Sunday, January 1, 2017

O RELÓGIO (por João Cabral de Melo Neto)



Ao redor da vida do homem
há certas caixas de vidro,
dentro das quais, como em jaula,
se ouve palpitar um bicho.

Se são jaulas não é certo;
mais perto estão das gaiolas
ao menos, pelo tamanho
e quadradiço de forma.

Umas vezes, tais gaiolas
vão penduradas nos muros;
outras vezes, mais privadas,
vão num bolso, num dos pulsos.

Mas onde esteja: a gaiola
será de pássaro ou pássara:
é alada a palpitação,
a saltação que ela guarda;

e de pássaro cantor,
não pássaro de plumagem:
pois delas se emite um canto
de uma tal continuidade.



João Cabral de Melo Neto
nasceu em Recife, Pernambuco
em 9 de janeiro de 1920.
Sua poesia vai de uma tendência
surrealista até a poesia popular,
porém caracterizada pelo rigor estético,
com poemas avessos a confessionalismos
marcados pelo uso de rimas toantes.
João Cabral inaugurou uma nova forma
de fazer poesia no Brasil,
e deixou uma obra literária densa
e relaticamente extensa.
Quando morreu, em 9 de Outubro de 1999,
era considerado um forte candidato
ao Prêmio Nobel de Literatura.










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