Tuesday, February 27, 2018

LEMBRA QUE O SONO É SAGRADO (por Germano Quaresma)



A falta de sexo, para Falópio, resultava numa insônia escruciante. Ele padecia de um priapismo crônico, e por tal razão passava os dias se arrastando, consequência das noites despertas.

Não é que a rigidez peniana o impedisse de dormir, afinal todo homem, mesmo os impotentes, acordam em ereção. Verdade que a primeira urina leva a dureza embora, é o que o populacho, em demonstração de seu insuperável mau gosto, denomina "tesão de mijo". Falópio dormiria com seu phallus erectus não fosse o não menos rígido colchão ortopédico em que deitava, forçado por sua coluna sentimental.

Ele se recolhia cedo, e logo a lembrança cívica das namoradas de antanho o assomava, fazendo o mastro erguer-se sem bandeira. Falópio usava dormir de bruços, mas o atrito do membro face à tábua do colchão o despertava.

Foi quando o psiquiatra o aconselhou a dormir de lado. Deu certo até o ingresso no território da vigília. Uma vez dormido, a primeira mudança involuntária de lado o fazia despertar, o membro batendo contra o colchão feito uma cancela de pedágio que não se ergueu e barrou o coche.

Como derradeira tentativa, esgotados os modos esquerda, direita e bruços, ou leste, oeste e sul, Falópio enxergou um norte na bússola da esperança: podia tentar dormir de barriga para cima.

Ele se deitou na noite quente, ligou o ar condicionado, cobriu-se de edredom macio e sentiu num torpor que poderia assim, rosto pro céu mirando Deus, entregar-se à volúpia de um sono restaurador. Foi indo, bobinho, entrando nos limites de Morfeu. Ao longe a lembrança de Váguina, sua namorada, o nome era isso, feminino de Váguiner segundo sua sogra. Ele a amava.

Lembrando o corpo nu de Váguina, seus seios esfregados contra a poça de sêmen que lhe brotava da glande, Falópio sofreu ereção brutal, e relaxou mais ainda. Teria dormido feito uma criança se o caralho, duro feito um diamante, não tivesse erguido o edredom, descobrindo-lhe os pés, que ficaram expostos ao frio do ar condicionado.




Germano Quaresma, ou Manuel Herzog,
nasceu em Santos, São Paulo, em 1964.
Criado na cidade de Cubatão,
trabalhou na indústria química
e formou-se em Direito.
Estreou na literatura em 1987
com os poemas de "Brincadeira Surrealista".
É autor dos romances
"A Jaca do Cemitério É Mais Doce" (2017),
"Dec(ad)ência" (2016), "O Evangelista" (2015)
e "Companhia Brasileira de Alquimia" (2013),
além dos livros de poemas
"6 Sonetos D’amor em Branco e Preto" (2016)
e "A Comédia de Alissia Bloom" (2014)



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