Thursday, December 22, 2016

O MALONE (uma crônica publicitária de Carlão Bittencourt)


Não concorde comigo,
pelo menos até eu acabar de falar
(Darryl F. Zanuck)


Se você teve a infelicidade de presenciar uma legítima puxada de saco, sabe do que vou falar. Note bem que simples bajulação não vale. Nada disso. Refiro-me àquela chaleirada para valer que, de tão forte, deixa até o alvo da vergonhosa subserviência totalmente passado.

Em propaganda esse tipo de babão é bastante comum. Conhecidíssimo, atende pelo codinome de Malone. E suas façanhas, no afã mais xiita de agradar ao chefe, são as famosas malonadas.

O Malone é imbatível no jogo escroto de se ajoelhar diante de qualquer forma de poder. Pra ele isso é natural. O lambeteiro nasceu sem um pingo de vergonha na cara. È capaz de gestos de causar asco num Dragão de Komôdo. Como na historinha que conto a seguir, provavelmente a maior malonada da história da propaganda brasileira. Prepare seu estômago.

Numa grande agência de São Paulo, nos anos 80, a Criação e o Atendimento estavam reunidos há horas, discutindo a campanha anual de uma grande montadora de automóveis, principal cliente da casa. A sala estava lotada.

Nisso, a porta se abriu e entrou o filho do dono. Problema. Não havia nenhuma cadeira vazia. Antes que alguém pudesse esboçar um gesto, o Malone rapidamente disse a que veio ao mundo.

Num gesto teatral, o baba-ovo se levantou e, ofereceu sua cadeira ao executivo, mandando essa pérola da sabujice mais servil:


“Patrãozinho, faz favor,
senta aqui que está quentinho...”

A reunião acabou.



Carlão Bittencourt
é redator publicitário
e cronista.
É autor de
"Pela Sete - Breves Histórias do Pano Verde"
(2003, Editora Codex),
um mergulho no universo
dos salões de bilhar de São Paulo
e escreve todas as quartas
em LEVA UM CASAQUINHO.








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