Saturday, July 8, 2017

CAFÉ & BOM DIA #65 (por Carlos Eduardo Brizolinha)



A primeira vez que entrei num cinema foi pelas mãos de minha avó, tinha eu seis anos de idade. Não era um filme apropriado para minha idade, tanto é que algumas imagens minha mente nunca conseguiu apagar. Fui outras tantas vezes, não havia quem ficasse comigo, então lá ia eu ao cinema com minha vó. Anos depois fui companheiro de muitas noitadas assistindo filmes das décadas de 30, 40. 50. Nesses tempos virei fã de Jean Arthur, Loretta Young, mas sempre fui encantado com Betty Davis. Minha vó se derretia com Charlton Heston. Minha mãe conhece muito e está ai Argemiro Antunes para confirmar minha afirmação. Creio que não haja filmes dos anos 40 e 50 que desconheça diretor e elenco. Montgomery Clift, Sinatra são deuses para ela. Nos anos 60 comecei a me interessar por filmografias, então Capra, Kazan, Monicelli, Fellini, Bergman, Mazzaropi, Person, Pedro de Andrade, uma infinidade de obras. Veio o videocassete e com Maurice Legeard, Marcos Capalbo vieram novos caminhos, cinema japonês, Russo. Cheguei num ponto que não havia mais lugar para filmes e estava entrando o DVD, razão pela qual me desfiz de quase todos os filmes, 6 aparelhos de videocassete, rebobinadores, chaves de parafuso, produtos para tirar mofo. Voltei a montar uma videoteca, desta feita mais enxuta. Ocorre que o cinema ganha da literatura no quesito criatividade com qualidade. É a única mão que aceito para me atualizar.


Tempos atrás me desfiz de quase todo meu acervo de filmes. Considerei que 100 filmes seriam bons companheiros até o fim da minha passagem pela terra. No início desta semana não resisti e arrematei um lote de 500 filmes. Não sei se sou compulsivo, mas o fato é que tenho um prazer tão grande por livros e filmes, direi hipnótico, refletidamente não tenho dentro de mim o perfil do " Alfarrabista " de Gustave Flaubert, não estou em busca de primazia. Estou fazendo esse registro não para minimizar o impulso, mesmo porque meus amigos Paulo e Argemiro tiveram o prazer de escolher com inteira liberdade alguns títulos. Por outro lado, no acervo vieram muitos, mas muitos musicais. Meu psicanalista fora do palco profissional ponderou ser edipiano quando falei do meu prazer de ter dado esses musicais para minha mãe. Esses musicais foram o top de uma geração nos anos 40, base do prazer da geração da minha mãe. Ver esses musicais perfilados, sabendo que está cada vez mais difícil tê-los disponíveis me impulsionou. Tudo que possa escrever ou falar perde para o brilho nos meus olhos, nos de Paulo e Argemiro, quiçá de minha mãe. 


Aparício Torelly, o Barão de Itararé, é autor de máximas como "Um homem que se vende recebe sempre mais do que vale". Em 1934, fundou o Jornal do Povo. Nos dez dias em que durou, o jornal publicou em fascículos a história de João Cândido, um dos marinheiros da Revolta da Chibata, de 1910. O barão foi seqüestrado e espancado por oficiais da Marinha. Depois disso, voltou à redação do jornal e colocou uma placa na porta onde se lia: "Entre sem bater". Militante e um dos fundadores da Aliança Nacional Libertadora, foi preso pela polícia política de Getúlio Vargas e ficou na Casa de Correção durante todo o ano de 1936. Ali conviveu com Graciliano Ramos, que descreveria o encontro dos dois na cadeia e o drama de centenas de presos políticos em "Memórias do Cárcere". Durante seis anos, a partir de janeiro de 1938, publicou no "Diário de Notícias" a coluna "A manhã tem mais. Pablo Neruda, o poeta chileno, que lhe dedicou estes versos: "Ao Barão de Itararé / um grande entre os grandes / com respeito o saúda / de pé / o poeta dos Andes/ Neruda. Convidado pelo líder comunista Luiz Carlos Prestes, Aporelly começou a escrever na "Folha do Povo", junto com o poeta Carlos Drummond de Andrade, o pintor Di Cavalcanti e o escritor Jorge Amado. Suas tiradas, como: "A estrela de Belém foi o primeiro anúncio luminoso" ou a confusão que o teria feito aderir ao integralismo, cujo lema era "Deus, Pátria e Família!", e que o barão teria entendido como "Adeus, pátria e família!". O Barão faz falta neste momento em que nos sentimos obrigados a escolher entre Ali Babá ou os 40 ladrões e O ladrão e os 40 Ali Babás.


Clássica e sarcástica, esta obra, escrita no século 19 pelo espanhol Pedro Felipe Monlau sob o pseudônimo D. Dimas Camándula, pode atravessar os próximos séculos sem perder uma linha de sua desconcertante atualidade. Afinal, trata de um tema que jamais saiu da berlinda em toda a história e parece revigorar-se a cada dia: a propensão humana ao roubo, que, para o autor, é inata e comum a todos os mortais. Ele provoca: “Que homem não haverá infringido sequer uma vez em sua vida o sétimo mandamento?”. Camándula esclarece, porém, que há duas categorias de ladrões – a de ladrões “normais” e a de ladrões “excepcionais”, informação fundamental para justificar a obra. Dirigido aos ladrões “normais”, os “homens de bem”, o livro apresenta-se como manual prático para ajudá-los a se prevenir da ação malévola do outro grupo. “A primeira de todas as precauções é estar muito atento e lembrar a todo instante de que todos somos ladrões, que a ocasião faz o ladrão”, escreve o autor. Depois de expor suas intenções e situar o ambiente de roubalheira – a vida como um perpétuo combate entre ricos e pobres, entre os que têm e os que não têm -, Camándula passa a descrever toda sorte de roubos, golpes e golpistas, numa infindável galeria de tipos que ainda hoje assombram os ladrões “normais”. Na enorme lista, não faltam os furtos de livros, aqueles que, emprestados a amigos, jamais retornam. Estes, porém, foram elencados entre os “roubos decentes”. Camándula ainda defende o direito autoral, no caso o seu, estampando, antes do prólogo, uma advertência aos que eventualmente pretendessem reproduzir A arte de roubar sem autorização ou pagamento. Na conclusão do livro, porém, ele reproduz um artigo surrupiado. Houvesse escrito nos dias atuais e fosse ele brasileiro certamente faria de todos os ladrões que pesquisou inexpressivos diante do que estaria vendo por aqui.


VOLTAIRE - O AMOR COMPARADO
Queres ter uma ideia do amor, vê os pardais do teu jardim; vê os teus pombos; contempla o touro que se leva à tua vitela; olha esse orgulhoso cavalo que dois valetes teus conduzem à égua em paz que o espera, e que desvia a cauda para recebê-lo; vê como os seus olhos cintilam; ouve os seus relinchos; contempla os seus saltos, cambalhotas, orelhas eriçadas, boca que se abre com pequenas convulsões, narinas que se inflam, sopro inflamado que delas sai, crinas que se revolvem e flutuam, movimento imperioso com o qual o cavalo se lança para o objecto que a natureza lhe destinou; mas não tenhas inveja, e pensa nas vantagens da espécie humana: elas compensam com amor todas as que a natureza deu aos animais, força, beleza, ligeireza, rapidez. Há até mesmo animais que não sabem o que é o gozo. Os peixes escamados são privados dessa doçura: a fêmea lança no lodo milhões de ovos; o macho que os encontra passa sobre eles e fecunda-os com a sua semente, sem saber a que fêmea eles pertencem. A maior parte dos animais que copulam só têm prazer por um sentido; e, assim que esse apetite é satisfeito, tudo se extingue. Nenhum animal, com excepção de ti, conhece os entrelaçamentos; todo o teu corpo é sensível; os teus lábios, sobretudo, gozam de uma volúpia que nada cansa, e esse prazer só pertence à tua espécie; enfim, tu podes a qualquer tempo entregares-te ao amor, os animais têm o seu tempo específico. (...) Por isso, estás acima dos animais; mas, se gozas de tantos prazeres que eles ignoram, em compensação quantas tristezas os animais não fazem ideia!

CAFÉ...CAFÉ....CAFÉ E BOM DIA

 

Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta
é poeta e proprietário
da banca de livros usados
mais charmosa da cidade de Santos,
situada à Rua Bahia sem número,
quase esquina com Mal. Deodoro,
ao lado do EMPÓRIO SAÚDE HOMEOFÓRMULA,
onde bebe vários cafés orgânicos por dia,
e da loja de equipamentos de áudio ORLANDO,
do amigo Orlando Valência.




No comments:

Post a Comment