Saturday, May 9, 2015

BALCONISTA É QUEM FAZ BALCÃO (por José Luiz Tahan)

publicado no Publish News em 13/04/2012


Hoje estou encasquetando com algumas ideias e nomes que se dão aos bois. A gente vive perto das palavras, e não tem jeito. Quando nos damos conta, começa a birra. A minha birra, ao menos.

Todos os meses chegam aqueles impressos, a folha de pagamento da equipe. O nome mais comum que se vê na qualificação profissional é o de balconista.

Balconista pra mim é quem faz balcão. Os marceneiros que constroem esses móveis nos quais apoiamos os cotovelos angustiados.

A madeira é a bisavó do livro, e os marceneiros têm uma profissão que namora a arte – estou me lembrando do Paulinho da Viola, ele mesmo um marceneiro nas suas horas vagas. Gosto do nome livreiro – já falei aqui que adoro ser chamado assim. 

Até o Carlo Carrenho, criador deste espaço, me chamava de “o último livreiro”, muito mais bonito do que o último balconista, sem dúvida.

Acho que quanto mais cuidarmos dos nomes das nossas ocupações mais vamos sentir o peso da responsabilidade depositada no rótulo. Ficamos mais pressionados e mais inspirados, acredito.

Uma vez assisti aquele filme, “Nunca te vi, sempre te amei”, que conta a bela relação entre um balco... – argh! – livreiro e sua cliente (cliente também é um nome ruim, rato de livraria idem, ai ai). Se não viram, vale a pena: que livreiro é o Anthony Hopkins na película!

Volta e meia, alunos de faculdade vêm me entrevistar para seus TCCs – trabalhos de conclusão de curso – ou jornalistas pedem uma declaração, e aí chega a hora de me autorrotular para os créditos da entrevista, um momento sempre enrolado.

Acho estranho falar que sou empresário. Aparenta que ganho mais dinheiro do que efetivamente ganho. Em “comerciante” também não me enquadro. Parece que eu negocio batatas – com todo o respeito às batatas, que fique claro, são perfeitas na vocação delas.

Acho que por isso tenho um bloqueio em tentar umas orientações de um Sebrae. Vai que a minha livraria vira um negócio organizado, com balconistas com bê gótico. Tomara que escrevendo este texto eu consiga destravar, acho que uma orientação pode ser boa para os livreiros rebeldes.

Somos livreiros e aprendizes de livreiro. Os iniciantes têm que se rotularem como aprendizes. O nosso ramo é tinhoso, delicado e neurótico.

Ainda bem que um balcão nos separa: longa vida aos marceneiros.


José Luiz Tahan, 41, é livreiro e editor.
 Dono da Realejo Livros e Edições em Santos, SP,
 gosta de ser chamado de "livreiro",
 pois acha mais específico do que
 "empresário" ou "comerciante",
 ainda mais porque gosta de pensar o livro
 ao mesmo tempo como obra de arte e produto.
 Nas horas vagas, transforma-se
 no blues-shouter Big Joe Tahan.


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