Monday, March 28, 2016

CAPAS E CAPUZES: UM HISTÓRICO DOS SUPER-HERÓIS NA TV (por Carlos Cirne - parte 2)


publicado originalmente em Colunas & Notas
com material da Playlist



ANOS 60: MESMA BAT-HORA, MESMO BAT CANAL

Pouco depois do encerramento de As Aventuras do Superman, o produtor Ed Graham adquiriu os direitos de seu parceiro no combate ao crime, o Batman, na esperança de produzir um seriado nos mesmos moldes do Superman, com o jogador de futebol americano Mike Henry (que se tornaria astro em alguns filmes de Tarzan) como o cruzado mascarado. Quando ele não conseguiu um acordo com a rede de televisão CBS, a ABC entrou na jogada, com o produtor William Dozier (ex-marido de Joan Fontaine) como responsável pelo show.

Dozier não havia sequer lido qualquer um dos gibis, e procurou o roteirista Lorenzo Semple Jr (autor de A Trama, 1974, e Três Dias do Condor, 1975), dizendo: “Isto” é o que a ABC está nos dando! O conceito da série praticamente explodiu na minha cabeça! Ele pretendia fazer de Batman não uma série policial, mas uma comédia pop beirando o kitsch.



A dupla levou a ideia de volta para a ABC – eloquentemente apresentada com todos os POW!! BLAM!! WHAMM!! que interferiam na ação – e, apesar da surpresa dos executivos, o show recebeu a aprovação para se tornar uma série regular, sem sequer a preparação de um episódio piloto. Na verdade, eles pretendiam fazer um longa-metragem que “apresentasse” os personagens ao público, mas a ABC estava tão entusiástica a respeito da série que esperaram até o final da primeira temporada para produzir o filme, que chegou aos cinemas apenas dois meses depois do final da primeira temporada da série, em julho de 1966.

O ator Adam West foi escala no papel título, depois de Dozier vê-lo num comercial de Quik para a Nestlé (numa paródia de James Bond), enquanto que o jovem Burt Ward, de 19 anos, foi escalado para viver seu parceiro Robin e o veterano ator inglês Alan Napier seria seu mordomo, Alfred. O show também se tornou notório por apresentar convidados especiais nos papeis dos coloridos vilões do crime, como Cesar Romero (Coringa), Burgess Meredith (Pinguim), Frank Gorshin (Charada), Julie Newmar e Eartha Kitt (Mulher Gato), Victor Buono (Rei Tut), Vincent Price (Cabeça de Ovo), e George Sandres, Otto Priminger e Eli Wallach (Sr. Frio). O show era divertido, cheio de comédia para as crianças, certa malícia para os adultos e, a cada dois ou três episódios, terminava num “gancho” que lembrava muito os velhos seriados de cinema.



A série foi, a princípio, um enorme sucesso, ocupando os quinto e décimo lugares entre os shows mais vistos de 1966 (era apresentado duas vezes por semana), com mais de 13 milhões de espectadores em cada episódio. Tinha uma aura psicodélica que o encaixava entre A Hard Day’s Night e Woodstock. Mas a audiência caiu muito depois da primeira temporada, mesmo com a inclusão de apelos como a Batgirl (Ivonne Craig) e sua Bat-motocicleta. Na verdade, a série era calcada no princípio de “mais do mesmo”, e teve sua produção abreviada após os 26 episódios da terceira temporada, dado seu orçamento cada vez mais alto.

Objeto de culto entre os fãs, a série permaneceu – por uma questão de direitos autorais – indisponível em DVD até 2014, mas assim mesmo foi parodiada e homenageada – inclusive pelos Simpsons – desde sua exibição. E abriu caminho para outra produção de Dozier, que durou apenas uma temporada: O Besouro Verde, que estreou em 1966, e foi notável por apresentar o lendário ator Bruce Lee no papel de Kato. Infelizmente, as convulsões sociais do final da década afastaram os heróis encapuzados das telinhas por um bom tempo.




ANOS 1970: NÃO ME IRRITE, VOCÊ NÃO VAI GOSTAR DE ME VER IRRITADO

Eles não sumiram por muito tempo, principalmente por causa de uma nova companhia que reinventou o negócio dos quadrinhos. A DC Comics vinha reinando por décadas até que, em meados dos anos 1960, o editor da Marvel, Stan Lee, apresentou uma nova legião de heróis: primeiro o Quarteto Fantástico, depois o Homem-Aranha, Hulk, Thor, Homem-Formiga, Homem de Ferro, os X-Men, e muitos mais. Mais populares e muito mais próximos do leitor que os intocáveis deuses da DC, tornaram-se sucessos que vendiam 50 milhões de revistas por ano em 1968, e não só para crianças, mas para adultos também. Lee logo tentou transportar seus heróis para a TV, mas o começo não foi nada fácil.

Neste meio tempo, um terceiro herói da DC chega à telinha com sucesso, na pele de Diana Prince/Mulher Maravilha, a destemida amazona criada por Willian Moulton Marston em 1941, que Dozier vinha tentando transformar numa série desde a década passada, após Batman.



Em 1974 a ABC produziu um piloto com Cathy Lee Crosby no papel principal, que foi exibido como um especial em março de 1974, mas foi considerado um erro pela rede de TV. Mesmo assim, encomendaram uma versão mais próxima do original, escrita por Stanley Ralph Ross, autor de um terço dos roteiros de Batman. Escalada como Diana estava a ex-Miss Mundo Lynda Carter, e o sucesso foi tamanho que gerou mais dois especiais e uma primeira temporada de mais onze episódios, todos ambientados na época da Segunda Guerra Mundial.

Apesar dos bons índices de audiência, a ABC não renovou a série, e a CBS passou a produzi-la, modernizando a ação e se livrando de todos os atores, exceto Lynda Carter. Mais duas temporadas foram produzidas, ajudando a colocar o personagem, seu laço e sua transformação giratória no inconsciente coletivo do público. Infelizmente esta foi a única tentativa bem sucedida de colocar em cena a heroína, o que a israelense Gal Gadot espera conseguir modificar no próximo Batman vs Superman: A Origem da Justiça.



Uma das razões da não renovação de Mulher Maravilha foi a repentina acirrada competição na TV. O Homem de Seis Milhões de Dólares e A Mulher Biônica, superherois sem uniformes, tornaram-se sucessos concomitantes à Mulher Maravilha. E os personagens da Marvel finalmente estavam chegando às telinhas, graças aos esforços de Stan Lee.

Em setembro de 1977, além da estreia da Mulher Maravilha, a CBS apresentou também dois pilotos de novas séries, que alcançaram boa audiência: O Espetacular Homem-Aranha e O Incrível Hulk. Ambos começaram a ser transmitidos em 1978, sendo que Hulk foi, de longe, o mais bem sucedido.


Com a estrutura da história baseada no clássico sucesso anterior O Fugitivo, com o Dr. David Banner (o nome foi mudado de Bruce – dos gibis – para David porque os executivos acharam Bruce “muito gay”), interpretado por Bill Bixby fugindo de um crime que não cometeu, ajudando pessoas e, ocasionalmente, transformando-se no gigante verde Hulk (interpretado por Lou Ferrigno) e arrebentando tudo à sua volta. A série durou cinco temporadas, e ainda produziu mais três telefilmes nos anos 1980, além de influenciar as produções para cinema posteriores.



Menos sucesso teve Peter Parker. Criada por Alvin Boretz (de Kojak) e estrelada por Nicholas Hammond -– Friederich, uma das crianças Von Trapp em A Noviça Rebelde --, a série do Homem-Aranha não se assemelhava em quase nada aos gibis, sem nenhum dos vilões tradicionais aparecendo e com óbvias restrições orçamentárias na produção. Apesar da boa audiência, a série teve uma primeira temporada de seis episódios e uma segunda de treze, sendo cancelada a seguir, para grande decepção de Lee.

A CBS parecia ter uma estranha relação com as séries de superherois. Apesar de pilotos para Dr. Estranho (1978) e Capitão América (1979), no começo dos anos 1980 apenas O Incrível Hulk permanecia no ar, e mesmo assim com os executivos preocupados que a rede fosse estigmatizada pelo gênero. E, apesar do sucesso do Superman de Christopher Reeve nos cinemas, os super-heróis ficaram longe das telinhas por um bom tempo.



ANOS 1980 e 1990: A MORTE E A VIDA DO SUPERMAN

Depois que o Hulk saiu da programação, poucos super-heróis podiam ser encontrados na TV. A ABC produziu por três temporadas a comédia The Greatest American Hero, sobre um professor tornado super-herói, que não teve maiores repercussões.

Os anos 1980 permaneceram sem nenhuma série de super-heróis até 1988. Os detentores dos direitos sobre o Superman produziram uma série chamada Superboy em 88, para coincidir com os 50 anos do personagem, que durou quatro temporadas, apesar das constantes trocas de equipe criativa e atores. Ela só foi cancelada quando a Warner recuperou os direitos sobre a franquia, e parece que os fãs não sentiram muito sua falta.

Não muito tempo depois, o enorme sucesso do Batman de Tim Burton fez ressurgir o interesse no gênero, e algumas novidades surgiram nas telinhas em seguida. As de maior sucesso foram as séries animadas de Batman, Superman e dos X-Men, consideradas por alguns fãs como as versões definitivas dos heróis. Os 1990 ainda trouxeram a primeira versão de The Flash (1990), com uma temporada apenas.



A única série a capitalizar em cima do sucesso de Batman foi Lois & Clark: As Novas Aventuras do Superman, estrelada por Dean Cain como o kryptoniano favorito de todos e Teri Hatcher como seu interesse romântico, a repórter Lois Lane. A série transferiu a ênfase da ação para a redação do Planeta Diário, dando um tratamento quase de comédia aos episódios.

Claro que com o baixo orçamento a maioria dos vilões tradicionais não estava presente, mas mesmo assim Cain e Hatcher definiram os personagens para toda uma geração. Ajudou o fato da série coincidir com a controvérsia da “Morte do Superman” nos quadrinhos, o que fez a ABC manter a série até 1997, quando outra revolução estava para acontecer no gênero.

(continua amanhã...)


Carlos Cirne é um dos mais respeitados
críticos de cinema de São Paulo.
Ao lado do pesquisador teatral Marcelo Pestana,
vem editando há 14 anos a newsletter
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