O QUEBRA-CABEÇAS
Escolhi assistir
a O Quebra-Cabeças, refilmagem do filme argentino Rompecabezas de 2009, por
causa da Kelly Macdonald. Ela é uma as atrizes mais subjugadas do cinema atual,
desde Transpotting já demonstra o seu talento, mas sua carreira nunca decolou
de verdade – seu melhor trabalho foram as 5 temporadas de Boardwalk Empire.
O filme acabou
sendo bastante agradável, apesar de tratar de um tema bastante recorrente no
cinema, por isso não conseguir escapar de alguns clichês.
Kelly é Agnes,
uma dona de casa que se dedicou ao marido e aos filhos durante 20 anos de
casamento, que segue uma rotina previsível até que ganha um quebra-cabeças de
presente de aniversário.
Ela descobre que
é muito boa em montar aquilo e é aí que fica difícil escapar dos clichês, já
vimos várias vezes filmes sobre donas de casas desvalorizadas pela família que
a partir de algum evento passam a questionar a vida que levam. Mas o filme tem
dois trunfos, Kelly, que está ótima, encantadora, passando toda a sutileza
necessária para a mudança gradual da personagem, e a própria ideia do
quebra-cabeças – pessoas com raciocino logico apurado tentam em vão encontrar
padrões para encaixar na vida e a ideia de conseguir formar algo ordenado a
partir do caos acaba sendo um alento – que traz originalidade e alguns bons
diálogos ao filme.
Ao longo do
filme Agnes encontra um parceiro, se inscreve num concurso de montagens de
quebra-cabeças, entra em conflito com o marido e um dos filhos e, obviamente,
questiona suas escolhas de vida. Mas uma vez, nada que nunca tenhamos visto,
mas contado de uma maneira competente, com alguma originalidade. Não é um grande filme, mas dá pra ser
assistido com prazer.
EM CHAMAS
Em Chamas é um
filme sul-coreano adaptado de um conto de Haruki Murakami, gosto baste dos
livros dele, mas sempre imaginei que seria dificílimo adaptá-los ao cinema. O
forte de seus livros são as palavras, a maneira de contar a história, e não a
trama, o que torna bem difícil imagina-los como filmes.
O diretor Chang-Dong
Lee, que foi ministro da cultura da Coréia do Sul, troca a força das palavras
pela força das imagens de forma muito eficaz, conseguindo, com isso, transmitir
o poder das palavras de Murakami e criando no filme um ritmo muito parecido com
os seus livros.
Lee Jong-su
encontra por acaso uma antiga colega de escola e começa a se relacionar com ela
até que aparece o rico e misterioso Ben – Steven Yeun, de Walkind Dead – e os
três acabam envolvidos num triangulo, opondo a condição social e a
personalidade dos dois jovens. Um é seguro e confiante, o outro inseguro e
desconfiado, totalmente desconfortável no ambiente de Ben. Ao mesmo tempo, este
parece sentir algum tipo de inveja em relação a Lee Jong, apesar do enorme
abismo da condição social, causando um incomodo que vai crescendo ao longo do
filme.
Em Chamas ganhou
o premio da critica em Cannes, não é um filme fácil, é lento e longo, mas a
história é interessante e intrigante - notei até uma certa influência de Festim
Diabólico – cheia de referencias à desigualdade da Coréia do Sul, o que nos
deixa mais próximos daquele dia-a-dia, apesar da imensa diferença cultural entre
os países e que acaba gerando um interesse a mais.
INFILTRADO NA
KLAN
Assisti a
Infiltrado na Klan em setembro, no seu lançamento nos EUA, e a pergunta que me
veio é por que o distribuidor não lançou o filme no Brasil antes das eleições?
Claro que não
havia como prever que o líder da Klan, David Duke, que tem uma grande
participação no filme, declararia afinidades com um dos candidatos da eleição
brasileira, mas o filme é extremamente político e teria se valido da
polarização da época para aumentar o seu potencial de bilheteria.
Spike Lee faz o
seu melhor filme em anos contando a história verídica de Ron Stallworth – John
David Washington, filho de Denzel, que tem começado a despontar com trabalhos
interessantes –, um policial negro da pequena cidade de Colorado Springs que
nos anos 70, ao ver um anuncio de recrutamento da KKK num jornal, resolve tirar
o telefone do gancho e se inscrever como membro. Após ser aceito, Ron recorre a
outro policial, Filp Zimmerman – o excelente Adam Driver – para se passar por
ele e participar das reuniões da Klan.
Lee faz uma
mistura de estilos, uma história dessas não poderia ser contada sem um tom de
comédia, mas ele caminha no limite entre uma comédia de absurdos, um filme
policial e uma crônica de costumes da época, com toda a efervescência do
movimento de direitos civis nos EUA.
Essa mistura de
estilos feita com maestria é um dos pontos altos do filme, o filme consegue ser
homogêneo, mesmo alternando estilos tão distintos – tenho apenas alguma
restrição às cenas enxertadas no final, mas isso não consegue estragar o filme.
Outra escolha
inteligente é não caracterizar os racistas como típicos vilões, o filme se
aproxima tanto deles que é possível perceber a sua humanidade, apesar das
escolhas totalmente idiotas e de destilarem ódio o tempo todo.
Fábio Campos convive com filmes e música
desde que nasceu, 52 anos atrás.
Seus textos sobre cinema passam ao largo
do vício da objetividade que norteia
a imensa maioria dos resenhistas.
Fábio é colaborador contumaz
de LEVA UM CASAQUINHO.
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