Prender palhaço é patético. O estado a que chegou o Paraná é esse, de ignorância total, sermos governados pela polícia na falta da política. Prender palhaço trabalhando, num festival de teatro, sob vaias e na frente de câmeras e numerosos jovens, é não ter mais noção das coisas. O palhaço Tico lá em Cascahell estava no lugar errado, na hora errada, diria o senso comum. Tal como disseram os familiares dos 18 mortos e 7 feridos que na semana que passou foram vítimas da maior chacina do ano, desta vez na periferia de Osasco e Barueri. Que lugar errado é esse, devemos perguntar? Um bar, a rua – o espaço público. Eis a constatação do que se tornou este país, um lugar em que não se pode estar livremente no espaço público porque se pode ser assassinado ou preso, quando não assaltado. Preso como o palhaço, porque em vez de uma polícia como todo país civilizado, temos uma polícia militar, criada durante o período da ditadura, com um modo de atuação truculento porque está preparada para a guerra e não para a atuação civil na sociedade. Prender palhaço está virando rotina assim como são rotineiras as chacinas, que fazem parte do dia a dia das periferias. A desta semana resultou numa carnificina cuja imagem mais chocante foi a de pessoas empurrando o sangue com rodos para o esgoto. Os mortos e feridos “estavam na hora e lugar errados” como um catador de lixo na noite de sábado, com outro que saiu ferido, na região de Parelheiros, quando apareceram vários homens encapuçados e os metralharam. Como esse reciclador de lixo, que deixou a mulher grávida e mais dois filhos, as biografias de todos esses mortos eram de pessoas com família, trabalhadores, desempregados, gente vivendo na periferia ou indo da periferia para a praça trabalhar de palhaço como o Tico, que reclamou que onde mora não há polícia, somente no centro abastado de Cascahell, comentário que foi transformado em desacato pela poderosa força de choque e cavalaria armadas para prender palhaços. No Estado de São Paulo tanto os moradores como os jornais apontam fortes suspeitas de que os encapuçados que estão causando as chacinas são policiais, fato que é comum há décadas, dada a forma como pensam e se organizam se perpetuando as forças militares no país. Este ano já foram dez chacinas e quase 40 mortos contra 75 no ano passado, ou 358 mortos por policiais somente este ano no Estado de São Paulo, um novo recorde. Por isso, o massacre dos professores no Paraná, que parecia ter sido o auge dessa lógica policial que está vigente também no Estado não foi o fim. É algo que continuará. Como uma pantomima teatral, polícia prendendo professores, palhaços e se as estatísticas forem claras, muitas constatações parecidas com as de São Paulo surgirão numa análise atenta. Como disse Eliane Brum, no El País, “Uma polícia militar num regime democrático já é uma contradição em si. A deformação estrutural prejudica os bons policiais – sim, eles existem – e mergulha a população das periferias no horror cotidiano, vítimas de uma guerra não declarada oficialmente, colocada em curso por agentes do Estado, cuja rotina de vinganças é exibida sem pudor em manifestações nas redes sociais, por parte dos membros da corporação, e tolerada por quem deveria puni-la. É preciso enfrentar a estrutura. É preciso formar uma polícia que cumpra a lei e proteja os cidadãos, em vez de assassiná-los”. Ou prende-los de forma desproposital como fizeram com o palhaço ou bombardearam, como fizeram com os professores.
onde nasceu em 7 de Abril de 1960.
Além de poeta, cronista e tradutor,
é editor da prestigiada revista BABEL.
Possui diversos livros publicados.
Seus poemas estão reunidos em "Pirão de Sereia"
e suas crônicas em "Siri Na Lata",
ambos publicados pela Realejo Edições.
Suas crônicas, que saem semanalmente
no Diário do Norte do Paraná, de Maringá,
são publicadas todas as quintas
aqui em Leva Um Casaquinho
Lúcido, excelente.
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