Thursday, June 22, 2017

EM PRÓXIMA PARADA, EDUARDO CAVALCANTI FALA DE MONSTROS DA ANTIGA AINDA ATUAIS


PRÓXIMA PARADA desta semana
traz os filmes clássicos de monstros
do estúdio Universal, e mostra
por que eles são essenciais
para o cinema de horror
e o que é o Dark Universe,
que teve (um péssimo) início
com a refilmagem da 'Múmia'.

Publicado originalmente
no caderno Galeria
do jornal diário
A Tribuna (de Santos SP)
em 18 de Junho de 2017
com a criação gráfica sinistra
de Luiz Sérgio Fonseca Moura.

Leia ouvindo 'Bela Lugosi's Dead'
do Bauhaus.

(Eduardo Cavalcanti)



Antes – muito, muito antes – de a Marvel virar um estúdio de cinema e lançar filmes com histórias que juntam seus super-heróis num só universo, outro estúdio já havia percebido que, se um personagem faz sucesso, por que não misturar vários e ver no que dá? Só que no lugar de gente usando malhas coloridas querendo salvar a humanidade, apresentava monstros que queriam mesmo era acabar com ela.

A Universal Studios, uma relíquia da Era de Ouro de Hollywood, é mais lembrada hoje como parque temático, mas já foi uma das mais inovadoras e influentes fábricas de ícones cinematográficos de que se tem notícia. Nesse caso, ícones de um gênero específico, o de terror.

Nenhum outro estúdio – com a possível exceção da britânica Hammer – se tornou tão notório por levar o medo às massas. Os monstros apresentados pela Universal em seu glorioso auge, durante a década de 30, formaram a base de todo o cinema de horror.

Boa parte deles era inspirada na literatura gótica britânica do Século 19 (Drácula, de Bram Stoker; Frankenstein, de Mary Shelley; O Homem Invisível, de H. G. Wells). Outros, eram criações com base no folclore europeu (O Lobisomem, de 1941), em versões de registros históricos (A Múmia, de 1932), e nas tendências do terror no cinema (O Monstro da Lagoa Negra, 1954).

Em comum, tinham a mesma estética de luz, sombra e tormento psicológico do expressionismo alemão – um dos principais movimentos de vanguarda da arte moderna do início do século 20. Diretores e fotógrafos europeus fugiram do nazismo em direção a Hollywood levando na bagagem essa inovação que teve impacto profundo no cine- ma norte-americano, e que geraria outro estilo influente até hoje, o policial noir.

Quase todos os filmes de monstro da Universal se tornaram clássicos e estabeleceram a temática fundamental do horror moderno – o conflito entre ciência e sobrenatural, e razão e superstição, e os conflitos morais derivados dessas oposições. Do mesmo modo, também acabaram superados, em termos de efeito de choque, pela evolução da linguagem cinematográfica, e se banalizaram pela incorporação à cultura pop.

Faz toda lógica, portanto, que a Universal tenha embarcado na tendência muito lucrativa dos mundos conectados dos filmes da Marvel, trazendo monstros no lugar de super-heróis. E se desde os quadrinhos a Marvel combina a trajetória de personagens vin- dos de contextos tão diferentes, quanto Thor e os Guardiões da Galáxia, o Dark Universe trará múmias e lobisomens compartilhando as mesmas histórias, por mais improvável e absurdo que isso possa parecer.

A própria Universal, em pleno declínio do horror tradicional, na década de 40, já tinha feito algo semelhante, quando juntou frankensteins, vampiros e afins em dois filmes, numa última tentativa de espremer até a última gota o potencial de bilheteria dos monstros originais. A diferença é que agora esse tipo de recurso é uma manobra calculada, e não um ato de desespero.

Outra diferença, também decisiva, é que o Dark Universe abandonou o terror, em favor da aventura. Ou algo parecido com isso.

O primeiro exemplar da série, o recém-lançado A Múmia, com Tom Cruise, é tão genérico que fica difícil saber o que o estúdio pretende fazer na refilmagem de A Noiva de Frankenstein, previsto para 2019. O filme de 1935 foi nada menos que o melhor de todo o ciclo dos monstros da Universal, a ponto de seu diretor, James Whale, ter se tornado uma figura lendária.

Nas décadas de 50 e 60, a Hammer injetou cores vivas e altas doses de violência e sexo em sua releitura memorável dos filmes de Drácula e Frankenstein. A Universal, ao que tudo indica, vai no sentido contrário. Está pronta para diluir todo o poder expressivo que ainda possa restar a esses e outros personagens que, se um dia representaram os piores pesadelos do público, agora tendem a jogar para uma plateia cada vez menos exigente e mais apática.


Eduardo Rubi Cavalcanti
é jornalista desde a década de 80.
Trabalhou em A TRIBUNA de Santos
e em várias outras publicações. 
É Mestre em Comunicação Social
pela Universidade Metodista de São Paulo
e leciona Jornalismo na Unisantos,
onde cursou sua graduação.
Publica domingo sim, domingo não,
em A TRIBUNA de Santos,
a página PRÓXIMA PARADA,
que reproduzimos aqui.

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