Monday, August 24, 2020

CROSSES' CAVERN (Chapters 1 to 5) (by Manoel Herzog aka Germano Quaresma)

 


Chapter The First

Capítulo de número um

 

Good Afternoon, folks. My name is Manny Duke. I am a farmer, sorry, eu sou um fazendeiro (falemos portuguese, please) aqui do Estado de Idaho, EUA. Nem sempre eu tenho sido um fazendeiro, isto é, eu usava ser um lawyer quando vivia lá na cidade grande. Um lawyer, um homem de leis. Cirscunstâncias da life me levaram, no entanto, a me tornar um farmer, recluso aqui no escondido Idaho, no munícipio de Crosses Cavern (Caverna das Cruzes), onde possuía já, adquirida com o dinheiro que ganhei como homem de leis, uma pequena propriedade rural. Montaigne, um sábio francês, e nós norteamericanos adoramos os franceses, viveu experiência parecida à minha, a determinado ponto de sua life decidiu abolir todo contato humano e se recolheu na sua quinta, nos arrebaldes de Paris, de onde passou a escrever memórias e reflexões.

Eu também decidi abandonar por completo o contato com os seres humanos, e devo acabar por expor as razões que me levaram a tal decisão ao longo deste relato. Não o faço agora por dupla razão: primeiro, não há uma lógica ou um ponto determinante que me tenha feito optar pela vida em eremitério, the lonely life; e segundo, se eu fosse enumerar o conjunto de razões por certo haveria de inviabilizar este que denominei first chapter, capítulo primeiro, passando a já fazer uma novel do que seria um simple chapter.

Meus chapters, nesta historinha country, terão sempre o padrão de três parágrafos, de forma a não cansar os leitores que se disponham a acompanhar. Aliás, here am I já no terceiro parágrafo deste chapter de hoje, de onde devo estacionar. Antes, contudo, vou adiantar dois substantivos que bem se podem incluir entre as razões de minha escolha pelo isolamento no campo: um simple, Galinhas (sim, chickens) and um nome próprio, Tiffany.

 

Chapter The Second

Capítulo Segundo

 

Hi, Folks. Passei o weekend no meu  private Idaho, com minhas galinhas. Que animais fantásticos. Desde que resolvi me isolar no Idaho, em Crosses' Cavern, tive bem clara a ideia de empreender uma criação de chickens. Foi então que adquiri, num fornecedor do Alabama, um lote de cento e cinquenta pintainhos (tweeties), de variadas raças, para corte, postura de ovos, ornamento, sacrifício religioso, etc. Há três semanas os tenho acompanhado, e como crescem! Começa a surgir até mesmo alguma afeição entre me and my tweeties, e é sobre isso que quero filosofar today.

Viver a rural life pode nos ressignificar a relação com os animals. O homem urbano, constato, se acanalhou de tal forma que passou, em sua arrogância, a pretender humanizar os bichos, aos quais atribuiu a detestável alcunha de "pets". Um pet é a derrota da civilização. Famílias urbanas reservam mais cota de amor a seus bichos de estima que a outros de sua espécie, que são capazes de ver nas ruas, em absoluta miséria, com indiferença. Já presenciei festa de aniversário pra cachorro, batismo de hamster, desfile de moda de coelhos. Os próprios animais se tornam canalhas, como se humanos fossem, com tais procedimentos. Ficam arrogantes, enjeitam alimento, avançam na mão que os provê etc.

Eu com meus pintos mantenho uma relação de bem querer e respeito mutual. Sabem que minha função ali é alimentá-los e devem saber, se a intuição lhes sopra, que meu intuito é o de um dia devorá-los, se necessário. mas não se restringe a uma troca econômica a nossa relação, e só isso já a justificaria, segundo Karl Marx. Há, sim um relação de afeto: não os crio em confinamento, não lhes ministro hormônios para que cresçam mais e vivam menos, serão lançados a campo onde viverão em liberdade e à noite terão ração fresquinha e água gelada com que matar suas fome e sede, além de um poleiro limpo pra dormir ao abrigo das intempéries. Tudo isso justifica sobremaneira a relação que um homem possa ter com seu animal, é justo para ambos e mais, é digno. Aliás, dignidade é o que a Tiffany faltou - a cretina usava manter aqueles gatos imundos como dois parasitas, dois funcionários públicos estáveis, gordos e soltando pelos pela casa. Paro por aqui hoje. Said papa Hemingway: just three chapters a day. Bye, folks.

 

3rd. Chapter

 

'Mornin, folks. Yesterday eu estava muito bitter, amargo. Gostaria de me desculpar por um excesso, ao dizer que Tiffany carecia de dignidade. It's not true. Ela apenas tem uma predisposição maior que a minha, a nisso a invejo, de suportar a vida em society, a urban life. O fato de colocar ametistas no chacra frontal de nossa Shit-su, ou de me recriminar por querer comer ao molho madeira um dos coelhinhos de nossa daughter, não a torna indigna. Apenas confirma que não serve pra mim esta relação, e that´s allright, ninguém é obrigado.

Comprei um lote de cem tweeties, como disse no chapter anterior, mesclados. Havia ali galinhas brancas, dessas inúteis de granja que só prestam pra comer, havia galinhas francesas Label Rouge, do pescoço pelado, havia galinhas poedeiras Rhode Island e galinhas inteiramente negras, de belos olhos e crista vermelhos. Estas se vendiam caríssimo, um old tycoon, um feiticeiro do underground de Crosses' Cavern, as comprava para rituais satânicos. Os galináceos são seres especialíssimos. Têm uma graça natural, não há quem não simpatize com eles, sempre em volta da gente a nos olhar inquisitivos, curiosos da nossa tão sem sabor humanidade.  Comem o que quer que se lhes apresente, vegetal, animal, mineral ou celestial. Carne, até a das companheiras elas comem. Restos de ossos, pelos, cabelos, vísceras, sangue, pele, pelanca e toda sorte de muxibas, em que estado de frescor ou putrefação se encontrem. Vegetal, comem de tudo, a casca dos legumes, os grãos, as raízes, os caules, os frutos e as sementes, inclusive a erva, o capim, e o que mais viceje. Comem também areia, pedra, casca de ovo, comem, comem e, na medida em que comem, defecam. Suas fezes têm um teor de nitrato e calcário absurdo, o que retroalimenta as plantações que haja numa farm ou cottage, e assim criar galinhas se torna um círculo fechado em que se aduba o que se planta pras galinhas comerem. São engraçadas e, glória maior, absolutamente burras. Uma galinha é dos seres mais idiotas e primários que Deus criou, quase tão estúpida quanto uma anêmona. Não tem sentimentos, o que come é por ela processado com uma rapidez e indiferença exemplares, não possui memória e nem guarda rancor. E come, come desesperadamente. Diz-se que se um homem  deitar no pasto e mantiver-se inerte elas o devoram. Creio seja verdade. Billy J., de Oklahoma, garante que seu avô nonagenário adormeceu sob um pé de oak e quando encontraram o corpo este se reduzia a um esqueleto, já bastante bicado, pois as galinhas comem ossos também. Mais um dia de esquecimento do Old Papa J. resultaria em nada se encontrar além de titica calcárea.

Nem só a galináceos, contudo, se resume a minha rural life. Ontem, for example, passei o dia podando apple trees. Com uma tesoura de poda manual fui desbastando os galhos que as arvorezinhas insistiam em fazer germinar pra dentro, no sentido do tronco. É sabido, vi-o num curso de youtube com Dan T., um velho plantador de mirtilos, que se devem eliminar os galhos concorrentes numa árvore, aqueles que nascem pra dentro, priorizando os externos, mais propensos a floração e frutos. A natureza é isso, babies: algo a ser dominado, instruído, dirigido, orientado por uma entidade mais sábia, como o é um homem frente a uma estúpida galinha ou a uma árvore de maçãs. É a missão de um homem, dirigir sua propriedade no sentido, não de oprimi-la, mas de lhe promover o desenvolvimento. Todas as vezes que pretendi podar os comportamentos de Tiffany foi justamente por a fazer evoluir, e ela nunca quis entender isso, a rebelde. E eu sempre, todas as vezes, fui eu quem se deixou podar, direcionar, governar por ela.

 

4th. Chapter

 

Hi, folks. Esta noite fui despertado por um nightmare, um pesadelo horrivel. Um alarido vindo dos lados do galinheiro. Corri lá por ver o que havia, e presenciei uma coisa inusitada: as galinhas de postura deblateravam numa plenária de partido. A vermelhinha Rhode Island presidia os trabalhos e deu voz à galinha preta, que estava inscrita. "Toda semana, especialmente às sextas-feiras, uma galinha preta é assassinada! E a mando de um capitalista, que lucra com o sacrifício." A caipira pé duro, namorada do galo índio, inscreveu-se também: "Os galos têm fixação por cu. Meu namorado vive naquelas rinhas de galo, e agora só come os franguinhos viados. É preciso lembrar que nós também temos cu. Os humanos, pelo menos, nos querem pelo que temos de melhor, botar ovos. Eles valorizam nosso cu."

A galinha branca, de granja, também deu seu pitaco: "Uma galinha trabalha duas vezes a jornada de um frango, e ganha menos. Há uma hegemonia no mercado profissional, podem ver, só galo branco adulto e hetero ganha bem nessa porra. Não passarão!" E foi assim que passei a me apropriar do conceito de postura, uma postura radical. Minhas aves tinham sido levadas ao verdadeiro "empoderamento".

Era de fato um dream bem idiota. Mesmo depois de desperto e do dream estar over, contudo, eu continuei muito impressionado. Uma tristeza de opressão me apertava o peito fazendo lágrimas brotarem de my eyes. Ai ai ai I should have done better, tocava essa música chata na rádio mental. A tristeza e a solidão me invadiram na night solitária do Idaho. Eu tinha visto muito bem na plenária das galinhas comunistas, o rosto da branca que deblaterava contra os homens era o dela. Tiffany.

 

5th chapter

 

A sensação ruim do nightmare, a visão do rosto de Tiffany num corpo de ave me acusando de todas as culpas pela desgraça do mundo acabou evanescendo com cinco minutos na doce atividade de poda de apple trees. Era como se, manuseando a tesoura, a livrar a árvore do excesso de galhos, eu próprio livrasse minha aura de satélites obscuros, pensamentos ruins que orbitavam em torno de minha cabeça. Estava já bastante distraído e leve, sentindo o prenúncio dessa Springtime em pleno frio de agosto, quando um homem soturno bateu à porteira da Farm:

"'D'morne. Estou procurando Mr. Emmanuel Duke."

"Seu criado."

"Big Morgan P., muito prazer. Me recomendaram sua cottage, preciso de um fornecedor de galinhas fixo."

Admiti-o à propriedade e lhe mostrei as instalações do pinteiro, com os primeiros animais em plena adolescência. Contou-me que era um capitalista, e que sua atividade principal era o off-shore. Mesmo sendo um intelectual, um lawyer com absoluto domínio da língua inglesa, eu embatuquei. Achei a princípio que fosse um insólito piloto de lanchas off-shore, atividade de todo incompatível com as gélidas montanhas do Idaho. Mas ele me fez ver que era outra coisa: cambalacho financeiro, pilantragem, obtenção de ganho sem trabalho, especulação. Era riquíssimo, um verdadeiro Tycoon. Propôs um preço bem razoável apenas pelos pintainhos negros, aqueles sem uma única pluma de outra cor. Compraria quantos eu produzisse."

 

(CONTINUA SEMANA QUE VEM)


Germano Quaresma, ou Manoel Herzog,
nasceu em Santos, São Paulo, em 1964.
Criado na cidade de Cubatão,
trabalhou na indústria química
e formou-se em Direito.
Estreou na literatura em 1987
com os poemas de Brincadeira Surrealista.
É autor dos romances
A Jaca do Cemitério É Mais Doce (2017),
Dec(ad)ência (2016), O Evangelista (2015)
Companhia Brasileira de Alquimia (2013),
além dos livros de poemas
6 Sonetos D’amor em Branco e Preto (2016)
A Comédia de Alissia Bloom (2014).
Aqui, seus mais recentes trabalhos publicados:




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