Thursday, August 24, 2017

PERGUNTAS INÚTEIS E SEM RESPOSTA (uma pensata de Ademir Demarchi)




Por que um recém-nascido, quando abre os olhos, não se assusta com o que vê, com pessoas que nunca viu, com coisas espantosas vistas pela primeira vez, muitas das quais nem ele mesmo tem, como bocas cheias de dentes, risos e palavras, olhos, narizes, em seres que lhe deveriam parecer estranhos?

Por que o tempo muda e tudo se altera quando um trem passa?

Por que uma mulher está feliz num dia e completamente infeliz e desesperada no outro?

Por que de manhã ela sorri e à noite chora como se passasse de uma dimensão a outra do espaço em que tudo se inverte?

Por que ninguém para a olhar as árvores se movendo vivas, dançando a música silenciosa do vento que as balança?

Por que um homem se deita na calçada tal como todos os outros homens em suas camas e acorda no dia seguinte para repetir seus passos até novamente à noite ir dormir na calçada e se entregar aos mesmos sonhos de todos os outros?



Por que nas obras de arte as pessoas parecem estar sonhando?

Seríamos todos estúpidos por não nos assustarmos com o que se forma quando fechamos os olhos, assim como com tudo o que se insurge à frente quando os abrimos?

Por que você está fazendo isso?

Não teria afinal o capitalismo incorporado o comunismo em seu sistema, de modo que hoje todos comem e compram as mesmas coisas e viajam para os mesmos lugares?

Seriam estas perguntas completamente inúteis a ponto de se tornarem poesia?

Se o homem enfim conquistar outro planeta, a Terra se tornará uma colônia?

Você é livre? Por quê?

Por que todas essas pessoas na rua andando de um lado para o outro parecem ir para algum lugar e por que parece ser normal isso?

Como se completa um estado de ser algo? Não se vai à igreja para se tornar completamente fiel? Não se vai ao hospital para se tornar completamente doente? Não se vai ao cemitério para se tornar completamente morto?

Por que os quero-queros estão sempre irritados? E os bem-te-vis, por que todas as manhãs aprontam confusão?

E aquele homem, por que aprisiona um gavião e uma arara?

Por que crianças fazem perguntas esquisitas e adultos não fazem perguntas?

Por que domingo deu praia?

Por que hoje o céu está nublado?

Por que quando chove cai granizo e quando venta caem árvores, destelham casas?

Por que a vida afetiva se manifesta nos objetos?

Por que prazer e sofrimento estão no mesmo pacote?

Por que diante de um semáforo nos encontramos com a eternidade?

Por que um animal come outro animal?

Por que você ainda está lendo este texto?



Chove hoje?

Quem garante que o céu que nos protege não cairá sobre nossas cabeças?

Por que tanta beleza no mundo e tão poucos olhos para desfrutá-la?

De que lado deve ser visto o óbvio?

Por que a luz foge à velocidade da luz?

Por quê?

Por quê?

[publicado originalmente em 13/11/2008]




Ademir Demarchi é santista de Maringá, no Paraná,
onde nasceu em 7 de Abril de 1960.
Além de poeta, cronista e tradutor,
é editor da prestigiada revista BABEL.
Possui diversos livros publicados.
Seus poemas estão reunidos em "Pirão de Sereia"
e suas crônicas em "Siri Na Lata",
ambos publicados pela Realejo Livros e Edições.
(basta clicar nos nomes para ser enviado
ao website da editora)



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