Thursday, May 11, 2017

JIM JARMUSCH (por Antonio Luiz Nilo)



Ontem, finalmente, assisti Amantes Eternos, de Jim Jarmusch, produzido em 2013 e com pouca ou nenhuma repercussão aqui em terra brasilis.

Confesso que protelei por quase 4 anos por puro preconceito. Jamais assistiria a um filme de vampiros, iria de encontro ao meu pretenso bom gosto cinematográfico. Lembrei do português da padaria que sempre me dizia, com simpatia e uma ponta de ironia, “jamais diga jamais”. E eu, sempre na minha empáfia de postulante a aprendiz de intelectual, ouvindo com pouca tolerância um português repetir seus aforismos fora de moda, tive que me dobrar aos fatos. Fato é que hoje o português mantém sua padaria, mora num apartamento de 4 suítes e anda de Corolla do ano. E o “crítico de cinema” gostosão aqui por sorte mora no apartamento que foi dos seus pais, só cumpre com 70% dos seus compromissos mensais e mal consegue manter sua bike de 450 reais. Pois, pois...

Mas, me desculpem, Jim Jarmusch não tem nada a ver com isso. Só achei estranho um diretor do seu calibre aparentemente enveredar por um estilo hipercomercial. Ainda cheguei a imaginar que essa legião de grandes diretores americanos contemporâneos, da qual fazem parte gênios como Todd Solondz, Spike Jonze, David Fincher, Paul Thomas Anderson e os Irmãos Coen, estavam com seus dias contados nas bilheterias da sétima arte. Afinal, a massa do público gosta mesmo é de histórias sobrenaturais, violência, ficção científica, velocidade, luta e, é claro, vampiro... muitos vampiros. Cinema arte é um luxo para meia dúzia de gatos pingados em salas de cinema alternativo cada vez menores e mais escondidas.

Mas, como se tratava de Jim Jarmusch, o diretor que bagunçou a minha cabecinha de espectador trivial com filmes fascinantes como Ghost Dog, Daunbailó, Uma Noite sobre a Terra, Trem Mistério, Sobre Cafés e Cigarros, Dead Man e o relativamente conhecido Broken Flowers, eu teria a obrigação de pelo menos assistir ao trailer para não tirar conclusões precipitadas. Foi exatamente o que “não” fiz. Ainda bem, poderia ter tomado a decisão de não assistir, até porque os trailers nem sempre são assim tão sedutores, ainda mais em filmes de pouca ação e muita introspecção.

Fiz uma pipoca com sal rosa do Himalaia (para me eximir um pouco da culpa do microondas), abri uma coca-cola, que a minha nutricionista só permite aos sábados (claro que é lorota...se eu não tenho grana pra arrumar a bike, imagina pagar uma nutricionista... com certeza, eu morreria de fome), peguei a senha do Netflix da minha irmã e me preparei psicologicamente para ver um filme de vampiros.

Bingo. Assisti a um filmaço. Vampiros eruditos, que se escondem em seus “castelos” particulares ambientados pelo bom gosto estético e musical, desfilam os seus conhecimentos científicos e históricos seculares, na cumplicidade de uma história de amor excêntrica e ao mesmo tempo enternecedora. E, como não podia deixar de ser, com direito a sangue humano e até mesmo umas poucas mordidas em pescoços desavisados.

Vampiros que inquirem a própria classe num autoquestionamento insólito, mas de uma responsabilidade sobre-humana. E, acima de tudo, que questionam como testemunhas “vivas” o rumo tortuoso que o mundo tomou nestes últimos séculos, definhando social e moralmente.

Uma história de vampiros para adultos. De pouco sangue, sem violência, sem terror, sem ação, mas com muito charme e elegância.

Uma curiosidade sobre os bastidores do filme: os produtores pediram para que o diretor incluísse mais cenas de ação. Ele fez exatamente o contrário e tirou as poucas que existiam.

Jim Jarmusch tem os seus amantes eternos. E eu sou um deles.



Antonio Luiz Nilo
nasceu em Santos
e é redator publicitário
e diretor de criação
há quase 30 anos,
com prêmios nacionais
e internacionais.
Circulou a trabalho
por todo o país,
com paradas prolongadas
em Brasília,
Belo Horizonte
e Salvador.
Publicou em 1986
"Poemas de Duas Gerações"
e, mais recentemente, o romance
"Ascensão e Queda de Pedro Pluma"
(à venda em alnilo@gmail.com).
Além disso, atuou como cronista
para o diário Correio da Bahia.
De volta a Santos desde 2013,
Antonio segue sua trajetória
cuidando de Projetos Especiais
na Fenômeno Propaganda
e como sócio-diretor
da Agência de Textos
TP Texto Profissional.





 





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