Tuesday, March 12, 2019

CITAÇÕES E OCULTAÇÕES (por Marcelo Rayel Correggiari)


A vantagem de se tocar um ‘secos & molhados’ é que há certa informalidade no tratamento de pessoas & coisas.
Às vezes, era para ser leve, mas acaba não sendo.
Em outras, há peso, mas se procura alguma leveza.
O ‘mundão-de-meu-Deus’ não está para brincadeiras: show de ódio, raiva, xingamentos, intemperâncias, intolerâncias... e mais uma dúzia de péssimos sentimentos.
Em todas, uma espécie de ‘cagaço monumental’ contra as quase sempre costumeiras (e frequentes!) má-interpretações.
Os conteúdos não andam sendo o mais simples dos mundos. Logo, é preciso dar um jeito na bagaceira-transgênica para que a ópera não saia do tom.
Numa avalanche de informações diárias, há de se concordar que a ‘caozada’ se avizinha (fake news!). Em alguns casos, com o claro objetivo de destruir, por completo, a reputação de uma pessoa.
Contra isso, andam pintando, aqui e acolá, tentativas de se dar autoria aos conteúdos. A primeira abordagem sempre recai sobre as questões de ‘copyright’ (direito autoral). Algo bem longe de ser simples, simples, ‘simplérrimo’...
Quem acompanha direito & webesfera, já ouviu falar sobre os artigos 11 e 13 de uma lei de meios tramitando na União Européia que, em breve, entrará em vigor. Os dois artigos trazem liberdade para empresas de VOD e redes sociais de retirarem do ar qualquer conteúdo que contenha, por exemplo, dados & conteúdo produzidos (sob muito esforço & custo) por terceiros (leia-se empresas de comunicação, jornalismo).
Uma lógica para lá de simples: uma empresa de televisão gasta uma nota preta para colocar um informativo no ar, e a galera pega trechos inteiros das reportagens para colocar em seus próprios vídeos.
Sem contar que os canais de ‘vlogueiros’ se “monetarizam” volumosamente apenas repassando conteúdo no qual não gastaram um tostãozinho para produzí-lo.
‘Tá’ fácil, ‘né’?!
Pois bem, pelos tais artigos 11 e 13, se a empresa que fornece a hospedagem desses canais sacar a manobra sinistra e fizer nada, sofrerá consequências razoáveis. Ou seja, esses serviços & empresas terão, quase que obrigatoriamente, de tirar do ar conteúdos que contenham material produzido previamente por quem for.
E, então?! Censura? Defesa do direito autoral posto que o conteúdo foi produzido com grande esforço por uma empresa jornalística, que investiu uma dinheirama para ‘tornar carne’ tal conteúdo?!
Em que ponto a nossa prática do compartilhamento em redes sociais, até mesmo de links de notícias e reportagens especiais, não pode ser encarado com uma espécie de “pirataria”?!
Só que, agora, o ‘espírito de torquemada’ anda se alastrando de uma forma que, logo, logo, ter uma rede social pode ser encarado como delito, seja de transmissão ou de conteúdo.
A Google, detentora do Você Tubo (YouTube), na linha do “não indicar vídeos que contenham material de terceiros”, ampliou o tamanho da ‘pegada’ e pode, na maior, interferir no seu direito a entrar em contato com as coisas do mundo de acordo com o que você deseja.
Não indicar um vídeo desse ‘imagético’ merceeiro porque ele utiliza material dos outros e monetariza sua mercearia com algo que ele não produziu é até compreensível.
Agora, não indicar vídeo, e colocá-lo na 84ª posição após utilizar a ferramenta de busca, porque foi considerado por essa mesma empresa como “conteúdo tóxico” (ou inadequado), ruim para o(a) usuário(a), é um limite para lá de tênue e bastante perigoso.
É tirar do(a) usuário(a) o direito de procurar aquilo que bem entender por intermédio desse site (e sua respectiva ferramenta de busca). A empresa pode, de cima para baixo, achar “desenho animado” uma coisa altamente alienante (ou divulgador de ‘teses estapafúrdias’) e dificultar tanto a indicação quanto a busca dessa forma de conteúdo.
Se, por exemplo, a Google considerar ‘receita de bolo sem farinha’ algo que pode se tornar nocivo ao(à) seu/sua usuário(a), ele, além de não sugerir como ‘vídeo relacionado’, coloca na posição 132ª da busca mesmo que seja a postagem mais indicada e vista sobre esse assunto.
A lista atual, hoje, inclui temas como “cura milagrosa para doenças terminais (ou graves)”, “terra plana”, “11 de setembro”, entre tantos que a Google acredita ser apenas “... delírio da cabeça de algumas pessoas na face da Terra”.
Pois, então, essa setembrina mercearia propõe: beleza, querido(a) freguês(a)! Se você quiser saber se houve mesmo “teoria da conspiração” no 11 de setembro, você vai encontrar 131 vídeos de gente dizendo que “ah... isso é bobagem!” antes de você achar um vídeo que, seriamente, trata sobre o assunto?! E se você, querido(a) freguês(a), estiver a fim de, sei lá, saber finalmente do que se trata essa celeuma toda em torno da tal “terra plana”, você terá de se deparar com 213 vídeos de gente dizendo que você é doido(a) antes de achar alguém que procura informar cientificamente sobre essa possibilidade?!
O que a Google indicou nesses últimos tempos é que: a. ela acha que “terra plana”, “cura alternativa de doenças graves”, “teorias conspiratórias sobre 11 de setembro”, é coisa de ‘doidinho(a)’; b. exatamente por esse motivo, ela colocará na frente dos resultados de busca um quatrilhão de gente dizendo o contrário apenas para fazer o(a) querido(a) freguês(a) cansar e desistir de encontrar um vídeo que trate do assunto com seriedade e/ou base científica (de pesquisa).
Não é censura: é bem pior que isso! Ela pega todas as opiniões contrárias e faz uma ‘cortina-de-fumaça’ exatamente para que o(a) usuário(a) não encontre os vídeos mais populares e que são populares justamente porque tratam o assunto com seriedade e, às vezes, rigor científico.
Não é censura: é bem pior que isso! É contrasserviço! Não é censurar a “terra plana” ao dificultar todos os vídeos, mas pegar a opinião contrária e favorecê-la ao colocá-la na frente.
Perceberam o que está por vir?!
Do jeito que a coisa será feita, o interesse do(a) usuário(a) sobre certo tema (e a liberdade de declarar possibilidades!) pouco importará na disposição das apresentações dos ‘vídeos mais recentes’ ou ‘vídeos mais populares’. Se a Google, detentora do YouTube, decidir que mercearias são delírios de vossas cabeças, uma ideia sem pé, nem cabeça, que só traz desinformação e péssimas condições aos(às) seus/suas usuários(as), ela penderá em favor de todos aqueles vídeos que dizem que mercearia “... é doidice” e complicará tanto os resultados de busca quanto os ‘vídeos mais populares’.
Censura ‘mudérna’?! Porque a empresa, na boa, se defenderá ao declarar que “... que não fazemos censura! Apenas desfavorece vídeos de ‘conteúdos delirantes’ ao favorecer aqueles que afirmam que ‘tal tema’ é ‘delírio’. Afinal, não tiramos tais vídeos do ar!”.
Ah, ‘tá’! Cabe agora à empresa descrever o que devemos pensar?! Cabe à empresa ‘bater o martelo’ sobre “achismos”?! Ela realmente tem ‘bala na agulha’ para estabelecer qual tema é ‘delírio’ ou não?!
Perceberam que ela, ao ‘bel prazer’, pode, repentinamente, decidir que certa área é ‘doidice’ e fazê-la desaparecer da face da Terra?! E se a próxima área (ou assunto) afetada for a neurologia, a residência médica, a logística portuária, alguma pedagogia consagrada, fica como?!
Pois bem! Em algum ponto da história, independente do motivo, o sol girava em torno da Terra. Já pensou se a galera, naquela época, postasse vídeos afirmando que era o contrário?! A Google faria o quê?! ‘Meteria o loko’ e faria desaparecer dos olhos do(a) usuário(a) as versões que, nos dias de hoje, são a norma corrente?!
Perceberam o tamanho do desastre?!
Com qual base a empresa teria como afirmar que a Terra jamais giraria em torno do sol?! Ela é uma empresa de hospedagem de vídeos, não uma instituição científica que, por conta própria, teria como entender o quanto seria amalucada a ideia da Terra girando em torno do sol.
Perceberam o tamanho da nociva interferência em relação às possibilidades que podem virar informação exata lá adiante?!
Uma empresa de hospedagem de vídeo?! Se fosse a Nasa, até entenderíamos. Mas não é o caso! Ela não teria grande capacidade para interferir em quaisquer possibilidades humanas e científicas simplesmente trocando censura por favorecimento de clientes que postam aquilo que simplesmente é música aos seus próprios ouvidos.
Ou seja, vem osso duro de roer pela frente. Dependendo de como for, se pintar uma caça às bruxas, de repente, os(as) perseguidores(as) podem contar com a participação do site de hospedagem de vídeo para terminar de fazer o resto do “trabalhinho”.
É, por essas e outras, que às vezes fico a pensar que, em breve, ser merceeiro será, acima de tudo, um ato revolucionário.
“Enquanto Seu Lobo não vem”, os ‘brecinhos’ estão uma beleza, querido(a) freguês(a)! Algum café & colóquio nessa Mercearia que custa a pregar as pestanas diante de vários descalabros mundo afora.


Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 47 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É autor de Areias Lunares
(à venda na Disqueria,
Av. Conselheiro Nébias
quase esquina com o Oceano Atlântico)
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO

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