos seios. Eu estava certa de que seria perigosíssimo me abaixar.

— Nada mal — declarou a chefe de guarda-roupa e pôs-se a enfiar um imenso saco plástico na parte de cima da fantasia. Colocou uma faixa com orelhinhas de coelha em torno de minha cabeça e um semicírculo de material macio preso com um gancho no local mais arrebitado da parte traseira da fantasia. — Muito bem, querida. Agora coloque os saltos e vá mostrar a Sheralee. Olhei no espelho e a imagem da Coelhinha olhou para mim.

— Você está uma graça — disse Sheralee. — Encoste naquela parede e sorria bem bonito para ver o passarinho.—Ela tirou várias outras fotos com a polaróide.

A ruiva com voz de bebê entrou para avisar que ainda não encontrara uma fantasia que coubesse. Uma minúscula lourinha vestindo cetim lilás tirou o rabinho e se empoleirou na mesa.

— Olha — começou — , não ligo para os deméritos, já recebi cinco. Mas eu não ganho pontos por trabalhar horas extras? Sheralee pareceu desconcertada e dirigiu-se a Voz de Bebê:

— As garotas novas acham que as garotas de Chicago recebem tratamento especial e as mais antigas não treinam as novas.

—Deixa que eu treino estas pestinhas — disse Voz de Bebê. Mas me arruma uma fantasia.

Eu me vesti e esperei. E prestei atenção:

— Ele me deu trinta pratas e eu só fiz comprar cigarros para ele.

— Abaixa aí, meu docinho, e se enfia nesta fantasia.

— Ah, sei lá. Acho que ele fabrica Leite de Magnésia ou coisa parecida.

— Você sabia que tem gente que comete suicídio com estes sacos plásticos?

— Aí o babaca pede Cortinas de Renda. Alguém lá já ouviu falar em Cortinas de Renda?

— Eu disse a ele que nossos rabos eram de asbesto e ele quis queimar o meu para ver se era verdade.

— Semana passada ganhei trinta pratas de gorjeta. Grande coisa.

Sheralee me chamou de volta ao escritório.

— Então você quer ser Coelhinha — ela disse.

— Oh, sim. Gostaria muito — respondi.

— Bem… — Ela fez uma pausa significativa. — Nós também queremos que seja!

Fiquei perplexa. Não haveria mais entrevistas? Investigações?

— Chegue amanhã às três. Vamos tirar as medidas e pedir para que assine algumas coisas. — Eu sorri e senti uma exultação tola.

Descendo as escadas e subindo Fifth Avenue. Saltitante eu vou, sou uma Coelhinha!

QUINTA-FEIRA, DIA 31
31/01/1963

Agora tenho duas fantasias de Coelhinha: uma de cetim laranja e outra azul-rei. A escolha de cores e a qualidade do cetim são quase as mesmas dos catálogos de material esportivo. Os corpinhos das fantasias, pré-cortados para caber em corpos e seios de tamanhos variados, são experimentados na mesma hora. Aguardei, de pé, no piso de cimento, com os pés descalços e uma calcinha de biquíni. A chefe de guarda-roupa me deu um tapetinho de banheiro.

— Não dá para deixar uma Coelhinha novinha em folha pegar gripe — foi o que disse. Perguntei se ela poderia seguir a linha do meu biquíni; a fantasia que eu experimentara no dia anterior era mais cavada do que qualquer uma que eu vira em fotografias. Ela riu. — Olha, querida, se você acha que aquela estava cavada, devia ver umas que usam por aqui.

A fantasia foi aparada e apertada até estar com cinco centímetros a menos do que minhas medidas em todos os locais, menos no busto.

— Aqui você vai precisar de espaço para enchimento. Quase todo mundo enche. E é aqui que você guarda as gorjetas. Chamam de “caixa forte”.

Uma garota de cabelos negros e muito pó-de-arroz, vestindo uma fantasia verde, parou à porta.

— Meu rabinho está caído — ela disse, arrumando-o com um dedo. — Esses malditos clientes não param de puxar.

A chefe de guarda-roupa entregou-lhe um alfinete de fralda.

— E melhor arrumar um rabinho mais limpinho do que este, meu anjo. Vai arrumar um demérito se andar por aí com um rabinho maltrapilho destes.

Outras garotas apareceram pedindo fantasias, marcando o nome num caderninho preso ao balcão. Descobri que não era permitido sair do prédio com a fantasia e que cada uma pagava dois dólares e meio pela manutenção e lavagem da mesma. As Coelhinhas também pagavam cinco dólares por um par de meias-calças pretas e podiam receber deméritos se usassem meias rasgadas. A chefe de guarda-roupa me deu amostras de ambas as fantasias e me disse para mandar pintar os sapatos para que combinassem com a roupa. Perguntei se o clube pagava a pintura dos sapatos.

— Você enlouqueceu, meu bem? Esse lugar não dá dinheiro para nada. E certifique-se de que são saltos dez. Vai arrumar um demérito se usar mais baixos.

Eu me vesti e fui ver a Mamãe Coelha. Sheralee estava sentada à escrivaninha. Com os longos cabelos presos, parecia ter dezoito anos. Ela me entregou um formulário rosa-choque no qual estava escrito “Solicitação para Coelhinhas” e uma maletinha de plástico marrom com a miniatura de uma garota nua e THE PLAYBOY CLUB escrito em laranja.

— Esta é a bíblia da Coelhinha — ela me disse muito séria. — Quero que me prometa que vai passar o fim de semana inteiro estudando-a.

O formulário tinha quatro páginas. Eu já inventara grande parte das respostas para a minha biografia mas algumas das perguntas eram novas. Eu estava saindo com algum cliente do clube, se estivesse, qual o nome dele? Nenhum. Pretende sair com algum cliente? Não. Tem ficha na polícia? Não. Deixei o espaço destinado ao número de seguridade social em branco.

Subi um lance de escadas e entreguei o formulário à Srta. Shay. A sala de chão de cimento estava pontilhada de escrivaninhas. Mas a da Srta. Shay, como diretora de pessoal, ficava num canto. Ela vasculhou o formulário e tirou mais polaróides de mim.

— Traga o cartão de seguridade social amanhã, sem falta.

Eu me perguntei o que fazer sobre o fato de Marie Ochs não possuir um. Um homem atarracado de terno azul, camisa preta e gravata branca fez um gesto na direção de uma garota gorducha que se encontrava logo atrás dele.

— O Sr. Roma disse que eu a trouxesse aqui e eu ficarei muito grato por qualquer coisa que puder fazer por ela—ele disse, piscando.

— Em casos de extrema recomendação pessoal — disse a Srta. Shay com enorme indiferença. — Nós fazemos a entrevista imediatamente.

— Ela fez sinal para Sheralee que levou a garota para baixo.O homem pareceu aliviado.

Uma ruiva, acompanhada de dois homens, se aproximou mas a Srta. Shay pediu-lhes que aguardassem. O mais jovem deu um soquinho brincalhão no queixo da ruiva e sorriu.

— Você não tem com o que se preocupar, benzinho. — Ela o olhou com desdém e acendeu um cigarro.

Assinei um formulário de imposto de renda, vale refeição, um recibo referente aos vales, um formulário de solicitação de emprego, um outro de seguro e uma autorização para a divulgação de fotografias para qualquer finalidade — publicidade, editorial ou outra — que escolhesse a Playboy Clubs International. Um jovem em mangas de camisa, com aparência bastante apressada, entrou para dizer à Srta. Shay que os dois homens que trabalhavam no porão iam pedir demissão. Eles haviam esperado receber 75 dólares por seis dias de trabalho e iam trabalhar apenas cinco por sessenta. Estavam descontentes e tinham famílias para sustentar.

-Não posso mudar coisa alguma — ela disse, secamente. — Eu me limito a pôr em prática as decisões do Sr. Roma.

A Srta. Shay grampeou duas fotos polaróides à minha solicitação de emprego e entregou-me os meus horários.

— Amanhã, irá ao Larry Matthews para lhe auxiliarem com a maquiagem. Este fim de semana é para estudar a bíblia da Coelhinha e marquei um horário na segunda para você fazer um exame médico.— Ela chegou para frente e disse em tom de confidência:—Um exame completo. Segunda-feira é o dia da palestra da Mamãe Coelha e do Papai Coelho. Terça-feira é dia de Escola de Coelhinhas e quarta você treinará no próprio bar.

Eu perguntei se a consulta podia ser feita com meu próprio médico.

— Não. Você precisa ir ao nosso médico para um exame especial. É obrigatório para todas as Coelhinhas.

A Srta. Shay me mandou assinar um último formulário, uma requisição para que uma cópia do registro do nascimento de Marie Ochs fosse enviada para o Playboy Club. Eu o assinei, esperando que o estado do Michigan demorasse um pouco para descobrir que Marie Ochs não existia.

— Enquanto isso, vou precisar ver sua certidão de nascimento. Não podemos permitir que trabalhe sem que a vejamos. Concordei em enviar uma carta urgente para casa para que a enviassem.

É claro que não me permitiriam servir bebidas alcoólicas ou trabalhar à noite sem provar que era maior. Por que não pensei nisso antes? Bem, o futuro de Marie talvez fosse curto mas talvez ela conseguisse ao menos terminar a Escola de Coelhinhas.




TERÇA, DIA 12
12/02/1963

Duas das minhas colegas da Escola da Coelhinha, Gloria e a assistente de mágico, juntaram-se a nós na Sala de Almoço. Peguei-me explicando como servir o rosbife e como convencer os clientes de que estava malpassado, bem-passado ou ao ponto, embora estivessem todos, na verdade, idênticos.

Era dia do aniversário de Abraham Lincoln e o movimento estava fraco. Ouvi a Coelhinha sem enchimento explicar que gostava de homens mais velhos porque “eles te dão dinheiro”.

— Saí uma vez com um velho que conheci no clube e arrumei mais duas Coelhinhas para os amigos dele. Sabe que ele me deu um cheque de cem dólares só porque foi com a minha cara?

A Coelhinha sem enchimento explicou também que um dos executivos da casa lhe havia dado setecentos dólares para comprar um vestido.

— Eu tinha quinhentos dólares e comprei um vestido de 1.200 -e ele me levou a uma festa vestindo o tal vestido.

Uma Coelhinha de cabelos escuros disse que conhecia o mesmo cara de Chicago.

— Você e todo mundo — disse a Coelhinha sem enchimento.

— Se você fosse contar todas as Coelhinhas que saíram com o cara…

A Coelhinha de cabelos escuros estava pensativa.

— Nós tivemos um caso muito louco durante três semanas. Foi loucura mesmo. Eu deveria saber que não ia dar em nada…

— Todas as garotas acham que vai dar em alguma coisa — disse a Coelhinha sem enchimento em tom de consolo. — Mas nunca dá.

— Conversaram sobre o apartamento imenso do executivo, sobre sua fortuna e impulsos românticos. Ele me pareceu um exterminador.

Sem Enchimento se levantou para servir um cliente e a Coelhinha de cabelos escuros olhou para ela com desdém.

— Duvido que ele tenha dado setecentos dólares para ela – declarou com firmeza. — Ninguém arranca um centavo dele.

QUARTA, DIA 13
13/02/1963

Completei a lista de enchimentos de decotes:

1. Lenços de papel
2. Sacos plásticos
3. Algodão
4. Rabos de Coelhinhas
5. Espuma
6. Lã de carneiro
7. Absorventes íntimos cortados ao meio
8. Lenços de seda
9. Meias de ginástica

Descobri também que não só podemos sair com clientes Número Um como com qualquer um a quem estes nos apresentem. Podemos sair também com quem quer que conheçamos nas festas de Vic Lownes. Mas, no entanto, há limites para esta pesquisa.

SEXTA, DIA 15
15/02/1963

A Sala de Almoço estava cheia de homens bebendo sem parar porque é sexta-feira. Carreguei pratos de rosbife e a alternativa especial de sexta-feira: truta. Coelhinha Gloria estava de pé, com uma bandeja cheia de xícaras esperando que a cafeteira fosse enchida.

— Sabe o que nós somos? — perguntou, indignada. — Garçonetesl

Sugeri que nos juntássemos ao sindicato.

— Sindicatos só servem para tirar o seu dinheiro e não deixar que você trabalhe dois turnos — disse Vozinha de Bebê.

A assistente de mágico estava servindo uma mesa ao lado da minha e concordava, sinceramente, com um cliente que dizia que nossas fantasias eram “tão inteligentes e realçam tão bem as formas femininas”. Ela tentava tanto fazer as coisas com “graça”, como mandava a bíblia, que não era nada eficiente como garçonete. Ao nos programar com o que era, nas palavras de uma outra Coelhinha, “um glamourzinho de merda”, o clube muitas vezes se prejudicava.

Foi meu último dia de almoços e isso me deixava muito contente. De alguma forma, os puxões nos rabinhos, as cantadas, os beliscões e os olhos esbugalhados eram bem mais deprimentes quando o sol brilhava além das paredes daquela sala sem janelas.

Encontrei Sheralee em seu escritório e contei a ela a história que eu escolhera porque deixava as portas abertas caso eu precisasse de mais informações: minha mãe estava doente e eu precisava passar algum tempo em casa.

— Justo agora que estamos com uma falta enorme de Coelhinhas! —ela exclamou, consternada, e perguntou quando eu estaria de volta.

Eu disse que não sabia, mas que ligaria. Ela me entregou o salário da primeira semana: 35,90 dólares pelas duas noites na Sala de Estar. Perguntei a respeito da primeira noite na chapelaria.

— O treinamento não é remunerado — ela disse. Protestei que não fora treinamento. — Vou falar com o contador — concordou, sem muita convicção.

QUINTA, DIA 21
21/02/1963

Quase uma semana se passou. Liguei para Sheralee para dizer que voltara para buscar algumas roupas mas que precisava pedir demissão. Ela me implorou para trabalhar no bar mais uma noite. Por algum motivo (será que eu aprenderia alguma coisa nova?) eu me peguei aceitando.

SEXTA, DIA 22
22/02/1963

Mas foi exatamente a mesma coisa:

CHEFE DE SETOR: “AS suas mesas são aquelas: quatro de quatro e três de dois”.
CLIENTE: “Se você é minha Coelhinha, posso levá-la para casa?”
BARMAN: “Eles não param de mudar o tamanho das doses: sobe, desce, desce e sobe. É de enlouquecer”.
COELHINHA: “Trabalhei na festa.privé da LoLo Cola e ganhei seis latas de brinde. Grande coisa”.
CLIENTE: “Estou no Hotel New Yorker. Quarto 625. Você vai lembrar?”
HOMEM: “Se mocinhas fossem grama, o que seriam os mocinhos?”
COELHINHA: “Deixa eu ver… Cortadores de grama?”
HOMEM: “Não. Gafanhotos!”

Aviso na parede da despensa:
ESTE É O SEU LAR. NÃO JOGUE BORRA DE CAFÉ NA PIA.

SERVENTE: “Tem dinheiro saindo pelos lados da sua fantasia, meu anjo”,
COELHINHA: “Ele é mesmo um cavalheiro. Trata você bem, quer tenha dormido com ele ou não”.

Eram quatro da manhã quando entrei na Sala da Coelhinha para tirar a fantasia. Uma loura bonita juntava duas cadeiras para dormir. Ela prometera substituir outra garota no almoço, depois de oito horas no bar, e não teria tempo de ir até em casa. Perguntei por que ela fazia uma coisa dessas.

— Bem, a grana não é ruim. Ganhei duzentos dólares na semana passada.

Finalmente eu encontrara alguém que ganhava o mínimo do salário prometido. Mas para isso ela trabalhava sem parar.

No escritório de Sheralee havia um quadro com uma lista das cidades onde seriam inaugurados os próximos clubes (Pittsburgh, Boston, Dallas e Washington) e um papel amarelo intitulado O QUE É UMA COELHINHA?

“Uma Coelhinha do clube”, dizia o texto, “assim como a Coelhinha da revista é… linda, atraente… Nós faremos o que estiver em nosso poder para transformar você, Coelhinha, na garota mais invejada da América por trabalhar no lugar mais glamouroso e excitante do mundo.”

Entreguei minha fantasia pela última vez.


— Tchauzinho, querida — despediu-se a loura. — Te vejo nos quadrinhos.