Não
entendo muito de gibis e nem da transposição de seus heróis para as telas do
cinema. Mas, pelo pouco que sei, creio que se pode dizer que Pantera Negra é um
clássico. Todos os clichês estão lá: batalhas estrambólicas, explosões, raios
destruidores, efeitos especiais e os super poderes dos que querem proteger o
mundo contra os que querem dominá-lo.
Logo
de início e do alto da minha pouca experiência chamou a atenção a referência à
lenda do reino perdido de Atlântida.
Ao
menos, foi assim que Wakanda me pareceu: uma civilização superior, erigida com
base no conhecimento e enriquecida pela exploração de um metal especial, o
vibranium que, tal como o oricalco – o metal da montanha, mais brilhante do que
o ouro – dava uma aparência especial aos artefatos de Atlântida.
_
Sim, eu sei que Atlântida era uma ilha e que Wakanda, ao contrário, fica no
coração do continente africano. Também sei que os super heróis de Atlântida são
os aquáticos Namor (da própria Marvel) e o Aquaman da (DC Comics).
Mas,
não estou pensando na geografia e nem na Atlântida da antiguidade, descrita nas
obras de Platão, a rica e poderosa ilha que teria sucumbido por um cataclismo,
provocado ou não – não se sabe – pela ira dos deuses.
Penso
na Atlântida que ressurgiu na mente do homem moderno que enfrentou os oceanos
de Poseidon e navegou pelo planeta. O homem que inventou o capitalismo e o
conceito de civilização.
É
exatamente como modelo de “civilização” que a antiga Atlântida ressurge, com
nomes diferentes e, também em diferentes enredos. Uma civilização contemporânea
e paralela, oculta do nosso mundo, às vezes pelas águas do mar, pelas areias do
deserto, por gigantescas montanhas ou pela neblina dos lagos. A sociedade
perfeita, onde as pessoas são felizes, todos tem o seu lugar numa economia
próspera e produtiva; os governantes são sérios e dedicados ao bem comum; as
leis são rígidas e respeitadas e, em geral, baseadas em antigas tradições; o
novo e antigo convivem em harmonia nessa sociedade baseada no conhecimento e na
razão.
Foi
assim que vi Wakanda. Uma espécie de sonho comum.
Todo
sonho um dia chega ao fim e ele está, geralmente, relacionado ao contato da
civilização perfeita e avançada com a sociedade humana.
Os
mais pessimistas ou moralistas relembram o fim da lendária Atlântida de Platão:
os atlantes eram descendentes de Poseidon e da humana Cleitó. Um dia, a
natureza humana começou a prevalecer sobre a divina e instalou-se a corrupção e
a arrogância. A ilha quis dominar o mundo ao redor, provocando a ira dos deuses
e dos outros homens.
Os
autores do Pantera Negra parecem conhecer esse final e o recriaram. Claro que
eu não vou contar.
Mesmo
porque, o final não é a única cereja do bolo nesse filme que traz, ainda, uma
importante discussão sobre os heróis e os líderes. O filme utiliza o arquétipo
mítico do herói presente nas mais diversas culturas humanas em todos os tempos:
o herói é aquele que sacrifica seus interesses particulares ou pessoais em prol
da comunidade.
Em
contrapartida, o vilão é egoísta, embora ele não seja ontologicamente mal. Sua
vilania se prende a um desejo de vingança, em geral, provocada por uma perda na
infância.
Como
ele não ama, quer dominar. É o que dizem os mitos antigos produzidos em várias
línguas, por povos de diferentes cores.
Falando
em cores, chegamos a verdadeira cereja do bolo do filme. Pantera Negra é um
excelente filme de super herói que explora os conhecimentos sobre mitologia com
ação e emoção suficientes. Poderia ser um filme de brancos. Mas é um filme de
negros. De negros que querem marcar o seu lugar numa sociedade de brancos. De
negros que querem viver em igualdade num mundo de brancos.
Um
mundo que pode ser mais colorido se reconhecer a beleza da arte, dos corpos ou
da música e da cultura que vem dos negros. Tudo isso aparece no filme em meio
às lutas estrambólicas.
Foi
muito emocionante assistir ao filme Pantera Negra num cinema lotado de negros
orgulhosos.
Ao
meu lado, uma menina negra acompanhada pela mãe, pulou da frente da cadeira
assim que as luzes se apagaram – a tela enorme na sala escura é sempre mágica.
Lá
pelas tantas...ainda passavam os trailers, ela viu a menina num desenho e
gritou:
_
“Mãe, olha! As tranças iguais as minhas!”
Fiquei
imaginando o que ela sentiria depois que o filme começasse, ao ver a rainha, a
princesa e as heroínas, todas parecidas com ela.
Esse
final, eu também não vou contar.
Meu nome é Denise Mattos Marino,
mas fui sintetizada: Denise Marino
ou, simplesmente, Dê,
acompanhada ou não do Marino.
Sou historiadora e professora de história.
Atualmente aposentada – fui mais rápida
que a reforma. Mas ainda levo
para os meus aposentos a curiosidade,
o “só sei que nada sei”
e a vontade de ensinar.
Ah! Sou libriana.
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