Thursday, March 1, 2018

FÁBIO CAMPOS COMENTA O FILME DA SEMANA: "TRAMA FANTASMA", DE PT ANDERSON





Paul Thomas Anderson é um dos cineastas mais autorais da atualidade, você pode gostar ou não dos filmes dele mas tem que admitir, o cara não faz concessões. Difícil apontar em toda a sua filmografia um filme fácil, talvez o mais fácil deles seja Boogie Nights e mesmo assim tem o mundo da pornografia como tema, não é exatamente um filme fácil.

Como todo cineasta autoral, ou você embarca de cabeça em seus filmes, ou o filme parece morno, lento, arrastado, sem graça. Eu, por exemplo, detestei seu ultimo filme, Vicio Inerente, mas não deixa de ter sua marca pessoal.

Seu ultimo filme, A Trama Fantasma, não é diferente e ainda tem um atrativo extra, é a despedida de Daniel Day Lewis do cinema, o que pode levar mais gente a assistir o filme, já que os filmes do diretor nunca são sucessos de bilheteria – o preço a pagar por não se fazer concessões.
No filme Daniel Day Lewis é Reynolds Woodcock, um genial e bem-sucedido estilista na Inglaterra pós-segunda guerra.

Reynolds é extremamente perfeccionista e tem uma rotina extremamente rígida, voltada totalmente para a sua criação. Sua irmã, Cyril – a ótima Lesley Manville – se assegura de que nada perturbe a atenção do irmão. Qualquer coisa além da criação fica relegada a segundo plano, inclusive relacionamentos amorosos. O encontramos no inicio do filme no final de um relacionamento, pronto para descartar a parceira.

Já sozinho, tomando café da manhã num restaurante, ele encontra uma jovem garçonete, Alma – Vicky Krieps, perfeita para o papel – bela, espontânea, um tanto simples, mas com potencial para se tornar uma de suas melhores criações. Aí está um dos principais temas do filme, um criador obcecado só consegue se apaixonar por uma de suas criações, e é exatamente o que acontece. Na tela a maneira como o jogo de sedução entre os dois é apresentado é algo espetacular, Reynolds de cara dá a sua maior cartada e usa Alma como modelo para um vestido, certo do seu enorme poder de sedução dentro do seu metier. Alma se encanta com o talento, a sofisticação, a elegância e a educação do estilista. Isso se dá sem pressa, o espectador se sente um voyers observando os dois.
Lentamente, Alma vai se encaixando na vida de Reynolds, evoluindo como uma criação sua, cada vez mais parecida com o criador, mas nunca tomando o protagonismo, sempre em segundo plano, caminhando para repetir o roteiro do relacionamento anterior e, provavelmente, todos os relacionamentos anteriores.

Mas, ao contrario da amante anterior, ela vai lutar contra o descarte usando tudo que aprendeu sobre o amante.
Diferentemente da imensa maioria das produções atuais, o filme não tem pressa, não pinta o mundo de cor de rosa, não divide a turma entre mocinhos e bandidos. Tanto os personagens como as cenas são carregadas de ambiguidade, alguém capaz de uma gentileza é logo em seguida capaz de uma tremenda grosseria. O filme não se preocupa em explicar tudo, deixa que cada um tome suas conclusões.

Tudo no filme beira a perfeição, o figurino, a fotografia, os diálogos, a trilha sonora e a sublime direção de atore – isso já era de se esperar, vindo de um cineasta que conseguiu uma atuação convincente de Adam Sandler.
Se você for capturado pelo filme vai sair dele cheio de duvidas e questionamentos – mais uma característica dos filmes de Anderson – o filme me pareceu espelhar a dinâmica das relações, onde sempre há disputa pelo protagonismo e dominância, normalmente tentando causar no outro uma dependência.

Apresar das 6 indicações ao Oscar, dificilmente o filme deve ganhar alguma – Daniel Day Lewis já tem três – mas, como todo filme de Paul Thomas Anderson, é um filme que merece ser visto.


TRAMA FANTASMA
(Phantom Thread, 2017, 130 minutos)

Produção e Direção
Paul Thomas Anderson


Elenco
Daniel Day Lewis
Vicky Krieps
Lesley Manville
Pip Phillips
Camila Rutheford
Brian Gleeson
Sarah Lamesch



Cotação

em cartaz nas Redes Roxy e Cinemark


Fábio Campos convive com filmes e música
desde que nasceu, 50 anos atrás.
Seus textos sobre cinema passam ao largo
do vício da objetividade que norteia
a imensa maioria dos resenhistas.
Fábio é colaborador contumaz
de LEVA UM CASAQUINHO.


2 comments:

  1. Assisti ao filme esta semana. Daniel surpreendente, impecável. Mas a trama me lembrou os aristocráticos dramas do século XIX. Reflexões sobre relacionamentos contemporâneos somente como metáfora.

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  2. Assisti ao filme esta semana. Daniel surpreendente, impecável. Mas a trama me lembrou os aristocráticos dramas do século XIX. Reflexões sobre relacionamentos contemporâneos somente como metáfora.

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