Sunday, November 5, 2017

CAFÉ & BOM DIA #79 (por Carlos Eduardo Brizolinha)



Harold Bloom me causa arrepios. Li anos atrás motivado por uma pessoa que respeito, também por ser crítico literário respeitado e referendado por cadernos de literatura. Não me decepcionou, mas não me surpreendeu. Antes de ler Bloom havia lido David Denby que embora seja crítico de cinema, no livro "Grande Livros" volta para a Universidade de Columbia para fazer o mesmo curso de Letras Clássicas que havia feito 30 anos antes. Pude então acompanhar o programa de formação que abre com Homero passa por Safo, Platão, Aristóteles, teatro grego, Virgílio, os grandes da Idade Média e o passeio termina com Beauvoir e termina em Virgínia Woolf. Há uma lista de leituras como apêndice que não incluí ninguém da América latina, África, Oriente Médio e Ásia. Sinceramente os arrepios que “O Cânone Ocidental” me causou pelo anglicanismo, afinal Bloom é professor em Yale, não me causou em “O Cânone Americano”. Não é uma história da literatura americana, fala do que considera espinha dorsal da literatura norte americana. Vale sua avaliação dos poetas, principalmente T. S. Eliot.




Giordano Bruno é desses seres humanos que fascinam. Me passou desapercebido até ver o filme de Guiliano Montaldo com atuações de Gian Maria Volonté - Giordano Bruno e Charlotte Rampling - Fosca, então parti para ler algumas poucas obras, duas para ser preciso. Formei a imagem de um homem sem sorrisos talvez pelo seu patente pessimismo. Viveu num período de paixões e do Concílio de Trento que espalhou Jesuítas prontos para denunciar livros suspeitos, culminando em muitas fogueiras. Bruno não escapou desses fatores. Li poucos autores do Século XVI, os que li confesso amar (Rabelais e Villon) e buscando algo para intercalar a leitura de outro autor eis que encontro ' O Castiçal ' de G. Bruno. Talvez a soma do que li mais o filme jamais imaginaria um homem que fizesse rir, tampouco ter texto de teatro. Peça de 5 atos centrada em três personagens, Bonifácio, Ascânio e Bartolomeu. Os três trilham em tramas paralelas para convergir numa única conclusão. Bonifácio em busca de um nigromante para obter favores para conquistar uma mulher fora do casamento. Bonifácio é um alquimista apaixonado que quer convencer outros a encontrar a pedra filosofal. Ascânio tem a presença mais curta na peça para desfilar sua ignorância e acaba enganado como todos os outros. Tudo acaba de maneira cômica. Bruno escreveu essa comédia num momento agitado, sete anos após ser acusado de heresia por defender que o sol era o centro do nosso universo e na pluralidade de mundos habitados. Contudo Giordano Bruno demonstra claramente cinismo , descrença e desprezo social. Acabou vítima da vulgaridade e boçalidade, presa de pensamentos cujo opositores precisaram calar.




Dias que preciso do irascível Mencken para gritar que Imoralidade é a moralidade daqueles que estão se divertindo mais do que nós. Preciso de Pitigrilli para por os pingos nos is e dizer que ' Sempre existiram drogas mais potentes, mais calmantes, mais tranquilizantes, mais alucinógenas do que todas as drogas da farmacopéia antiga e da farmacologia moderna. Essas miracle-drugs, essas drogas-milagre são as palavras '. Dias que preciso de Albert Camus, Miguel de Unamuno e E.M. Cioran, principalmente o aforístico Cioran considerando que No edifício do pensamento não encontrou nenhuma categoria na qual pousar a cabeça. Em contrapartida, que belo travesseiro é o Caos! Camus é o laço cor de rosa para embalar meu pessimismo, pois o termo “absurdo” está associado a Camus. Camus fez do caráter absurdo da existência o eixo central de sua análise sobre a condição humana no livro Mito de Sísifo.




Conheci a literatura de Ivan Junqueira através da relação da minha mãe com o escritor dinamarquês Per Johns. Junqueira passou a mandar seus livros pelo correio, além de manter correspodência escritas a mão. Não foram muitos livros, não li todos, mas dos que li me veio a memória 'Essa Música ' pois passeia pela morte. Tal como Junqueira morri muitas vezes. A primeira morte foi da infância, depois morreu a inocência, morreram sonhos, perspetivas, amores, amigos e parentes, cães e gato. algumas plantas. Neste ano vejo a morte da esperança enterrada de mãos dadas com perspectiva.



O sopro da vida brotou em águas amnióticas. Após o aviso das águas articulei meu primeiro som. Há um saco lacrimal lubrificando as emoções. Chorei me anunciando com líquidos vertidos dos olhos.Também há líquido subaracnóideo no cérebro e na medula espinhal, basta dizer que meu cérebro carrega 75% de água. Os líquidos transportam tudo dentro de mim A lágrima é liquida e a saliva também. O perdigoto é um líquido voador transportados pela sonorização do pensamento e foi com um beijo em você que estanquei. Beijo molhado, líquido. O esperma é liquido e o sexo é protegido por líquidos. Nasci 75% líquido, atravessei anos com 70% de líquido e vai chegando os dias que terei 50%. Caminho desidratando e certamente serei pó. Quanto estou com você somos 80 litros de água condensando vapores dos pulmões numa troca saudável de líquidos, bebemos líquidos para dominar as regiões mais quentes. Somos a soma de dois universos líquidos.


VOCÊ E MEU CAFÉ SÃO LÍQUIDOS PRECIOSOS. BOM DIA.


Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta
é poeta e proprietário
da banca de livros usados
mais charmosa da cidade de Santos,
situada à Rua Bahia sem número,
quase esquina com Avenida Mal. Deodoro,
bebe diversas xícaras de café orgânico
ao longo de seu dia de trabalho.



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