Friday, September 15, 2017

CAFÉ & BOM DIA #74 (por Carlos Eduardo Brizolinha)



Em "A Teoria do Romance", Lukács (2000) retoma o tempo em que bastavam os mitos para que se obtivessem todas as explicações. Esse era, pois, um tempo sem dúvidas, sem necessidade de respostas. Delineava-se, assim, o contexto em que surgiu a epopeia: o mundo grego, apresentado como homogêneo e fechado, ao contrário do mundo atual que, cada vez mais vasto e rico, perdeu em totalidade o que ganhou em abrangência. O homem rompeu com a harmonia cósmica, e o mundo passou a apresentar-se como uma estrutura incoerente, incompleta. O que difere a epopeia do romance, portanto, é o fato de que esse último pertence a uma época em que a totalidade da vida já não é mais evidente, ao contrário dos textos épicos, que nos apresentavam uma totalidade acabada em si mesma. Faz hoje pouco mais de uma semana que estou lendo Vassili Grossman " Vida e Destino ", sempre desdenho de comparações, este é comparado com Guerra e Paz do Tolstoi. A simetria lembra os problemas humanos ligados com a guerra. É um livro corajoso, consumiu uma década para ser escrito, duas para ser publicado e mais três para ser liberado pela politica do seu país. Aproximar Nazismo de Stalinismo é um ato de coragem que produz efeitos de reflexões tal como Tolstoi produziu em Guerra e Paz pela guerra Napoleônica e Grossman testemunha da batalha de Stalingrado. É um livro denso, duro, dramático e amargo. Um livro.



Allan Poe formulou a estética da história de Horror sobrenatural de forma magistral e a medida que via desfilar no palco do congresso os personagens mais bizarros de De la Mare, M R James, Redcliffe, Fouqué, Maupassant, Lovecraft comecei a perder o domínio das minhas reações. O horror sempre existiu e tem tenaz vigor, surge como se para aliviar a mente de certas formas fantasmais. Dickens escreveu narrativas de pavor, mais, quem não leu o poema tétrico de Browning " Childe Roland " ou " A Volta do Parafuso " do H. James? Ora, a medida que via infindos personagens apavorantes desfilando num circulo com atmosfera de terror sufocante, expressando com solenidade e seriedade adequada a insanidade, confesso que a razão como minha unica forma de defesa contra as agressões do caos e destes demônios vindos de algum espaço insondado, já estava me fazendo buscar algo forte para beber na tentativa de assentar meu descontrole. Tenho a mais absoluta certeza que Poe não conseguiria dar uma solução estética a nossa criação coletiva, ainda que tenha sido ele um mestre na arte do sobrenatural. Não creio lhe ter ocorrido colocar tantos monstros num cenário só e com todas as mazelas distribuídas de forma equânime oriundas de todos os cantos da nove estações do inferno.




Tenho muitos livros que não li, sei porém terem algo a dizer que merecem ser lidos. Como não leio por ordem de aquisição, alguns dormem silenciosos, mas nunca esquecidos. Ismael Kadaré, autor Albanês nascido em Gjirokaster, 28 de Janeiro de 1936 me surpreendeu positivamente. O que sempre ouvi da Albânia foi rebaixamento pelo regime politico, mas nossos olhos uma vez direcionados para as singularidades culturais dão de encontro com um exotismo encantador. " Abril Despedaçado " filme de Walter Salles é baseado em Kadaré e dá bem uma ideia da força narrativa do autor, sempre guardo prudência ao comparar filme com livro. " O General do Exército Morto " livro de 2004 traz o cenário do final da Segunda Guerra quando o exército italiano sofre revés no território albanês. Um general e um padre chegam a A Albânia para resgatar soldados mortos no combate. O roteiro de acontecimentos nos faz rir, passar por atos heroicos, dramáticos e trágicos. A narrativa nos oferece uma visão clara das diferenças deste povo de tradição milenar que se contrapõe se comparada ao que entendemos por europeização, mas no sentido antropológico saímos ganhando com a leitura de Kadaré.




Os anos 60 foi poente para muitos mestres das artes, mas foi nascente de outros tantos. Década refletora, descobriu, captou, questionou, modificou e auto questionou. Nada foi proibido do lado ocidental e derrubou conceitos colocando um carro amassado como escultura, fez com que um sono de oito horas virasse filme, histórias de quadrinho pousar nas paredes de galeria de arte, assim como latas de sopa e coca cola. Gritos exasperantes ser som em disco, enfim abriu espaço para tudo. Década de descoberta e redescobertas. A música foi definidora, pois deu voz alta para se desprender de tradições e Cage, Stockhausen com panelas, carros se chocando, Beatles com roncos de porcos. Descobriu que o meio é a mensagem. O Living Theatre com audácia sexual e somo Rauschenberg chocando uma Bienal para ser engolido e se transformar em vestido, paginação de revistas, decoração de bar. Quem imaginaria ver cinema underground de Andy Warhol com 25 horas de projeção ou Robert Beer com um minuto. O inconformismo, subversão com formas estranhas em todos os campos da arte marcou artes desfeitas e rompidas. Posso acrescentar o teatro que sai do espetáculo anestesia e faz entrar o teatro choque. Me apraz olhar a tatuagem da minha formação desenhada nos anos 60, confesso ficar assustado quando comparo com o dias da segunda década do século XXI. Pois é Mino Carta e Zuenir Vnerura, não sei dizer se o elevador sobe ou desce.




Dorothy Parker (Dorothy Rothschild, era o seu nome) nasceu em West End, New Jersey, em 1893. Em 1914, vendeu o seu primeiro poema para a revista Vanity Fair. Dois anos depois foi contratada pela revista Vogue; em 1917 passou a escrever crítica de teatro para Vanity Fair. Os seus contos passaram a ser publicados em 1925 pela The New Yorker, criada nesse ano; para essa mesma revista passou a escrever resenhas de livros em 1927. Dois anos depois ganhou o prêmio O. Henry pelo seu conto Big Blod, que a escritora incluiu nos seus livros de contos: After Such Pleasures (1933), Here Lies (1939) e Collected Stories (1942). Parker seguiu escrevendo contos, poemas e crítica, que foram publicados no seu país nos anos que se seguiram, sempre com grande sucesso, o que não ocorria com o que mais gostava, suas peças teatrais. Dorothy Parker também escreveu roteiros para Hollywood, dentre eles a Star Is Born (Nasce uma Estrela), com indicação para o Oscar em 1937 (a escritora passou a detestar Hollywood, a ponto de recusar-se pronunciar esse nome, substituindo- por “lá”). A escritora foi amiga e também a contista preferida do erudito crítico literário norte-americano Edmund Wilson, autor de Axel's Castle (O Castelo de Axel). Quando Dorothy Parker foi entrevistada pela The Paris Review, no pequeno quarto do hotel em que morava, no centro de Nova York, dentre as muitas perguntas, que lhe fez a entrevistadora da revista, uma foi se é vantagem a segurança econômica para o escritor; Parker respondeu-lhe: "Sim. Ficar dura não faz bem nenhum, a menos que você seja uma espécie de Keats. Os que escreviam bem nos anos 20 tinham uma vida confortável. Quanto a mim, gostaria de ter dinheiro. E gostaria de ser uma boa escritora. Essas duas coisas podem se juntar, e espero que se juntem, mas, se for pedir demais, prefiro ter dinheiro. Odeio quase todos os ricos, mas acho que eu seria adorável. No momento, porém, gosto de pensar na observação de Maurice Baring: “Se você quer saber o que o Senhor pensa do dinheiro, terá apenas de olhar para aqueles a quem Ele o dá”. Sei que não ajuda muito quando o lobo bate na porta, mas é um consolo". Dorothy Parker morreu de um ataque cardíaco no Hotel Volney, em Nova York, em 1967, aos 74 anos, deixando obras poéticas, contos e crítica literária da maior importância. No Brasil, foi publicado pela primeira vez o livro de contos Big loira e outras histórias de Nova York. Edmund Wilson, ficcionista e crítico literário famoso, dizia sobre os contos da talentosa escritora da era do jazz dos anos 20 e 30: “Os contos de Dorothy Parker continuam hoje tão agudos e engraçados como na época em que foram escritos." E, para F. Scott Fitzgerald, Dorothy Parker era "A melhor escritora de sua geração."




Neste último sábado senti muitas dores no corpo e uma forte sonolência. Previdentemente contatei a Home Care para me conduzir a base aérea com a finalidade de me encaminhar de helicóptero ao Hospital Sírio Libanês. Fui atendido por uma equipe de especialistas e com eles uma serie exaustiva de exames. Foi diagnosticado um tipo de vírus mutante oriundo da estrela XLZ 673 que provoca reações inenarráveis. Decumbere Dorsum é o nome dado ao que infestou meu sacro corpo. Já retomei minhas atividades ainda que com rigores medicamentosos a base de Café e apoio psicológico dos meus inimigos.


BOM DIA SÓ É BOM DIA SE TIVER CAFÉ


Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta
é poeta e proprietário
da banca de livros usados
mais charmosa da cidade de Santos,
situada à Rua Bahia sem número,
quase esquina com Avenida Mal. Deodoro,
bem ao lado do Empório Homeofórmula,
onde bebe diversas xícaras de café orgânico
ao longo de seu dia de trabalho.


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