Tuesday, November 10, 2015

PIRELLI: CINQUENTA ANOS DO CALENDÁRIO QUE AJUDOU A MUDAR O NOSSO TEMPO





Não há mais como negar: o mundo masculino, como nós o conhecemos, parece estar com os dias contados. 



O fim das fotos de nu frontal na Revista PLAYBOY é uma evidência clara disso. Os executivos da PLAYBOY não admitem publicamente, mas tempos atrás o mercado publicitário deu um ultimato à revista: ou mudavam o linha editoral, ou muitos anunciantes iriam zarpar de suas páginas. Motivo: empresas que visavam atingir consumidores homossexuais passarama ter receio de expor seus produtos nas páginas de uma revista que exibe mulheres completamente nuas. PLAYBOY não teve saída: cedeu para conseguir sobreviver no mercado publicitário.


 Pois bem: a nova vítima dos marquetólogos politicamente corretos de plantão é o tradicionalíssimo Calendário Pirelli, da famosa marca de fabricantes de pneus européia, que anuncia uma mudança significativa para 2016: ao invés de trazer fotos de modelos sensuais, exuberantemente femininas, como de hábito há 50 anos, a edição do ano que vem trará imagens de mulheres "fortes", de atitude e de impacto – como a tenista Serena Williams e a cantora e compositora Patti Smith.

Patti Smith comentou que ficou muito surpresa com o convite que recebeu para aparecer no calendário, e declarou: "Não faço ideia de como o público tradicional vai receber isso, mas acho que eles devem admirar essa mudança ousada, vamos ver..."

Já a fotógrafa americana Annie Leibovitz, responsável pelas fotos, está radiante com a novidade: "Esse calendário vai ser completamente diferente. É uma grande mudança. A ideia é fazer fotos despretensiosas, indo direto ao ponto numa série clássica de retratos. Quero mostrar mulheres que parecem fortes, mas que são assim naturalmente. Então, decidi partir para um conceito bem simples, fotografando todas elas no estúdio."

Além de Patti Smith e Serena Williams, a edição 2016 do Calendário Pirelli trará a artista plástica Yoko Ono, a escritora Fran Lebowitz, a comediante Amy Schumer, a escritora e atriz Tavi Gevinson, a diretora Ava DuVernay, a filantropa Agnes Gund, a produtora de cinema Kathleen Kennedy, a empresária Mellody Hobson, a artista visual iraniana Shirin Neshat e a atriz chinesa Yao Chen, além da modelo russa Natalia Vodianova numa participação bastante inusitada, que deve dar o que falar.


Pois é, os tempos mudaram. Cinquenta anos atrás, quando Betty Friedan invadiu com um grupo de mulheres o Oak Room do Plaza Hotel, em Nova York -- onde só homens podiam entrar até então --, todo arremedo de mudança social forjado por militantes feministas era realizado de cara limpa na queda de braço e(ou) na chamada para a consciência, tendo como aliado os ventos nada conservadores que sopravam na época. 

Hoje é tudo completamente diferente. A velha bandeira feminista foi devidamente aposentada. Em seu lugar, entrou em cena a bandeira do arco-íris LGBT. Nada mais natural, já que homossexuais dominam o meio corporativo hoje em dia. Os consumidores homossexuais são hoje tão numerosos que todo produto lançado no mercado que não se adeque aos parâmetros de consumo deles está condenado à morte. E quem insistir em desafiar esse "novo dogma", está condenado a sofrer boicotes comerciais sempre muito discretos e eficazes. 

Daí, empresas como a Pirelli, cujo Calendário nunca foi alvo da ira das feministas de Anos 60 e 70, agora encampa uma pauta como essa na esperança de vir a ser -- quem sabe? -- a marca de pneus favorita das motoristas e dos motoristas homossexuais.


Bom, mas o motivo de estarmos falando do Calendário Pirelli é que a Editora Taschen -- sim, a mesma do livro de fotos de Gisele Bündchen comentado aqui semana passada -- lançou há três meses um livro celebrando seus anos de publicação. Trata-se um volume belíssimo chamado "The Calendar - 50 Years And More", no padrão luxuoso habitual da Taschen, que custa 70 dólares e reúne todas as edições já feitas da folhinha mais fashionista do mundo.

Com 576 páginas, o livro traz top-models e atrizes como Alessandra Ambrosio, Gisele Bündchen, Adriana Lima, Isabeli Fontana, Naomi Campbell, Laetitia Casta, Cindy Crawford, Penélope Cruz, Milla Jovovich, Heidi Klum, Angela Lindvall, Sophia Loren e Kate Moss em cliques ousados de renomados fotógrafos como Richard Avedon, Peter Beard, Patrick Demarchelier, Nick Knight, Karl Lagerfeld, Inez van lamsweerde e Vinoodh Matadin, Annie Leibovitz, Peter Lindbergh, Sarah Moon, Terry Richardson, Herb Ritts, Mario Sorrenti, Bert Stern, Mario Testino, Bruce Weber e Steven Meisel, responsável pela edição de 2015.


Apesar de ser bancado por um fabricante de Pneus, o Calendário Pirelli nunca esteve exposto em paredes de borracharias. Pelo contrário, é um "collectors' item" disputadíssimo, pois não é vendido, apenas distribuído para clientes e pessoas escolhidas a dedo pela empresa. 

A primeira versão do Calendário foi publicada em 1963 pela filial inglesa da Pirelli, que estava em busca de uma nova estratégia de marketing no mercado. 

E então, em 1964, nasceu o conceito do Calendário Pirelli como é conhecido hoje, ainda que sem um tema principal, com imagens despojadas, modelos pouco conhecidas e o olhar do grande fotógrafo inglês Robert Freeman. As fotos dessa primeira edição foram feitas em Mallorca, na Espanha, e são sensuais, porém comportadas.

Na medida em que é uma peça de marketing de uma grande empresa, o Calendário Pirelli sempre tratou de se adequar às mudanças sociais e tecnológicas acontecidas ao longo desse meio século. Em tempos mais liberais, fotógrafos com uma pegada mais artística promoveram verdadeiros showcases artísticos em trabalhos de ruptura. Já em tempos mais conservadores, foram convocados fotógrafos especializados em moda para fazer um trabalho que fosse, antes de mais nada, visualmente bonito. 

De uma maneira ou de outra, as fotos do Calendário Pirelli sempre acontecem em locações extremamente descoladas e com as modelos mais caras e mais badaladas do mercado. O próprio avanço da tecnologia e da linguagem fotográfica podem ser apreciadas no conjunto de fotografias feitas ao longo desses 50 anos.


Na década de 70, por exemplo, as cores das imagens ficam mais fortes e mais quentes, e as modelos cada vez mais sexy e provocantes. 

Já a década de 80 trouxe as supermodelos magérrimas, lindas e glamourosas, ocupando o lugar no imaginário masculino que antes pertencia às grandes atrizes de cinema. Modelos negras como Iman e Naomi Campbell começaram a aparecer nas cobiçadas páginas do calendário.

A década de 90, por sua vez, foi palco de ensaios sensuais antológicos realizados por Arthur Elgort (inspirado nos Jogos Olímpicos) ou pelo lendário Richard Avedon (inspirado nas quatro estações do ano). Foi um período em que o Calendário ganhou um status artístico inabalável, que, de certa forma, persiste até hoje.


Foi também nos Anos 90, mais precisamente em 1998, num ensaio quase todo em preto & branco, que o fotógrafo Bruce Weber colocou pela primeira vez homens nas fotos clicadas para a Pirelli. Não eram modelos, e sim figuras importantes como B.B. King, Ewan McGregor e Bono Vox. Foi um choque para os fãs do Calendário. 

Na época, rolou solto o comentário de que aquilo era o princípio do fim de uma era. Mas não. Em 1999, o Calendário trouxe de volta as fotos sensuais de mulheres que sempre o caracterizaram.


Então, em 2000, convidaram a fotógrafa Annie Leibovitz (Rolling Stone, Vanity Fair) para cuidar do Calendário naquele ano, e ela tratou os modelos como se fossem peças de um taxidermista. Fotografou os corpos como objetos, recortando-os e aplicando uma espécie de textura nas imagens, deixando-as ainda menos humanas. Paradoxalmente, foi a primeira vez que o Calendário trouxe fotos de nu frontal.

Em 2001, Mario Testino reuniu as modelos Gisele Bündchen, Mariana Weickert, Fernanda Tavares e Ana Claudia Michels e as fotografou glamourosamente em Nápoles resgatando a sensualidade das décadas de 40 e 50. Em 2002, Peter Lindberg optou por fotografar apenas atrizes, algumas usando lingerie de Giorgio Armani, numa grande homenagem a Hollywood. E em 2003, Bruce Weber inovou novamente, unindo pela primeira vez homens e mulheres no calendário, mesclando fotos em cores e em preto & branco, com um resultado surpreendente.


Desde então, o Calendário vem seguindo sua rota às vezes ousada, outras vezes nem tanto, sempre de forma cícilica, orientado artisticamente pela escolha dos fotógrafos convidados pelo Marketing da Pirelli.

Em 2010 e 2013, o Brasil serviu de locação para as fotos do Calendário. 

Praticamente todas as edições do Calendário realizadas nos últimos 15 anos tiveram ao menos uma modelo brasileira em seu elenco.


Esse livrão da Taschen, "The Calendar - 50 Years And More", mostra tudo isso, e muito mais. 

Traz a íntegra do ensaio de 1963, que não chegou a ser publicado na época. 

Frisa que entre 1975 e 1983, devido à crise do petróleo que golpeou a economia mundial, o Calendário teve sua publicação suspensa, voltando a ser publicado somente em 1984.


E apresenta pela primeira vez um ensaio de 1986 clicado por Helmut Newton que, devido a problemas familiares, ficou inacabado. Newton teve que ser substituído por outro fotógrafo na ocasião.


Daí, só nos resta torcer para que a edição do ano que vem do Calendário Pirelli com mulheres "fortes" seja apenas mais uma idiossincrasia entre as várias que compoem a trajetória dessa instituição masculina tão importante quanto a edição anual "swimsuit" da revista Sports Illustrated e a eleição da Playmate do Ano da Revista Playboy. 



Está na hora dos grupos corporativistas femininos e homossexuais serem menos cruéis com esses pobres machos acuados em que nos transformamos ao longo dos anos. 

Não se iludam: somos inofensivos. Se existe algum inimigo, acreditem: não somos nós. Não nos estingam. Clemência!





Odorico Azeitona está pouco a pouco 
tornando-se um hábil resenhista 
de livros de mulher pelada, 
e não só está adorando isso 
como pretende, na medida do possível, 
tentar começar a ganhar a vida 
fazendo unica e exclusivamente isso 
daqui por diante.
Escreve todas as quartas-feiras
 em LEVA UM CASAQUINHO



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