Saturday, August 15, 2015

POEMINHA DE DOMINGO (por Mário Faustino)


Sinto que o mês presente me assassina


Sinto que o mês presente me assassina, 
As aves atuais nasceram mudas
E o tempo na verdade tem domínio
sobre homens nus ao sul das luas curvas. 
Sinto que o mês presente me assassina, 
Corro despido atrás de um cristo preso, 
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda 
Ao beco de agonia onde me espreita 
A morte espacial que me ilumina.
Sinto que o mês presente me assassina 
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas 
De apóstolos marujos que me arrastam 
Ao longo da corrente onde blasfemas 
Gaivotas provam peixes de milagre. 
Sinto que o mês presente me assassina, 
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora 
(Na libra escorpiões pesam-me a sina) 
Há panos de imprimir a dura face 
À força de suor, de sangue e chaga. 
Sinto que o mês presente me assassina, 
Os derradeiros astros nascem tortos 
E o tempo na verdade tem domínio 
Sobre o morto que enterra os próprios mortos. 
O tempo na verdade tem domínio
Amen, amen vos digo, tem domínio
E ri do que desfere verbos, dardos
De falso eterno que retornam para
Assassinar-nos num mês assassino.


Mário Faustino nasceu em 1930
 em Teresina e morreu em 1962, 
vítima de acidente aéreo. 
Jornalista, crítico literário e poeta, 
Mário editou entre 1956 e 1959, 
a página semanal Poesia-Experiência 
no Suplemento Dominical 
do Jornal do Brasil, 
apresentando um panorama poético
que englobava tanto poetas clássicos 
quanto poetas iniciantes
e apresentava o melhor 
da produção estrangeira do gênero. 
"O Homem e Sua Hora" (Cia das Letras)
foi seu único livro publicado em vida.





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