Wednesday, January 20, 2016

A ELEGÂNCIA INIGUALÁVEL DE CARY GRANT NUMA ENTREVISTA DELICIOSA E REVELADORA

por Kent Schuelke
para INTERVIEW Magazine
(Janeiro 1987)

Cary Grant deixou o mundo da mesma maneira como viveu - discretamente. 48 horas após a morte do ator de 82 anos de idade de um acidente vascular cerebral maciço em Davenport, Iowa, seus restos mortais foram levados para Califórnia e ele foi cremado. Não teve funeral, nem qualquer serviço memorial. Grant queria assim. Ao longo de sua carreira no cinema, abrangendo 72 filmes, Grant sempre evitou os holofotes, e raramente concedeu entrevistas.

Nascido com o nome Archibald Leach em Bristol, na Inglaterra, em 20 de Janeiro de 1904, Cary Grant seguiu para os Estados Unidos no início da adolescência como um artista em uma trupe acrobática. Seu talento o levou aos palcos da Broadway, onde atuou em musicais. Logo foi convidado para ser contratado da MGM. Para muitos críticos, o afável Grant foi o maior comediante na história do cinema. Junto com Howard Hawks, George Cukor e Frank Capra, ele ajudou a inventar a "screwball comedy." Com seu charme arrebatador, seu sotaque elegante e seu timing impecável, ele brilhou em algumas das maiores comédias de Hollywood, como "Bringing Up Baby", "Topper", "The Awful Truth" e "The Philadelphia Story". Nesses filmes, ele contracenou com muitas das principais atrizes de Hollywood: Katharine Hepburn, Marilyn Monroe, Mae West, Ingrid Bergman e Grace Kelly. Mas provavelmente o mais importante colaborador de Grant foi Alfred Hitchcock, com quem fez "North by Northwest", "Notorious" e "To Catch a Thief".

Ao se aposentar como ator em 1966, Grant passou o resto de seus dias trabalhando no Conselho de Administração da MGM e na sua Fabergé Cosméticos. Ele gostava de sua privacidade, mas seus cinco casamentos - com Virginia Cherrill, Barbara Hutton, Betsy Drake, Dyan Cannon e Barbara Harris - e seus quatro divórcios meio ruidosos trouxeram a ele muita publicidade indesejada. Mas, mesmo assim, o público sempre amei Cary Grant.

Esta entrevista com o Sr. Grant foi feita quatro meses antes de sua morte. Ele concedeu a entrevista quando a Universidade de Iowa, em Iowa City, o homenageava com uma Mostra Retrospectiva com seus melhores filmes. Esta foi uma das últimas conversas públicas dessa lenda do cinema.


Qual foi a sua mais antiga ambição?
Minha mais antiga? Eu não sei. Eu não tinha ambição definida. Tem gente que tem algumas idéias malucas sobre ser um bombeiro ou um grande boxeador ou um jogador de futebol. Mas nunca foi o meu caso.

E sobre atuar?
Nem me passava pela cabeça querer virar ator.

Soube que você, quando menino, tinha verdadeiro fascínio por viajar em alto mar. Você queria ser um marinheiro?
Sim. Eu sonhava em viajar muito. Bristol, a cidade onde nasci, é uma cidade aberta ao mundo. Viaja-se muito a partir dalí. É uma cidade muito antiga, e os navios entravam e saíam o tempo todo por conta do Porto. Eu estava sempre interessado no que acontecia naqueles navios que levavam pessoas para todos os cantos do mundo.

Como você começou a atuar?
Devido ao meu desejo de viajar, me juntei a uma pequena trupe de acrobatas. Vim pela primeira vez a Nova York com a trupe. Quando a trupe voltou para a Inglaterra, eu permaneci aqui. Eu gostei muito de estar neste país. Comecei a me candidatar para participar de musicais. Naquela época, um musical ficava em cartaz no máximo um ano, e não haviam muitos deles na Broadway. Participei de vários deles antes de vir para Hollywood trabalhar com cinema.


Os jovens de hoje não eram sequer nascidos quando você rodou seu último filme, e agora eles estão descobrindo você em filmes clássicos. O que você pensa sobre isso?
Eu acho que eles têm uma vida longa pela frente. Vão fazer suas próprias escolhas. Torço pelo melhor para a próxima geração, mas, francamente, ela não parece prometer muito. Se bem que ao longo dos Séculos as pessoas vivem se queixando que o mundo está indo. Eu não sei ao certo o que os jovens pensam ou fazem. Eu os vejo escutando grupos de rock e ruídos semelhantes. Mas se isso é o que os torna felizes, tudo bem - contanto que eles não venham ouvir essas coisas ao meu lado.

Como você se vê?
Como posso me ver? Nós somos o que somos, na opinião dos outros. Eu só posso me ver como um homem de 82 anos que permanece em funcionamento. Eu faço o melhor que posso, nas circunstâncias em que a idade me colocou.

Como você gostaria que a História se lembrasse de você?
Como ... "um sujeito simpático que não balançou o barco", eu espero.

Sua vida é relativamente calma nos dias de hoje?
Eu vivo muito tranqüilamente. Não é o que se espera que um homem da minha idade faça?

É assim que você quer viver o resto de sua vida, em silêncio, em Beverly Hills?
Eu não sei quanto tempo isso vai durar "o resto da minha vida", mas eu gosto do que estou fazendo e, é claro, vou viver a minha vida aqui, a menos que alguma mudança extraordinária ocorra de repente. Se eu não gostar mais de viver em Beverly Hills, então eu me mudo. Eu posso dar ao luxo de fazer isso.


Qual é a coisa mais difícil de ser Cary Grant, a estrela de cinema?
Eu não considero difícil ser Cary Grant. A única coisa que eu lamento sobre isso é o assédio do público pedindo autógrafos, querendo atenção enquanto estou fazendo uma refeição, essas coisas.

Os fãs ainda assediam você hoje?
Ainda acontece. Claro que não tanto quanto acontece com Robert Redford ou outras estrelas mais jovens. Sempre fiquei muito incomodado com essas coisas. Não nego autógrafos. Mas odeio quando os fãs são intrusivos demais.

Você tem encontrado fãs interessantes?
Olha, as pessoas que eu mais gostaria de conhecer são as pessoas que são menos susceptíveis de vir até mim.

Você é acessível aos fãs? Interage com eles?
Eu não sou rude. Eu tento ser o mais simpático e atencioso possível. Mas conheço bem os meus limites. Mas eu não respondo a todas as cartas que recebo. Nem poderia. São muitas cartas até hoje. Dois sacos grandes de correio toda semana. É muita coisa. Precisaria ter um funcionário só para fazer isso por mim.

É verdade que o Presidente Kennedy, uma vez que você telefonou da Casa Branca só para ouvir o som de sua voz?
John era uma pessoa ótima. Extremamente simpático. Ele ligava sim. Ríamos muito. Nosso atual Presidente também é uma pessoa muito querida e muito amigável. Nós [Reagan e Grant] somos velhos amigos.

Estudantes de cinema desconstroem seus filmes para analisá-los. Você não acha que certos estudiosos levam a sério demais certos filmes de que foram feitos estritamente para entretenimento?
Sim, com certeza. Um filme é um filme. Como Hitch diria que quando alguém ficava chateado no set: "Vamos, rapazes, relaxem, é apenas um filme." Agora, se você quiser fatiá-lo para estudá-lo, bem, aí é até você. Nos os fizemos. Não sabíamos ao certo o que estávamos fazendo metade do tempo. Para todos os efeitos, estávamos nos divertindo e atraindo as pessoas para as bilheterias dos cinemas.


Quais são as suas lembranças de trabalhar com Alfred Hitchcock?
Só lembranças felizes. Para mim, sempre foi uma grande alegria trabalhar com Hitch. Ele era um homem extraordinário. Lamento muito esses livros idiotas escritos sobre ele, quando o homem não pode se defender.

Você trabalhou com algumas das mulheres mais admiradas da história do cinema. Quem foi a melhor atriz com quem você trabalhou?
Eu trabalhei com muitas ótimas atrizes. Mas, na minha opinião, as melhores foram Grace (Kelly), Ingrid (Bergman), Audrey (Hepburn) e Deborah (Kerr). São todas esplêndidas, atrizes esplêndidas. Grace atuava completamente relaxada, algo extraordinário. Era inteligentíssima. Eu a adorava. Não é uma profissão fácil, apesar do que a maioria das pessoas pensa.

Foi decepcionante para você ver Grace Kelly deixando o cinema para casar com o Príncipe Rainier?
De certa forma, foi sim. Mas foi uma escolha dela. Ela era incrivelmente boa, uma mulher notável em todos os sentidos. Quando ela decidiu sair, nós respeitamos sua decisão.

Como foi trabalhar com Katharine Hepburn?
Maravilhosa. Trabalhamos juntos cerca de cinco vezes. Não se faz uma determinada coisa com alguém mais de uma vez sem gostar. A menos que você seja um idiota, claro!


Na década de 1950, você anunciou que estava se aposentando do cinema. A aposentadoria foi de curta duração. O que fez você querer desistir de filmes no auge da sua carreira?
Eu estava cansado de fazer filmes.

Como seus amigos e colegas reagiram a sua decisão?
As pessoas dizem todos os tipos de coisas. Eu desisti porque eu cansei de fazer filmes naquele ponto da minha vida. Eu não tinha idéia se iria, mais adiante, retomar a minha carreira ou não. Só sei que quando decidi largar em definitivo, eu sabia que eu não iria voltar nunca mais. Eu gostava muito da minha profissão muito, mas sentia que não tinha mais nada de relevante a oferecer.

Alguém na indústria do cinema já lhe disse que o seu trabalho influenciou os filmes que eles fizeram?
Já. Acho engraçado quando isso acontece. Não consigo me imaginar tendo tamanha importância na vida artística de alguém.

Como você responde às críticas de que dizem que você sempre interpretou a si próprio em todos os filmes que fez?
Bem, quem mais eu poderia retratar? Eu não posso retratar Bing Crosby. Eu sou Cary Grant. Sim, estou por inteiro em todos os papéis que interpretei. Não é nada fácil ser você mesmo diante das câmeras sabendo que vai ser visto imediatamente por 300 milhões de pessoas.

E quando às pessoas que dizem que o criticam por não ter expandido seu repertório para papéis mais complexos?
Eu não me importo que as pessoas dizem. Eu não levo em consideração o que os críticos dizem. Você fez o filme, eles assistem. Se quiserem criticá-lo, é com eles. Eu não presto atenção ao que críticos dizem. Mas sempre fui todo ouvidos para as observações feitas pelos diretores, produtores, roteiristas e atores com quem trabalhei. Mas já não faço filmes há 20 anos....

Você acha que essas pessoas interpretam mal o que você estava tentando fazer?
Eu não tenho nenhuma preocupação com o que eles pensam a meu respeito. Eu não me importo. Eu não tenho nada a ver com isso, e eu não posso controlar isso, então não importa o que as pessoas dizem.

Você tem um filme favorito?
Não realmente. Eu fiz todos eles com um propósito. Às vezes eu esperava melhores resultados. Outras vezes eu ficava surpreso com os resultados.

Por que você deixou de atuar para entrar para o mundo dos negócios nos anos 60?
Atuar tornou-se cansativo para mim. Eu simplesmente desisti de atuar. Não me imaginava indo muito além do que realizei como ator. E confesso que fiquei fascinado com esse mundo novo que se abriu para mim. É um mundo diferente, mas igualmente interessante. Talvez até mais.





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