Friday, October 6, 2017

COISAS DO BRASIL: HISTERIA IMBECIL (uma crônica de Álvaro Carvalho Jr.)



A sociedade está doente. Refiro-me à sociedade como um todo, coisa mundial. Os fatos nos mostram o chinesinho maluco construindo bombas (prá que?), discutindo com outro louco; este, um ariano doentio que sonha em construir um muro para proteger seu País, ação que já caiu na dúvida: para proteger seu País ou impedir que seus loucos invadam o vizinho? E aqui, em terras tropicais, pudicos de plantão (totalmente histéricos, diga-se de passagem), chegaram à conclusão de que nudismo é indecente. Pior, obsceno. Isso, depois de tantos anos, depois de lutas e mais lutas politicas, depois de enfrentarmos péssimos governos, déspotas no poder, uma ditadura militar, atingirmos a democracia e, chegarmos ao ponto mais alto da imbecilidade: uma lei que permita às mulheres a amamentação em público. Pode? O mais nobre ato do ser humano foi considerado indecente por meia dúzia de doentes mentais...

Nós, humanos, somos iguais, exatamente iguais, apenas em dois momentos: o da concepção e o nascimento. Na concepção define-se o sexo e no nascimento, apenas por alguns minutos, a igualdade é pétrea: nascemos nus! No momento que que somos protegidos por mantas e roupas, a desigualdade começa a se transformar numa realidade que carregaremos pela vida inteira: uns terão muitas roupas, outras quase nenhuma. Esse é um fato claro, que não dá nem prá discutir. E com a vitória da desigualdade, formamos uma sociedade à sua imagem e semelhança. Portanto, o que há de errado com a nudez, aquela que nos iguala, aquela que não tem conta no banco?

Assim, os fatos que ocorreram no MAM-Museu de Arte Moderna de São Paulo, são assustadores. Não se viu nada de indecente, nada de imoral, muito menos de sensual, no fato de um homem nu ser visto e até tocado por crianças. A ignorância, o preconceito atingiram níveis assustadores, como se estivéssemos a passos largos gerando uma nova Inquisição, uma caça às bruxas e que teve seu ápice no momento em que "famílias defensoras da tradicional família", chegaram a fazer um documento para o fechamento do museu. É difícil de compreender. Na novela das 20 horas (que só meça às 21 horas), essas mesmas famílias, tão pudicas, certamente não impedem seus filhos de assistirem cenas bem mais picantes, diariamente. Lá estão homens de bustos nus e mulheres com roupas mínimas sendo idolatrados e admirados. Que tipo de moral é esse?

Os líderes dessas famílias deveriam voltar aos bancos escolares. Uma lidinha na carta de Pero de Vaz de Caminha, o escrivão da armada que descobriu o Brasil liderada por Cabral, faria muito bem. É um belíssimo exemplo do choque e da compreensão da nudez. Portugal de 1500, um País católico até nas entranhas, via a nudez como pecado. Em sua carta, porém, Caminha demonstra incômodo com a situação, mas, em nenhum momento, é desrespeitoso ou exige que os índios se vistam como os portugueses. Pelo contrário, ainda coloca em dúvida a beleza de suas patrícias portuguesas:..."uma daquelas moças tinha daquelas tintura, de fundo acima, a qual, certo, era tão bem feita e tão redonda, e sua vergonha, que ela não tinha, (era) tão graciosa que a muitas mulheres da nossa terra -vendo-lhes tais feições- faria vergonha, por não ter a sua como ela".

Caminha ficaria desapontado com o comportamento desses pudicos de plantão. Nudez não é obscena. Nudez não é sexo. Nudez não é pecado. Obsceno é levar dinheiro sujo na cueca; obsceno é desviar dinheiro de merenda escolar; obsceno é dividir uma sociedade em "nóis e eles" pelo poder; obsceno é legislar em causa própria; obsceno é usar o governo e o poder para se defender; obsceno é matar os sonhos de uma população; obsceno é financiar partido com dinheiro público; obsceno é ver os defensores do atraso criarem fatos para impedir a modernização do Pais; obsceno é impedir milhares de crianças de frequentarem uma escola decente; obsceno é o salário das professoras primárias; obsceno é defender a impunidade; obsceno é enfrentar todos os dias o descaso com que os políticos deste País nos tratam.

Não sei onde vamos chegar. Gostaria de saber como esses pudicos se comportam com seus filhos nos vestiários de clubes, academias e derivados. Com essa mente doentia serão bem capazes de, amanhã ou depois, defenderem o uso da burca, barba para os homens, saiais ao nível do chão e outra tonterias. Claro, eles defenderão a família e tentarão ligar a nudez à pedofilia, uma loucura sem limites. Nem vale a pena discutir isso. Mário de Andrade, um de nossos maiores poetas, também ficaria indignado e desapontado com essa histeria imbecil e louca. Tanto que em um soneto maravilhoso, uma obra-prima, ele deixa bem claro sua posição:

"Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio.
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português".

Pois é, caro Mário, realmente foi uma pena...

Álvaro Carvalho Jr. é jornalista aposentado
e trabalhou para vários jornais e revistas
ao longo de 40 anos de carreira.
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quando quer e quando sente vontade,
pois, como dissemos acima,
Álvaro Carvalho Jr. é jornalista aposentado.

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