Ir para os Estados Unidos pela primeira vez é algo que se deve planejar, pois se há uma coisa que americano tem é obstáculo pra marinheiro de primeira viagem. Começa que o pedido de visto tem que ser agendado num site confuso e cheio de janelas estranhas. Depois de se ler uma série de recomendações parte-se para o preenchimento de um interrogatório de fazer criança rir, pois há questões que nos soam tão ingênuas quanto “você tem algum desajuste mental?” ou “você cometeu abuso de drogas?” ou “você participou de algum tipo de tortura ou ato de violência?” E por aí vai, fazendo que o interrogado se perguntar se é a si próprio que se está considerando um tonto ou eles é que são mentalmente simplificados, digamos assim. Depois que se passa por várias páginas desse formulário que tem até tutorial de preenchimento, chega-se ao boleto salgado que chapa o sujeito em 160 dólares para obter o visto. Feito isso, faz-se um agendamento da primeira entrevista, pois é bom que se diga: há duas. Então se descobre que o site teve uns bugs, ou seja, “problemas técnicos insolúveis” na língua do Windows... e andou “descontinuando” o serviço. São dois agendamentos. Chegando no primeiro, há um sujeito que já aborda quem chega no táxi, passa para outro agente especializado em se comunicar com brasileiro confuso, que então indica uma fila dessas sem-fim, que se vai dando voltinhas em labirinto até chegar a outro segurança armado de pistola e caça metais que dá uma geral em cada um e depois libera para uma fila de espera em novo labirinto num lugar que parece um estacionamento de shopping. Essa até anda rápido e acaba num balcão onde um funcionário checa toda a papelada feita na internet e documentos, em seguida indica para seguir uma linha contínua verde que aparentemente poderia ir até o fim do arco-íris. Mas não, passa por escada, dá voltas e leva a outra fila labiríntica até chegar a um guichê a prova de balas onde alguém pega os papéis conferidos e etiqueta o passaporte, indicando para continuar a fila até outro atendente que tira fotos. Feito isso, é esperar a outra entrevista, na semana seguinte e num lugar ainda mais distante, onde se chega ao que parece ser um castelo. Sim, há grades de mais de dois metros e blocos de concreto do tamanho de um fusca, acho que para impedir tanques de guerra. A região é tomada por despachantes que ficam super felizes quando dá bug. E deu, pois um funcionário saiu falando que tinha que ter uma foto com os papéis pois o “sistema” apresentara falha. No despachante, um usuário reclama do preço e uma mulher despachada diz que “sem propina São Paulo para”. Ali toda uma organização funciona com captação de pessoas na rua, recepção, cobrança, fotógrafo. Feito isso, com a tal foto, que tem que estar em uma pasta, palavra que os homens de preto falam muito nas filas que vão se alternando no caminho. Pois eis que se entra então numa sequencia de filas: a da entrada do castelo; feita a checagem, vai-se para outra de baias que parecem seguir para um matadouro. Tudo parado, de repente aquilo começa a andar e chega numa espécie de controle de aeroporto em que se tem que tirar até o cinto. Nova fila. A checagem da primeira entrevista e a tirada de digitais é refeita tal e qual, pois lembre-se, deu bug. Fila final: a entrevista. Em pé, diante do que parece um caixa de banco, alguém faz umas três ou quatro perguntas e depois devolve um papelito dizendo: “seu visto foi aprovado”. Ou não... Então, se foi, é só esperar eles devolverem o passaporte, que fica retido por uns 10 dias... para então poder a começar a sonhar com as idas aos shoppings, que é praticamente o que brasileiro faz quando vai para os EUA...
onde nasceu em 7 de Abril de 1960.
Além de poeta, cronista e tradutor,
é editor da prestigiada revista BABEL.
Possui diversos livros publicados.
Seus poemas estão reunidos em "Pirão de Sereia"
e suas crônicas em "Siri Na Lata",
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