ilustração: Heikenwaelder Hugo/Creative Commons
A metafísica é como uma doença. Quem se deixa acometer por ela, enveredando pelo sem-fim que é a indagação da existência e do ser, está sujeito a ser comido pelas pernas ou acabar nas certezas estofadas da religião para se salvar do inferno glacial da dúvida. Como o ser é uma entificação idealizada, uma ideia, uma construção fantasiosa, a prática metafísica pode levar a um platonismo nefelibata, mas, também, a uma prática poética sujeita a todos esses riscos.
A metafísica é como uma doença. Quem se deixa acometer por ela, enveredando pelo sem-fim que é a indagação da existência e do ser, está sujeito a ser comido pelas pernas ou acabar nas certezas estofadas da religião para se salvar do inferno glacial da dúvida. Como o ser é uma entificação idealizada, uma ideia, uma construção fantasiosa, a prática metafísica pode levar a um platonismo nefelibata, mas, também, a uma prática poética sujeita a todos esses riscos.
Voltaire, na vivacidade crítica do Iluminismo e no seu peculiar senso de humor, definiu a metafísica como a “novela do espírito”. Tenho grande apreço por essa definição espirituosa, digamos assim, de Voltaire, pois ele bem define a metafísica como uma construção fantasiosa do ser. Além do que, seu senso de humor indica que a melhor saída para lidar com a existência, com o ser e seus subprodutos, é justamente a ironia, não acreditando nele, nessa idealização, e sim desmontando-a do corcel branco da fantasia que quer se cristalizar em pureza apesar de ser uma agonia.
A reflexão me ocorre a partir de uma constatação de que a prática poética, não lhe bastando ser crítica, incorporando como linguagem consciente a negatividade, ganha ainda mais potência sendo irônica neste tempo de aplainamento de todos os valores que engole com facilidade todas as platitudes.
Ou seja, não é possível condescendência alguma, nem à linguagem mesma e muito menos com relação ao próprio escritor que a explora. Quando Nietzsche afirmou o fim da maior das idealizações, “Deus”, com ela todas as outras seguiram juntas para o matadouro, como uma manada de deificações menores, restando para os artistas a constatação de que dali em diante seria por sua conta e risco.
Por isso, causa-me espanto quando leio muitos poetas contemporâneos que têm balizado sua escrita por uma agônica metafísica da linguagem, o que me leva a indagar sobre que sentido teria em ser metafísico neste tempo. Percebo, claro, uma forma contestatória ao tempo que se vive, o que dá a essas poéticas a negatividade desejável pela poesia, de se estar contra um sistema de consumo que transforma a todos e a tudo em mercadoria com uma rapidez antes inimaginável, motivo suficiente para agonizar até uma “barbie”...
Mas essas poéticas, por outro lado, correm esse risco da platitude, de ficarem restritas, com a metafísica, a deificações idealizadas que as restringem. Por isso seus poemas são marcados pelo excesso imagético, pelo tom adjetivado e por um onirismo que patina num vocabulário que é recorrente no uso de palavras como “morte”, “espelho”, “milagre”, “anjo”, “tempo”, “deus”, “deserto”, “abismo”, “silêncio”, “noite”, “oceano”, “ser”, “eu”, “outro” e por aí vai. Levando-se assim tão a sério, falta-lhes o riso.
(PUBLICADO ORIGINALMENTE EM 13 DE AGOSTO DE 2009)
Ademir Demarchi é santista de Maringá, no Paraná,
Ademir Demarchi é santista de Maringá, no Paraná,
onde nasceu em 7 de Abril de 1960.
Além de poeta, cronista e tradutor,
é editor da prestigiada revista BABEL.
Possui diversos livros publicados.
Seus poemas estão reunidos em "Pirão de Sereia"
e suas crônicas em "Siri Na Lata",
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