Saturday, April 8, 2017

CAFÉ & BOM DIA #57 (por Carlos Eduardo Brizolinha)



Como afirma Arlindo Daibert (1995)*, artista plástico e ensaísta, “palavra e imagem sempre estiveram em contato ao longo da história da pintura ocidental, quer através das legendas e das inscrições da pintura medieval ou do primeiro renascimento; quer de maneira mais sutil e dissimulada, nos títulos que acompanham as pinturas, explicitando, ampliando ou restringindo o poder narrativo das imagens”. O célebre quadro Ceci n’est pas une pipe [Isto não é um cachimbo], do pintor belga Réne Magritte; a relação entre a poesia do surrealista Murilo Mendes e a obra do artista plástico Ismael Nery; os romances de Graciliano Ramos e os quadros de Candido Portinari; ou, em uma mesma obra, como em The Scallop Shell: “Notre avenir est dans l’air” [A concha de vieira: nosso futuro está no ar], de Pablo Picasso. Voto por lembrar Baudelaire e Constantin Guys, K. Huysman, Zola, Balzac e mais, buscando na história a origem da relação entre imagem e palavra, chega-se ao pensador e poeta latino Horácio (65-68 a.C.), que teria sido o primeiro a estabelecer a comparação entre essas duas modalidades artísticas, ao afirmar: “como a pintura é poesia”. Já no século XVII, o pintor francês Charles Alphonse Du Fresnoy aprofundou essa relação: “Um poema assemelha-se a um quadro; deste modo um quadro deveria também assemelhar-se a um poema… Um quadro é muitas vezes considerado como poesia muda; e a poesia um quadro falante”. No Renascimento, o italiano Giotto usava textos bíblicos como inspiração para seus quadros. A internet é uma ferramenta maravilhosa para transformar informação em conhecimento sem cobrar débitos intelectuais. Portanto querido amigo, sou um cético racional, não me enquadro no antropocentrismo paroquial e arte para mim é vida. Rodin tinha uma proposição, todos deveriam aprender um oficio artístico. Não tive a possibilidade, mas sou um intelectual com a força do sentido inicial do termo ou seja, um amante da arte pelas emoções simpáticas. Olhos, gosto e ponho na minha página do FB. Ciente das minhas limitações, vaguei pelo verso de Pessoa. De algumas artes gosto pelas qualidades, de outras gosto pela falta das mesmas qualidade e de outras ainda gosto simplesmente por gostar.


Muitos anos atrás li alguns volumes publicados pela "Coleção Saraiva" e tantos outros do "Circulo do livro de São Paulo" organizado pelo Afonso Smith. Confesso não lembrar se li Cyrano de Bergerac numa coleção ou noutra. Tempos depois a Editora Abril publicou uma serie de textos para teatro batizada com " Teatro Vivo ", entre os autores publicados Edmond Rostand com " Cyrano de Bergerac ". Obviamente que considerei haver um elo, mas o escritor Cyrano não tinha e não tem nada no personagem Cyrano de Rostand. O que levou Rostand escolher para um personagem tão romantico? Lendo Italo Calvino reunindo textos para argumentar leveza numa conferência em Harvard fala de Cyrano, o escritor. Italo Calvino abre considerando Cyrano extraordinário e propõe que seja mais lido. Em minha longa jornada com livros confesso que só em uma oportunidade tive um volume de Cyrano que encontrei casualmente . Voltando ao Italo, esse mestre das letras aponta ser Cyrano - autor, o primeiro e verdadeiro precursor da ficção cientifica, gênero que li muito pouco, ainda que tenha tido a coleção " Argonauta " cuja qual Cyrano não figura. A argumentação de Italo ativou um vulcão de curiosidade em mim quando afirma a qualidade intelectual e poética além do sensualismo de Gassenai ( nunca ouvi falar ), ainda fala de vapores de Copérnico no que tange astronomia e da nutrição da filosofia natural de Giordano Bruno, Campanella, e Cardano ( Não conheço ). Italo consegue fustigar a curiosidade, mas ainda que mal me pergunte, em que momento Rostand resolveu batizar de Cyrano o homem que cativou Roxane? CAFÉ E BOM DIA


Dickens trata da sociedade inglesa durante a Revolução Industrial usando como pano de fundo a fictícia e cinzenta cidade de Coketown e a história seus habitantes. No seu décimo romance, o autor faz uma crítica profunda às condições de vida dos trabalhadores ingleses em fins do século XIX, destacando a discrepância entre a pobreza extrema em que viviam e o conforto proporcionado aos mais ricos da Inglaterra vitoriana. Simultaneamente, lança seu olhar sagaz e bem humorado sobre como a dominação social é assegurada por meio da educação das crianças, com uma compreensão aguda de como se moldam espíritos desacostumados à contestação e prontos a obedecer à inescapável massificação de seu corpo e seu espírito. Acompanhando a trajetória de Thomas Gradgrind, “um homem de fatos e cálculos”, e sua família, o livro satiriza os movimentos iluminista e positivista e triunfa ao descrever quase que de forma caricatural a sociedade industrial, transformando a própria estrutura do romance numa argumentação antiliberal. Por meio de diversas alegorias, como a escola da cidade, a fábrica e suas chaminés, a trupe circense do Sr. Sleary e a oposição entre a casa do burguês Josiah Bounderby e a de seu funcionário Stephen Blackpool, o resultado é uma crítica à mentalidade capitalista e à exploração da força de trabalho, imposições que Dickens alertava estarem destruindo a criatividade humana e a alegria. Cabe dizer que o período que minha Mãe descansou temporariamente da luz solar, me fez encontrar um caminho luminoso na literatura inglesa.


SERVIDÃO HUMANA DE William Somerset Maugham nasceu em Paris, em 1874. Sexto filho do procurador da embaixada britânica, sua primeira língua foi o francês. Ficou órfão aos dez anos, quando o mandaram para a Inglaterra para viver com o seu tio, vigário de Whitestable. --- O garoto Philip, aleijado de um pé, fica órfão. Seu tio Carey, irmão de sua mãe, passa a cuidar dele. A partir de então convive em uma família impregnada de conceitos morais e dogmas religiosos que terminam por conduzi-lo a uma formação rigorosa que termina por rechaçar. A falta de independência financeira, já que não tinha idade para gerir a pequena herança deixada pelo pai, inibe as suas escolhas e com isso advém o sofrimento. Encaminhado a uma escola, para formação básica, é discriminado devido à sua deformidade. Rogou a Deus para curá-lo e como suas preces não foram atendidas acreditou que a sua fé não era suficientemente forte para merecer a atenção divina. Philip decide ir à Alemanha e ao retornar a Inglaterra encontra-se com a miss Wilkinson, filha de um vigário, hospede na casa dos tios. Terminou se envolvendo com a moça, apesar da diferença de idade entre eles. Contra a sua vontade, o protagonista é encaminhado para Londres para se tornar um aprendiz de contador. Sente-se sozinho e teve um desempenho desastroso. Acreditando na sua capacidade artística, resolve mudar-se para Paris e matricular-se em um ateliê de pintura, contudo, também, não logrou sucesso. Em Paris, conhece miss Price que o leva a ver obras de pintores famosos. Ao ser conduzido para apreciar “Gare St. Lazare”, o famoso quadro de Monet que retrata uma estação de trem, Philip, comenta com a amiga que os trilhos não estão paralelos. Price, por sua vez, responde: “Que importância tem isso? “


Retomo o veio de literatos esquecidos na minha estante com André Malraux. Mereceu atenção de Hannah Arendt que referendou sua contribuição para o pensamento contemporâneo. Minha edição de " A Condição Humana " deveras empoeirada recebeu o trato merecido. André Malraux nasceu em Paris em 1901, participou ativamente das maiores batalhas ideológicas deste século, desde o nacionalismo chinês à Guerra Civil espanhola e a luta de vida ou morte contra o nazismo. Militante de esquerda, ligado ao Partido Comunista Francês, se opos ao banimento de Trotsky e se rebelou contra o regime ditatorial de Stalin, na União Soviética. Entre 1958 e 1969, Malraux participou do governo do general Charles de Gaulle como ministro da Cultura. Morto em 1976. No livro " A Condição Humana " Tchen, um dos protagonistas, mata um fornecedor de armas e toma consciência que a luta tinha tornado o seu destino irreversível. A morte era tida como certa, diante da escolha que tinha feito. O texto, publicado em 1933, escrito como reportagem, pesa nas mãos muito pela construção dos diálogos que são cansativos, mas não perdeu a importância histórica e as questões morais, que tomam forma nos personagens, apesar de apresentadas numa narrativa fatigante, o texto merece ser lido.

Café et bonjour.



Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta
é poeta e proprietário
da banca de livros usados
mais charmosa da cidade de Santos,
situada à Rua Bahia sem número,
quase esquina com Mal. Deodoro,
ao lado do EMPÓRIO SAÚDE HOMEOFÓRMULA,
onde bebe vários cafés orgânicos por dia,
e da loja de equipamentos de áudio ORLANDO,
do amigo Orlando Valência.


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