Serpenteava
pela Frei Caneca pensando o que é uma cidade? O que faz pensar que uma cidade é
aquilo que vejo? Não será a cidade por onde Artur passa e onde imagino estar
Artur bebericando sem minha espera, olhando as garotas, fumando sem tédio por minha ausência? Parei
de pensá-lo , ele voltou para Santos ,
surfando e agora retomo inventar
outra metrópole. Sinuosa essa rua por
quem ninguém dava nada e se inventa. Um
lugar são as pessoas que cruzam , cada
boteco partícula dessa metáfora. Como a
lembrança do pau de Artur, sua bunda com marca de sunga, o filete de caipiroska na baba pelo peito
cabeludo. Não tão desatento com entorno
: ´´Por quê São Paulo não é tão conhecida nesse mundo?´´ ´´Será por estar em
latitude meridiano fora de mão?´´ Mesmo
sem Artur por perto havia ali um despenhadeiro vale um platô onde meteram
imensa avenida: mais um pouco iria me
encontrar com Fiducia , eu sem jeito com as mulheres, eu sem
assunto com as mulheres, sem nenhuma
astúcia com esse outra metade de toda gente do planeta. Por amor a Artur procurava por Fiducia .
Notava com a pressa estar com
casaco puído, os sapatos com alguma lama seca, não tivera tempo se deter no seu
aspecto , seu estilo não era de afetação
no trato e tinha largado qualquer contato social estiloso. Era só despojamento. No fone de ouvido uma sonata de Mozart , por
trás o vão do Masp, um café ralo ainda
no hálito, - eu poderia ter pego um
táxi, comeria o caminho e essa ansiedade,
não correria risco de assalto, agora foda-se todo medo , meus créditos de celular, essa porra de guarda-chuva é um saco! Ansiava pelo verão quando estaria livre dessa
terra íngreme, solto e só com Artur numa praia abafada de gente e sensações
onde pegar o dia a noite mesmo não indo além do mar em frente ao burburinho. Como começar com Fiducia? Ela entretida com o
deplorável mercado de estilo, moda,
galerias, objetos fortuitos e me dizendo sobre os dotes de Artur para a
passarela, as vernissages , tudo aquilo
de que se compõem uma ´saison´ ? para
mim que o criara como um filho decifrando os criptogramas da Divina
Comédia? Os vinis de Chet Baker? Paciência da porra ouvir Fiducia e sua ignorância reflexa sobre o
mundo dos homens.... Porque levaria esse recado que recomporia seu amor ? que
Arthur estava pronto retomar o namoro com uma imbecil de grife? Essa que o arrastava a baladas sertanejas
regadas de gim de terceira? Por uma
buceta trocaria nossas noites de Bach entre rodadas de ´rabo de galo´ em meu quarto sala entulhado da melhor poesia
de Whitman? Não! não seria esse Hermes das encruzilhadas do Baixo Augusta....
Três meses de não resposta e ela o esqueceria naturalmente na primeira
temporada de Aspen! Não seria esse Pigmalião por tudo a perder em nome do bom
mocismo esquálido das novas gerações!
Entrei no bom e velho saguão no Hotel Jaraguá para filar seu banheiro
decente entre mulheres de burkas e caipiras exitantes no saguão que guarda
ainda algum charme de Errol Flynn.... piquei o bilhete em pedaços felinos e fui
curtir a madrugada comendo o melhor sanduíche de pernil do mundo no Estadão....
aqueles livros ensebados que folheava já guardados para Arthur e seu futuro
simbolista de hipster suburbano ....
Poeta, contista e crítico literário,
Flávio Viegas Amoreira é das mais inventivas
vozes da Nova Literatura Brasileira
surgidas na virada do século: a ‘’Geração 00’’.
Utiliza forte experimentação formal
e inovação de conteúdos, alternando
gêneros diversos em sintaxe fragmentada.
Participante de movimentos culturais
e de fomento à leitura, é autor de livros como
Maralto (2002), A Biblioteca Submergida (2003),
Contogramas (2004) e Escorbuto, Cantos da Costa (2005).
Este é seu mais recente trabalho publicado:
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