Thursday, June 1, 2017

UM PARA MIM, UM PARA VOCÊ, DOIS PARA TODOS (por Marcelo Rayel Correggiari)


Isso aqui ainda é uma Mercearia e, como um razoável estabelecimento de secos-e-molhados, não há nada de errado na realização de bons negócios.
Todos os negócios são bem-vindos: se o ofertado nesse humilde comércio encontra algum interesse por parte do(a) querido(a) freguês(a), podemos conversar sobre os métodos e formas de pagamento.
Alguém comercializar o que deseja, e da forma como melhor convir, é algo livre de maiores interferências. Assunto que só caberia para as partes interessadas.
Contudo (e bem ‘contudo’!), a negociação não pode virar negociata: se houver ‘externalização’, aí...
Para os que ainda não conhecem o conteúdo do termo ‘externalização’, super simples: imaginem uma fábrica de pneus. Imaginaram?! Pois bem, para que essa fábrica venda seus produtos, fábricas de automóveis são necessárias. Para que essas fábricas de automóveis tenham bom êxito, ruas precisam ser abertas.
Porém, o dinheiro para a abertura dessas vias não vem nem da fábrica de carros, nem da indústria de pneus. Não é permitida a construção de uma rua pela iniciativa privada, cabendo ao famigerado ‘poder público’ arrecadar os devidos impostos para utilizar o dinheiro desses tributos no ‘nascimento’ dessas ruas.
Entretanto, o lucro tanto da fábrica de pneus quanto da automobilística está diretamente ligado à presença dessas vias. Sem elas, cessam as vendas desses dois artigos e esse ganho das fábricas fica comprometido.
Ou seja, para que a fábrica de pneus lucre, é preciso que o povo pague pela abertura de ruas. A isso damos o nome de ‘externalização’.
Todo comércio é sagrado, e não há problema algum em comercializar o que for. Só que para o sucesso dos negócios, a transação precisa estar boa para um, boa para o outro e excelente para absolutamente todo mundo, até mesmo para aqueles que nem estavam sabendo da negociação. Caso contrário, ...
Então, vamos lá... o que tem de gente fazendo negocinho escuso, obscuro pacas, esquisitaço, entre outras bossas, não está no gibi. E se vocês acham que estamos falando de ‘políticos’, na-na-ni-na-nina! É da massa da população, mesmo! Povão... já ouviram falar?! É cada troca-troca de cair o queixo.
Aí... quando a transação dá errada, o que se esperava não veio... é um tal ‘pé-na-cara’, ‘pé-na-porta’, esculacho, ‘bas fond’, gritaria... um ‘auê’ daqueles.
É de se perguntar ao(à) distinto(a): “... mas o que é que você queria fazendo negócio com essa gente?! Tapete vermelho?! Nota fiscal com certificado de garantia estendida?!”. Dá licença, ‘né’?!
O segredo da boa negociação não tem segredo: ela simplesmente tem de ser boa para pessoas que a gente nem conhece. Tem de ser boa ‘no geral’, não somente para as partes imediatamente envolvidas. Negociação de sucesso é aquele que não interfere negativamente na vida de alguém. Se não for assim, é um ‘saruê’ ‘da moléstia’.
Porque o que por aqui se faz pode ter sua representação em esferas mais elevadas. Aí, é bom não reclamar...
Reiterando a Mercearia da semana passada, continuamos a achar muuuuuito estranho a urgência nas reformas trabalhista e previdenciária, sob a alegação de que é “... para salvar as aposentadorias e pensões” e de que “... são absolutamente necessárias para a retomada do crescimento no país”.
15 entre 10 economistas convidados para as comissões de assuntos econômicos das casas legislativas são quase categóricos na afirmação de que não essas reformas que farão o país crescer novamente. Segundo eles, o Brasil, de fato, nunca ‘cresceeeeeu’... assim... ‘taaaanto’ nos últimos 20 anos. Apenas teria feito alguns ajustes pontuais que beneficiaram certo aumento de renda interna, pequenas mudanças que contaram com certa conjuntura favorável.
As mudanças que realmente garantiriam bom rumo para essa retomada do crescimento seriam as reformas política e tributária. Isso, somado ao bom andamento da educação no país, é o que realmente daria certo alento para o tão sonhado “... crescimento”.
No mais, uma discussão bem tépida se deve haver ‘... mais imposto’, ‘... menos imposto’, ‘... mais direitos’, ‘... menos direitos’ que parece realmente não levar a lugar algum. Isso sem contar que se o troço der errado, a conta vai para ‘la derrière’ populacional.
Ou como dizia o falecido Alborghetti: “(...) Tudo o que pinta de novo, pinta na bunda do povo. (...)” [sic].

Midiaticamente, o ‘trem’ é uma verdadeira cracolândia: políticos, formadores de opinião e imprensa em desespero, naquela fissura, para que as reformas sejam aprovadas para ontem. Se Deus aparecer em Brasília, dizendo: “... é ‘nóis’, mano! Relaxa com esse lance de reforma que ‘tá’ tudo sussa...”, vai levar pedrada que só.
“Reformas... ou morte!”. Hmm... esquisitaço, isso! De novo, “tem gato na tuba”. Expliquem isso direito: as trabalhistas e previdenciárias na frente das políticas e tributárias. E tem de sair a qualquer custo! Estranho... muuuuuito estranho.
Aí, nem precisa dizer, ‘né’... é negociata, não é negociação. Se bobearmos, a Constituição é rasgada e feita de confete para mais um carnaval. E o pessoal sequer se enrubesce, gagueja, ou qualquer coisa parecida.
O atual governo já sinalizou ao mercado sua mais nova ameaça: se a reforma previdenciária não sair na íntegra, os pontos rechaçados voltarão à casa legislativa por meio de medida provisória. Essa Mercearia, ao ouvir tamanha sandice, lembrou da infância: um negocinho fascistoide ‘per cazzo’. Lembramos do Figueiredo. Pensamos: “Não é possível! A foto de presidente pendurada no gabinete do Temer deve ser a do Ernesto Geisel!”. Só pode...
Walter Benjamin sempre nos pareceu meio cético em relação às ‘novidades da história’: realmente, andamos, andamos, andamos e a impressão que se tem é de uma involução de doer na alma.
A pergunta que se faz não é “... andaremos na linha?!”. A grande curiosidade fica em qual momento faremos algo bom para todos.


Marcelo Rayel Correggiari
nasceu em Santos há 48 anos
e vive na mítica Vila Belmiro.
Formado em Letras,
leciona Inglês para sobreviver,
mas vive mesmo é de escrever e traduzir.
É avesso a hermetismos
e herméticos em geral,
e escreve semanalmente em
LEVA UM CASAQUINHO


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