Sinto que o mês presente me assassina
Sinto que o mês presente me assassina,
As aves atuais nasceram mudas
E o tempo na verdade tem domínio
sobre homens nus ao sul das luas curvas.
Sinto que o mês presente me assassina,
Corro despido atrás de um cristo preso,
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda
Ao beco de agonia onde me espreita
A morte espacial que me ilumina.
Sinto que o mês presente me assassina
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas
De apóstolos marujos que me arrastam
Ao longo da corrente onde blasfemas
Gaivotas provam peixes de milagre.
Sinto que o mês presente me assassina,
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora
(Na libra escorpiões pesam-me a sina)
Há panos de imprimir a dura face
À força de suor, de sangue e chaga.
Sinto que o mês presente me assassina,
Os derradeiros astros nascem tortos
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre o morto que enterra os próprios mortos.
O tempo na verdade tem domínio
Amen, amen vos digo, tem domínio
E ri do que desfere verbos, dardos
De falso eterno que retornam para
Assassinar-nos num mês assassino.
Mário Faustino nasceu em 1930
em Teresina e morreu em 1962,
vítima de acidente aéreo.
Jornalista, crítico literário e poeta,
Mário editou entre 1956 e 1959,
a página semanal Poesia-Experiência
no Suplemento Dominical
do Jornal do Brasil,
apresentando um panorama poético
que englobava tanto poetas clássicos
quanto poetas iniciantes,
e apresentava o melhor
da produção estrangeira do gênero.
"O Homem e Sua Hora" (Cia das Letras)
foi seu único livro publicado em vida.
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