Que
belo convite escrever nesse sítio com tanto glamour! E precisava duma pegada
caminho vereda para engatar reflexões alinhavadas do meu tempo: teço essas linhas ouvindo Pat Metheny sob o
calor senegalesco dos trópicos paulistas.... nessa virada de ano re-assisti com
mesmo gozo de sempre "Os sonhadores" de Bertolucci: esse mestre me é tão familiar quanto os
canais de Santos e a Vila Belmiro: gosto que me enrosco da maneira e das
temáticas da obra tão eclética de Bernardo! Sim chamo-o da maneira com que
beberico uma cerveja no Terminal Jabaquara com expectativa de descer a serra
ouvindo Gato Barbieri. Cresci nos anos
70 sob a égide da famigerada ditadura e a mítica proibição de “Saló” de
Pasolini (que assisti em 1980 no extinto Cine Indáia) e “O Último Tango em
Paris”, que veria pela primeira vez em VHS nos anos 90 tão somente.... meu
tesão por Marlon Brando já arrefecia e ainda ecoa permanentemente a trilha
sonora que virou hit pessoal de boêmia e existencialismo tardio.... fico a
pensar que aos 52 anos sou dos últimos laivos ou galhos semeados pelo sonho
abortado de 1968!
Leitor desvairado de Sartre, apaixonado por Barthes e Foucault com orgulho gay de ter esses dois ícones no panteão da libertária causa de dar o rabo ouvindo Bob Dylan ao lado do mântrico Ginsberg: esse meu barato meu desbunde que o advento da Aids pôs tudo a perder.... como soa estranho conversar com jovenzinhos gays reacionários e burrinhos que já nem sabem quem foi Elis Regina!! Mas começo de ano deve ser otimista e estou para cima louvando nunca ter caído nas garras de nenhuma ortodoxia, nunca ter babado ovo de qualquer marxismo e mantido meu anarco-homossexualismo tão devedor de Thoreau e Walt Whitman! Me sinto uma ave rara pairando sobre uma colina espreitando tanta babaquice patrulhadora de néscios que desconhecem o valor da liberdade poética.... meus avatares foram desgarrados: Darcy Ribeiro, Glauber e mais proximamente Roberto Piva todos messiânicos sem uma fé definida. O grande legado de 1968 foi essa imprecisão do delírio, um grito “rimbaudiano” por um socialismo epidérmico, um comunismo sexy & anti consumista!
Rebobinando: “Os sonhadores” é um tesão de atmosfera até pela hipocrisia que ronda aqueles rapazes que louvavam Mao sob a égide protetora dos chequinhos de seus pais burgueses! É linda essa incoerência pura e quão linda visão do paraíso da nudez de Louis Garrel & Michael Pitt! com sua bundinha em torno dos seios pontiagudos de Eva Green! Desde a bundinha antológica de Leonard Whiting no clássico “Romeu e Julieta” de Zefirelli não via espetáculo glúteo tão sublime.... falando em Zefirelli ele vai chegando aos 100 anos ainda tentando escamotear sua paixão pelos rapazes.... até nisso existe lirismo, na saudável hipocrisia dos nobres da arte. Por onde andará Leonard Whiting? Será hoje um ébrio tão decadente quanto meu amado Helmut Berger?! Aí que lindo era Berger e saudavelmente depravado era Berger cafetinando Visconti e Valentino nos anos 70! Berger eu sei que anda trôpego pelas ruas de Viena: como diria De Gaulle (tão 68 as avessas!) a velhice é um naufrágio....
Não consigo esquecer o mais 68 dos filmes decadentistas: “Gruppo di Famiglia in um Interno” de Visconti que no Brasil ganhou nome tosco de "Violência e Paixão". Que obra prima! Amaria viver dentro desse filme: sensação de cinéfilos essa de morar habitar uma película e sua atmosfera! Sonho com Helmut Berger nu disposto para o amor naquele ambiente romano mezzo barroco mezzo moderno onde um Burt Lancaster impera com erudição gay melancólica diante dum mundo em ruínas! Todas mulheres do mundo eram para mim esse Puig santense Silvana Mangano! e pasmem: essa fita une o principesco Luchino ao nosso brejeiro Roberto Carlos!! Não é que a canção “A distância” fica classuda na voz de Iva Zanicchi? “La mia solitude” é outra trilha sonora desse bardo beat fascinado por 68! Todo cinismo no sentido grego me representa nesse universo viscontiniano: a virginal Cardinale, os quadros de Fragonard e Canaletto, o culto esteta dum poeta cagando para qualquer finalismo salvacionista para um mundo idiotizado.
A mensagem de 68 é essa geléia geral dos dois personagens de Bertolucci divididos entre Chaplin e Buster Keaton: eram niilistas mas cultuadores, negavam a alta cultura mesmo espreitando sua perenitude muito além do besteirol que se imporia com o neoliberalismo onipresente! No Brasil 68 leva obviamente a Zuenir Ventura, mas dois livros recentes me chamam atenção: "Pai, Pai" de João Silvério Trevisan e por que não? as deliciosas memórias de Jô Soares! Não estranhem esse literato estrear essa coluna com tanta referência ao cinema: será aqui uma hora do recreio ainda assim cult, vintage, dum poeta hipster que ficou sinceramente comovido com o convite do querido Chiquinho para colaborar.... meu propósito nos próximos capítulos será destilar essa curtição da linguagem que é Arte no sentido amplo e profundo e perpetuar a memória do nosso irmão partido Carlos Brizolinha! Agora tomar uma cerveja na boca da noite ouvindo “Paroles, Paroles”: quem além de nós ainda lembra de Dalida e Delon!! 2018 será motivo e momento para rememorar 68 que vivi mais porque vivi no eco! Somos cinqüentões derradeiras gotinhas esporradas do Quartier Latin e da Maria Antonia com suas esperanças e decepções! Apesar de..... como ressaltava Clarice Lispector...apesar de.... é o fato de sermos artistas que nos faz felizes: pena e tesão! Sentir muito e melhor como diria Burt Lancaster: "Os gaviões voam só, enquanto os corvos em bando" ....somos esses raros lobos da estepe..... meu rosebud pendular: entre a bunda de Leonard Whitting, uma ode a beleza de Keats e o rosto de Sting cantando “My Funny Valentine”! é a Beleza estúpido!
Leitor desvairado de Sartre, apaixonado por Barthes e Foucault com orgulho gay de ter esses dois ícones no panteão da libertária causa de dar o rabo ouvindo Bob Dylan ao lado do mântrico Ginsberg: esse meu barato meu desbunde que o advento da Aids pôs tudo a perder.... como soa estranho conversar com jovenzinhos gays reacionários e burrinhos que já nem sabem quem foi Elis Regina!! Mas começo de ano deve ser otimista e estou para cima louvando nunca ter caído nas garras de nenhuma ortodoxia, nunca ter babado ovo de qualquer marxismo e mantido meu anarco-homossexualismo tão devedor de Thoreau e Walt Whitman! Me sinto uma ave rara pairando sobre uma colina espreitando tanta babaquice patrulhadora de néscios que desconhecem o valor da liberdade poética.... meus avatares foram desgarrados: Darcy Ribeiro, Glauber e mais proximamente Roberto Piva todos messiânicos sem uma fé definida. O grande legado de 1968 foi essa imprecisão do delírio, um grito “rimbaudiano” por um socialismo epidérmico, um comunismo sexy & anti consumista!
Rebobinando: “Os sonhadores” é um tesão de atmosfera até pela hipocrisia que ronda aqueles rapazes que louvavam Mao sob a égide protetora dos chequinhos de seus pais burgueses! É linda essa incoerência pura e quão linda visão do paraíso da nudez de Louis Garrel & Michael Pitt! com sua bundinha em torno dos seios pontiagudos de Eva Green! Desde a bundinha antológica de Leonard Whiting no clássico “Romeu e Julieta” de Zefirelli não via espetáculo glúteo tão sublime.... falando em Zefirelli ele vai chegando aos 100 anos ainda tentando escamotear sua paixão pelos rapazes.... até nisso existe lirismo, na saudável hipocrisia dos nobres da arte. Por onde andará Leonard Whiting? Será hoje um ébrio tão decadente quanto meu amado Helmut Berger?! Aí que lindo era Berger e saudavelmente depravado era Berger cafetinando Visconti e Valentino nos anos 70! Berger eu sei que anda trôpego pelas ruas de Viena: como diria De Gaulle (tão 68 as avessas!) a velhice é um naufrágio....
Não consigo esquecer o mais 68 dos filmes decadentistas: “Gruppo di Famiglia in um Interno” de Visconti que no Brasil ganhou nome tosco de "Violência e Paixão". Que obra prima! Amaria viver dentro desse filme: sensação de cinéfilos essa de morar habitar uma película e sua atmosfera! Sonho com Helmut Berger nu disposto para o amor naquele ambiente romano mezzo barroco mezzo moderno onde um Burt Lancaster impera com erudição gay melancólica diante dum mundo em ruínas! Todas mulheres do mundo eram para mim esse Puig santense Silvana Mangano! e pasmem: essa fita une o principesco Luchino ao nosso brejeiro Roberto Carlos!! Não é que a canção “A distância” fica classuda na voz de Iva Zanicchi? “La mia solitude” é outra trilha sonora desse bardo beat fascinado por 68! Todo cinismo no sentido grego me representa nesse universo viscontiniano: a virginal Cardinale, os quadros de Fragonard e Canaletto, o culto esteta dum poeta cagando para qualquer finalismo salvacionista para um mundo idiotizado.
A mensagem de 68 é essa geléia geral dos dois personagens de Bertolucci divididos entre Chaplin e Buster Keaton: eram niilistas mas cultuadores, negavam a alta cultura mesmo espreitando sua perenitude muito além do besteirol que se imporia com o neoliberalismo onipresente! No Brasil 68 leva obviamente a Zuenir Ventura, mas dois livros recentes me chamam atenção: "Pai, Pai" de João Silvério Trevisan e por que não? as deliciosas memórias de Jô Soares! Não estranhem esse literato estrear essa coluna com tanta referência ao cinema: será aqui uma hora do recreio ainda assim cult, vintage, dum poeta hipster que ficou sinceramente comovido com o convite do querido Chiquinho para colaborar.... meu propósito nos próximos capítulos será destilar essa curtição da linguagem que é Arte no sentido amplo e profundo e perpetuar a memória do nosso irmão partido Carlos Brizolinha! Agora tomar uma cerveja na boca da noite ouvindo “Paroles, Paroles”: quem além de nós ainda lembra de Dalida e Delon!! 2018 será motivo e momento para rememorar 68 que vivi mais porque vivi no eco! Somos cinqüentões derradeiras gotinhas esporradas do Quartier Latin e da Maria Antonia com suas esperanças e decepções! Apesar de..... como ressaltava Clarice Lispector...apesar de.... é o fato de sermos artistas que nos faz felizes: pena e tesão! Sentir muito e melhor como diria Burt Lancaster: "Os gaviões voam só, enquanto os corvos em bando" ....somos esses raros lobos da estepe..... meu rosebud pendular: entre a bunda de Leonard Whitting, uma ode a beleza de Keats e o rosto de Sting cantando “My Funny Valentine”! é a Beleza estúpido!
Poeta, contista e crítico literário,
Flávio Viegas Amoreira é das mais inventivas
vozes da Nova Literatura Brasileira
surgidas na virada do século: a ‘’Geração 00’’.
Utiliza forte experimentação formal
e inovação de conteúdos, alternando
gêneros diversos em sintaxe fragmentada.
Vem sendo estudado como uma das vozes
da pós-modernidade literária brasileira
em universidades americanas e européias.
Participante de movimentos culturais
e de fomento à leitura, é autor de livros como
Maralto (2002), A Biblioteca Submergida (2003),
Contogramas (2004) e Escorbuto, Cantos da Costa (2005).
flavioamoreira@uol.com.br
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