ENTREVISTA CONCEDIDA
AO WEBSITE OMELETE
O quanto a figura de Bobby, um roteirista em busca de um lugar ao sol na indústria, reflete um pouco do seu próprio passado no cinema?
Ele não é um espelho do que eu fui e sim um elemento de um conto moral sobre deslumbramento com um mundo de glamour. Jesse Eisenberg é um ator excelente que tem autonomia criativa suficiente para fazer as escolhas certas em relação ao personagem que eu ofereci a ele: um homem que está aprendendo a lidar com o estrelato. E aquele é um universo cruel. Basta você mergulhar na literatura de F. Scott Fitzgerald, o autor de O Grande Gatsby, que trabalhou no cinema nesse início do século XX, para entender a selvageria que foi a Era dos Estúdios. Ali, ideias eram propriedades das grandes companhias cinematográficas, não dos diretores. Já eu sou fruto de um tempo onde os filmes são responsabilidade dos cineastas. A diferença é que, no meu caso, só o que eu faço é deixar quem sabe de verdade sobre cinema trabalhar em paz, ou seja, os fotógrafos, os atores...
O que levou o senhor a esta Hollywood clássica, aos anos 1930?
Eu não sou uma pessoa saudosista, daquelas que consideram o passado um lugar perfeito. Não gostaria, por exemplo, de ter vivido em um mundo onde não houvesse penicilina. Mas eu tive Hollywood como minha babá e nada pode mudar isso. O que acontece aqui é algo relativo à tradição: se você quiser entender como o cinema se estabeleceu como indústria, precisa revisitar a época na qual os estúdios mandavam na criação, tendo peixinhos pequenos do processo artístico nadando entre tubarões. Os agentes dos estúdios, por exemplo, eram figuras de muito poder, com secretárias lindas como estrelas de cinema. Era esse clima que eu queria. Um clima no qual obras-primas foram geradas.
Mas como o senhor se reportou ao cinema americano dos anos 1930 na hora de construir a narrativa? Houve diálogo com algum cineasta específico daquela época para criar a linguagem do filme?
Essa linguagem veio da literatura, porque eu tentei construir um filme que se parecesse com um romance sobre relações familiares e satélites amorosos. No fundo, Café Society é sobre como a família de Bobby se estrutura e se redefine conforme ele amadurece. E essa estrutura de romance seria melhor delineada se eu fizesse um filme narrado. E narrado por mim mesmo, já que eu, como autor, sou uma espécie de escritor dessa história.
Entra década, sai década, em seus 50 anos de cinema, e o senhor está sempre falando do amor. O que de novo para se falar sobre o verbo amar?
Talvez eu seja um romântico, uma vez que eu fui educado pelo cinema, num tempo onde a gente crescia às voltas com histórias de amor. Tenho certeza de que eu não sou um romântico como os personagens do Clark Gable, um ator que em E o Vento Levou... e tantos outros filmes encarnou um ideal romântico épico. Eu sou um romântico que erra, que vacila... mas alguém com a percepção de que amar pode ser divertido e doloroso. Aliás... todas as histórias têm algo de cômico e um quê de dor. O que vai prevalecer? Bom... isso vai depender da maneira como se encara a vida. E a palavra “amor”, indefinível para mim, ela pode ter vários sentidos. Um amigo é um indício de amor. Pais e mães amam... do jeito deles. Eu não tenho mais idade para ter certezas absolutas. Aos 80 anos, eu só tenho a certeza de que é bom fazer exercício físico e comer direitinho.
Existiria um “método Woody Allen” de dramaturgia? Como o senhor escreve seus roteiros?
Não tem método. Tem um processo de guardar ideias. Às vezes, eu tenho uma ideia, rascunho e guardo na gaveta. Um dia, ao mexer nas anotações, percebo que aquela tal ideia esparsa pode caber num projeto que estou começando. O que vale é a atenção à equipe. Eu tento me cercar dos melhores. Neste filme, por exemplo, vi que o Vittorio Storaro estava livre e resolvi convidá-lo. Tive a sorte de ele aceitar. Daí é só deixar ele fazer o trabalho dele e não atrapalhar.
(Cafe Society, 2016, 96 minutos)
Roteiro e Direção
Woody Allen
Direção de Fotografia
Vittorio Storaro
Elenco
Jesse Eisenberg
Kristen Stewart
Steve Carell
Parker Posey
Blake Lively
Corey Stoll
Jeannie Berlin
Ken Stott
Tony Sirico
em cartaz no
Cinespaço Miramar Shopping
e no Roxy Iporanga 4
No comments:
Post a Comment