Wednesday, May 11, 2016

AH... COMO EU QUERIA SER ROGER VADIM (por Odorico Azeitona)



Quando eu tinha 13 anos de idade, tentei ver um filme impróprio para menores de 18 anos no cinema, e fui barrado na porta -- várias vezes ao longo de uma mesma semana, diga-se de passagem.

O cinema era o saudoso Iporanga 3, sala prá lá de aconchegante localizada na Avenida Ana Costa, em Santos, num belo prédio de arquitetura funcional inclassificável que infelizmente não existe mais.

E o filme era "Se Don Juan Fosse Mulher", de Roger Vadim, com Sua Magestade Brigitte Bardot no explendor de seus 40 anos e a jovem e lindíssima Jane Birkin encabeçando o elenco.

Eu passava em frente ao cinema, tentava entrar e sempre saía puto com as consecutivas negativas do porteiro do cinema em me deixar passar pela porta em direção ao paraíso erótico de Roger Vadim.




Pausa para falar rapidamente de Monsieur Vadim:

Ele era um diretor mediano, com uma afinidade especial por roteiros mais apelativos em termos sexuais -- isso na segunda metade dos anos 50 e durante os anos 60. 

Era uma espécie de Walter Hugo Khoury que deu certo, pois conseguia não só escolher a dedo as atrizes mais deslumbrantes da França e da América como ainda comer, casar e ter filhos com elas.

E que estrelas: Primeiro Brigitte Bardot... Depois, Catherine Deneuve... Por último, Jane Fonda. Todas altamente problemáticas. Mas todas exuberantes e -- cada uma a sua maneira -- inesquecíveis. 

Para quem não sabe, Vadim tem um livro autobiográfico fácil de encontrar em sebos onde conta sua vida com as três estrelas.

Ao contrário do que se imaginou a princípio, ele é de uma delicadeza impressionante com as três nas suas lembranças, apesar delas terem tentado -- cada uma a sua maneira -- enlouquecê-lo.

 



Então, os anos passaram. "Se Don Juan Fosse Mulher" nunca foi lançado em vídeo ou em DVD por aqui. Nunca passou no Eurochannel, nem na TV5. Permaneceu inédito no cinema da minha mente.

Até que um dia, dez anos atrás, fazendo uma busca num banco de torrents, dou de cara com "Se Don Juan Fosse Mulher" disponível para download.

Quase enlouqueci, claro. Virei adolescente novamente. Mal podia acreditar no que o indicador de downloads me mostrava: o filme estava chegando aos poucos, mais alguns minutos e eu iria à forra com aquele infeliz daquele porteiro do Iporanga 3 que nunca me deixou entrar para ver este filme.. 

Confesso que estava até com medo de ver o filme, de tanto que fantasiei nas fotos que ficavam expostas na entrada do velho Iporanga, com Bardot e Birkin nuas numa cama redonda gigantesca, uma imagem que não saiu da minha cabeça um dia sequer ao longo da minha adolescência.

Só de pensar que o original daquela cena não era estático como na foto na entrada do cinema, já era o suficiente para deixar a minha libido completamente descontrolada.




Então, naquela noite, abri uma garrafa de vinho, cortei umas lascas de parmesão e finalmente pus o filme para rodar no computador.

Começou.

Como eu já esperava, não tinha legendas, estava no original em francês -- um francês civilizado e altamente compreensível, bem distante dessa língua estranha que se fala hoje nos arredores de Paris, onde carros pegam fogo, e pessoas às vezes até explodem.

 E então: uma surpresa surreal: surge em off uma voz de homem, falando em polonês, traduzindo (para o polonês) todas as falas do filme, em voice-over, como se fosse um documentário da TV Cultura, da série PLANETA TERRA.

Fiquei horrorizado, claro!

Será possível que não exista dublagem ou legendagem na Polônia? 

Como a voz em polonês estava mixada num volume mais alto que a banda original do filme, o máximo que eu conseguia ouvir, e entender, era o início dos diálogos dos personagens do filme, que logo em seguida eram atropelados pelo polaco inconveniente.

Pensei seriamente em me aborrecer, mas confesso que não consegui.

E vi o filme até o final com muito prazer.

E adorei as tomadas de cena chiquérrimas e pretensamente existencialistas de Monsieur Vadim.

E, claro, finalmente pude ver as tais cenas de Bardot e Birkin nuas na cama, agora em movimento.

E, com isso, sinto que um ciclo se fechou na minha vida, e que, de alguma maneira, valeu esperar todos esses anos para poder ver essas duas Forças da Natureza se enroscando diante das câmeras classudas e pervertidas de Roger Vadim, talvez o maior e melhor "ladies' man" do Século XX!



O motivo pelo qual estou lembrado disso é que acabo de localizar num servidor uma cópia, dessa vez toda em francês, de "Se Don Juan Fosse Mulher".

Já dei uma olhada preliminar e o áudio está perfeito.

Dessa vez não tem voice-over em polonês.



Odorico Azeitona está pouco a pouco 
tornando-se um sociopata perigosíssimo,
mas sabe que se matar um desses infelizes,
Deus estará a seu lado.

 Escreve todas as semanas
em LEVA UM CASAQUINHO

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