Wednesday, September 27, 2017

PRINT SCREEN (uma crônica de Marcelo Rayel Correggiari)


Mercearia... tecnológica...
Muito se fala das famigeradas ‘redes sociais’: que “... é isso...”, “... é aquilo...”. Há muita teoria para uma prática cada vez mais funesta.
A começar pelo que é ‘tornado público’ (publicar!): sempre uma representação de ‘uma parte do todo’, uma ‘simplificação’ que nem sempre reflete a ‘complexidade’ inerente a qualquer ser. Há muita ‘redução’ nessas representações: a vida, mesmo, a de verdade, costuma ser bem mais acachapante do que sonharia nossa vã filosofia.
Com as redes sociais, pudemos constatar uma máxima muito praticada por essa desinternetada Mercearia: que a vida de ninguém dá um livro. As histórias costumam ser as mesmas e são raríssimamente interessantes. Apesar da complexidade do desfile, nada que já não tenha sido visto antes.
Eis, aí, o ‘pobrema’: se a vida de ninguém ‘dá um livro’, o que faz todo mundo pensar ‘que daria’?! As vidas privadas são razoavelmente desinteressantes como matéria-prima da Literatura: em nenhuma aula dessa disciplina, seja direcionada a uma língua específica, Teoria da Literatura ou Literatura Comparada, há discussões tremendamente extensas sobre a vida privada de alguém.
Afinal, é uma aula de Literatura, não de alcovitagem...




Uma coisa que se aprende oficialmente nos cursos de Letras (nos bons, é claro!) por intermédio das aulas de Literatura é que tal área de conhecimento possui uma tecnicidade quase semelhante à Engenharia, ao Direto e à Medicina. Óbvio que é uma ciência humana e possui suas particularidades, mas há muita técnica e observações de regramentos nessa modalidade de Arte.
Não é bagunça, não...
A arte de narrar bem a história que se quer contar é o coração dessa disciplina, não a história em si. É possível, na Literatura, apanhar uma ocorrência pequena da vida e contá-la de uma forma magistral.
É uma arte narrativa (sobre ‘como se conta’) com postos avançados, hoje em dia, no teatro e principalmente no cinema.
Essa arte (a de narrar!) não dispensa aquele ‘fundamental’ para qualquer coisa: a vocação e o talento. Esse ‘contar uma história’ pode ter inúmeras formas e maneiras: agradáveis, inusitadas, ‘chatinhas’, surpreendentes, mas todas encantadoras pelo sabor que imprimem.
Contudo, isso não quer dizer que, nas famigeradas redes sociais, tudo é narrativa ou toda narrativa é cabível.




A internet, assim como uma rede social, é uma praça pública: aberta 24 horas para a fauna mais variada que se possa imaginar. Qualquer um pode frequentar tal espaço da forma como melhor deseja, com qualquer tipo de roupa, por exemplo, ou mesmo sem roupa alguma: nu(a) ou fantasiado(a) de Pikachu.
A questão em torno desse espaço (internet, rede social) é que ele jamais filtrará aquilo que compõe o íntimo de alguém. Se um sujeito é dado a certas ‘saliências’ (e cabe aqui um substancial eufemismo porque o nome é bem outro!) em sua vida privada, não se preocupe: o acinte e falta de respeito em ambientes privados logo estarão à luz do dia, interferindo impiedosamente na vida de pessoas que sequer imaginamos.
E aí, nesses casos, é melhor ‘printar a tela’.
É possível compreender certas motivações que vão ao íntimo do ser humano. Entretanto, isso não significa deixar de levar o outro em consideração antes de uma tomada de decisão (o respeito!) por mais que se entendam as contingências que fizeram alguém ser o que é.
Em caso de desatenção sobre o acima exposto, podem esperar: abuso a caminho! Em geral na privacidade dos ‘mensageiros instantâneos’, sob uma perigosa premissa de que “... não vai sair dali.”. Sai! Sai, sim! As pessoas se conversam, compartilham telas printadas e, em breve, o nome do(a) querido(a) freguês(a) estará em “bocas de matildes”.
‘De boa’, caro(a) freguês(a)?! Chamem para conversar ao vivo e em cores. Bem mais seguro...!
A postura fora da internet e das tais redes sociais é o que confere segurança para certos dados transmitidos com total discrição. O problema é que pessoas assim são cada vez raras, rasíssimas, gente madura bastante para que certos detalhes e informações possam ser seguramente compartilhados.
E lembrem-se: jamais apertem botões como “publicar” e/ou “enviar” sem maiores certezas quando em assuntos que podem interferir negativamente a vida de alguém. Essa impublicável Mercearia já passou por isso e não aconselha ninguém. No mundo das baixezas e dos ataques, tudo o que vai para uma rede social pode causar um dano irreparável: de reputação a trabalho, de vida amorosa a social.

E deixemos as peculiaridades e idiossincrasias para os relacionamentos privados e íntimos de cada um. Nos casos de abuso e desrespeito, quem é vítima sempre se protege: é cada ‘print screen’ de arrasar quarteirão.


Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 48 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É avesso a hermetismos
e herméticos em geral,
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO

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