Saturday, December 29, 2018

A ENTIDADE PROTETORA DO REVEILLON (por Marcelo Rayel Correggiari)


Pois é, caro(a) freguês: mais um ano que chega ao fim.
Na certeza de que, em questão de dias, horas, minutos, começará a segunda temporada de 2018.
Não nos iludamos: 2019 tem tudo para ser uma repetição desse “tudo o que sempre foi”, “o mais da mesma coisa”, disco de vinil arranhado e ruim de escutar. Precisar-se-ia de muita paciência e boa vontade para acreditar que “... daqui ‘pra’ frente/tuuudo vai ser difereeente...”.
O ser humano, ultimamente, anda a se tornar um bichinho bem previsível e quase nada criativo. Chegou a hora de darmos ‘adeus’ para aquelas ‘supresas boas’, notáveis, que faziam nossas vidas ainda valerem a pena.
Uma espécie de ‘canção de despedida’ para “... os felizes acidentes”.
Cálculo fácil de fazer: como gostaríamos que aquelas pessoas que amamos, pais, mães, filhos, grandes amigos, estivessem, em questão de dias, horas, minutos, junto com a gente no “deeeeez, noooooove, ooooooito, seeeeete...”.
Muita gente amada e querida ficou pelo caminho.
Selos fechados, e somente o Senhor, ou a entidade máxima pertinente à crença do querido(a) freguês(a), é capaz para qual prato a balança penderá.
Duro! Ficamos sem essas pessoas.
Na tentativa de continuar, apesar da enorme tristeza dessas ausências, tentamos olhar o réveillon como um momento festivo na tal “... renovação da esperança...” de que nossos próprios desaparecimentos ainda demorem um pouquinho mais para acontecer.
E um fluxo monumentalmente caudaloso de saudade.
Convenhamos, réveillon pode ser uma festinha bem do cão, mesmo. São inúmeras famílias que relatam perdas de entes queridos ao longo da virada do ano em situações e acidentes bem trágicos.
Muita droga, cabeça feita, ‘chapando o coco’ com bebida e substâncias, “... ‘vamu ficá’ doidaço!”. Acidentes automobilísticos, comas, overdoses, cortes, tombos, afogamentos: a lista que resulta em perdas inestimáveis é gigantesca.
“A morte é parte da vida”... ‘Humm... OK!’. Mas há situações que não precisariam chegar onde chegam. Com alguma prudência, a diversão é garantida e todos voltam para casa.
Em termos proporcionais, claro que as fatalidades do réveillon constituem a minoria. Chato?! Triste?! Sim, mas a minoria.
É como se existisse uma ‘mão invisível’ de uma entidade protetora universal guardando mesmo aqueles(as) que se excedem (sabe-se lá o porquê) na tal ‘virada de ano’.
Dizem as más línguas que ‘cu de bêbado não tem dono’, e há uma questão “sobre-o-natural” que talvez ampare essa afirmação.
Reza certa recente lenda que no famigerado bairro do Aparecida, ditoso operador do judiciário foi alvo dessa ‘bença’ proveniente da entidade universal protetora de bebuns, réveillon e bebuns no réveillon.
Após longa ingestão de álcool com amigo de ex-profissão, o sujeito chegou em casa ‘miando’. Após extensa manobra para entrar no elevador, acertar o andar e sair do dispositivo, achou-se certo de não portar as chaves do apê.
Que engano!
Entre o desespero de entrar em casa para uma cama quentinha e sem lembrança de que as tais chaves estavam na sacolinha que carregava, sentou-se no corredor do prédio para sacar do celular. Viva o WhatsApp! Foram quatro mensagens para sua mulher, que dormia dentro do apartamento do casal. Contatos bem curtos, nada desse negócio de textão, com intervalos de quase 20 minutos entre cada um.
Um canto desesperado de “... amor, abre a porta que eu cheguei...”.
“... amor, você ‘tá’ aí dentro...?!”.
O peso da biritagem o empurrava para os braços de Morpheu. A impressão que se tinha é de ele, junto com o amigo, tinha bebido ‘... até a gravata do garçom’. No rincões do Brasil, diz-se “lambeu até a rolha”.
“... amor, abre a porta...”.
A digníssima, lá pelas três da manhã, estranhou a ausência do cônjuge. Olhou para um lado, para o outro... passou a mão no telefone e nada de uma ligaçãozinha sequer para dar o ar da graça. ‘Estranho’, pensou, diante da promessa horas antes de chegar em casa em tempo hábil.
Abriu o ‘uáifái’, e as quatro mensagens do queridíssimo pulularam na tela do telefone. Ainda com a ‘roupa-de-baixo’, abriu a porta do apê e a cena encontrada era digna de uma série dessas de CSI.
Dava para passar o giz em torno do corpo estendido no chão. “Acorda, bem...”. “Huuuummm...”. “Acorda, acorda... entra!”. “Huuuummm...”. “Acorda, filho da mãe! Não vou ficar aqui a noite toda”. “Huuuummm...”. “Olha, não vou ficar te pajeando a noite inteira. Levanto daqui a pouco ‘pra’ trabalhar, já esqueceu?!?”.
Para tentar resumir toda a ópera-bufa, o camarada entrou engatinhando em casa. Quando namorou a tendência de partir para a esquerda, a porta do quarto, ouviu da mulher:
“Na-na, na-na, na-na!!! Segue reto... segue reto! Fica aí na sala e dorme no sofá!”.
Segundo o “... o boletim de ocorrência...” fornecido pela cônjuge, só por milagre o ditoso não perdeu os pertences: o telefone jazia há meio-metro de distância do corpo cultivado no álcool, e a bolsinha com a chave dentro estava sobre o capacho da porta.
Ah, essa entidade universal protetora dos embriagados e dos réveillons!
Que essa proteção esteja com absolutamente todos e todas em mais um giro do calendário que, em breve se inicia.
Feliz segunda-temporada de 2018 a todos(as)!
Tá bom! Tá bom! Que o próximo ano seja de grandes conquistas, realizações, paz, saúde (principalmente!), prosperidade (vem ‘ni mim’, criatura!), harmonia e um montão de coisas boas para tudo e para todos(as)!
Feliz 2019!



Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 47 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É autor de Areias Lunares
(à venda na Disqueria,
Av. Conselheiro Nébias
quase esquina com o Oceano Atlântico)
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO


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