Wednesday, March 21, 2018

O VISIONÁRIO UMBERTO ECO (por Denise Marino)



Em 2015, numa cerimônia na Universidade de Turim, Umberto Eco declarou:

“As mídias sociais deram direito à fala a legiões de imbecis que, anteriormente, falavam só no bar, depois de uma taça de vinho, sem causar dano à coletividade. (...) O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade”.

Muita gente torceu o nariz para o escritor italiano: “elitista” – pensaram. E alguns correram a defender o direito à voz dos excluídos da razão e do bom senso e a saudar a internet como um espaço democrático de comunicação e informação.

Passados quase três anos, duvido que exista um único internauta ativo que, pelo menos três vezes por semana, ao deparar com certos posts em sua linha do tempo, não tenha exclamado com convicção: “imbecil!”, “idiota!!”.

Dá para ouvir Umberto Eco em seu descanso eterno: - Tesoro, non te l´no detto?

Mas o filósofo e professor de Semiótica não parou por aí. Ele criticou o excesso de informação, tão prejudicial quanto a falta de informação: “O excesso de informação provoca amnésia” – disse.
Falou também sobre manipulação política e, como não podia deixar de ser, falou sobre as mentiras, que podem transformar a internet num “mundo selvagem e perigoso”.

De fato, as mentiras e as deturpações maliciosas dos fatos, das fotos e das falas acirram os ânimos e promovem o tal “ódio” de que um lado acusa o outro. “Selva” é uma boa imagem.

Então, por que razões as pessoas publicam e compartilham mentiras?

A primeira razão é óbvia. Desde tempos imemoriais as mentiras têm sido usadas para denegrir os adversários ou inimigos. Estratégia de poder ou mera canalhice, simples assim.
Entretanto, tanto no passado como atualmente, os canalhas necessitam dos mensageiros para reproduzir e espalhar suas maledicências.
Vejo mensageiros de três tipos: o primeiro é contratado. O segundo é o crente, o iludido que realmente acredita no teor das mensagens que o “líder” lhe sugere propagar. E o terceiro é o militante, que sabe que as mensagens são falsas, mas acredita que elas podem favorecer a “causa” que é única coisa que importa. Em outras palavras, o militante adota a tese de que “os fins justificam os meios” esquecendo que diferentes caminhos conduzem a diferentes destinos.

Ao se despedirem da ética ou do senso crítico, os mensageiros se aproximam do território da imbecilidade e da idiotia mencionadas por Eco. Sem eles, o canalha teria dificuldades em sobreviver.

Mas, os mensageiros não são os únicos a compartilhar mentiras. Há os distraídos, os apressados e os idiotas de verdade que se deixam levar pelo tom alarmista e não checam as fontes; não ponderam, não comparam e saem compartilhando, alucinadamente, como se tivessem vindo ao mundo, exclusivamente para isso.

Enfim, assim como os canalhas criadores de calúnias e mentiras, os mensageiros não são exclusividade contemporânea. Que seria dos grandes tiranos da história se não fossem os mensageiros pagos, os militantes e os fanáticos crentes? Por outro lado, que seria da intriga e da fofoca se não fossem os apressados, superficiais e os idiotas?

Todavia, atualmente, chama a atenção um propagador de mentiras que, me parece, constitui uma novidade.

Trata-se do “compartilhador indignado”. Ele navega como uma espécie de inspetor das redes sociais. Assim que detecta uma mentira ou falácia, compartilha, revoltado. Porém, via de regra, acredita que sua indignação será compreendida. O que acaba acontecendo, ao contrário, é insuflar a coragem aos idiotas para assumirem suas idiotices.

Dialético! Tentarei explicar com exemplos.

O idiota está em sua casa cogitando sozinho... “Esse Sérgio Moro é esquisito, persegue o Lula; olha pra cima quando fala; estudou nos Estados Unidos...”

De repente, o estulto entra no feicebuque e dá de cara com um post do “compartilhador indignado”: “Moro é da Cia”.

O tanso se agita: “ahá, eu sabia!”

E, assim, com forças renovadas, sentindo-se o máximo, como só os idiotas sentem, saí gritando nas redes: “o Moro é da Cia! O Moro é da Cia!”
Um outro exemplo, com a imbecilidade oposta, para tornar-me compreensível.

O idiota está em sua casa cogitando sozinho... “Essa Marielle é do PSOL, apoia o Lula, defende bandidos...”

Eis que o estulto entra no feicebuque e dá de cara com um post do “compartilhador indignado”: Marielle foi casada com o Marcinho VP”

O tanso de agita: “ahá, eu sabia!”

E, assim, com forças renovadas, sentindo-se o máximo, como só os idiotas sentem, saí gritando nas redes: “a Marielle é do tráfico! A Marielle é do tráfico!”

A psicologia explica a reação do imbecil. Sozinho, ele é capaz de um pouco de autocrítica ou controle. Mas, quando o imbecil se vê num grupo de iguais ele se sente forte e a imbecilidade se fortalece.

Esse é o fenômeno que explica as violências praticas pelas torcidas organizadas, pelos que praticam estupro coletivo ou mesmo pelas milícias formadas pelos governos totalitários de direita e esquerda ou, paralelamente, pelos criminosos e traficantes.

... Mondo selvaggio e pericoloso.

O compartilhador indignado deve estar me xingando: “Porra! Não sou o culpado!”
Não, não é integralmente. Os mensageiros ainda existirão. Mas você pode fazer a sua parte, deixando de divulgar as mentiras e falácias com as quais não concorda. E se não resistir, porque elas lhe incomodam demais, em vez de reproduzir, explique porque são mentiras ou falácias.

Explique, não grite! Use o bom senso, em vez da raiva.

Creio que podemos colaborar com 25% menos de imbecilidade.





Meu nome é Denise Mattos Marino,
mas fui sintetizada: Denise Marino
ou, simplesmente, Dê,
acompanhada ou não do Marino.
Sou historiadora e professora de história.
Atualmente aposentada – fui mais rápida
que a reforma. Mas ainda levo
para os meus aposentos a curiosidade,
o “só sei que nada sei”
e a vontade de ensinar.

Ah! Sou libriana.

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