Wednesday, October 4, 2017

ELIMINANDO DESAFETOS (uma crônica de Marcelo Rayel Correggiari)


Como todos bem sabem, essa iletrada Mercearia tem a ver com texto...
... e livros, por que não?!
As vendas de tal artigo nesse modesto estabelecimento comercial poderiam estar mais aquecidas. Contudo (e apesar da crise!), nada que espante brilhante plateia de se enfronhar no que pensam autoras(es), escritoras(es) e demais operadoras(es) de tão nobre indústria.
Sunday night at Guarany Theatre, Mesa 10 da IX Tarrafa Literária, a derradeira! Sob o nome de “Jornalismo do Agora e do Amanhã” e na batuta sempre esperta do mediador nota mil-bom papo Vladir Lemos (apresentador do Cartão Verde/TV Cultura), Cynara Menezes e o eternamente combativo José Trajano (ex-ESPN Brasil) vieram dar os seus ‘plás’.
Ambos, hoje, fazem jornalismo fora daquilo que se costumou chamar de “grande mídia” (sob égides de grandes marcas de empresas jornalísticas renomadas). Nos canais alternativos atualmente apresentados pela web/internet (como blogs e hubs de vídeo/TV como o YouTube), os dois consagrados nomes trazem para os holofotes assuntos e temas que nenhum ‘jornal-nacional-da-vida’ teria colhões de expor.
Cynara Menezes, magnífica, usou seu inerente talento para apresentar ao público a necessidade de se ter a “contrapartida”, o ‘outro lado’, as diferentes versões sobre um mesmo fato, o que naturalmente seria a essência do jornalismo, mas que hoje em dia passa muito longe disso. Ela sabe, como ninguém, trazer a plateia para perto quanto à relevância de seu trabalho, a saber: colaborar com as diferentes facetas da informação para uma consistente ‘formação de opinião’.
Já o Zé Trajano... com aquela cadência tijucana de elaborar a grande oratória (algo semelhante à conversa em mesa de bar, regada a muitos risos, humor e cerveja) continua sentando o relho para cima da babaquice!
Está igual a vinho: cada vez melhor!
A começar que ele dá ‘nome-aos-bois’, sem medo de ser feliz e correndo ‘pro’ abraço! Começou desancando o apresentador do Roda Viva (TV Cultura), Augusto Nunes, que, para ele, atua como preposto de qualquer ‘barão’ da grande mídia com uma facilidade e docilidade ímpar neste ‘mundão de meu Deus’.
Afinal, coragem, ouro e diamantes são quase sempre de difícil aquisição.
É admirável a coragem do Trajano em certas situações que fariam qualquer um de nós encolher. Certa feita, quando saíra da editoria do Ilustrada, da Folha de S.Paulo, para o caderno de esportes, fôra convocado para uma reunião no gabinete do patrão, o Otávio Frias.
Rega-bofe de presença, uísque e demais acepipes, onze da noite (pós-horário do fechamento do jornal). O comunicado do barão Frias: uma suspeitíssima transferência do diretor de jornal, o lendário jornalista Cláudio Abramo, para a Europa (se eu não me engano, Paris).
Sabedores das malícias do ‘regime de exceção’ em curso naquele instante (era época da Ditadura Militar), tirar do caminho um ‘homem de esquerda’ como Cláudio era um troço para lá de punitivo. Manobrinha bem suja, mas habilmente mitigada por Frias.
Até aí, morreu neves atolado em cuspe. Zé Trajano foi o Zé Trajano de sempre quando do anúncio do substituto de Abramo: o jornalista Bóris Casoy, um declarado simpatizante do CCC.
Aí, querido(a) freguês(a), ‘fodeu o barraco da Dita’! Trajano, em meio aos editores dos demais cadernos, pediu a palavra para comunicar que estava igualmente ‘puxando o carro’.
“Mas... Trajano! Não vai mudar nada no Esporte! Não vai acontecer nada no seu caderno”.
José Trajano explicou que ele não estava ali só pelo emprego e pelo salário, mas também pelo prazer de trabalhar e aprender com o mestre Abramo. O sumiço providenciado para o Cláudio também lhe tolhia certo elã no exercício do ofício e desdobramentos positivos para a carreira, sem contar que não compactuaria com a tremenda sacanagem feita contra o seu mestre.
Além disso, a cereja-do-bolo: ficar sob a tutela de Casoy, declarado simpatizante do CCC, soava como ‘o início da picada’! Uma roubada sem precedentes...
A hora de ‘entrar’, todos sabem. Mas a hora de ‘sair’, é para poucos.
Esse é o José Trajano: não abraça certas ‘ideias de jerico’ que rolam por aí, num mundo imerso em babaquice da pior espécie, onde a humanidade, a cortesia, a lealdade e a sensibilidade de se ‘vestir a pele do outro(a)’ parecem relegados a vigésimo plano. Num primeiro momento até soa grosseria da parte dele: uma observação mais detalhada, daquela com a lupa na mão, e rapidamente se vê que o respeito ao próximo não confunde ‘beijo roubado’ com ‘beijo à força’.
Nos comentários finais entre os honrosos membros do público após a ‘derradeira’, entre um gole de café e outro, verificou-se também que tudo hoje acaba descambando para o lance da política, ou do “debate político”.
Tremendo engano, o nosso! Não há “debate político” (e botem aspas nisso!). O que há é a utilização de um suposto debate político para o ataque vil a desafetos de toda sorte. Aliás, o trem hoje é encontrar pêlo em ovo como motivo suficiente para atacar aqueles de quem não gostamos quando a saída seria bem simples: ou se contrataria um(a) advogado(a), ou os casos de litígio seriam resolvidos no tapa.
A babaquice: presente nos relacionamentos, nas ‘baladas’, no ambiente de trabalho, comum na falta de comportamento humano e generoso do dia-a-dia, de não ter o(a) outro(a) em alguma consideração antes de uma tomada de decisão; esse açoite, essa brutalidade de causar a náusea e a vertigem, de pôr em prantos quem não se deve, de ferir tanto por tão pouco.

Item abundantemente encontrado comércio afora, mas não comercializado por essa modesta Mercearia.

Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 48 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É avesso a hermetismos
e herméticos em geral,
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO

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