Friday, May 31, 2019

MUITO, MUITO DIFERENTE... E PARA PIOR! (por Marcelo Rayel Correggiari)



Cada país possui seu jeito: uns acertam mais, outros, bem menos.

Com o último dia de circulação do Expresso Popular nesta sexta, 31 de Maio de 2019, vi jornalistas e ex-empregados da casa lamentarem o fechamento do jornal.

O que, realmente, é lamentável mesmo que o "Expresso..." não seja mais um "modelo de negócio" pertinente.

Compreensível.

Vi algumas manifestações, aqui & acolá, sobre a efeméride de amanhã. Em alguns, o "... o Brasil encolhe...", em outras, "...o jornalismo está em crise...", nessa linha.

Algumas comparações com o tipo de jornalismo que se faz em outros lugares do planeta. Vira, mexe, cai na BBC como uma espécie de 'modelo a ser seguido'.

Opa! Por conta de uma amiga pessoal, a Srª Susan Lovell, "comissioner" da BBC Ulster (Irlanda do Norte), "... dessa empresa, eu conheço".

Começam, assim, "as jabuticabas", internacionalmente conhecidas como "delírio brasileiro".

Acreditem! Como o(a) brasileiro(a) "delira"... coisa de maluco!

Os municípios, no Reino Unido, são agrupados em 'county', um "condado". Por exemplo, se a Baixada Santista, com seu conjunto de cidades, recebesse uma classificação britânica, ela seria chamada, provavelmente de "County Down" (o "condado da baixada").

Um condado, lá, além de agrupar um conjunto de cidades, também é uma organização político-judiciária (uma espécie de divisão política do território com comarca judiciária). Sei, sei, sei... sei bem que é um troço difícil de explicar para o tipo de divisão territorial que há em nosso país.

Um conjunto de comarcas, lá, formam as regiões (Essex, Cumbria, Ulster, ...) que, bem mal comparando, seriam os nossos "estados" (São Paulo, Santa Catarina, Goiás, Bahia, ...).

Pois, vejam! A Srª Susan Lovell é "comissioner" de um desses "estados", o Ulster, se bem que, ultimamente, anda também trabalhando com a República da Irlanda (independente), ou seja, com toda a ilha da Irlanda.

O que é um(a) "comissioner"?

É a pessoa que tem a palavra final e a chave-do-cofre da empresa. Tudo o que você vê na TV e ouve nas rádios tem de ter o 'sim' desse(a) profissional. Tudo! Absolutamente tudo! Até a cotação do preço do papel higiênico da turma da reserva técnica e transporte da emissora tem de ter o 'sim' desse posto da empresa.

Tudo, gente! Tudo! Da qualidade do conteúdo à logística, tudo tem de ter o 'joinha' do(a) "comissioner".

Acima dos(as) "comissioners", o(a) presidente da BBC. Seria a única pessoa que 'breca' qualquer inconveniência de alguma(a) "comissioner". Tanto que as 'reuniões de cúpula' (presidente e "comissioners" das regiões) acontecem a cada quinzena, na sede, em Londres.

É, minha gente... 'cês num' têm ideia! É cada história...!

Aí, começam os 'delírios nacionais' de comparação (Brasil-sil-sil-sil-sil !!!). O primeiro, a BBC É UMA EMPRESA PÚBLICA! PERTENCE AO POVO DO REINO UNIDO! Aliás, um troço que não entra na cabeça dos compatriotas nem f... Compreensível: o máximo de TV pública que há no país são as 'TVs culturas' que são confundidas (com razão!) com TVs estatais (ou estaduais), mantidas por 'governos de estados' e, logo, a reboque do sabor político do(a) governador(a) de plantão.

Segundo: A TV NO REINO UNIDO É PAGA! TODAS! Mesmo que o sinal seja o tal "aberto", paga-se! Há uma taxa de pagamento anual mesmo que a TV que você assista seja de "sinal aberto".

A 'anuidade' é coletada e paga o funcionamento da BBC ao longo do ano.

Simples assim!

Não tem rainha, não tem primeiro(a)-ministro(a), nada disso! Recolhe-se o dinheiro do povo e se faz o conteúdo da emissora para o povo que financia, diretamente, essa emissora.

Uma ideia que não entra na cabeça dos compatriotas nem f...

Afinal, tudo aqui, no Brasil, é "feudo" de alguém: tem dono (como o caso do Expresso Popular). O modelo-de-negócio não anda bem, fecha-se 'a bagaça' e muda-se de ramo, se for o caso.

Aplica-se, no Brasil, o mesmo modelo de gerenciamento de negócio igualzinho às Capitanias Hereditárias, tanto para a 'coisa pública' quanto para a 'coisa privada'.

Pelo 'jeitão' da coisa, acho que nosso modelo anda meio falido, não?!

E tem gente que quer fazer a comparação...

... 'cês tão' em qual planeta, ou tomam qual remédio?!

Sem contar a avalanche de asneira que se produz no jornalismo brasileiro a respeito do Brexit. Aí, é de doer! "280% brasiliæ delirium".

O terceiro grande delírio jabuticabal: a última coisa que a BBC contrata é gente com bacharelado em comunicação social. Isso, para eles, pode ser 'veneno no sangue'. Susan Lovell é historiadora! Nunca estudou "jornalismo". Foi ser jornalista "na prática", lá dentro da maior e melhor emissora de rádio e TV do mundo.

Se você entrar na redação de uma BBC, certamente encontrará bacharéis em Letras, História, Geografia, Matemática, Física, Sociologia, Filosofia, Antropologia, Biologia, Química, Astronomia, menos "jornalista".

Nada mal para quem produz o conteúdo que produz, e tem a credibilidade que tem, não?! "Jornalismo", lá, para eles, pode ser um belíssimo sinal de "coisa de miopia".

Um belo conteúdo, afinal. Tão bom que aquelas coberturas jornalísticas e documentários ESPETACULARES que não podem ser passados na própria BBC são exibidos no famoso Channel 4, se eu não me engano uma associação de capital da BBC com a iTV.

O conteúdo do Channel 4 dá surra em qualquer um! Qualquer um! O jornal, a rádio e a TV brasileiros não conseguem sequer se aproximar da sola dos pés de um Channel 4.

Sei que os fatos são duríssimos! Mas... dados da vida!

Logo, não fiquem com medo da queda da obrigatoriedade do diploma de jornalismo para se fazer jornalismo: quem sabe, essa será nossa primeira grande oportunidade de se aproximar com o que há de melhor em termos de conteúdo ao redor do planeta.

Afinal, o "jornalista especialista", o que cursou o tal curso de comunicação social, pode não ter cultura, erudição, sequer bagagem, para um conteúdo que seja, de fato, relevante, coisa que a BBC dribla contratando o profissional de Letras, Literatura, Química, História, Geografia, ...

***

Lamento & lamentamos muito o fechamento do Expresso Popular, mesmo sabedores que, de repente, o negócio anda mais 'no vermelho' do que 'no azul'. Lamenta-se pelas famílias que não terão mais o seu sustento num país com já tantos desempregados. Sempre é bom uma região como a nossa ter bastantes jornais e emissoras de rádio e televisão. Nunca é bom começo o fechamento de um jornal. Lamenta-se pelo desaparecimento da memória afetiva pertencente aos(às) profissionais que por lá passaram, alguns fundadores do jornal. É uma perda irreparável! Contudo, acho que chegou também o momento de se questionar se realmente estamos com "essa bola toda". Na minha humilíssima opinião, situações como a do fechamento do "Expresso.." mostram bem que talvez estejamos na "Idade das Trevas", sem qualquer visão de como as coisas funcionam ao redor do planeta, de fato. O sumiço da erudição, da Cultura, do bom trato com o 'fazer artístico' e de uma educação que nos permita à civilização andam mexendo demais com a nossa mentalidade (que, de tão péssima, nos coloca na situação de realmente duvidarmos se temos uma!). Não, meus caros e minhas caras, não é somente uma questão de educação e cultura. É uma questão de mentalidade!

Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 47 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É autor de Areias Lunares
(à venda na Disqueria,
Av. Conselheiro Nébias
quase esquina com o Oceano Atlântico)
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO

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