Thursday, December 29, 2016

CIDRA SECA - FELIZ 2017! (uma crônica de Marcelo Rayel Correggiari)





Pode ser que sim, pode ser que não.

Sem compassos de espera, sem expectativas.

Quem aguentaria?

Ninguém, de fato. Em terras sem sonhos, nada floresce muito, nada é verdejante em boa parte do tempo, do ano, do período.

Não há ciclos, nem esperanças, nem temores. Tudo sempre parece absolutamente calma.

No outro lado do estuário há promessas. Como o próprio nome diz, ‘promessas’.

O suor do rosto não é devidamente recompensado, tudo está em falta, a fábula do grande atraso. Para qualquer lado onde se vire o rosto, é isso: uma teia frágil de um devir etéreo.

Lutas pessoais pelos ‘protagonismos do desejo’ e uma terra arrasada de dar dó. Entre às 23:59h do dia 31 e a 0:00h do dia primeiro, somente os ponteiros avançarão.

O perpétuo modo de se guiar em escuridão permanecerá. Não há de se ter perspectiva acamada de alguma corrosão nascida em fé.

É melhor não acreditar, é melhor não crer, é melhor não confiar. Inúmeras histórias: desde que o mundo é mundo, sempre fôra assim.

Das guerras, dos reinos, das vetustas batalhas, dos impérios, das amantes, do poder, das revoluções, dos registros, das lendas, dos indícios, dos fatos, das falsas provas, tudo pusilânime em entregar domicílio adentro, nesse futuro próximo, o mergulho profundo na grande anedota.

Governantes que não sabem governar, amantes que não sabem amar, mestres que não sabem ensinar, o bem que vive a fazer maldades: cansativo, enojante, repulsivo.

Portanto, cá estamos, sem petições ou plumas, para mais um giro de tempo fechado e calado em miseráveis migalhas corriqueiras, costumeiras, que muito pleiteamos para nosso avanço inabalável rumo à felicidade.

Viva o torto! Viva o obtuso! Viva o abjeto! Tríade magnânima, nossos mestres! Senhores de tudo aquilo que viceja sobre a face desse lugar.

Não há muito com o quê se surpreender. Assim fatalmente foi, mesmo que fechemos os olhos ou caia sobre nossos rostos o véu da ignorância.

Ergamos nossos aparatos de arames dentados e cortantes em nossa arte de transformar solares em sarcófagos, o ‘bunker’ definitivo de onde nada mais nasce ou perece.

Tudo aquilo que foi vivido será exatamente o que se viverá. Nem mais, nem menos.

O que foi ofertado será o mesmíssimo manjar a ser servido. Vivamos a vileza, o embuste, a inexatidão! Oremos pela água da terra seca, sua irrigação macabra de subir espinhos.

E celebremos a mesma covardia dos anos anteriores que nos guiou até aqui.

Entre fogos de vencimentos extemporâneos, numa praia imunda e regada a sentimentos entorpecidos, pular-se-ão sete ondas e a cidra seca, amarga, descerá o esôfago feito serrilhado anti-horário de cauda de arraia.

Essa Mercearia sempre desejará, a todos, ‘um 2017’. Quanto ao ‘feliz’, pensamos que fica a cargo de cada um.


Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 48 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É avesso a hermetismos
e herméticos em geral,
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO





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