Wednesday, April 11, 2018

MANUAL DO ATOR PENSANTE PARTE 3 (por Flávio Viegas Amoreira)


‘’ SEIS PERSONAGENS À PROCURA DE UM AUTOR.’’ – PIRANDELLLO.
Santos, 07 de maio de 2.003.

‘’ aplicabilidade, - do método.
‘making-off’ – da carpintaria’’

‘’ William Blake aplicado à dramaturgia;
Corpo e Alma, Arte e biografia, unidade pós-moderna do real e simulacro.’’

-         fractal – estrutura geométrica complexa cujas propriedades, em geral , repetem-se em qualquer escala.  Diritambo - primitivamente
-         canto de louvor ao deus grego Dioniso.
-         ( o Baco dos romanos ).
-         composição poética sem estrofes regulares quanto ao número, de versos e pés. Diritambos.’’

Santos, 09 de maio de 2.003.

‘’ A palavra, Tom , a palavra mesmo que excede seu elemento, - transcende, - se redefine.
-         Comecemos a leitura: seu processo e gestação,
-         ( em cabines pouco maior que um quarto ),
-         ambientação imaginária, o texto ao leitor atento e ali! (aponta) a dupla contracena quase silenciosamente. Vamos! ( mão em riste )
-         leiam em conjunto uníssono.’’

[ ambientação : composição de clima adequado(...) cena literária ].
-         desenformado – retirado da forma (Ô) desmoldado. Adjetivo : ‘desenformado’.
Palavras desenformadas. Midiático / mediático.
Ametria – ausência ou anomalia de medida; desordem. ( trompetes / trumpetes );- nexo entre
o aleatório; - a palavra é um passo bem / mal dado: corre estrada.
‘’ achei o método! rever pontualmente o calhamaço, reter erros na seleção; estrutura básica conceitual; ‘metodológica’. Poesia aplicada ao palco! Insights ambulantes, deambulantes! Poesia cotidiana; dobrar a lírica melancolia. ‘O MÉTODO’; fixar um ponto: desdobram-se artifícios, o nexo causal se impõe---
----- subjetivo é tudo! ‘’
---- do método: em transe / trânsito; verdade se estabelece, consolida, na contundência do poético ( ‘o fazer ofício’ ),- ‘práxis’ literária.
‘separa o poema da prosa: extorquindo o romance, - torná-lo refém do conceito : desestrutura as formas e fluem interagindo --
‘poetizar a prosa dramatúrgica’; da ‘peça em prosa’,- poesia intrínseca.

‘’Nota , Tom, teu canto de estudo e reflete a variedade, o que concerne à permanência, a solidificação no punho de um brado: poetizar!
Abstrair do vasto ou preciso conteúdo. Tom, ao cabo de tudo ,na ponta se fixa a Poesia contida.’’

Santos, 10 de maio de 2.003.

‘’ Parece tanto Arte quanto confissão . Cedemos a deixa, - ator canhoto esmera no efeito preciso em lado oposto. ‘’

[ ‘’Deus é o eterno confidente nessa tragédia de que cada um é o herói.’’ Baudelaire.]

‘’ confissão, Tom , ou técnica de lembrança: sentir mais de novo. Trilharemos outra vez o caminho de retorno: representamos o preenchimento desse hiato repetido: nascimento e morte. Tom, lê muito os que amaram! Montaigne amou um amigo, Wilde um amante,
Pessoa o desejo de ambos juntos. Trilogia de leitura: retórica dos ensaios, exaltação do apego, dramatização do desamparo.’’

[ ‘’ Só te verei um dia e já na eternidade? Bem longe, tarde, além, jamais provavelmente. Não sabes aonde vou, eu não sei aonde vais, Tu que eu teria amado ---- e o sabia demais.’’ Baudelaire.]

‘’ poetizar , como dizia, abstrair : leite de pedra; o romance menos linear possível , seja até o grau do entendimento.’’
[ A BIBLIOTECA ].
‘’ Tom, - a literatura não tem ordem cronológica, é indivisível por suportes ou narrativas, - sente isso como essa rebentação infreme? Fluxo ordenado, isso é nota de cartório ou obituário;- literatura sem Tempo numerado / o Tempo da literatura é de espera e arranque. Batente, chuva na calha. A literatura por mais ordinária inspira o que sobrevêem de melhor à ela: ato, soneto, enredo, entrecho... trama tosca / estereotipada: transporta isso ao exagero ou reduz em Essência; (des) – tensiona - refaz. ‘Limar’, diria Borges sobre ajuste ao imaginário, o esboço.’’

Santos, 10 de maio de 2.003.

-dizer para o encantamento : espiralada frase correspondia / ‘tropo’
       cidadania podia ser concedida por decreto dos
       atenienses; cidadão por nascimento ou por adoção, impunha-se o registro do mesmo nas
       circunscrições que constituíam a cidade-estado: demos, trítias e tribos.
       Classe censitárias
       (experiência histórica); Grécia insular.
       Poeta – experimento; metecos ( os que habitam com) eram os estrangeiros domiciliados em Atenas.
       coloquializar, do autor autodidata; o escritor pleno, absoluto: diálogo ator-escritor.
       @ ‘há espécies de pensadores e artistas; o autodidata é a mais terrivelmente dura posição independente de sustentar.’
       @ arte-final / arte e finalidade. Reparos, polimento, a lima de Borges.
       ‘’ as duas partes de Henrique IV são plenas de imagens que refletem a preocupação de Shakespeare com a construção’’
       [ ‘a estrutura e imensa fundação da terra].
       ‘’ como alguém que desenha o modelo de uma casa.’’ -[Não fazer poesia como produto acabado, mas trocá-la por estruturas pré-existentes / expondo a fio seus afazeres / laçando sua dor----------- traçando
       definida. O poema / método: tecer os fios dos
       desdobramentos / relêr os esboços sem importância cronológica estreita / flexibilizar os traços / distender as imagens do poema.]
       Santos, 13 de maio de 2.003.

       29 de maio/ 2.003.
       ‘’Manual do Ator Pensante.’’
       - dialogação: princípio pressuposto do texto.
       ‘peça em prosa’, definição aproximada do Diálogo.
      ‘commedia dell”arte, uma forma teatral do gênero ‘comédia pastelão’, com personagens
       tradicionais (Arlequim, Colombina, Pierrô, Pantaleão) e falas improvisadas pelos intérpretes no palco.
       ‘’A épica e o burlesco,- estudemos a apresentação das Formas. Burlesco como apropriação prosaica da comédia cósmica:
       aurora boreal, no translúcido desse copo azul
       de vinho. Burlesco : Tom te apresento o teatro de bolso, nas paredes escrevinho, realço a luz de retinir do plástico. Brilho saído das cópias
       mal-feitas de Campanella: toldaram a vista de
       fulgor sintético, mandando longe a luz dos rios.
       Mataram os rios quando eles mesmo entram nas tuas cidades.   A trama foi morta como o Rio. Esquecemos que somos atuantes títeres de
       infindável trama? Mutante cenário de poeira
       que se molda e toca ao contato? Salvemos o Rio, Tom, é o princípio para caminho longo.’’
       ‘’Tom , ainda será possível catarse?’’
        O que comove ainda? Onde lançam dardos os condutores da Alma? Toda cena é deformação
       perene de mau esboço.’’
       Santos, 31 de maio de 2.003.

[ o manual a partir de Barthes, Jakobson, Stalinavsky.]

Pauline Kael: ‘’ Esta é nova imagem do cinema americano, mostrando o jovem como um animal belo e conturbado, tão cheio de amor e indefeso.
Talvez o pai não o ame, mas a câmera, em compensação, o adora! A câmera oferece ao público um produto tão irresistível, exigindo desse mesmo público exclamações tipo --- Olhe que desespero bonito.!’’ Pauline Kael.
Sobre James Dean, o rosto de ator, o impulso.
Adorno, - o ator pós-moderno.
-         ‘’ A interpretação ainda é necessária , Tom?
-         Até que ponto...? Tom, quem serão os atores?
-         O que será ser? Tom...’’

Santos, 03 de maio de 2.003.
‘’a locução, o vocativo, o enunciado construído ao ser dito / re-‘dizido’; o poema na narrativa ou tragédia se empresta de boca-em-boca   : numa se redime dos excessos e deficiências: Tom!
Molda a frase, mas lembra que antes de ti ela já não foi tua! Não pertencimento é a regra! Toma emprestado como doença de que se cura com purgante! Toma retendo sem lamúria, nem ‘desdizeres’.’’
[ a sopeira dispõem-se sem gênero , irreflexiva, “‘existente ‘ na ‘ocorrência’]. ‘formalista’ ou ‘conteudista’ , aprecio que leia Jakobson e o mestre Constantin; perdoa-se mais autor sem erudição que ator nada lido ou perscrutador! Tom, guarda a aura, não te expõem muito além das milhas do palco! Os meios de apresentação variegados fazem-te perder Alma!
O vôo, o baile, a foto em mau recinto, a revelação definitiva de amor  : deixa- te ator quando assim te apresenta. Liuba ou um Montéquio de pileque causa menos dano que a perda do fausto no prazer mundano. Um ator deve ser só por convicção ou por verdadeiro sofrimento. Casar?
Isso é para os principiantes religiosos? A representação bem feita e observada só tem paralelo à física quântica em valência e incerteza!
Nada mais verdadeiro que teu fingimento, portanto finge necessário ou sem mais acompanhamento...’’

[ linha de ação contínua].

‘’O excesso de exposição soa justificação; não demonstra, mostra. Confessar, assumir é para bandidos: na verdade, ‘denota’ atuando , sendo no momento. Lembra, o ator pela voz do escritor é que mais se aproxima de qualquer possibilidade ou aproximação. Tudo se coloca para adequação do personagem.’’
‘’ Há tautologia nesse impasse contemporâneo: atuar, interpretar, Jimmy, é fundir espanto com resistência,- essa melancolia toda se converte em possibilidade, gesto, imprecação, traço, reflexo, -         e todo acúmulo crítico pós-moderno gesta: é um saco a súplica saudosa, acomodar-se no niilismo : desde já Arte! A literatura , veja:
-         se parece tanto fluxo ejaculatório...’’

‘’ O QUE TORNA A VOLÚPIA TÃO TERRÍVEL É TALVEZ O FATO DE QUE ELA NOS ENSINE QUE TEMOS UM CORPO.’’ YOURCENAR.

‘’ Cessa aqui nosso primeiro encontro: antes de seguires ao mundo serra acima, tentemos estabelecer relação de prosseguimento:
pensar o escritor pelo ator, segues enquanto me alivio refletindo
Arte. Arte e Mãe sugerem mesmo núcleo. Ventre seguidor .’’

‘’’Sente,aprecia, percebe e retêm em ti o sentido poético : se explícito ou não à ti só cabe bem dizê-lo. Que cheio te encontre, contenha mundos, aprofunda, quando regurgita só expõe a fímbria, a frágil tessitura correspondente.’’

Santos, 11 de julho de 2.003.

‘’Edword Hill,- roupa esporte e peruca nobre em desajeito: remonta ‘haikais’ em prosa, - quer ser transposto ao teatro, curto-seco-cool cheio como chat , -‘short-cut’, -prosa-fragmentada.
Uma tristeza na cena do banho , pós-banho, ver a paisagem estreita , azul de sabonete gasto, - quando mais jovens mais passam pêlos, pelos pentelhos , desfiando água, verão que imunda o corpo. Um atento espectador se põe no palco: soberano sobre o intérprete ensaboado, - repete-lhe a fala, segue a deixa, dão-se as dálias , - vida não cessava naquele enxugar com a cena de porta aberta. Na primeira fila, o mesmo do que é composto as preliminares de sexos. Pensava num ato sobre Wickelman; flagrantes ocasionais , desterro na Austrália – também convidado como autor iniciante deslumbrei com simulação da cena. Caracteres sobrepostos: atuação requer percepção e prioridade instantânea: onde atuo primeiro? A lenda precisa ser encenada com ênfase ! alguém porta a lenda sem restituir : doa-se, fode-se sem volta: ninguém pira de vez no palco! Tom, ele dita notas taquigráficas de Deus, -hermeneuta insone , sem escrutínio ou resguardo : rala prá cacete, samba-dança , conecta o que éramos, o que percebemos um no outro, a prece não atendida. Toda noite recolhe essa esteira e o biombo. Uma gana, um martírio concentrando tudo que mentimos nele: e chamam-no farsante!’’

Santos, 15 de julho de 2.003.

‘’’O ator é um crítico voluntarioso do texto, - Mr. Eliott, - interpassa, repõe entendimento ao lentificado da palavra escrita, ideada, impressa no instante intuído. Por que ainda carrega guarda-chuva? Alinha tudo no aparador e senta ao chá.’’
[‘Um crítico vale , não pela excelência dos seus argumentos, mas pela qualidade de sua escolha.’]

‘’Quando na estréia ou já nos bastidores passo de enfermo ao imponderável são... homem desprotegido / humanidade desprotegida / êxito impositivo. Não ! interpretando a metáfora performática , o que é Vida de dentro se mostra. Guerra ao apressados cartesianos: terapeutas do sucesso, esse terríveis vilipendiadores do pensamento; a superfície. Miudezas, sem reducionismo. Sopa, chá e biscoito,- ritual de gueixa de paletó e gravata surrados com pano xadrez de xale. A xícara e o gole, ninguém que sofrer pensando...’’

‘’ sinto calores na solidão, me envolvem e pedem dizer, expressar, estar diante, tornam insuportável o calor as vontades de te contar.’’

Santos, 15 de julho de 2.003.

‘’ Esperava tua chegada ontem, mas sei da preparação, e mormente , a rota sinuosa entre escarpas traiçoeiras até a praia resvalada. Tom, cede à almofada, deita de frente e te conto
Reconhece em tudo pré-olhar e retira o travo. Refaz o sonho no período fértil, aproveita e anota... escreve e corrige. O olhar do saber pelo desejo. O ‘Senhor Azul’ é o manuscrito aqui estudado, você ator falta erigi-lo. Tudo carece finalização na peça, no ato, nos contornos da concomitância: o vento do Dia molda o meu drama ao gosto do método, - liberdade direcionada. Pensei tanto no texto, em nossa Vida juntos, e notei que formamos a concretização, Tom, de uma metáfora ou símbolo: o ator espelha em segunda instância, espelhando! o gesto primordial : brinca, enfara, corrige-se, arremeda, vocaliza... percebe o tanto de humanidade diante do Universo tens representado mil-maneiras!?
Lançar-se liberto pelo rochedo, em gesto ou em signo como eu contigo: o intertexto, a poetização das querelas e fúrias. Ator e escriba gestando algum paralelo possível. Sabe, entre o teatro e a poesia uma contenda entre gêmeos: representar antes ou depois de viver, Tom, é tudo assim andrófilo, não se produz com desígnio de produção definitiva. A casa, essa praia em ferradura, a colina de onde espreitei o ocaso, - como estando na platéia ou palco , um amor masculino incompreensível à quem não denote inversão até algo muito próprio, diferenciado, de acústica e plasticidade em par de anjos. Entendo os elisabetanos. Interpretar é tão erótico quanto te amar em segredo.’’

[ ‘’ Certo os personagens. Mas, aqui, meu caro senhor, quem representa não são os personagens. Quem representa aqui são os atores. Os personagens ficam ali, no texto (indica a caixa do ponto)... quando existe um texto.’’
‘’Diretor- Exatamente. Já que não existe e coube aos senhores a sorte de tê-los aqui, vivos, diante de si, os personagens...’’
‘’Ah! garanto-lhes que dariam um belíssimo espetáculo.’’]

Pirandello, (é preciso distribuir os papéis).

‘’ Encontrar papéis transmutados,- revigorados, entretecidos, o palco se renovando através da resistência à tornar-se obsoleto.
O que tornaria o essencial desnecessário, Tom? Inutilizado o que há de substante.
Substante?
Sim substante, sinal carrado de satisfação renovada pelo mundo.
Não se fala mais mundo, é preciso mundo! mundo! mundo!’’

[ ‘’Com certeza não pensam que sabem representar, não é?’’
Diretor]

‘’ O contrário, Tom, é certeza duvidada. Comecemos pelo contraditório das falas, dos sintomas, das desejações Poder na atuação, ver-se transtornado.’’

[ ‘’ Arranja-se com a caracterização.’’]

‘com a maquilagem’- Diretor.

‘’Triangulação primeira entre eu, tu e Pirandello.
Oou Pessoa que seremos mil. Queneu e Perec, milhares!
Não pranteia estar aqui eu, tu e a Literatura! Somos tantos
Que podemos merecer. Aí é o ator percebendo.’’


Falo-te de Brando pela solidão exigente, representava a partir de sua precariedade arrogante: amante, soldado, angustiado, sempre destacava-se do conjunto cênico: a solidão impõem-se quando se atinge grau de especificidade teatral.


Publicado originalmente em
MEIO TOM - POESIA & PROSA
editado por Constancio Negaro.
http://www.meiotom.art.br


Poeta, contista e crítico literário,
Flávio Viegas Amoreira é das mais inventivas
vozes da Nova Literatura Brasileira
surgidas na virada do século: a ‘’Geração 00’’.
Utiliza forte experimentação formal
e inovação de conteúdos, alternando
gêneros diversos em sintaxe fragmentada.
Vem sendo estudado como uma das vozes
da pós-modernidade literária brasileira
em universidades americanas e européias.
Participante de movimentos culturais
e de fomento à leitura, é autor de livros como
Maralto (2002), A Biblioteca Submergida (2003),
Contogramas (2004) e Escorbuto, Cantos da Costa (2005).

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