Thursday, November 30, 2017

CELEBRAMOS COM UM PEQUENO ATRASO OS 40 ANOS DA ADORÁVEL MAGGIE GYLLENHAAL

por Chico Marques


Maggie Gyllenhaal é filha do diretor de cinema Stephen Gyllenhaal e da produtora de cinema e roteirista Naomi Foner Gyllenhaal, além de irmã mais velha do ótimo ator Jake Gyllenhaal.

Seu pai vem de uma família de nobres suecos. Já sua mãe é uma ex-professora judia do Brooklyn. Maggie cresceu entre Nova York e Los Angeles depois que seus pais se separaram.

Seu curriculum escolar é no mínimo curioso.

Em 1995, ela decidiu estudar literatura e religiões orientais na Columbia University, e se formou em 1999 como Bacharel em Artes.

Depois disso, seguiu para Londres estudar na Royal Academy of Dramatic Arts.

De volta aos Estados Unidos, foi fazer cinema e teatro, tudo ao mesmo tempo.


A estreia de Maggie Gyllenhaal no cinema aconteceu em 1992 com "Terra D'Água".

Trabalhou em diversas ocasiões ao lado de seu pai e de seu irmão, mas só foi chamar a atenção de Hollywood a partir do sucesso de "Donnie Darko" (2001), onde faz um pequeno mas marcante papel.

Seu primeiro papel como protagonista veio no ano seguinte em "Secretária", de Steven Shainberg, quando o crítico Stephen Holden, do The New York Times, publicou um elogio rasgado:

"O papel de Lee em que Maggie Gyllenhaal interpretou com uma delicadeza e doçura contida em quadrinhos, deve fazer dela uma estrela".

O desempenho de Maggie valeu-lhe o prêmio National Board of Review of Motion Pictures na categoria Melhor Performance de uma Revelação, além de indicações ao Golden Globe e ao Independent Spirit Award.


Em 2002, Maggie Gullenhaal teve a oportunidade de trabalhar em dois projetos do grande roteirista Charlie Kaufman.

O primeiro foi "Adaptação", dirigido por Spike Jonze.

E o segundo foi "Confissões de Uma Mente Perigosa", que marcou a estreia na direção de George Clooney.

Na sequência, fez uma série de filmes bem descolados como "40 Dias e 40 Noites" (2002), "O Sorriso de Mona Lisa" (2003), "Casa De Los Babys" (2003), "Criminal" (2004), "Nove Rainhas" (2004), "Finais Felizes" (2005), "Totalmente Apaixonados" (2005), "Mais Estranho Que A Ficção" (2006) e "Sherrybaby" (2006).

Todos eles filmes bons o suficiente para estabelecer seu rosto com destaque em meio a elencos de apoio.


E então... "Batman The Dark Knight" (2008) aconteceu na vida de Maggie Gyllenhaal e virou tudo de ponta cabeça de uma hora pra outra.

Ela se surpreendeu quando viu que ganhou subitamente um público extenso, que nunca havia prestado a atenção devida nela antes.

Passou a ser citada nas listas das mulheres mais lindas e mais quentes do cinema americano, e seu passe no mercado foi para as alturas com o sucesso do filme de Christopher Nolan.

Mesmo assim, Maggie continuou a escolher papéis nada óbvios e sempre fugir dos atalhos fáceis para sua carreira 

Casada com o excelente ator Peter Sarsgaard, Maggie está brilhando atualmente como uma prostituta na série HBO "The Deuce", ambientada na barra pesada do Times Square dos Anos 70.

Completou 40 anos no último dia 16 de Novembro, e nós aqui celebramos esta data selecionando alguns dos filmes mais marcantes -- e menos vistos -- de sua carreira.

Todos, claro, disponíveis para locação nas estantes da Paradiso Videolocadora.
  



TERRA D'ÁGUA
(Waterland, 1992, 95 minutos, dir.: Stephen Gyllenhaal)

O professor de História Tom Crick sofre críticas de seus alunos, principalmente de um deles, Price, que questiona para que serve a História e usa o discurso do fim da História. Diante de jovens que não conseguem mais visualizar a importância desta disciplina e que influenciam inclusive as decisões da escola em Pittsburg, uma vez que se valoriza a produção e ganhar dinheiro e se esquece que é preciso também aprender a viver. O professor mostra que somos todos história, e o faz de uma forma diferente contando sua própria história que começa na Inglaterra. Baseado no premiado romance de Graham Swift. Marca a estreia de Maggie Gyllenhaal aos 15 anos de idade, no papel de uma estudante.
ADAPTAÇÃO
(Adaptation, 2002, 114 minutos, dir.: Spike Jonze)

Charlie Kaufman (Nicolas Cage) precisa de qualquer maneira adaptar para o cinema o romance "The Orchid Thief", de Susan Orlean (Meryl Streep). O livro conta a história de John Laroche (Chris Cooper), um fornecedor de plantas que clona orquídeas raras para vendê-las a colecionadores. Porém, além das dificuldades naturais da adaptação de um livro em roteiro de cinema, Charlie precisa lidar também com sua baixa auto-estima, sua frustração sexual e ainda Donald, seu irmão gêmeo que vive como um parasita em sua vida e sonha em também se tornar um roteirista. Um quebra-cabeças psicológico brilhante e absolutamente delicioso do grande roteirista Charlie Kaufman rodado brilhantemente por Spike Jonze. Maggie faz Caroline, uma figura curiosa e enigmática na trama.
CONFISSÕES DE UMA MENTE PERIGOSA
(Confessions Of A Dangerous Mind, 2002, 113 minutos, dir.: George Clooney)

Chuck Barris (Sam Rockwell), um jovem homem cheio de energia e concentrado em uma carreira de destaque na crescente indústria da televisão, percebe que está sendo seguido por um sujeito suspeito, que logo o introduz em um universo secreto e perigoso: o dos agentes da CIA. Enquanto Barris adquire notoriedade como um dinâmico produtor de televisão, criando programas inovadores e populares como o game show "The Newlywed Game" e o programa "The Gong Show" (no Brasil "Show de Calouros"), que ele mesmo apresenta, ele comete assassinatos com regularidade para o governo dos Estados Unidos. Aos poucos Barris vai incorporando seus programas de televisão em sua vida secreta: os casais vencedores do game show "The Dating Game" (no Brasil "Namoro na Tevê") ganham viagens para "a fabulosa Helsinki" e a "romântica Berlim Ocidental" para o encontro de seus sonhos – não é o mesmo que Paris, mas proporciona a Barris, que os acompanha, um disfarce para suas missões secretas. Roteiro magnífico de Charlie Kaufman. Maggie faz um papel pequeno mas marcante no filme.
SECRETÁRIA
(Secretary, 2002, 111 minutos, dir.: Steven Shainberg)

Após passar algum tempo em um sanatório, Lee Holloway (Maggie Gyllenhaal) volta para a casa de seus pais pronta para recomeçar sua vida. Ela então faz um curso de secretária e tenta um emprego com E. Edward Grey (James Spader), que tem um escritório de advocacia. Apesar dela nunca antes ter trabalhado Lee é contratada por Grey, que não dá importância para sua falta de experiência. Inicialmente o trabalho parece bem normal e entediante, pois só digita, arquiva e faz café e Lee se esforça para agradar seu chefe e sua mãe, Joan (Lesley Ann Warren), se mostra ansiosa para a filha ser bem sucedida. Lentamente Lee e Grey embarcam em uma relação mais pessoal atrás de portas e cruzam linhas de conduta da sexualidade humana, um caso de amor no qual os papéis de dominação e total submissão ambos desempenham perfeitamente. Filme estranhíssimo, mas surpreendente, de Shainberg. Primeiro papel de Maggie Gyllenhaal como protagonista.
 MAIS ESTRANHO QUE A FICÇÃO
(Stranger Than Fiction, 2007, 105 minutos, dir.: Marc Forster)

Nesta trama metalingüística, Will Ferrell vive Harold Crick, cobrador de impostos da Receita Federal que surta quando a sua vida começa a ser contada por uma voz que só ele consegue ouvir. A narradora, Kay Eiffel (Emma Thompson), luta para completar o que pode ser seu melhor livro, ápice de uma carreira de romances trágicos. Kay só não percebe que o seu protagonista está vivo e incontrolavelmente guiado por suas palavras.  Escrito por Zach Helm, o roteiro ganha ares de contagem regressiva quando Harold descobre que Kay planeja matá-lo no final do livro. Harold é o tipo de pessoa que precisou ter uma vez dentro de sua cabeça, narrando seus atos e antecipando a sua morte, para perceber que estava jogando a vida fora. Apoiado nos excelentes diálogos de Helm e na estrutura narrativa familiar ao espectador, o diretor Marc Forster vira do avesso o batido mote do loser-que-desabrocha. Trama deliciosa, elenco magnífico, e Maggie Gyllenhaal lindíssima: precisa mais do que isso?
 SHERRYBABY
(Sherrybaby, 2007, 96 minutos, dir.: Laurie Collyer)

Após três anos presa, Sherry Swanson (Maggie Gyllenhaal) volta para casa. Ela busca um emprego e tenta se reaproximar da filha, mas logo percebe que encontrar seu lugar na sociedade será mais difícil que o esperado. Drama contundente e exasperaddor, onde Maggie dá um banho de inter´retação, num papel ousado e repleto de nuances. Um filme pouco visto que merece ser descoberto.
BOAS VIBRAÇÕES
(Hysteria, 2011, 100 minutos, dir.: Tanya Wexler)

No século XIX, muitas mulheres eram diagnosticadas com histeria. Segundo o Dr. Robert Dalrymple (Jonathan Pryce), famoso especialista em medicina da mulher, essa doença exclusivamente feminina "dominava" quase que população feminina de Londres. Por acreditar que a origem do problema encontrava-se no útero, ele tratava suas pacientes com longas massagens na vagina, provocando assim um outro efeito, mais conhecido como prazer sexual. Ao dar oportunidade para que o jovem Dr. Mortimer Granville (Hugh Dancy) começasse a dar consultas no seu consultório, o local passa a receber cada vez mais pacientes, provocando no rapaz um grave problema nas mãos. Disposto a combater a dor crônica que sentia, ela acaba descobrindo em um aparelho criado por seu amigo e inventor Edmund St John-Smythe (Rupert Everett) uma solução que iria atender a ele e também as mulheres: um massageador elétrico. Baseado em fatos reais sobre a criação do aparelho, também conhecido nos dias atuais como vibrador, consolo, entre outros nomes.




NOSSO FILME DA SEMANA VEM DA NORUEGA, E É EXTREMAMENTE INUSITADO E ORIGINAL.

por Manuel Mann


Em circunstâncias normais, odeio filmes de terror, e falta-me paciência para a imensa maioria dos filmes de suspense produzidos de vinte anos para cá.

Mas “Thelma” é diferente. É um filme de suspense com toques de horror que mescla romance, drama e temas sobrenaturais de uma maneira absolutamente original.

É escrito e dirigido por Joachim Trier ("Reprise", “Louder Than Bombs” e “Oslo”), e é a grande aposta da Noruega ao Oscar de melhor Filme Estrangeiro de 2018.



É sobre uma garota do interior que vai para a Universidade em Oslo e, longe de seus pais, se vê livre das privações religiosas e comportamentais impostas por sua família, e pode finalmente frequentar bares e festas, pode fumar e beber, pode usar drogas e pode ter uma vida sexual.

Conforme ela vai tentando se integrar ao mundo para descobrir qual o seu papel, driblando a insistência de seus pais em monitorar seus passos à distância, ela descobre que possuí superpoderes, e se atrapalha um bocado ao tentar manejá-los.

Joachin Trier soube enlaçar a trama com um ar de mistério, um pouco de comédia e leves tons de terror, fazendo uso de poucos diálogos e de muitas simbologias nas descobertas de sua personagem.

A interpretação de Eili Harboe como Thelma é no mínimo corajosa, já que o filme é repleto de cenas fortes, e envolve temáticas polêmicas como homossexualidade, fanatismo religioso e repressão vivenciadas pela personagem.



O filme reflete sobre a vida e sobre a importância do autoconhecimento. Questiona a forma prejudicial com que a religião e comportamentos tidos como “certos” são impostos. E enfatiza a importância de preservar sempre o livre arbítrio e o direito de escolha de cada indivíduo.

Trocando em miúdos, "Thelma" talvez seja uma espécie de cruzamento entre "Carrie" de Brian De Palma com "A Zona Morta" de Davod Cronenberg, com "O Bebê de Rosemary" de Roman Polanski como a cereja do bolo.

Se você está procurando por um suspense divertido, inusitado, envolvente e perturbador, venha por aqui...



THELMA
(Thelma, 2017, 116 minutos)

Roteiro e Direção

Joachin Trier

Elenco

Eili Harboe
Thelma Kaya Wilkins
Ellen Dorrit Petersen
Henrik Rafaelsen

Cotação



É PROIBIDO VIVER (uma crônica de Marcelo Rayel Correggiari)


Essa entristecida Mercearia veste luto...
Deixou-nos, há exato uma semana, um dos colunistas dessa casa, o querido e amado Carlos Eduardo Motta, o Brizolinha. Perda tremenda, uma orfandade que essa cidade enfrentará no que tange à livro, Literatura...
... e, acima de tudo, à gentileza e ao carinho por ele sempre manifestados nos cafés e na generosidade.
Tecnicamente falando, sendo esse iletrado merceeiro egresso das Letras oficiais, ele valia bem mais do que 40 ‘pós-doc’s (ou livre-docências) em qualquer grande instituição de ensino superior do mundo...
... e nem por isso lhe subia a arrogância de nos tratar bem mal, nós... reles ignorantes da escrita como Arte. Pelo contrário: ele era nosso amigo, ele nos acolhia e nos acarinhava com seu sorriso, seu café e uma gentil pausa para pitar.
Um dos poucos (quem sabe, o único!) que garantia a esse pedacinho de terra perdido nos mares-do-sul seu derradeiro traço de cosmopolidade.
Vamos empobrecer... como já cantava o saudoso Johnny Hansen com o seu Harry, naquele clássico: “(...) Sky will be grey (...)”.
Uma grande amiga dessa Mercearia chegou a comentar algo como ‘renovação’, ‘... os excelentes, n’algum dia, “passam o bastão” para que os novos ares, outras pessoas, continuem e melhorem uma excelência que já existe’.
Uma continuidade que pessoalmente refuto, mas contemplo. Foi essa mesma grande amiga que me cumprimentou pela coragem de um gesto recente quando atingido mais uma vez por uma recente ocorrência constituída pela boa e velha violenta interferência em sua forma mais grotesca de ‘descolamento da realidade’.
Explicou-se que não é ‘coragem’, mas ‘falta de opção’. O troço é tão descabido que, chega uma hora, não se é possível certa discrição. A comunicação do fato não será pública, mas partes diretamente envolvidas precisam ser avisadas do que vem por aí. Porque é preciso deixar claro (ou notificado!) que, se bobear, será uma realidade que se arrastará por décadas.
A interferência: fruto de uma doença que distorce até mesmo o mundo como ele realmente é. Flagelo de um que, sem os devidos cuidados (até mesmo medicamentosos), tem tudo para deixar um rastro de tristeza e destruição para muitos.
É o ‘povo da gangorra’, querido(a) freguês(a): sentados na extremidade ao rés-do-chão, colocam qualquer coisa ou alguém na ponta elevada para brincarem de ‘subir-e-descer’. Não se atém aos danos provocados por tal exercício: ao invés do bom e velho exame da condução de si próprio(a) no ‘merdelê’ todo, distribuem culpa e responsabilidades que, no frigir dos ovos, são somente delas mesmas.
É aí que você entra ‘de gaiato(a)’, querido(a) freguês(a)! Quando você menos espera, está servindo de contrapeso para um eterno ‘altos e baixos’ que não é seu. E se você sair da gangorra, pode se preparar: a porrada chega!
Você será o ‘grande demônio’, digno dos mais baixos insultos, escárnio, impropérios... em caso de muita sorte do(a) estimado(a) freguês(a), quem sabe, a indiferença, o que pode, dependendo da circunstância, ser a salvação da lavoura!
O ‘povo da gangorra’, no caso do querido(a) freguês(a) ter como vida a pareceria de um ‘ombro-a-ombro’ ao invés do eterno ‘sobe-e-desce’, interfere! Acham que podem. Uma característica desse grupo é um sutil controle que, quando ineficiente, se transforma em escancaradas ameaças (se couber) e uma maledicência sem fronteiras.
Passam horas na polifonia das alcovitagens: uma mecânica que permite se ter alguma impressão de “controle”, de “saberem das coisas” (quando, na verdade, nada sabem), de “estarem atentas a tudo” (quando, na verdade, são engolidas pelo mundo a cada milésimo de segundo).
Craques na divulgação de algo que não são: personagens muito mal acabados de si próprios(as) num interminável arremedo de disfarce de uma densidade que jamais alcançariam. Nada mais fazem do que publicar (aqui, nesse caso, como “tornar público”) um tipo de sabedoria que um dos grandes colunistas dessa casa, o Dr. Luiz Cancello, comumente chama de “psicologia de almanaque” (popularmente conhecido como “filosofia de bar”).
Tudo na mais desalinhada tentativa de seduzir você, querido(a) freguês(a), a tomar assento na ponta mais elevada da gangorra. Afinal, essas pessoas precisam subir e nada mais eficaz do que tê-lo(a) como “... parte mais agradável desse buraco no qual me encontro...” (“... e fui eu mesmo(a) quem cavei essa merda...”).
Doença pura! Pessoas incapazes de ‘virar a página’ delas mesmas, interferindo seriamente em quem já virou a sua faz tempo. Sempre optam pela pior escolha, imersas na crença de que os(as) demais deveriam fazer o mesmo.
Experimente sinalizar a saída dessa espiral descendente: a pancadaria chegará. O que é pior: às vezes, envolvendo gente que nem sabe da ocorrência. No caso de sorte, apenas uma indiferença ao se colocar fora da funesta mecânica dessa pantomima macabra. E caso isso ocorra (a indiferença), agradeça aos céus.

O ‘povo da gangorra’ tem por mote “... ninguém pode viver melhor do que eu...”. A fachada é a do ‘savoir-vivre’, mas o gesto definitivo é a da ‘proibição da vida’. Tenhamos, sempre, boa temperança no enfrentamento de suas vis interferências.

Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 48 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É avesso a hermetismos
e herméticos em geral,
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO

PLAY IT AGAIN, SAM! (uma crônica publicitária de Carlão Bittencourt)



“Menos é Mais”
(máxima da propaganda)


Nunca gostei da badalação que cerca a propaganda. Acho exagerada. E sem sentido. Afinal, um sapateiro, solitário em seu ofício, agrega tanto valor para a sociedade quanto um publicitário. Com a vantagem de falar menos e não nos deixar a pé.

Outra coisa que me incomoda na profissão é a falsa intimidade. Você já reparou? Qualquer pessoa que atue na área se refere ao publicitário da moda como se tivesse morado com ele. É vergonhoso.

Por essas e outras, evito sempre que possível os grandes eventos do meio. Mas existem alguns a que você precisa ir. Por alguma razão imperativa. Daí, como não tem remédio, remediado está.

A historinha a seguir aconteceu numa dessas ocasiões, no começo dos anos 90. Intimado a comparecer, abotoei o paletó e encarei. Aliás encaramos, pois o Diretor de Criação da agência, Luiz Christino foi junto comigo. E o convescote em questão era a Semana Internacional de Criação, no Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo.

Como sempre, gente saindo pelo ladrão. Depois de muito aperto, conseguimos encontrar dois lugares na terceira fileira, a do gargarejo.

O palestrante era Sam Scally, fundador da Scally, McCabe & Sloves. Sócio de ninguém menos do que Ed McCabe, o mítico redator. Portanto, a noite tinha tudo para ser, no mínimo, interessante. Depois da falação de praxe, o colunista que fazia a vez de mestre de cerimônias, finalmente chamou ao palco o presidente da filial brasileira da agência, para apresentar o gringo.

Não vou citar o nome do cidadão por uma questão de respeito. O mesmo respeito que ele não teve pela inteligência da distinta platéia. Vaidoso, louco para aparecer, o publicitário abriu os trabalhos com o seguinte discurso. Sem tirar nem por.

“Sam Scally.
O que dizer de Sam Scally?
Dizer que, ao se unir a McCabe e Sloves,
Sam criou um novo modelo para as agências
de propaganda em todo o mundo?"

"Sam Scally... Sam Scally…
O que dizer de Sam Scally?
Dizer, por exemplo, que nós
da Scally, McCabe & Sloves do Brasil
estamos honrados com sua presença
nesta Semana Internacional de Criação?”

A essa altura você pode imaginar a reação da platéia. Ninguém no imenso salão de convenções do Maksoud Plaza estava acreditando nas pataquaras e baboseiras que ouvia. Mas, como os idiotas não têm tédio, o retardado narcisista continuou:

“Sam Scally... Sam Scally…
O que dizer de Sam Scally?
Dizer que Sam é meu ídolo?
Meu exemplo de profissional?
Não! Isso seria dizer muito pouco."

"Sam Scally... Sam Scally…
O que dizer de Sam Scally?
Faltam-me palavras que possam definir
a imensa importância de Sam Scally
na propaganda moderna."

"Sam Scally... Sam Scally… Sam Scally…
O que mais dizer de Sam Scally?
Senhoras e senhores,
com vocês o homem, a lenda, o mito...
Palmas para Sam Scally!!!”

O silêncio era gritante, constrangedor. Durante alguns segundos, não houve aplauso. Só um silencio profundo. As pessoas estavam chapadas.

De repente, meu amigo Christino não agüentou mais tanta bobagem e, em alto e bom som, resumiu o que todos estavam pensando:

"Vai apresentar mal assim na puta que o pariu!!!"

A platéia veio abaixo.

Carlão Bittencourt é redator publicitário
e cronista. É autor de
"Pela Sete - Breves Histórias do Pano Verde"
(2003, Editora Codex),
um mergulho no universo dos salões de bilhar
de São Paulo e escreve às quartas
em LEVA UM CASAQUINHO.







A ÉTICA DOS SAMURAIS SEGUNDO MISHIMA (uma crônica de Ademir Demarchi)



O escritor japonês Yukio Mishima se notabilizou, mais que por sua obra, por sua excentricidade, configurada num amor idealizado pela pátria, pelo imperador e pelo modo de vida do Japão medieval que tinha os samurais como exemplo moral de conduta e que o levou às últimas consequências do ato teatralizado do harakiri, feito com seu amante. Por esse credo, nunca aceitou a rendição japonesa na Segunda Guerra Mundial, para ele manchada sobretudo com a humilhação imposta ao imperador Hiroito, que teve que admitir para os súditos que não tinha caráter divino. Insatisfeito com o que considerava ser uma degradação moral do país, Mishima criou uma sociedade e recrutou cerca de 90 jovens universitários de extrema-direita e os treinou nas artes samurais e na filosofia tradicional. Esse modo de pensar e agir foi compilado num livro, “O hagakure”, sobre o qual Mishima escreveu “O hagakure – A ética dos samurais e o Japão Moderno”, considerado por ele “o único livro que existe para mim”. Esse ideário foi elaborado por um antigo samurai, Jocho Yamamoto, que o escreveu para prescrever para seus discípulos nos séculos XVII e XVIII. Seu maior ensinamento é afirmar que “Descobri que o Caminho do Samurai é a morte”, constatação que permite buscar uma lucidez para encarar a vida de modo prático e que depois viria a inspirar os pilotos kamikazes. Assim, nesse livro ele prescreve ensinamentos como “Numa crise em que as possibilidades de vida ou morte são iguais, simplesmente solucione-a escolhendo a morte imediata. Não há nisso nada de complicado. Basta firmar-se e prosseguir... Para ser um samurai perfeito, é necessário preparar-se para a morte a cada manhã e a cada tarde, todos os dias”. Lido hoje, parece uma manual de autoajuda e de etiqueta desses banais que garantem a existência do que se chama mercado editorial. Apregoando a fidelidade masculina total, à morte, a um senhor, o patrão, esse modo de pensar se estende na defesa da homossexualidade, porém contra a “feminização do homem” e passa pelas regras para lidar com contas de despesas, mulheres, como comportar-se em festas e reuniões, como conduzir a vida, educar os filhos e manter relações humanas... Mishima, em seu tempo, reagiu contra a moda banalizada de Pierre Cardin, dizendo que “certamente não é a primeira vez que as modas masculinas floresceram como se quisessem ofuscar a moda feminina”. Seu homossexualismo era másculo, erotizado pela cultura samurai e idealizado, tendo por modelo sublime o imperador Hiroito, que o traiu com a submissão aos Estados Unidos ao perder a Segunda Guerra e sempre o ignorou. A vingança de Mishima foi espetacular. Planejou detalhadamente um ritual que se deu na manhã do outono de 25 de novembro de 1970. Enviou antes para o editor a parte final de sua tetralogia épica focada no Japão moderno, O mar da fertilidade (1965-1970), formada pelos romances “Neve da primavera”, “Cavalos selvagens”, “O tempo da aurora” e “A queda do anjo”. Com quatro companheiros da Tateno-Kai, ou Sociedade dos Escudos, criada por ele em 1968, Mishima foi para o quartel-general das Forças Armadas em Tóquio, onde obrigou o general Kanetoshi Mashita a recebe-lo e reunir no pátio central do quartel mil soldados para os quais leu seu discurso final marcado pelo amor ao Japão e suas tradições. Em seguida, ajoelhou-se vestido apenas com uma bandagem e uma faixa na testa, gritou três vezes o lema “Longa vida ao imperador!” e cometeu o haraquiri, de acordo com o ritual de suicídio dos samurais, cortando o ventre. Masakatsu Morita, seu braço direito na Sociedade e seu amante, concluiu o ritual degolando-o e em seguida também se matou, sendo degolado por um dos acompanhantes. Algo impensável hoje em dia em relação a um país.




Ademir Demarchi é santista de Maringá, no Paraná,
onde nasceu em 7 de Abril de 1960.
Além de poeta, cronista e tradutor,
é editor da prestigiada revista BABEL.
Possui diversos livros publicados.
Seus poemas estão reunidos em "Pirão de Sereia"
e suas crônicas em "Siri Na Lata",
ambos publicados pela Realejo Edições.
Suas crônicas, que saem semanalmente
no Diário do Norte do Paraná, de Maringá,
passam a ser publicadas todas as quintas
aqui em Leva Um Casaquinho


Monday, November 27, 2017

A BRINCADEIRA: versos sacânicos de FRANCISCO ALVIM


Debaixo da mesa -
de porquinho -
um fuçando o outro

FRANCISCO ALVIM nasceu em
Araxá, Minas Gerais, em 1938.
Diplomata, habituou-se a ser
um cidadão do mundo.
Viveu um período em Brasília
onde participou de movimentos
de poesia marginal, tendo sido
o organizador da célebre antologia
"Águas Emendadas" (1977).
Seus "Poemas 1968-2000"
foram reunidos num único volume
pela Editora Massao Ono.
Seus dois últimos livros de poemas,
"Elefante" (2000) e "O Metro Nenhum" (2011)
foram publicados pela Cia. das Letras.